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1 DEFINIÇÃO A bioética é o estudo sistemático das dimensões morais, incluindo visão moral, decisões, condutas e políticas das ciências da vida e atenção à saúde, utilizando uma variedade de metodologias éticas em um cenário interdisciplinar. A bioética emerge no contexto científico como uma reflexão sobre tudo o que interfira no respeito à dignidade da vida, representando o resgate da ética, da condição plena de cidadania e do respeito às diferenças. Em suma: A bioética envolve uma análise crítica e reflexão sobre os dilemas morais e éticos que surgem devido aos avanços científicos e tecnológicos na área da saúde e da biologia. Ela busca estabelecer princípios e diretrizes para orientar a conduta humana e as decisões tomadas em relação a questões como experimentação em seres humanos, reprodução assistida, manipulação genética, cuidados de saúde, fim da vida, pesquisa com células-tronco, entre outros. MORAL X ÉTICA Moral: Vem da sociedade. • Tem aspecto prescritivo, legal, obrigatório, impositivo, coercitivo ou punitivo. Ética: Vem da pessoa. • Valor captado e apreciado internamente e como tal, na reflexão do sujeito. Ética e moral são conceitos filosóficos que, apesar da estreita relação que mantêm com o comportamento em sociedade, possuem significados distintos. A moral está baseada em costumes e convenções estabelecidas por cada grupo. Por sua vez, a ética se vincula ao estudo e à aplicação desses valores e princípios no âmbito das relações humanas. • Ética pode ser definida como “um conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens na sociedade em que vive, garantindo, outrossim, o bem-estar social”. Ou seja, ética é a forma que o homem deve se comportar no seu meio social. • Moral é o conjunto de regras aplicadas no cotidiano e usadas continuamente por cada cidadão. Essas regras orientam cada indivíduo, norteando as suas ações e os seus julgamentos sobre o que é moral ou imoral, certo ou errado, bom ou mau. CONCEITOS Imoral: contraria o que foi exposto a respeito da moral. Quando há falta de pudor, quando há imoralidade. Aquilo que é contrário a moral. Amoral: é a pessoa que não tem senso do que seja moral, ética. A questão moral para este indivíduo é desconhecida, estranha e, portanto, não leva em consideração preceitos morais. Moral: é o que está de acordo com os bons costumes e regras de condutas propostos. Em suma, moral é um conjunto de valores e normas do que é permitido ou proibido, o imoral é aquele que tem conhecimento do que é moral, mas não o pratica e o amoral é aquele que não tem conhecimento das normas morais. DESENVOLVIMENTO DA BIOÉTICA EM SEU CONCEITO HISTÓRICO O nascimento da bioética tem suas raízes ideológicas nas ruínas da 2ª guerra mundial, quando se estimulou a consciência dos homens a uma profunda reflexão, com o intuito de se estabelecer uma fronteira entre a ética e o comportamento. A partir desse marco, estimulou-se a exigência de uma ética no campo biomédico, fundamentada na razão e nos valores objetivos da vida e da pessoa. ALEMANHA NAZISTA • Genocídio de judeus • Experiencias médicas em nome da ciência Dentre as atrocidades cometidas pelos nazistas sabe-se que eram feitos testes com gêmeos (injeção de sangue de um no outro, dissecava-os vivos), transplantes (tentava-se fazer transplante de medula óssea em cobaias que acabavam paralisadas, além da troca de olhos de irmãos INTRODUÇÃO E PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA 2 gêmeos), matavam pessoas com olhos de cor diferente para guarda-los, tentativa de mudança de cor dos olhos através de injeções, esterilizavam judeus, ciganos e deficientes de forma massiva, testavam a resistência de prisioneiros pela sua submersão em água gelada, além de coleções de ossadas de anões e deficientes. Entre os anos de 1945 e 1946, os atos cometidos na Alemanha nazista, foram julgados no tribunal de Nuremberg. O regime nazista tentava justificar os atos por meio das justificativas: • A investigação era decorrente de ordens superiores • Os indivíduos estudados estavam condenados à morte • A aquisição dos conhecimentos científicos deveria predominar sobre os direitos individuais. A partir disso, foi instituído o código de Nuremberg: 1. O consentimento voluntário do ser humano é essencial 2. O experimento deve ser útil para o bem da sociedade, mas não podem ser feitos de maneira casuística ou desnecessariamente 3. O experimento deve ser baseado em resultados de experimentação em animais 4. O experimento deve ser conduzido de maneira a evitar todo sofrimento e danos desnecessários, quer físicos, quer materiais. 5. Não deve ser conduzido qualquer experimento quando existirem razões para acreditar que pode ocorrer morte ou invalidez permanente 6. O grau de risco aceitável e limitado 7. Devem ser tomados cuidados especiais para proteger o participante do experimento de qualquer possibilidade de dano, invalides ou morte 8. O experimento deve ser conduzido apenas por pessoas cientificamente qualificadas 9. O participante do experimento deve ter a liberdade de se retirar no decorrer do experimento 10. O pesquisador deve estar preparado para suspender os procedimentos experimentais em qualquer estágio, se ele tiver motivos razoáveis para acreditar que a continuação do experimento provavelmente causará danos, invalidez ou morte para os participantes. A bioética na medicina discute dentre alguns temas polêmicos: • Eutanásia • Distanásia • Autonomia • Como dar más notícias • Alocação de recursos • Ordens de não ressuscitação • Suspensão ou não instalação de alimentação e/ou hidratação artificial • Sedação paliativa (sedação controlada) • Finitude da vida Conceitos de saúde e doença: Segundo a OMS, saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não mera ausência de doença ou invalidez. A constituição federal de 1988 inaugurou um avanço nos direitos de cidadania, garantindo o direito universal e igualitário à saúde. A bioética é a reflexão sobre a adequação ou inadequação de ações envolvidas com a vida: • Competência científica • Conhecimento • Tecnologia • Técnica • Competência humanista • Sabedoria • Confiança • Ética PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA Os princípios da bioética vêm de uma necessidade de estabelecer uma metodologia para analisar os casos concretos e os problemas éticos que emergiram da pratica da assistência à saúde. Em 1979 Beauchamp e Childress publicaram “Princípios da Bioética”, em que dita uma teoria fundamentada em 4 princípios: • Não-maleficência • Beneficência • Autonomia • Justiça PRINCIPIALISMO O principialismo é a teoria ética pratica normativa que estabelece os fundamentos para a bioética. 3 Considerada Prima facie, isto é, possuem validade à primeira vista, mas não são absolutos. Em suma, o principialismo busca fundamentar a bioética e esses fundamentos são algo a ser considerado em primeira vista, mas não são absolutos, pois casos variam e a conduta bioética pode mudar. Os fundamentos do principialismo ditam uma forma peculiar de definir e manejar os valores envolvidos nas relações dos profissionais de saúde e seus pacientes. Esses princípios não possuem um caráter absoluto, nem tem prioridade um sobre o outro. Eles irão servir como regras gerais para orientar a tomada de decisão frente aos problemas éticos e para ordenar os argumentos nas discussões de caso. NÃO MALEFICÊNCIA Há obrigação de não infligir o dano intencional. Evitar intervenções que determinem desrespeito à dignidade do paciente como pessoa. Se uma pessoa já se encontra em mal estado (dores, enfermidades, depressão, etc.) é sensato que se evite ao máximo mais um dano, seja ele qual for. Asseguraque sejam minorados ou evitados danos físicos aos sujeitos da pesquisa ou pacientes. Riscos da pesquisa são as possibilidades de danos de dimensão física, psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual do ser humano, em qualquer fase de uma pesquisa e dela decorrente. Dano associado ou recorrente da pesquisa é o agravo imediato ou tardio ao indivíduo ou à coletividade, com nexo causal comprovado, direto ou indireto, decorrente do estudo científico. BENEFICÊNCIA Fazer o bem é um dever. É obrigação ética de maximizar os benefícios e minimizar os danos ou prejuízos. Reconhecimento do bem supremo que é a vida humana e do reconhecimento de sua dignidade, que transcende seus aspectos materiais, qualquer que seja a situação biológica econômica ou cultural em que o indivíduo se encontre. Evitar submeter o paciente a intervenções cujo sofrimento resultante seja muito maior que o benefício eventualmente conseguido. Assegura o bem-estar das pessoas, evitando danos e garantindo que sejam atendidos seus interesses. O tipo de beneficência esperado do profissional da saúde em relação ao paciente é o específico. Tem o dever, estabelecido a partir do juramento hipocrático, de agir em benefício do paciente. Ele não faz “caridade”, cumpre o dever da beneficência. Limitantes: • Definir o que é “bom” para o paciente • A não aceitação do paternalismo • Autonomia do paciente • Utilização dos critérios de justiça O juramento de Hipócrates insere obrigação de não maleficência e beneficência: "Usarei meu poder para ajudar os doentes com o melhor de minha habilidade e julgamento; abster- me-ei de causar danos ou de enganar a qualquer homem com ele." O princípio de não maleficência envolve abstenção, enquanto o princípio da beneficência requer ação. O princípio de não maleficência é devido a todas as pessoas, enquanto que o princípio da beneficência, na prática, é menos abrangente. AUTONOMIA O ser humano tem o direito de usufruir do seu livre- arbítrio. Os serviços e profissionais de saúde devem respeitar à vontade, os valores morais e as crenças, a historicidade, as idiossincrasias de cada pessoa ou, em caso de ausência de sua consciência, de seu representante legal. Qualquer imposição tornar-se-á uma postura ditatorial e, por isso, agressão à intimidade do ser humano. O princípio do respeito à pessoa é ponto central nas discussões bioéticas. Requer do profissional: respeito à vontade, à crença, aos valores morais do sujeito, do paciente, reconhecendo o domínio do paciente sobre sua vida e o respeito à sua intimidade. 4 Em pesquisa: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, a ser feito pelo pesquisador e preenchido pelos sujeitos da pesquisa ou seus representantes legais, quando os sujeitos estiverem com sua capacidade. Um profissional da saúde deve respeitar as escolhas e decisões de seus pacientes: • Falar a verdade sempre • Respeitar a privacidade • Proteger as informações confidenciais • Obter consentimento dos pacientes para fazer intervenções • Quando solicitado, ajudar a tomar decisões importantes Respeitar a autonomia significa, ainda, ajudar o paciente a superar seus sentimentos de dependência, equipando-o para hierarquizar seus valores e preferências legítimas para que possa discutir as opções diagnósticas e terapêuticas. Circunstâncias especiais: • Incapacidade: de crianças, adolescentes ou adultos, por diminuição da capacidade de raciocínio e decisão, e nas patologias neurológicas e psiquiátricas severas. • Situações de urgência: quando se necessita agir e não se pode obter o consentimento. • Obrigação legal de declaração das doenças de notificação compulsória. • Risco grave para a saúde de outras pessoas: obrigação de informar mesmo sem a autorização do paciente. Transfusão sanguínea e testemunhas de jeová: • Conflitos entre proposta terapêutica e recusa do paciente. • Dilema médico em aceitar a vontade do paciente ou cumprir sua obrigação. • Autonomia do médico x autonomia do paciente • Orientação jurídica Constituição da República = lei fundamental de organização do Estado brasileiro. Contém princípios fundamentais dos outros ramos jurídicos, nenhuma norma jurídica poderá contrariá- la. Direitos individuais básicos: vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade (art. 5o, caput). Por um lado: Não importa ao direito e à aplicação das leis que o paciente tenha dado seu consentimento para a realização de ato destinado a interromper a vida. O texto legal é expresso ao assegurar a proteção da vida e, via de consequência, ao vedar a prática de atos que impeçam que a vida se esgote de maneira natural ou espontânea. Por outro lado: Liberdade de escolha limitada pela necessidade de não afetar a vida e a liberdade de terceiros. Para DINIZ (2008) a pessoa humana e sua dignidade constituem fundamento e fim da sociedade e do Estado, sendo o valor que prevalecerá sobre qualquer tipo de avanço científico e tecnológico. O artigo 31 (56) do Código de Ética Médica refere- se à autonomia: “É vedado ao médico: Art. 31 – Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente perigo de morte (vida).” O paciente, salvo nos casos de comprovada iminência de morte, pode decidir não aceitar certas práticas propedêuticas ou terapêuticas, e o médico terá de respeitar essa decisão (princípio da autonomia).” Deixar de respeitar a vontade de qualquer pessoa, considerada capaz física ou mentalmente, ou alimentá-la compulsoriamente, devendo cientificá- la das prováveis complicações do jejum prolongado e, na hipótese de risco iminente de morte, tratá-la. TESTEMUNHAS DE JEOVÁ - ARGUMENTAÇÃO FRENTE A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA • Fundamento religioso para recusa: “Não deveis tomar o sangue de carne alguma, pois a vida de toda carne é o seu sangue. Qualquer pessoa que tomar dele será cortada” (Levítico 17:13, 14). • Fundamento legal: Constituição Federal, no artigo 1º, III – dignidade da pessoa humana e no artigo 5º, VI – liberdade religiosa. Direito à vida e direito à crença religiosa - idêntico grau de importância. Não haveria sobreposição de um valor em relação ao outro. A Testemunha de Jeová acredita que ao se submeter à transfusão, jamais será perdoada. Tal fato traz para sua vida consequências religiosas importantes, que a afetarão definitivamente. 5 Realização da transfusão de sangue = ação de acordo com a lei e com o contido no Código de Ética Médica. O direito à vida se sobrepõe à liberdade de crenças religiosas. Assegurado o cumprimento do dever legal e a realização de transfusão de sangue. Obrigação configurada quando se está diante de iminente risco de morte. Testemunhas de Jeová - argumentos centrados em dispositivos constitucionais e artigos do Código de Ética Médica. O principal argumento utilizado diz respeito ao desrespeito causado à vida da pessoa que é submetida à transfusão de sangue compulsória, já que lhe é imposto tratamento que contraria sua crença religiosa. Julgados - o respeito à manifestação de vontade das Testemunhas de Jeová é legítimo até o momento em que se caracteriza risco de morte. Portanto, o reconhecimento do direito se dá durante o lapso de tempo em que são viáveis alternativas terapêuticas que visem obstar a transfusão de sangue. Constatado o risco de morte, a transfusão deve ser feita, em cumprimento a dever legal imposto ao médico. JUSTIÇA O princípio da justiça parte da equidade: • distribuição de bens e benefícios; • reconhecer as diferentes necessidades; • reconhecer igualmente o direito de cada um a partir de suas diferenças; Justa distribuição dos bens e serviços implicaque o acesso a eles deve ser sempre universal. Deve-se avaliar quem necessita mais e preceder a atenção igualitária. Equidade na distribuição de bens e benefícios. Igualdade de tratamento e à justa distribuição das verbas do Estado para a saúde, a pesquisa etc. É preciso respeitar com imparcialidade o direito de cada um. Não seria ética uma decisão que levasse um dos personagens envolvidos (profissional ou paciente) a se prejudicar. A SAÚDE ANTIGAMENTE ERA DIVIDIDA ASSIM: • O escravo era atendido por médico escravo; • O artesão era sempre impossibilitado de receber tratamentos; • O rico recebia o tratamento completo, e tinha todo o acesso necessário a saúde; Hoje: O princípio da justiça está associado numa tentativa de igualar as oportunidades de acesso a saúde, preocupando-se com a equidade na distribuição de bens e recursos considerados comuns. CONFLITO ENTRE PRINCÍPIOS AUTONOMIA X BENEFICÊNCIA • Nem sempre o paciente tem condições de avaliar qual o melhor tratamento para ele (afinal ele é leigo, não tem o conhecimento técnico necessário para isso). • Imaginemos um paciente que tem uma doença que exige a prescrição de medicamentos. Poderá ocorrer de ele se recusar a tomar os remédios. Contudo, nesse caso, o profissional não pode alegar que “o paciente é adulto, sua autonomia deve ser respeitada e por isso ele faz o que ele quiser”. Ao contrário, o profissional (por ter o conhecimento técnico que diz que aquele medicamento é necessário) deverá se esforçar ao máximo para explicar ao paciente a importância PRINCÍPIOS • Para cada um, uma igual porção; • Para cada um, de acordo com sua necessidade; • Para cada um, de acordo com seu esforço; • Para cada um, de acordo com sua contribuição; • Para cada um, de acordo com seu mérito; • Para cada um, e acordo com as regras de livre mercado; “Portanto podemos definir que a justiça dentro da bioética muitas vezes não é o direito.” "A distribuição natural dos bens não é justa ou injusta; nem é injusto que os homens nasçam em algumas condições particulares dentro da sociedade. Estes são simplesmente fatos naturais. O que é justo ou injusto é o modo como as instituições sociais tratam destes fatos".
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