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Farmacologia 5ed Rang Dale_part9

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O C O R A Ç Ã O 
de C a 2 + também provoca aumento da automaticidade, 
em decorrência do efeito da [ C a 2 + ] i sobre a corrente 
de entrada transitória, podendo resultar numa série de 
potenciais de ação após um único estímulo (Fig. 17.2). 
A ativação dos receptores p t repolariza o miocárdio 
lesado ou hipóxico ao estimular a bomba de N a + / K + . 
Esse processo pode restaurar a função caso tenha ocorri-
do assistolia após o infarto do miocárdio, e a adrenalina 
(epinefrina) constitui uma das substâncias mais impor-
tantes durante a parada cardíaca. 
A redução da eficiência cardíaca pelas catecolaminas 
é relevante, visto que significa um aumento da necessida-
de de oxigênio do miocárdio, mesmo se não houver ne-
nhuma alteração do trabalho cardíaco. Isso limita o uso 
de agonistas P, como a adrenalina (epinefrina) e a dobu-
tamina, no choque (Cap. 18). O infarto do miocárdio 
provoca ativação simpática (Fig. 17.6), que tem o efeito 
indesejável de aumentar as necessidades de oxigênio do 
miocárdio lesado. 
Sistema parassimpático 
A atividade parassimpática produz efeitos que, em geral, 
são opostos aos da ativação simpática, isto é: 
• lentificação cardíaca e redução da automaticidade; 
• inibição da condução AV 
1 0 s 
Estimulação simpática 
1 0 s 
400 ms 
NA 
Controle 
Potencial 
de ação 
® 
Estimulação vagai 400 ms 
Potencial 
de ação 
Fig. 17.8 Regulação autônoma do batimento cardíaco. 
A e B Efeitos da estimulação simpática e da noradrenal ina 
(NA; norepinefrina). C e D Efeitos da estimulação 
parassimpática e da aceti lcol ina (ACh). A estimulação 
simpática (A) aumenta a inclinação do potencial de 
marcapasso, bem como a freqüência cardíaca, enquanto 
a estimulação parassimpática (C) anula o potencial de 
marcapasso, hiperpolariza a membrana e interrompe 
temporar iamente o coração (seio venoso de rã). A NA (B) 
prolonga o potencial de ação, enquanto a A C h (D) o 
encurta (átrio de rã). (De: (A e C) Hutter O F, Trautwein W 
1956 J G e n Physiol 39 : 7 1 5 ; (B) Reuter H 1974 J Physiol 2 4 2 : 
4 2 9 ; (D) Gi les W R, Noble S J 1 976 J Physiol 2 6 1 : 1 03.) 
Esses efeitos resultam da ocupação dos receptores 
muscarínicos de acetilcolina ( M 2 ) , que são encontrados 
em quantidades abundantes nos tecidos nodal e atrial, 
mas que são escassos nos ventrículos. Esses receptores 
estão acoplados negativamente à adenilato ciclase e, por 
conseguinte, reduzem a formação de c A M P , atuando 
através da inibição da corrente lenta de C a 2 + , em oposi-
ção aos receptores Pj-adrenérgicos. Os receptores M 2 
também abrem um canal de potássio (denominado K A C h ) . 
Controle autônomo do coração 
• A at iv idade s impát ica, ao a tuar através dos 
receptores (5,-adrenérgicos, a u m e n t a a f reqüênc ia , 
a contrat i l idade e a au tomat i c idade cardíacas, 
porém reduz a ef iciência cardíaca (em relação ao 
consumo de ox igênio) . 
• Os receptores (3,-adrenérgicos a t u a m através do 
aumen to da fo rmação de cAMR que a u m e n t a as 
correntes d e C a 2 + . 
• A at iv idade parass impát ica, ao a tuar através dos 
receptores muscarínicos M 2 , p roduz lent i f icação 
cardíaca, d im inu ição da força de cont ração 
(apenas nos átrios) e in ib ição da condução 
atr ioventr icular. 
• Os receptores M 2 i n ibem a f o rmação de c A M P e 
t ambém ab rem os cana is de potássio, causando 
h iperpolar ização. 
O conseqüente aumento da permeabilidade ao K + pro-
duz uma corrente hiperpolarizante, que se opõe à cor-
rente de marcapasso dir igida para o interior da célula, 
reduzindo a freqüência cardíaca e a automaticidade (ver 
Fig. 17.8). A atividade vagai está freqüentemente aumen-
tada durante o infarto do miocárdio, tanto em associação 
à estimulação aferente vagai, quanto como efeito colate-
ral dos opióides utilizados no controle da dor, sendo os 
efeitos parassimpáticos importantes ao predisporem o i n -
divíduo a arritmias agudas. 
A estimulação vagai d i m i n u i a força de contração 
dos átrios associada a uma acentuada redução do po-
tencial de ação (Fig. 17.8). Tanto o aumento da per-
meabilidade ao K + quanto a redução da corrente de 
C a 2 + contr ibuem para o bloqueio de condução no nodo 
AV, onde a propagação depende da corrente de C a 2 + . 
O encurtamento do potencial de ação atrial d i m i n u i o 
período refratário, podendo resultar em arritmias de 
reentrada. Os vasos coronários carecem de inervação 
colinérgica; por conseguinte, o sistema parassimpáti-
co exerce pouco efeito sobre o tônus das artérias coro-
nárias (ver C a p . 10).* 
'"Entretanto, Deus teve a bondade de fornecer ao endotélio 
coronariano receptores muscarínicos ligados à síntese de NO (ver 
Caps. 14 e 18), presumivelmente para o deleite dos farmacologistas 
vasculares. 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M OS PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
AGENTES ANTIARRÍTMICOS 
Em 1970, Vaughan Williams propôs uma classificação dos 
agentes antiarrítmicos com base nos seus efeitos eletrofisi-
ológicos. Esta classificação proporciona um ponto de par-
tida útil para analisar os mecanismos envolvidos, embora 
muitas substâncias importantes não se ajustem claramente 
nessa classificação (Tabela 17.1). Além disso, o tratamento 
de emergência das arritmias graves é habitualmente efetu-
ado por meios físicos (por exemplo, marcapasso ou cardi-
oversão elétrica através da aplicação de choque de corren-
te direta ao tórax ou através de dispositivo implantado), 
mais do que por meios farmacológicos. 
E x i s t e m quatro classes de substâncias (ver Tabe-
la 17.2). 
T a b e l a 17.1 A g e n t e s a n t i a r r í t m i c o s n ã o 
c lass i f icados n o s is tema d e V a u g h a n W i l l i a m s 
Substância Uso 
Atropina 
Adrena l ina (epinefrina) 
Isoprenalina 
Digoxina 
Adenos ina 
Cloreto de cálcio 
Cloreto de magnésio 
Bradicardia sinusal 
Parada cardíaca 
Bloqueio cardíaco 
Fibrilação atrial rápida 
Taquicardia 
supraventricular 
Taquicardia ventricular 
decorrente de 
hipercalemia 
Fibrilação ventricular, 
toxicidade da digoxina 
Tabe la 17.2 Resumo dos agentes a n t i a r r í t m i c o s 
(c lassi f icação de V a u g h a n Wil l iams) 
Classe Exemplo(s) Mecanismo 
Ia 
Ib 
III 
IV 
Disopiramida 
Lidocaína 
Flecainida 
Propranolol 
Amiodarona , 
sotalol 
Verapami l 
3 1 2 
Bloqueio dos canais de 
sódio (dissociação 
intermediária) 
Bloqueio dos canais de 
sódio (dissociação rápida) 
Bloqueio dos canais de 
sódio (dissociação lenta) 
Antagonismo dos 
receptores 
beta-adrenérgicos 
Bloqueio dos canais de 
potássio 
Bloqueio dos canais de 
cálcio 
Classe I: substâncias que bloqueiam os canais de sódio 
sensíveis à voltagem. São subdivididas em Ia, lb e Ic 
(ver adiante). 
Classe II: antagonistas dos receptores p-adrenérgicos. 
Classe III: substâncias que prolongam consideravelmen-
te o potencial de ação cardíaco. 
Classe TV: antagonistas do cálcio. 
A Fig. 17.9 mostra a fase do potencial de ação em que 
cada uma dessas classes de substâncias exerce seu princi-
pal efeito. 
MECANISMOS DE AÇÃO 
Substâncias da classe I 
As substâncias da classe I bloqueiam os canais de sódio, 
exatamente como o fazem os anestésicos locais, através 
de sua ligação a sítios da subunidade a (ver Caps. 4 e 43). 
C o m o esta ação inibe a propagação do potencial de ação 
em muitas células excitáveis, foi descrita como atividade 
"estabil izadora da membrana" , uma expressão que é 
melhor evitar, visto que o mecanismo iônico envolvido já 
foi elucidado. Seu efeito característico sobre o potencial 
de ação consiste em reduzir a taxa máxima de despolari-
zação durante a fase 0. 
O motivo da subdivisão dessas substâncias nas classes 
Ia, lb e Ic reside no fato de que os primeiros exemplos, a 
quinidina e a procainamida (classe Ia), apresentam efei-
tos diferentes em relação a muitos dos fármacos desen-
volvidos mais recentemente, apesar de todos comparti-
lharem o mesmo mecanismo básico de ação. U m a expli-
cação parcial para essas diferenças funcionais provémde 
estudos eletrofisiológicos das características do bloqueio 
dos canais de sódio produzido por diferentes substâncias 
da classe I. 
O conceito central é o de bloqueio dos canais depen-
dente do uso. Esta característica é que permite que todas 
as fármacos da classe I tenham a capacidade de bloquear 
a excitação de alta freqüência do miocárdio que ocorre 
nas taquiarritmias, sem impedir os batimentos cardíacos 
em freqüências normais. Os canais de sódio existem em 
três estados funcionais distintos: em repouso, aberto e 
refratário. Os canais mudam rapidamente de seu estado 
de repouso para o estado aberto em resposta à despolari-
zação, sendo o processo conhecido como ativação. A des-
polarização mantida, como a que ocorre no músculo is-
quêmico, faz com que os canais mudem mais lentamente 
do estado aberto para o estado refratário (inativação), 
devendo a membrana ser repolarizada por algum tempo 
para restaurar o estado de repouso do canal antes que 
possa ser novamente ativado. As substâncias da classe I 
ligam-se aos canais mais fortemente quando estão no es-
tado aberto ou refratário e menos fortemente aos canais 
no estado de repouso. Por conseguinte, sua ação mostra 
a propriedade de "dependência do uso" (isto é, quanto 
Aesculapius
O C O R A Ç Ã O 
Agonis tas B 
4 - ® -
Potencial de 
marcapasso -+-
(fase 4) 
©<3>* - Despolarização rápida - v (fase 0) 
C l a s s e I 
Fig. 17.9 Efeitos dos agentes antiarrítmicos sobre as 
diferentes fases (definidas na Fig. 17.1) do potencial de 
ação cardíaco. 
mais freqüentemente os canais são ativados, maior o grau 
de bloqueio produzido). 
As substâncias da classe Ib, como, por exemplo, a lido-
caína, associam-se e dissociam-se rapidamente dentro do 
tempo do batimento cardíaco normal. A substância liga-se 
aos canais abertos durante a fase 0 do potencial de ação 
(afetando muito pouco a velocidade de elevação, porém 
deixando muitos canais bloqueados quando o potencial 
de ação atinge o seu pico). A dissociação ocorre a tempo 
para o próximo potencial de ação, contanto que o ritmo 
cardíaco seja normal. Todavia, um batimento prematuro 
será impedido, uma vez que os canais ainda estão bloquea-
dos. Além disso, as substâncias da classe Ib ligam-se de 
modo seletivo aos canais refratários e, por conseguinte, 
exercem bloqueio preferencial quando as células estão 
despolarizadas como, por exemplo, na isquemia. 
As substâncias da classe Ic, como a flecainida e á 
encainida, associam-se e dissociam-se muito mais lenta-
mente, atingindo, assim, um nível de bloqueio de esta-
do de equilíbrio dinâmico que não varia de modo apre-
ciável durante o ciclo cardíaco. Além disso, exibem ape-
nas preferência marginal pelos canais refratários, de mo-
do que não são específicas para o miocárdio lesado. Por 
conseguinte, produzem uma redução bastante geral da 
excitabilidade e não discriminam particularmente os ba-
timentos prematuros ocasionais, como o fazem as subs-
tâncias da classe Ib, porém suprimem os ritmos de reen-
trada que dependem de vias de condução unidirecio-
nais ou intermitentes, que operam numa baixa margem 
de segurança (por exemplo, algumas formas de FA pa-
roxística). Inibem acentuadamente a condução através 
do sistema de His-Purkin je . 
A classe Ia, que constitui o grupo mais antigo (por 
exemplo, quinidina, procainamida, disopiramida), situa-
se, no que tange às suas propriedades, a meio caminho 
entre as classes Ib e Ic; todavia, além disso, essas substân-
cias prolongam a repolarização, embora menos acentua-
damente do que as substâncias da classe III (ver adiante). 
Substâncias da classe II 
As substâncias da classe II compreendem os antagonistas 
dos receptores p (por exemplo, propranolol). 
A adrenalina (epinefrina) pode causar arritmias, em 
virtude de seus efeitos sobre o potencial de marcapas-
so e sobre a corrente de entrada lenta de C a 2 + (ver 
anteriormente). As arritmias ventriculares que ocorrem 
após infarto do miocárdio resultam, em parte, do au-
mento da atividade simpática (ver F ig . 17.6), forne-
cendo uma base racional para o uso de antagonistas 
dos receptores P-adrenérgicos nesse contexto. A con-
dução AV depende criticamente simpática, e os anta-
gonistas dos receptores P-adrenérgicos aumentam o pe-
ríodo refratário do nodo AV e, portanto, impedem ata-
ques recorrentes de TSV. Os antagonistas dos recepto-
res p-adrenérgicos também são uti l izados na preven-
ção de ataques paroxísticos de FA quando ocorrem 
durante a atividade simpática. 
Substâncias da classe III 
A categoria de substâncias da classe III baseou-se, or igi -
nalmente, no comportamento incomum de uma substân-
cia peculiar, a amiodarona (ver adiante), embora outras 
tenham sido descritas desde então com propriedades se-
melhantes (por exemplo, sotalol). Tanto a amiodarona 
quanto o sotalol exibem mais de uma classe de ações an-
tiarrítmicas. A característica particular que as define como 
substâncias da classe III é o fato de prolongarem conside-
ravelmente o potencial de ação cardíaco. O mecanismo 
desse efeito ainda não foi totalmente elucidado, porém 
envolve o bloqueio de alguns dos canais de potássio que 
atuam na repolarização cardíaca, incluindo o retificador 
de saída (tardio). O prolongamento do potencial de ação 
aumenta o período refratário, responsável pela poderosa 
e variada atividade antiarrítmica, como, por exemplo, ao 
interromper as taquicardias de reentrada e ao suprimir a 
atividade tópica. Entretanto, todas as substâncias que 
prolongam o potencial de ação cardíaco (detectado c l in i -
camente na forma de prolongamento do intervalo Q-T 
no eletrocardiograma) também podem, paradoxalmen-
te, exibir efeitos pró-arrítmicos, notavelmente uma for-
ma polimórfica de taquicardia ventricular, denominada 
(de modo um tanto extravagante) "torsade de pointes" 
(em virtude do aspecto do traçado do E C G que, segundo 
se afirma, lembra essa seqüência de balé). Isso ocorre par-
ticularmente em pacientes em uso de outros fármacos 
passíveis de prolongar o intervalo Q-T, incluindo vários 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M O S PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
agentes antipsicóticos, em pacientes com distúrbios dos 
eletrólitos envolvidos na repolarização (por exemplo, 
hipocalemia, hipercalcemia) ou em indivíduos com pro-
longamento hereditário do intervalo Q-T (síndrome de 
Ward-Romano) .* O mecanismo pró-arrítmico não está 
totalmente elucidado, e as possibilidades sugeridas inclu-
em aumento da dispersão da polarização e da entrada de 
C a 2 + durante o potencial de ação prolongado, com con-
seqüente aumento da pós-despolarização. 
Substâncias da classe IV 
Os agentes da classe IV atuam ao bloquear os canais de 
cálcio sensíveis à voltagem. As substâncias da classe IV de 
uso terapêutico como agentes antiarrítmicos (por exem-
plo, verapamil) atuam sobre os canais de tipo L. As subs-
tâncias da classe IV diminuem a velocidade de condução 
nos nodos SA e AV, onde a propagação do potencial de 
ação depende da corrente de entrada lenta de C a 2 + , lenti-
ficando o coração e interrompendo as T S V ao produzir 
bloqueio AV parcial. Reduzem a fase de platô do potencial 
de ação, bem como a força de contração. A entrada dimi-
nuída de C a 2 + reduz a pós-despolarização e, por conse-
guinte, suprime os batimentos ectópicos prematuros. 
DETALHES DOS FÁRMACOS INDIVIDUAIS 
Quinidina, procainamida e disopiramida 
(classe Ia) 
A quin id ina e a procainamida são semelhantes do p o n -
to de vista farmacológico. Hoje em dia, têm interesse 
principalmente histórico. A disopiramida assemelha-se 
à quinidina nos seus efeitos antiarrítmicos, bem como 
nos seus acentuados efeitos semelhantes aos da atropi-
na, que resultam em visão embaçada, ressecamento da 
boca, constipação e retenção urinaria. A disopiramida 
exibe inotropismo negativo maior que o da quinidina , 
porém tem menos tendência a causar reações de hiper-
sensibilidade. 
Lidocaína (classe Ib) 
A lidocaína é administrada na forma de infusão intrave-
nosano tratamento e na prevenção das arritmias ventri-
* "Uma menina de 3 anos de idade começou a ter perdas temporárias 
da consciência, cuja freqüência diminuiu com a idade. O E C G reve-
lou prolongamento do intervalo Q-T. Aos 18 anos, perdeu a consci-
ência quando estava correndo para pegar um ônibus. Aos 19 anos, 
ficou muito emocionada como participante de uma audiência de te-
levisão ao vivo e morreu subitamente." Na atualidade, a base mole-
cular deste raro distúrbio hereditário já é conhecida: é causado por 
uma mutação no gene que codifica um canal de potássio particular -
denominado HERG - ou de outro gene, SCNSA, que codifica o canal 
de sódio e cuja ruptura resulta em perda da inativação da corrente de 
N a + (ver Welsh & Hoshi 1995, para comentários). 
culares logo após o infarto do miocárdio. É quase total-
mente extraída da "circulação por ta" por metabolismo 
hepático de primeira passagem (Cap. 8), razão pela qual 
não pode ser administrada por via oral . Normalmente, a 
meia-vida plasmática é de cerca de 2 horas, porém a eli-
minação do fármaco é retardada se houver redução do 
f luxo sangüíneo hepático, como, por exemplo, na pre-
sença de redução do débito cardíaco após infarto do 
miocárdio ou com agentes inotrópicos negativos (por 
exemplo, antagonistas dos receptores p-adrenérgicos). Po-
dem ocorrer acúmulo e toxicidade se essa situação não 
for prevista e se a taxa de administração não for reduzi-
da. C o m efeito, a depuração da lidocaína tem sido utili-
zada para estimar o fluxo sangüíneo hepático, de modo 
análogo ao uso da depuração do para-amino-hipurato na 
medida do fluxo sangüíneo renal. 
Os efeitos adversos da lidocaína consistem, principal-
mente, em manifestações de suas ações sobre o sistema 
nervoso central, incluindo sonolência, desorientação e con-
vulsões. Em virtude de sua meia-vida relativamente curta, 
a concentração plasmática pode ser ajustada de modo bas-
tante rápido ao variar-se a velocidade de infusão. 
Fenitoína (classe Ib) 
A fenitoína é um anticonvulsivante (Cap. 39), que exerce 
ações antiarrítmicas sobre o coração; todavia, seu uso clí-
nico para esta indicação tornou-se obsoleto. 
Flecainida e encainida (classe Ic) 
A flecainida e a encainida suprimem os batimentos ven-
triculares ectópicos. Ambas têm ação longa e mostram-se 
eficazes na redução da freqüência dos batimentos ventri-
culares ectópicos quando administradas por via oral. To-
davia, em um estudo clínico bem controlado, foi consta-
tado que essas substâncias aumentam, na realidade, a in-
cidência de morte súbita associada à fibrilação ventricu-
lar após infarto do miocárdio, conseqüentemente não são 
mais utilizadas nessa situação. Este estudo clínico teve 
profundo impacto sobre o modo pelo qual os médicos e 
regulamentadores de fármacos consideram o uso de pa-
râmetros de avaliação final intermediários aparentemen-
te razoáveis (neste caso, redução da freqüência dos bati-
mentos ventriculares ectópicos) como prova de eficácia 
em estudos clínicos. Na atualidade, a flecainida é princi-
palmente utilizada na profi laxia contra a fibrilação atrial 
paroxística. 
Antagonistas dos receptores 
beta-adrenérgicos (classe II) 
Os antagonistas mais importantes dos receptores p-adre-
nérgicos são descritos no Cap. 11. Seu uso clínico nos 
distúrbios do ritmo é apresentado no quadro clínico. O 
propranolol, a exemplo de vários outros fármacos desse 
Aesculapius
O C O R A Ç Ã O 
Usos clínicos dos agentes 
antiarrítmicos da classe I _ 
• Classe Ia (por exemplo, d isopiramida) 
- arr i tmias vent r icu lares; 
- prevenção da f ib r i lação atr ial paroxística 
recorrente, d e s e n c a d e a d a por h ipera t iv idade 
vaga i . 
• Classe Ib ( l idoca ína por v ia intravenosa) 
- t ratamento e prevenção da taqu icard ia 
ventr icular e f ibr i lação durante e imed ia tamen te 
após o infarto do miocárd io . 
' Classe Ic 
- prevenção da f ib r i lação atr ial paroxística 
(f lecainida); 
- taquiarr i tmias recorrentes assoc iadas a vias de 
condução ano rma is (por exemp lo , s índrome de 
Wolf f -Pa rki nso n-Wh ite). 
pode ser irreversível; depósitos na córnea; e distúr-
bios neurológicos e gastrintestinais. 
O sotalol é um antagonista não-seletivo dos recepto-
res |3-adrenérgicos, cuja atividade reside no 1-isômero. Ao 
contrário de outros antagonistas P, prolonga o potencial 
de ação cardíaco e o intervalo Q-T ao retardar a corrente 
lenta de saída de K + . Essa atividade da classe III é encon-
trada nos isômeros tanto L quanto D . O sotalol racêmico 
(isto é, a forma prescrita) parece ser ligeiramente menos 
eficaz do que a amiodarona na prevenção das taquiarrit-
mias ventriculares malignas crônicas. Compart i lha com a 
amiodarona a capacidade de causar torsades de pointes, 
mas carece de seus outros efeitos adversos e mostra-se 
valioso em pacientes nos quais os antagonistas dos recep-
tores P-adrenérgicos estão contra-indicados. 
tipo, apresenta alguma ação da classe I, além de bloquear 
os receptores p. Isso pode contribuir para seus efeitos 
antiarrítmicos, embora essa contribuição provavelmente 
não seja muito importante, visto que um isômero com 
pouca atividade de antagonista P exerce pouca atividade 
antiarrítmica, a despeito de exibir atividade semelhante 
como agente de classe I. 
Os efeitos adversos são descritos no Cap. 11, e os mais 
importantes consistem em broncoespasmo em pacientes 
com asma ou outras formas de doença obstrutiva das vias 
aéreas, efeito inotrópico negativo e aumento da fadiga. 
Esperava-se que o uso de agentes pj-seletivos (por exem-
plo, metoprolol, atenolol) pudesse reduzir o risco de bron-
coespasmo, porém o grau de seletividade desses fárma-
cos é inadequado para atingir esse objetivo na prática 
clínica, embora a conveniência da administração de uma 
única dose ao dia tenha levado a seu uso disseminado em 
pacientes sem doença pulmonar. 
Amiodarona e sotalol (classe III) 
A amiodarona é altamente eficaz na supressão das ar-
ritmias (ver o quadro clínico). Infelizmente, apresenta 
diversas peculiaridades que compl icam o seu uso. L i g a -
se extensamente nos tecidos, apresenta meia-vida de 
eliminação prolongada (10-100 dias) e acumula-se no 
organismo c o m doses repetidas (ver p. 96), em conse-
qüência são normalmente necessários vários dias ou 
semanas para o aparecimento de sua ação. Por esse mo-
tivo, administra-se uma dose de ataque, e, para as ar-
ritmias potencialmente fatais, a substância é adminis-
trada por via intravenosa, numa veia central (provoca 
flebite se for administrada n u m vaso periférico). Os 
efeitos adversos são numerosos e importantes; consis-
tem em erupções cutâneas fotossensíveis e pigmenta-
ção cinza-azulada da pele; anormalidades da tireóide 
(hipo e hipert i reoidismo, associados a seu elevado teor 
de iodo) ; fibrose pulmonar de início lento, mas que 
Usos clínicos dos agentes 
antiarrítmicos da classe II 
(por exemplo, propranolol, timolol) 
• Redução da mor ta l i dade após o infarto do 
miocárd io . 
• Prevenção da recid iva de taqu iar r i tmias (por 
exemp lo , f ib r i lação atr ia l paroxística) p rovocada 
por a u m e n t o da a t iv idade s impát ica. 
Usos clínicos dos agentes 
antiarrítmicos da classe III 
• A a m i o d a r o n a é ut i l izada no t ra tamento da 
taqu icard ia assoc iada a s índrome de Wolff-
Park inson-Whi te (causada por u m a a n o r m a l i d a d e 
ana tômica da v ia de condução que pode 
e fe t ivamente de te rm ina r um cur to-c i rcui to do n o d o 
atr ioventr icular) . Mos t r a - se t a m b é m ef icaz n u m a 
a m p l a va r i edade de taqu iar r i tmias 
supravent r icu lares e vent r icu lares , po rém é 
reservada pa ra pac ientes pa ra os qua is out ros 
fá rmacos são inef icazes ou estão con t ra - i nd i cados , 
em decorrência de seus efei tos adversos graves . 
• O sota lo l ( racêmico, isto é, a f o r m a disponível pa ra 
prescrição) c o m b i n a as ações e os efei tos adversos 
das substâncias da c lasse III c o m as da c lasse II. 
E uti l izado nas ar r i tmias supravent r icu lares 
paroxísticas e supr ime os ba t imentos vent r icu lares 
ectópicos e episódios curtos de taqu ica rd ia 
ventr icular. 
Verapamil e diltiazem (classe IV) 
O verapamil é administrado por via oral . (Dispõe-se de 
preparações intravenosas, que são perigosas e quase nun-
ca necessárias.) Apresenta meia-vida plasmática de 6-8 
horas e está sujeito a um metabolismo de primeira passa-
gem muito extenso, que é mais acentuado para o isôme-
ro responsável pelos seus efeitos cardíacos. Dispõe-se de 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M OS PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
uma preparação de liberação lenta para administração 
uma vez ao dia ; todavia, é menos eficaz do que a prepa-
ração regular quando utilizada na prevenção das arrit-
mias, visto que a biodisponibilidade do isômero cardioa-
tivo é reduzida através da apresentação de uma baixa con-
centração uniforme às enzimas hepáticas envolvidas no 
metabolismo das substâncias. Quando se adiciona vera-
pamil à digoxina em pacientes com FA precariamente con-
trolada, é preciso reduzir a dose de digoxina, e a sua con-
centração plasmática deve ser determinada depois de al-
guns dias, visto que o verapamil desloca a digoxina de 
seus locais de ligação nos tecidos e também reduz a sua 
eliminação renal, predispondo, assim, a um acúmulo de 
digoxina com conseqüente toxicidade (ver Cap. 51). 
O verapamil está contra-indicado para pacientes com 
síndrome de Wolff-Parkinson-White e mostra-se ineficaz 
e perigoso nas arritmias ventriculares. Os efeitos adver-
sos do verapamil e do diltiazem são descritos adiante, na 
seção dos antagonistas dos canais de cálcio. 
O diltiazem assemelha-se ao verapamil, porém exer-
ce efeito relativamente maior sobre o relaxamento do 
músculo liso e produz menos bradicardia. 
Adenosine (não incluída na classificação 
de Vaughan-Williams) 
A adenosina, cuja produção é endógena, atua como i m -
portante mediador químico (Cap. 12), exercendo efei-
tos sobre a respiração, o músculo cardíaco, os nervos 
aferentes e as plaquetas, além de seus efeitos sobre o 
tecido de condução cardíaco, que constituem a base de 
seu uso terapêutico. O receptor A1 é responsável pelo 
seu efeito observado no nodo AV Esses receptores estão 
ligados ao mesmo canal de K + cardíaco ( K A C h ) , que é 
ativado pela acetileolina, e a adenosina hiperpolariza o 
tecido de condução cardíaca e, conseqüentemente, d i -
minui a velocidade de elevação do potencial de marca-
passo. E administrada por via intravenosa para inter-
romper a T S V quando este r i tmo persiste, a despeito de 
várias manobras, como massagem da artéria carótida 
para aumentar o tonus vagal. Substituiu, em grande par-
te, o verapamil para este propósito, em virtude de sua 
maior segurança proporcionada pelo seu efeito de curta 
duração. Trata-se de uma conseqüência de sua farmaco-
cinética: a adenosina é captada, através de um transpor-
tador de nucleosídios específico, pelos eritrócitos e me-
tabolizada por enzimas presentes na superfície luminal 
do endotélio vascular. Por conseguinte, os efeitos de uma 
dose de adenosina na forma de bo lo d u r a m apenas 
20-30 segundos. U m a vez terminada a TSV, o paciente 
geralmente permanece em ritmo sinusal, embora a ade-
nosina não esteja mais presente no plasma. Todavia, os 
efeitos indesejáveis desaparecem rapidamente, inc luin-
do dor torácica, dispnéia, tonteira e náusea. A teofilina 
e outros alcalóides da xantina bloqueiam os receptores 
de adenosina e inibem as ações da adenosina intraveno-
sa, enquanto o dipiridamol (um agente vasodilatador e 
antiplaquetário; ver adiante e C a p . 20) bloqueia o me-
canismo de captação do nucleosídio, potencializando a 
adenosina e prolongando seus efeitos adversos. Ambas 
essas interações são clinicamente importantes. 
Usos clínicos das substâncias 
antiarrítmicos da classe IV 
• O ve rapami l é o pr inc ipa l f á r m a c o . É ut i l i zado: 
- pa ra preveni r a recid iva da taqu ica rd ia 
supravent r icu lar (TSV) paroxíst ica; 
- pa ra reduzi r a f reqüênc ia ventr icu lar em 
pacientes c o m f ib r i lação atr ia l (em par t icu lar se 
for i n a d e q u a d a m e n t e con t ro lada c o m digoxina) , 
contanto que não t e n h a m s índrome de Wolff-
Park inson-Whi te ou a l g u m dis túrb io re lac ionado. 
• An t i gamen te , o ve rapami l e ra admin i s t rado por via 
in t ravenosa pa ra in te r romper a TSV; hoje em d ia , é 
ra ramente ut i l izado pa ra este propós i to , em virtude 
da m a i o r segurança da a d e n o s i n a . 
SUBSTÂNCIAS QUE A U M E N T A M A 
CONTRATILIDADE DO M I O C Á R D I O 
GLICOSÍDIOS CARDÍACOS 
Os glicosídios cardíacos são obtidos da dedaleira (Digita-
lis spp.) e de plantas relacionadas. Sobre o uso da deda-
leira, Withering (1775) escreveu: "Exerce um poder so-
bre o movimento do coração de um grau jamais observa-
do com qualquer outro remédio...". Há evidências da exis-
tência, nos mamíferos, de um fator endógeno semelhan-
te à digital, que se assemelha estreitamente a outro glico-
sídio cardíaco, a ouabaína, embora o significado fisioló-
gico deste permaneça incerto. 
Química 
T A dedaleira contém diversos glicosídios cardíacos com 
ações semelhantes. A digoxina é o mais importante do pon-
to de vista terapêutico. A ouabaína é semelhante, porém de 
ação mais curta. A estrutura química básica dos glicosídios 
consiste em três componentes: um açúcar, um esteróide e 
uma lactona. O componente açúcar consiste em monossaca-
rídios incomuns de ligação 1-4. O anel de lactona é essencial 
para a atividade, e as lactonas substituídas são capazes de 
reter a atividade biológica, mesmo quando se remove o com-
ponente esteróide. 
Ações e efeitos adversos 
As principais ações dos glicosídios são observadas sobre 
o coração; todavia, alguns de seus efeitos adversos são 
extracardíacos, inc luindo náuseas, vômitos, diarréia e 
confusão. Os efeitos cardíacos são os seguintes: 
Aesculapius
O C O R A Ç Ã O 
• lentificação cardíaca e redução da velocidade de 
condução através do nodo A V ; 
• aumento da força de contração; 
• distúrbios do ritmo, particularmente: 
- bloqueio da condução A V ; 
- aumento da atividade de marcapasso ectópico. 
Os efeitos adversos são comuns e podem ser graves. 
Um dos principais inconvenientes do uso clínico dos gl i -
cosídios consiste na estreita margem entre sua eficácia e 
toxicidade. 
Mecanismo de ação 
Os principais mecanismos de ação dos glicosídios cardía-
cos consistem em aumento da atividade vagal e inibição 
da bomba de N a + / K + . Os glicosídios cardíacos l igam-
se a um sítio no lado extracelular da subunidade a da 
N a + / K + ATPase (que é um heterodímero aP) e consti-
tuem um instrumento experimental útil para o estudo 
desse importante sistema de transporte. 
Freqüência e ritmo 
Os glicosídios cardíacos diminuem a velocidade de con-
dução AV ao aumentarem a atividade vagai através de 
uma ação sobre o sistema nervoso central. Seu efeito be-
néfico na fibrilação atrial rápida estabelecida resulta, em 
parte, dessa ação. Se a freqüência ventricular for excessi-
vamente rápida, o tempo disponível para o enchimento 
diastólico torna-se inadequado. O aumento do período 
refratário do nodo AV aumenta o intervalo mínimo entre 
os impulsos e diminui a freqüência ventricular. A arrit-
mia atrial não é afetada, porém a eficiência de bombea-
mento do coração melhora, em virtude do melhor enchi-
mento ventricular. A T S V pode ser interrompida pelos 
glicosídios cardíacos que reduzem a velocidade de con-
dução AV, embora outros fármacos sejam habitualmente 
empregados para esta indicação (ver adiante). 
Os glicosídios em doses mais altas causam distúr-
bios do r i tmo. Esses distúrbios podem ser observados 
com concentrações plasmáticas dentro da faixa tera-
pêutica ou apenas ligeiramente acima. A redução da 
velocidade de condução AV pode progredir para o b lo-
queio AV Além de depr imirem a condução AV, os g l i -
cosídios causam batimentosectópicos. C o m o a troca 
de N a + - K + é eletrogênica, a inibição da bomba pelos 
glicosídios provoca despolarização, predispondo a dis-
túrbios do r i tmo cardíaco. Além disso, o aumento da 
[ C a 2 + ] . provoca aumento da pós-despolarização, resul-
tando, inicialmente, em batimentos acoplados (bige-
minismo), em que um batimento ventricular normal é 
seguido de um. batimento ectópico; este evento é se-
guido de taquicardia ventricular, em que se verifica uma 
sucessão contínua desses batimentos ectópicos defla-
grados e, por f i m , de fibrilação ventricular. 
Força da contração 
Os glicosídios provocam acentuado aumento na tensão 
de contração em preparações isoladas de músculo cardí-
aco. Ao contrário das catecolaminas, não aceleram o re-
laxamento (compare a Fig. 17.7 com a Fig. 17.10). O 
aumento de tensão é causado por uma elevação transitó-
ria da [ C a 2 + ] ; (Fig. 17.10). O potencial de ação é apenas 
ligeiramente afetado, e a corrente de entrada lenta é pou-
co alterada, de modo que o aumento transitório da [ C a 2 + ] i 
provavelmente reflete uma maior liberação de C a 2 + das 
reservas intracelulares. O mecanismo mais provavelmen-
te envolvido é o seguinte (ver também o Cap. 4). 
1. Os glicosídios inibem a bomba de N a + / K + . 
2. O aumento da [ N a + ] ; d iminui a extrusão de C a 2 + atra-
vés do transportador de troca de N a + / C a 2 + . O aumen-
to da [Na + ] j reduz o gradiente de N a + dirigido para o 
interior da célula; quanto menor este gradiente, mais 
lenta a extrusão do C a 2 + pela troca de N a + - C a 2 + . 
3. A [ C a 2 + ] i aumentada é armazenada no retículo sarco-
plasmático, com conseqüente aumento da quantidade 
de C a 2 + liberada por cada potencial de ação. 
Efeito do potássio extracelular 
Os efeitos dos glicosídios cardíacos aumentam se houver 
redução da [ K + ] plasmática, em decorrência da competi-
ção diminuída pelo sítio de ligação do K + na N a + / K + 
ATPase. Esse aspecto é importante do ponto de vista clí-
nico, visto que os diuréticos (Cap. 23) são freqüentemente 
utilizados em associação com glicosídios no tratamento 
da insuficiência cardíaca, e que a maioria deles d iminui a 
[ K + ] plasmática, aumentando, assim, o risco de arritmia. 
Aspectos farmacocinéticos 
A digoxina é administrada por via oral ou, em situações 
de urgência, por via intravenosa. Trata-se de uma molé-
cula muito polar, cuja eliminação ocorre principalmente 
por excreção renal. A meia-vida de eliminação é de cerca 
Controle Acetilatrofantidina 0,75 umol/l 
Tensão 2 mN 
[Ca2 +]i , ^ A w v W * V W < J \ \ i ^ 
A Á 1 s 
Fig. 17.10 Efeito de um glicosídio cardíaco 
(acetilatrofantidina) sobre o C a 2 ' transitório e a tensão 
produzida por um músculo cardíaco de rã . O efeito foi 
registrado como na Fig. 17.7. (De: Al len D G, Blinks JR 1978 
Nature 273 : 509.) 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M O S PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
3 1 8 
de 36 horas em pacientes com função renal normal , sen-
do consideravelmente mais longa nos indivíduos idosos 
e pacientes com insuficiência renal franca, nos quais é 
necessário proceder a uma redução das doses. Adminis-
tra-se uma dose de ataque em situações de urgência. A 
faixa terapêutica das concentrações plasmáticas, abaixo 
das quais a digoxina tem pouca probabilidade de ser efi-
caz e acima das quais o risco de toxicidade aumenta de 
modo considerável, é bem definida (1-2,6 nmol/1). A de-
terminação da concentração plasmática de digoxina é útil 
quando se suspeita de falta de eficácia ou de toxicidade. 
Ocorrem interações farmacocinéticas clinicamente impor-
tantes com substâncias que reduzem simultaneamente a 
excreção de digoxina e sua ligação nos tecidos (por exem-
plo, amiodarona, verapamil). 
Uso clínico 
Os usos clínicos da digoxina encontram-se resumidos no 
quadro. 
Usos clínicos dos glicosídios cardíacos 
(por exemplo, digoxina) 
• Redução da f reqüênc ia ventr icu lar na 
f ibr i lação atr ial persistente ráp ida . 
• Tra tamento da insuficiência cardíaca em pacientes 
que p e r m a n e c e m s in tomát icos, a despe i to do uso 
ó t imo de diurét icos e in ib idores da e n z i m a 
conversora de ang io tens ina . 
OUTRAS SUBSTANCIAS Q U E A U M E N T A M A 
CONTRATILIDADE DO MIOCÁRDIO 
Certos agonistas dos receptores Pj-adrenérgicos, como, 
por exemplo, a dobutamina, são utilizados no tratamen-
to da insuficiência cardíaca aguda, porém potencialmen-
te reversível (por exemplo, após cirurgia cardíaca ou em 
alguns casos de choque cardiogênico ou séptico), basean-
do-se na sua ação inotrópica positiva. A dobutamina, por 
motivos que ainda não estão bem elucidados, produz 
menos taquicardia do que outros agonistas p r E admi-
nistrada por via intravenosa. O glucagon também aumenta 
a contratilidade do miocárdio ao aumentar a síntese de 
c A M P e tem sido utilizado em pacientes com disfunção 
cardíaca aguda em decorrência da superdosagem de an-
tagonistas dos receptores p-adrenérgicos (ver quadro clí-
nico do glucagon na pág. 440). 
Os inibidores do subtipo específico do músculo car-
díaco da fosfodiesterase (tipo III), a enzima responsável 
pela degradação intracelular do c A M P , aumentam a con-
tratilidade do miocárdio. Por conseguinte, a exemplo dos 
agonistas dos receptores P-adrenérgicos, aumentam o 
c A M P intracelular, porém são pró-arrítmicos pelo mes-
mo motivo. As substâncias desse grupo incluem a amri-
nona e a milrinona, que são muito semelhantes dos pon-
tos de vista químico e farmacológico. M e l h o r a m os índi-
ces hemodinâmicos em pacientes com insuficiência car-
díaca, porém agravam paradoxalmente a sobrevida, tal-
vez em virtude de seu efeito pró-arrítmico. Essa dicoto-
mia teve um efeito moderador sobre os médicos e as au-
toridades que regulamentam os fármacos. 
SUBSTÂNCIAS ANTIANGINOSAS 
O mecanismo da dor anginosa já foi discutido anterior-
mente (pág. 307). A angina é controlada por fármacos 
que melhoram a perfusão do miocárdio ou que reduzem 
suas demandas metabólicas ou que apresentam ambos os 
efeitos. Dois dos principais grupos de substâncias, os ni-
tratos orgânicos e os antagonistas do cálcio, são vasodila-
tadores e produzem ambos os efeitos. O terceiro grupo, 
constituído pelos antagonistas dos receptores $-adrenér-
gicos, reduz a freqüência cardíaca e, portanto, a deman-
da metabólica. Os nitratos orgânicos e os antagonistas do 
cálcio são descritos adiante. Os antagonistas dos recepto-
res p-adrenérgicos são considerados no C a p . 11, com 
exceção de suas ações antiarrítmicas, que foram discuti-
das anteriormente. 
NITRATOS ORGÂNICOS 
A capacidade dos nitratos orgânicos (ver também Caps. 
14 e 18) de aliviar a angina foi descoberta por Lauder 
Brunton, um renomado médico britânico, em 1867. Brun-
ton constatou que a angina podia ser aliviada, em parte, 
pelo sangramento e sabia que o nitrato de amila , sinteti-
zado 10 anos antes, causava rubor e taquicardia, com 
queda da pressão arterial, quando seus vapores eram ina-
lados. Acreditava que o efeito do sangramento resultava 
da hipotensão e verif icou que a inalação de nitrato de 
amila atuava muito melhor. Na atualidade, o nitrato de 
amila foi substituído pelo trinitrato de gliceril (nitrogli-
cerina).* Os esforços envidados para aumentar a dura-
ção de ação do trinitrato de gliceril levaram à síntese de 
vários nitratos orgânicos relacionados, dos quais o mais 
importante é o mononitrato de isossorbida. 
Ações 
Os nitratos orgânicos relaxam o músculo liso vascular e 
alguns outros músculos lisos (por exemplo, esofágico e 
biliar). Causam acentuado relaxamento venoso, com con-
seqüente redução da pressão venosa central (redução da 
pré-carga). N o s indivíduos sadios, essa ação d iminui o 
volume sistólico. Ocorre estase venosa na posição ortos-
* Nobel descobriu como estabilizar a nitroglicerina com kieselguhr, 
permitindo explorar suas propriedades explosivas na dinamite, cuja 
fabricação lhe trouxe a fortuna, que utilizou para contemplar os 
prêmios que levam o seu nome.Aesculapius
O C O R A Ç Ã O 
tática, podendo causar hipotensão postural e tonteira. As 
doses terapêuticas exercem menos efeitos sobre as pe-
quenas artérias de resistência do que sobre as veias, po-
rém observa-se um acentuado efeito sobre as artérias mus-
culares de maior calibre. Isso reduz a reflexão de ondas 
do pulso dos ramos arteriais (conforme percebido por 
Murrell no século X I X , porém desprezado durante mui-
tos anos) e, conseqüente redução da pressão central (aór-
tica) e pós-carga cardíaca (ver Cap. 18 para maiores de-
talhes sobre o papel desses fatores na determinação do 
trabalho cardíaco). O efeito direto sobre o tônus das ar-
térias coronárias opõe-se ao espasmo coronariano obser-
vado na angina variante. C o m doses mais altas, as arté-
rias de resistência e arteríolas sofrem dilatação, e verifi-
ca-se uma queda da pressão arterial. Entretanto, ocorre 
aumento do f luxo coronariano através da vasodilatação 
coronariana. Verifica-se redução no consumo de oxigê-
nio do miocárdio, em decorrência de reduções da pré-
carga e da pós-carga cardíacas. Isso, juntamente com o 
aumento do fluxo sangüíneo coronariano, produz acen-
tuado aumento no conteúdo de oxigênio do sangue do 
seio coronariano. Estudos realizados em animais de la-
boratório mostraram que o trinitrato de gliceril provoca 
desvio do sangue de áreas normais para áreas isquêmicas 
do miocárdio. O mecanismo envolve a dilatação de vasos 
colaterais, que evitam os segmentos estenosados da arté-
ria coronária (Fig. 17.11). 
T É interessante comparar esse efeito c o m o de outros vaso-
dilatadores (por exemplo, d ipir idamol) , que dilatam as arte-
ríolas, mas não os vasos colaterais. O d i p i r i d a m o l é, pelo 
menos, tão eficaz quanto os nitratos no aumento do f luxo 
coronariano em indivíduos normais, porém agrava a angina. 
Isso se deve, provavelmente, ao fato de que as arteríolas numa 
região isquêmica encontram-se totalmente dilatadas pela is-
quemia, de modo que a dilatação das arteríolas induzida por 
substâncias em áreas normais tem o efeito de desviar o san-
gue das áreas isquêmicas (Fig. 17.11), produzindo um fenô-
meno denominado " r o u b o " vascular. Esse efeito é explora-
do n u m teste de "estresse" farmacológico para doença coro-
nariana, que consiste na administração intravenosa de d i p i -
r idamol a pacientes c o m suspeita deste diagnóstico, mas que 
não podem efetuar qualquer exercício. 
Em resumo, a ação antianginosa dos nitratos envolve: 
• redução do consumo de oxigênio cardíaco, secun-
dária a uma diminuição da pré-carga e pós-carga 
cardíacas; 
• redistribuição do f luxo coronariano para áreas de 
isquemia através dos vasos colaterais; 
• alívio do espasmo coronariano. 
Além de seus efeitos sobre a musculatura lisa, o NO 
aumenta a taxa de relaxamento do músculo cardíaco (de-
nominada ação "lusiotrópica"). É provável que os nitra-
tos orgânicos imitam essa ação, que poderia ser impor-
H Controle (ausência de fármaco) num 
paciente com DC 
Efeito do nitrato 
- Dilatação do 
vaso colateral I i 
Efeito do dipiridamol 
Tônus arteriolar 
normal 
1 1 
• U 
(' Vaso colaterais j 
I não dilatado i ! 
y y Fluxo sangüíneo para a área normal do miocárdio Fluxo sangüíneo para a área isquêmica do miocárdio 
AUMENTO do fluxo 
sangüíneo para a 
área isquêmica 
AUMENTO do fluxo 
sangüíneo para a 
área normal 
REDUÇÃO do 
fluxo sangüíneo para 
a área isquêmica 
Fig. 17.11 Comparação dos efeitos dos nitratos orgânicos e de um vasodilatador arteriolar (dipiridamol) sobre a 
circulação coronariana. A Controle. B Os nitratos di latam o vaso colateral, permit indo, assim, um maior fluxo de sangue 
através da região hipoperfundida (principalmente, através de desvio de sangue da área adequadamente perfundida). C O 
dipiridamol dilata as arteríolas, aumentando o fluxo através da área normal , à custa da área isquêmica (onde as arteríolas 
estão totalmente dilatadas). (DC, doença coronariana.) 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M OS PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
3 2 0 
tante em pacientes com comprometimento da função d i -
astólica, que acompanha comumente a hipertensão e a 
insuficiência cardíaca. 
Mecanismo de ação 
Os nitratos orgânicos são metabolizados, com liberação 
de N O . Em concentrações alcançadas durante o seu uso 
terapêutico, o metabolismo envolve uma etapa enzimá-
tica e, possivelmente, uma reação com grupos sulf idri la 
(-SH) nos tecidos. O NO ativa a guanilato ciclase solú-
vel (ver C a p . 14), aumentando a formação de c G M P , 
que ativa a proteína quinase G e resulta numa cascata 
de efeitos no músculo liso, culminando na desfosforila-
ção das cadeias leves de miosina e seqüestro do C a 2 + 
intracelular, com conseqüente relaxamento. 
Tolerância e efeitos indesejáveis 
A administração repetida de nitratos em preparações de 
músculo liso in vitro resulta em diminuição do relaxa-
mento, possivelmente devido, em parte, à depleção dos 
grupos -SH livres, embora as tentativas de evitar o desen-
volvimento de tolerância através do uso de agentes que 
restauram os grupos - S H teciduais não tenham sido c l i -
nicamente úteis. A tolerância ao efeito antianginoso dos 
nitratos não ocorre em grau clinicamente importante com 
as formulações habituais de agentes de ação curta (por 
exemplo, trinitrato de gliceril), porém é observada com 
substâncias de ação mais longa (por exemplo, mononi-
trate de isossorbida), ou quando se administra trinitrato 
de gliceril por infusão intravenosa prolongada ou na for-
ma de aplicação freqüente de patch clamps transdérmi-
cos de liberação lenta (ver adiante). 
Os principais efeitos adversos dos nitratos constituem 
uma conseqüência direta de suas principais ações farmaco-
lógicas e incluem hipotensão postural e cefaléia. Esta era a 
causa da "doença da manhã de segunda-feira" entre os tra-
balhadores de fábricas de explosivos. A tolerância a esses 
efeitos desenvolve-se com muita rapidez, porém desaparece 
depois de um breve intervalo sem nitrato (motivo pelo qual 
os sintomas apareciam nas segundas-feiras, mas não poste-
riormente durante a semana). A formação de metemoglobi-
na, um produto de oxidação da hemoglobina que é ineficaz 
como transportador de oxigênio, raramente é observada 
quando os nitratos são utilizados clinicamente, mas pode 
ser induzida de modo deliberado com nitrito de amila no 
tratamento do envenenamento por cianeto, uma vez que a 
metemoglobina liga-se a íons de cianeto. 
Aspectos farmacocinéticos e farmacêuticos 
O trinitrato dç gliceril é rapidamente inativado por me-
tabolismo hepático. É bem absorvido por via oral, sendo 
tomado na forma de comprimido ou de spray sublingual, 
produzindo efeitos dentro de poucos minutos. Quando 
Nitratos orgânicos 
• Os compos tos impor tantes inc luem o 
tr initrato de gl icer i l e o monon i t ra to de 
isossorb ida de ação ma is l onga . 
• Trata-se de poderosos vasod i l a tado res , que atuam 
sobre as ve ias , reduz indo a pré-carga cardíaca e a 
def lexão da o n d a ar ter ia l pa ra reduz i r a pós-carga. 
• A t u a m através do ox ido nítr ico ( N O ) , ao qua l são 
me tabo l i zados . O NO est imula a f o r m a ç ã o de 
c G M P e , por tanto, at iva a proteína q u i n a s e G, 
a fe tando tanto as proteínas contrateis (cadeias 
leves de miosina) quan to a regu lação do C a 2 + . 
• A to le rânc ia , que é obse rvada exper imenta lmente , 
é impor tante do ponto de vista clínico c o m o uso 
f reqüente de substâncias de ação l onga ou de 
preparações de l iberação p r o l o n g a d a . 
• A ef icácia na a n g i n a resul ta , em par te , da redução 
da sob reca rga cardíaca e , em par te , da d i la tação 
dos vasos coronár ios co la tera is , p roduz indo uma 
dis t r ibu ição ma is efet iva do f luxo co rona r i ano . A 
d i la tação dos vasos coronár ios contraídos é 
par t icu larmente benéf ica na a n g i n a var ian te . 
• Os efeitos indesejáveis graves são i n c o m u n s ; no 
iníc io, p o d e m ocorrer cefaléia e h ipo tensãopostura l . Ra ramen te , a s u p e r d o s a g e m p o d e causar 
m e t e m o g l o b i n e m i a . 
deglutido, torna-se ineficaz em decorrência do metabo-
lismo de primeira passagem. O trinitrato administrado 
por via sublingual é convertido em di e mononitratos. A 
sua duração de ação efetiva é de cerca de 30 minutos. E 
muito bem absorvido através da pele, e pode-se obter um 
efeito mais duradouro pela aplicação do fármaco na for-
ma de patch transdérmico. U m a vez aberto um frasco de 
comprimidos, o prazo de validade é muito curto, em de-
corrência da evaporação da substância ativa volátil; as 
preparações na forma de spray evitam esse problema. 
O mononitrato de isossorbida tem ação mais prolon-
gada do que o trinitrato de gliceril (meia-vida de cerca de 
4 horas), porém apresenta ações farmacológicas seme-
lhantes. É deglutido em lugar de ser administrado por 
via sublingual, sendo administrado duas vezes ao dia para 
profi laxia (em geral, pela manhã e no almoço, para per-
mitir um período livre de nitratos durante a noite, quan-
do o paciente não está ativo, para evitar a tolerância). E 
também disponível numa forma de liberação lenta para 
administração uma vez ao dia, pela manhã. 
Uso clínico 
O uso clínico dos nitratos orgânicos encontra-se resumi-
do no quadro. 
ATIVADO RES DOS CANAIS DE POTÁSSIO 
O nicorandil combina a ativação do canal de potássio 
K A T p (ver Caps. 4 e 25) com ações nitrovasodilatadoras 
(doador de N O ) . Trata-se de um dilatador tanto arterial 
Aesculapius
O C O R A Ç Ã O 
Usos clínicos dos nitratos orgânicos 
- prevenção (por exemp lo , monon i t ra to de 
isossorbida regu lar ou tr initrato de gl icer i l por v ia 
sub l ingua l , imed ia tamen te antes do esforço); 
- t ra tamento (trinitrato de gl icer i l por v ia 
sub l ingua l ) . 
• Ang ina instável: tr initrato de gl icer i l por v ia 
in t ravenosa. 
• Insuficiência cardíaca a g u d a : tr initrato de gl icer i l 
por v ia in t ravenosa. 
• Insuficiência cardíaca crônica: monon i t ra to de 
isossorb ida, c o m h id ra laz ina (Cap. 18) q u a n d o o 
uso de in ib idores da e n z i m a conversora de 
ang io tens ina (que são mais eficazes) está 
con t ra - ind icado . 
• Estão sendo invest igados usos re lac ionados ao 
re laxamento de outros músculos lisos (por exemp lo , 
uterino, bi l iar). 
quando venoso, que produz os efeitos indesejáveis espe-
rados de cefaléia, rubor e tonteira. E utilizado em paci-
entes que permanecem sintomáticos a despeito do trata-
mento ótimo com outros fármacos, freqüentemente en-
quanto aguardam cirurgia ou angioplastia. 
ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES 
BETA-ADRENÉRGICOS 
Os antagonistas dos receptores P-adrenérgicos (ver 
Cap. 11) são importantes na profi laxia da angina. Atuam 
ao reduzir o consumo de oxigênio do coração. Seus efei-
tos sobre os vasos coronários são de menor importância, 
embora esses fármacos sejam evitados na angina varian-
te, em decorrência do risco teórico de aumentar o espas-
mo coronariano. Seus usos clínicos diversos encontram-
se resumidos no quadro da p. 198. 
ANTAGONISTAS DO CÁLCIO 
O termo "antagonistas do cálcio" é freqüentemente ut i l i -
zado para referir-se a substâncias que bloqueiam a entra-
da celular do C a 2 + através dos canais de cálcio, mais do 
que para referir-se a suas ações intracelulares (Cap. 4). 
Alguns autores uti l izam os termos bloqueadores da en-
trada de C a 2 + ou bloqueadores dos canais de cálcio para 
tornar essa distinção mais clara. Os antagonistas do cál-
cio terapeuticamente importantes atuam sobre os canais 
de tipo L. Os antagonistas do cálcio de tipo L compreen-
dem três classes quimicamente distintas: as fenilalquila-
minas (por exemplo, verapamil), as diidropiridinas (por 
exemplo, nifedipina, amlodipina) e as benzotiazepinas 
(por exemplo, diltiazem). 
Mecanismo de ação: tipos de canais 
de cálcio 
As propriedades dos canais de cálcio regulados por v o l -
tagem foram estudadas de m o d o pormenor izado atra-
vés das técnicas de fixação de voltagem (voltage-clamp) 
e de patch-clamp (ver C a p . 2). Todas as substâncias de 
cada uma das três classes químicas mencionadas ante-
riormente ligam-se à subunidade oij do canal de cálcio 
cardíaco do t ipo L, porém em sítios distintos, cada um 
dos quais interage de m o d o alostérico entre si e c o m a 
estrutura de " c o m p o r t a " do canal , i m p e d i n d o indire-
tamente a difusão do C a 2 + através de seu p o r o no ca-
nal aberto. M u i t o s antagonistas do cálcio ex ibem pro-
priedades de dependência do uso (isto é, b loqueiam 
c o m mais eficácia as células nas quais os canais de cál-
cio são mais ativos; ver discussão das substâncias ant i -
arrítmicas da classe I, anter iormente) . Pelo mesmo 
motivo, exibem também ações bloqueadoras dependen-
tes da voltagem, c o m bloqueio mais acentuado quan-
do a membrana está despolarizada, causando abertura 
e inativação dos canais de cálcio. 
Modo Modo 0 Modo 1 Modo 2 
_ , m » ^ ^ ^ ^ ^ -^\X^J^^ -—-cSSlSSto0 
^ Etapa de ^ ^ Etapa de ^ ^ Etapa de ^ 
despolarização despolarização despolarização 
Probabilidade de abertura Zero Baixa Alta 
Favorecida por Antagonistas DHP Agonistas DHP 
% do tempo normalmente 
passado nesse modo <1% - 7 0 % - 3 0 % 
Fig. 17.12 Modo de comportamento dos canais de cálcio. Os traçados são registros, através de patch-clamp (ver C a p . 2), 
da abertura de canais de cálcio isolados (deflexões para baixo) em retalho de membrana de célula muscular cardíaca. U m a 
etapa de despolarização é provocada próximo ao início de cada traçado, produzindo um aumento na probabi l idade de 
abertura do canal . Quando o canal se encontra no modo 1 (parte central), ocorrem algumas aberturas de breve duração; no 
modo 2 (à direita), o canal permanece aberto durante a maior parte do tempo na etapa de despolarização; e, no modo 0 
(à esquerda) o canal não se abre. Em condições normais, o canal passa a maior parte do tempo nos modos 1 e 2 e apenas 
raramente entra no modo 0. (Redesenhado de Hess et al. 1984 Nature 3 1 1 : 538-544.) 
Aesculapius
17 SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M OS PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
3 2 2 
• As di idropir idinas afetam a função dos canais de cálcio de 
maneira complexa, que não se l imita simplesmente a um tam-
ponamento físico do poro . Este aspecto tornou-se evidente 
quando foi constatado que algumas di idropir idinas , exem-
plificadas pelo Bay K 8644, ligam-se ao mesmo sítio, porém 
atuam de modo inverso, isto é, promovendo a abertuta dos 
canais de cálcio regulados por voltagem. Assim, o Bay K 8644 
produz efeitos opostos aos das di idropir idinas clinicamente 
utilizadas, isto é, aumento na força da contração cardíaca e 
consttição dos vasos sangüíneos; o Bay K 8644 é competit i-
vamente antagonizado pela nifedipina. Estudos sobre a res-
posta de canais de cálcio isolados a uma despolarização da 
membrana em etapas sugerem que os canais podem existir 
em três estados distintos, denominados " m o d o s " (Fig. 17.12). 
Quando um canal encontra-se no modo 0, ele não se abre 
em resposta à despolarização; no m o d o 1, a despolarização 
está associada a uma baixa probabilidade de abertura, e cada 
abertura é de breve duração. No modo 2, a despolarização 
produz uma probabilidade muito alta de abertura, e as aber-
turas isoladas são prolongadas. Em condições normais, cer-
ca de 7 0 % dos canais encontram-se, a qualquer momento, 
no modo 1, e apenas 1 % ou menos está no m o d o 2. Cada 
canal passa pelos três modos de maneira aleatória e muito 
lentamente. As di idropir idinas do tipo antagonista ligam-se 
seletivamente aos canais no modo 0, favorecendo, assim, esse 
estado de não-abertura, enquanto os agonistas ligam-se sele-
tivamente aos canais no modo 2 (Fig. 17.12). Este t ipo de 
modulação bidirecional assemelha-se ao fenômeno observa-
do na interação ácido gama-aminobutírico (GABA)/benzo-
diazepínico (Cap. 36) e favorece especulações sobre um pos-
sível mediador endógeno semelhante à d i idropir id ina c o m 
efeitoregulador sobre a entrada de C a 2 + . 
O mibefradi l é distinto, visto que bloqueia os canais tanto 
do tipo T quanto do tipo L em concentrações terapêuticas; 
todavia, seu uso terapêutico foi abandonado, visto que cau-
sava interações farmacológicas adversas ao interferir no 
metabolismo de substâncias. 
Efeitos farmacológicos 
Os principais efeitos dos antagonistas do cálcio, quando 
utilizados terapeuticamente, são observados no músculo 
cardíaco e no músculo liso. O verapamil afeta preferen-
cialmente o coração, enquanto a maioria das di idropir i -
dinas (por exemplo, nifedipina) exerce maior efeito so-
bre o músculo liso do que sobre o coração. O diltiazem 
ocupa uma posição intermediária quanto às suas ações. 
Ações cardíacas 
Os efeitos antiarrítmicos do verapamil e do diltiazem já 
foram discutidos. Os antagonistas do cálcio podem cau-
sar bloqueio AV e lentificação cardíaca através de suas 
ações sobre o tecido de condução; todavia, esse efeito é 
compensado por um aumento reflexo da atividade sim-
pática secundária à sua ação vasodilatadora. Por exem-
plo, a nifedipina tipicamente provoca taquicardia refle-
xa ; o diltiazem produz pouca ou nenhuma alteração na 
freqüência cardíaca; e o verapamil d iminui a freqüência 
cardíaca. Os antagonistas do cálcio também exercem efeito 
inotrópico negativo, que resulta da inibição da corrente 
de entrada lenta durante o platô do potencial de ação. 
Apesar disso, o débito cardíaco geralmente permanece 
constante ou aumenta, em virtude da redução da resis-
tência periférica. Neste caso, também existem diferenças 
clinicamente importantes entre as diferentes classes de 
substâncias. Assim, o verapamil é o que exerce ação ino-
trópica negativa mais pronunciada, estando portanto con-
tra-indicado na insuficiência cardíaca, assim como a mai-
oria dos outros antagonistas do cálcio, apesar de a amlo-
dipina não aumentar a mortalidade cardiovascular em pa-
cientes com insuficiência cardíaca crônica grave. 
Músculo liso vascular 
Os antagonistas do cálcio causam dilatação arterial/arte-
riolar generalizada, reduzindo, assim, a pressão arterial, 
enquanto não afetam acentuadamente as veias. Essas subs-
tâncias afetam todos os leitos vasculares, apesar da exis-
tência de consideráveis variações nos efeitos regionais 
Antagonistas do cálcio 
• Os antagon is tas do cálcio b l o q u e i a m a 
entrada de C a 2 + ao impedi r a abertura dos canais de 
cálcio de t ipo L e de t ipo T regu lados por vo l t agem. 
• Existem três t ipos pr inc ipa is de an tagon is tas do tipo 
L, exempl i f i cados pe lo v e r a p a m i l , d i l t iazem e 
d i id rop i r id inas (por e x e m p l o , n i fed ip ina) . 
• A fe tam pr inc ipa lmente o múscu lo cardíaco e o 
múscu lo l iso, in ib indo a en t rada de C a 2 + , c a u s a d a 
por despolar ização, nesses tec idos. 
• A se le t iv idade entre o múscu lo cardíaco e o 
músculo l iso va r i a : o ve rapami l é re la t ivamente 
card iosse le t ivo ; a n i fed ip ina é re la t i vamente 
selet iva pa ra o músculo l iso, e n q u a n t o o d i l t iazem 
o c u p a u m a posição in te rmed iár ia quan to à sua 
se le t iv idade. 
• O efei to vasod i l a tador (pr inc ipa lmente , as 
d i idropir id inas) é obse rvado p r inc ipa lmente nos 
vasos de resistência, p roduz indo redução da pós-
c a r g a . O s an tagon is tas d o cálcio t a m b é m d i l a tam 
os vasos coronár ios , um efei to impor tan te na 
a n g i n a var ian te . 
• Efeitos sobre o coração (verapami l , d i l t iazem): ação 
ant iar r í tmica (pr inc ipa lmente , taqu ica rd ias atr iais), 
em decorrência do c o m p r o m e t i m e n t o da condução 
atr ioventr icu lar e redução da cont ra t i l idade. 
• Os usos clínicos inc luem te rap ia ant iar r í tmica 
(pr inc ipa lmente, o v e r a p a m i l , sobre tudo na 
taqu icard ia atr ial) , a n g i n a (ao reduzi r o t raba lho 
cardíaco) e h iper tensão. 
• Os efei tos indesejáveis i nc luem cefa lé ia , 
const ipação (verapamil) e e d e m a m a l e o l a r 
(di idropir id inas). Existe um risco de causa r 
insuf iciência cardíaca ou b loque io cardíaco, 
par t icu larmente c o m o uso do v e r a p a m i l . 
Aesculapius
O C O R A Ç Ã O 
entre as diferentes substâncias. Causam vasodilatação 
cotonariana e são utilizados em pacientes com espasmo 
da artéria coronária (angina variante). Outros tipos de 
músculo liso (por exemplo, trato biliar, vias urinárias e 
útero) também são relaxados pelos antagonistas do cál-
cio, porém esses efeitos são menos importantes, do pon-
to de vista terapêutico, do que suas ações sobre o múscu-
lo liso vascular, embora possam causar efeitos adversos 
(ver adiante). 
Proteção dos tecidos isquêmicos 
Existem razões teóricas (ver Fig. 17.6) para que os anta-
gonistas do cálcio exerçam efeito citoprotetor nos teci-
dos isquêmicos, sendo portanto utilizados no tratamento 
do ataque cardíaco e do acidente vascular cerebral (ver 
Cap. 34); todavia, os estudos clínicos realizados fornece-
ram resultados desapontadores. Ainda existe pouca evi-
dência, em estudos clínicos randomizados, dos efeitos 
benéficos (ou prejudiciais) dos antagonistas do cálcio so-
bre a morbidade ou mortalidade cardiovasculares em 
qualquer grupo de pacientes. As respostas a essas indaga-
ções devem aguardar os resultados de grandes estudos 
clínicos em andamento. A nimodipina exibe alguma sele-
tividade para a vasculatura cerebral e, algumas vezes, é 
utilizada na esperança de reduzir o vasoespasmo cerebral 
que ocorre após hemorragia subaracnóide. 
Farmacocinét ica 
Os antagonistas do cálcio de uso clínico são todos bem 
absorvidos pelo trato gastrintestinal e administrados por 
via oral, exceto no caso de algumas indicações especiais, 
como, por exemplo, após hemorragia subaracnóide, em 
que são utilizadas preparações intravenosas. Esses fárma-
cos são extensamente metabolizados. As diferenças farma-
cocinéticas observadas entre diferentes substâncias e dife-
rentes preparações farmacêuticas são clinicamente impor-
tantes, visto que estabelecem o intervalo entre as doses, 
bem como a intensidade de alguns dos efeitos indesejá-
veis, como cefaléia e rubor (ver adiante). A amlodipina 
possui meia-vida de eliminação prolongada e é adminis-
trada uma vez ao dia, enquanto a nifedipina, o diltiazem e 
o verapamil apresentam meia-vida de eliminação mais curta 
e são administrados com mais freqüência ou apresentados 
em diversas preparações de liberação lenta para permitir a 
administração de uma única dose ao dia. 
Efeitos indesejáveis 
Os efeitos indesejáveis dos antagonistas do cálcio cons-
tituem, em sua maioria , uma extensão de suas pr inci -
pais ações farmacológicas. As di idropir idinas de ação 
curta provocam rubor e cefaléia, em virtude de sua ação 
vasodilatadora, e, quando administradas de modo crô-
nico, elas freqüentemente causam edema maleolar, re-
lacionado à dilatação arteriolar e ao aumento de per-
meabilidade das vênulas pós-capilares. O verapamil pode 
causar constipação, provavelmente em decorrência dos 
efeitos sobre os canais de cálcio nos nervos ou músculos 
lisos gastrintestinais. Os efeitos sobre o r i tmo cardíaco 
(por exemplo, bloqueio cardíaco) e a força de contra-
ção (por exemplo, agravamento da insuficiência cardía-
ca) já foram discutidos. 
Além desses efeitos previsíveis, que causam problemas 
desagradáveis, mas geralmente não muito graves, os anta-
gonistas dos canais de cálcio, como classe, parecem ser bas-
tante isentos de efeitos adversos idiossincrásicos, embora os 
dados de segurança a longo prazo ainda estejam sendo reu-
nidos a partir de estudos clínicos em andamento. 
Usos clínicos 
Os principais usos clínicos dos antagonistas do cálcio 
encontram-se resumidos no quadro clínico a seguir. 
Usos clínicos dos antagonistas 
do cálcio 0^ 
• Ar r i tmias (verapami l ) : 
- redução da f reqüênc ia vent r icu lar na f ib r i lação 
atr ial ráp ida ; 
- prevenção da rec id iva da taqu ica rd ia 
supravent r icu lar (TSV)(a admin is t ração 
in t ravenosa de ve rapami l pa ra in te r romper os 
a taques de TSV foi subst i tuída pe la adenos ina ) . 
• H iper tensão: em g e r a l , u m a d i i d rop i r i d ina , c o m o , 
por exemp lo , a m l o d i p i n a (Cap . 18). 
• Prevenção da a n g i n a (em ge ra l , u m a d i id rop i r id ina 
ou d i l t iazem). 
REFERENCIAS E LEITURA ADICIONAL 
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o papel da adenosina como mediador endógeno, bem 
como sua farmacologia e uso clínico) 
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on mortality and morbidity in patients with heart fai-
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tou a taxa de mortalidade global, porém reduziu as in-
ternações durante um acompanhamento de cerca de 3 
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1078 (Revisão dos progressos médicos, incluindo terapia 
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and intravenous magnesium sulphate in 58 050 patients 
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669-685 (Estudo clínico impressionante com resultados 
desapontadores: o magnésio foi ineficaz, e o nitrato oral 
não reduziu a mortalidade de 1 mês) 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M OS PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
Katz A M 1996 Calcium channel diversity in the cardiovas-
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de sinais no sistema cardiovascular) 
Linden J 2001 Molecular approach to adenosine receptors: 
receptor-mediated mechanisms of tissue protection. Annu 
Rev Pharmacol Toxicol 41: 775-787 (Adenosina no pré-
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M u r a d F, Leitman D, Waldman S, Chang C - H , Hirata M, 
Kohse K 1988 Effects of nitrovasodilators, endothelium-
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Spring Harb Symp Quant Biol 53: 1005-1009 (Mecanis-
mos celulares) 
Podrid P J 1999 Redefining the role of antiarrhythmic 
drugs. N Engl J M e d 340: 1910-1911 (Analisa os es-
tudos com a ibutilida e o sotalol, que "realçam o que 
poderá constituir a indicação primária da terapia far-
macológica antiarrítmica; como adjuvante da terapia 
não-farmacológica no alívio dos sintomas e melhora 
da qualidade de vida.") 
Prospective Randomised Amlodipine Survival Evaluation 
Study Group 1996 Effect of amlodipine on morbidity 
and mortality in severe chronic heart failure. N Engl J 
M e d 335: 1107-1114 (Não foi constatado nenhum efei-
to adverso ou benéfico na sobrevida do grupo como 
um todo) 
Rockman H A, Koch W J, Lefkowitz R J 2002 Seven-trans-
membrane-spanning receptors and heart function. N a -
ture 415: 206-212 (Revisão) 
Roy D, Talajic M, Dorian P et al. 2000 Amiodarone to pre-
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913-920 (A amiodarona em baixas doses foi mais efic 
do que o sotalol ou a propafenona) 
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mortalidade com o tratamento ativo, a despeito da su-
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498-499 (Comentário sobre a estratégia aparentemente 
lógica, porém problemática, de provocar deliberadamente 
arritmias em pacientes suscetíveis para selecionar uma te-
rapia individualizada, de acordo com suas necessidades) 
Welsh M J, Hoshi T 1995 Molecular cardiology - ion chan-
nels lose the rhythm. Nature 376: 640-641 (Comentário 
sobre a síndrome de Ward-Romano) 
Aesculapius
O sistema vascular 
Considerações gerais 325 
Estrutura e função do sistema vascular 325 
Controle do tonus do músculo liso 
vascular 326 
- O endo té l i o v a s c u l a r 3 2 6 
- O s i s tema de r e n i n a - a n g i o t e n s i n a 331 
Substâncias vasoativas 333 
- Substâncias v a s o c o n s t r i t o r a s 3 3 3 
- Substâncias v a s o d i l a t a d o r a s 3 3 4 
Aplicações clínicas das substâncias 
vasoativas 340 
- H ipe r tensão 3 4 0 
- Insuf ic iência ca rd íaca 3 4 2 
- C h o q u e e e s t a d o s h i po tens i vos 3 4 4 
- Doença v a s c u l a r per i fé r i ca 3 4 6 
- Doença de R a y n a u d 3 4 6 
CONSIDERAÇÕES GERAIS 
Este capítulo trata da farmacologia dos vasos 
sangüíneos. As paredes das ar tér ias , ar ter ío las , 
vênulas e veias contêm músculo liso, cujo estado 
de contração é controlado por hormônios circu-
lantes e por mediadores l iberados localmente 
das terminações nervosas simpáticas e das célu-
las endoteliais. A regulação das concentrações 
intracelulares de C a 2 + , [Ca 2 + ] ; no músculo liso 
vascular é descrita no Cap. 4. Neste capítulo, con-
sideraremos inicialmente o controle do músculo 
liso vascular pelo endoté l io e pelo sistema de 
renina-angiotensina e, a seguir, analisaremos as 
ações das substâncias vasoconstritoras e vaso-
dilatadoras. Por f im, faremos um breve resumo 
acerca dos usos clínicos das substâncias vasoati-
vas em algumas doenças importantes, como hi-
pertensão, insuficiência cardíaca, choque, doen-
ça vascular peri fér ica e doença de Raynaud. O 
uso das substâncias vasoativas no tratamento da 
angina é abordado no Cap. 17. 
ESTRUTURA E FUNÇÃO DO SISTEMA 
VASCULAR 
A cada batimento cardíaco, o sangue é ejetado do ventrí-
culo esquerdo para a aorta, a partir da qual f lui rapida-
mente até os órgãos através de artérias ricas em elastina e 
colágeno. A ramificação sucessiva leva, através de artérias 
progressivamente mais musculares, a arteríolas e capila-
res, onde ocorre troca de gases e nutrientes. Os capilares 
coalescem para formar vênulas pós-capilares, vênulas e veias 
progressivamente maiores até alcançarem, através da veia 
cava, o coração direito. O sangue desoxigenado ejetado 
do ventrículo direito circula pela artéria pulmonar, capila-
res pulmonares e veias pulmonares, retornando ao átrio 
esquerdo.'1' As arteríolas e as pequenas artérias musculares 
constituem os principais vasos de resistência na circula-
ção, enquanto as veias são vasos de capacitância. Por con-
seguinte, em termos de função cardíaca, as artérias e as 
arteríolas regulam a pós-carga, enquanto as veias e os va-
sos pulmonares regulam a pré-carga dos ventrículos. 
As propriedades viscoelásticas das artérias de grande 
calibre determinam a complacência arterial (isto é, o grau 
de aumento do volume do sistema arterial com o aumen-
to da pressão). Trata-se de um importante fator no siste-
ma circulatório, que é impulsionado por uma bomba in -
termitente, mais do que contínua. O sangue ejetado do 
ventrículo esquerdo é acomodado, a princípio, pela dis-
tensão do sistema arterial, que absorve as pulsações no 
débito cardíaco e libera um fluxo relativamente constan-
te para os tecidos. Quanto maior a complacência do sis-
tema, mais efetivamente as flutuações são amortecidas,** 
' 'William Harvey (médico do Rei Carlos I) deduziu a presença da 
circulação do sangue, baseando-se em experimentos quantitativos 
primorosamente elaborados, muito tempo antes que a invenção do 
microscópio permitisse confirmar visualmente os diminutos vasos 
sangüíneos, cuja existência havia previsto. Este triunfo intelectual não 
teve boas repercussõespara o seu prestígio como médico, e Harvey 
declarou que " foi literalmente arruinado como profissional e passou 
a ser considerado pelo vulgo como doido". Plus ça change... 
**Essa ação amortecedora é denominada efeito "windkessel". O 
mesmo princípio era utilizado para produzir um fluxo constante, 
mais do que intermitente, dos antigos hidrantes. 
Aesculapius
SEÇÃO 3 : FÁRMACOS Q U E A F E T A M OS PRINCIPAIS SISTEMAS O R G Â N I C O S 
e menores as oscilações da pressão arterial a cada bati-
mento cardíaco (isto é, a diferença entre a pressão sistó-
lica e diastólica ou "pressão do pulso"). A deflexão da 
onda de pressão dos pontos de ramificação na árvore vas-
cular também sustenta a pressão arterial durante a dias-
tole. Isso ajuda a preservar uma perfusão constante dos 
órgãos vitais, como os rins, durante a diastole. Entretan-
to, a deflexão excessiva pode aumentar patologicamente 
a pressão sistólica aórtica. A deflexão excessivamente rá-
pida resulta do endurecimento da aorta em conseqüência 
da perda de elastina no envelhecimento, particularmente 
em pessoas com hipertensão. O trabalho cardíaco (ver 
Cap. 17) pode ser reduzido através da introdução de com-
placência adicional no sistema arterial ou redução da de-
flexão da onda arterial, mesmo se o débito cardíaco e a 
pressão arterial média forem inalterados. N o s indivíduos 
de mais idade (em torno dos 55 anos), a pressão do pulso 
e o endurecimento da aorta constituem fatores de risco 
importantes para a cardiopatia. 
As ações das substâncias sobre o sistema vascular po-
dem ser divididas em efeitos sobre: 
• a resistência periférica total, que constitui um dos 
principais determinantes da pressão arterial, sen-
do importante no tratamento da hipertensão; 
• a resistência dos leitos vasculares individuais, que 
determina a distribuição local do fluxo sangüíneo 
para diferentes órgãos e no seu interior; esses efei-
tos são relevantes para o tratamento farmacológi-
co da angina (Cap. 17), do fenômeno de Raynaud 
e do choque circulatório; 
• a complacência aórtica e a deflexão da onda do 
pulso, que são importantes no tratamento da insu-
ficiência cardíaca e da angina; 
• o tônus venoso e o volume sangüíneo (a "plenitu-
de" da circulação) que juntos determinam a pres-
são venosa central e são importantes no tratamen-
to da insuficiência cardíaca e da angina; os diuréti-
cos (que reduzem o volume sangüíneo) são discu-
tidos no Cap. 23 ; 
• ateroma (Cap. 19) e trombose (Cap. 20). 
CONTROLE DO TÔNUS DO MÚSCULO 
LISO VASCULAR 
A exemplo de outras células musculares, o músculo liso 
vascular sofre contração quando aumenta a [ C a 2 + ] ; ; 
entretanto, o acoplamento entre [ C a 2 + ] ; e a contração 
é menos estrito do que no músculo estriado ou no mús-
culo cardíaco (Cap. 4). Os vasoconstritores e os va-
sodilatadores atuam ao aumentar ou reduzir a [ C a 2 + ] ; 
e/ou ao alterar a sensibilidade da estrutura contrátil à 
[Ca 2 + ]| . A F ig . 4 .10 fornece um resumo dos mecanis-
mos celulares envolvidos no controle da contração do 
músculo l iso. 
O ENDOTÉLIO VASCULAR 
Foi aberto um novo capítulo para a compreensão do con-
trole vascular com a descoberta de que o endotélio vascular 
atua não apenas como barreira passiva entre o plasma e o 
líquido extracelular, mas também como fonte de numero-
sos mediadores químicos potentes. Esses mediadores con-
trolam ativamente a contração do músculo liso subjacente e 
também influenciam a função das plaquetas e das células 
mononucleares; as funções importantes do endotélio na he-
mostasia e na trombose são discutidas no Cap. 20. Várias 
classes distintas de mediadores estão envolvidas (Fig. 18.1). 
• Prostanóides (ver Cap. 15) A descoberta da prosta-
glandina I2 (PGI 2 , também conhecida como pros-
taciclina) por Bunting, Gryglewski , Moncada & 
Vane em 1976, anunciou esta nova era. Este medi-
ador relaxa o músculo liso e inibe a agregação pla-
quetária ao ativar a adenilato ciclase. As células 
endoteliais dos microvasos sintetizam P G E 2 , que é 
um vasodilatador direto e que também inibe a l i -
beração de noradrenalina das terminações nervo-
sas simpáticas, enquanto carece do efeito da PGI 2 
sobre as plaquetas. Os intermediários endoperóxi-
dos das prostaglandinas ( P G G 2 , P G H 2 ) são fatores 
de contração derivados do endotélio, que atuam 
através de receptores de tromboxano. 
Músculo liso vascular 
• O músculo l iso vascu la r é con t ro lado por 
med iado res secre tados pelos nervos s impát icos e 
endoté l io vascular , b e m c o m o por ho rmôn ios 
c i rcu lantes. 
• A cont ração da célula muscu la r l isa é in i c iada por 
u m a e levação da [Ca 2 + ] . , que at iva a q u i n a s e da 
cade ia leve de m i o s i n a , c a u s a n d o fos for i lação da 
m i o s i n a , ou pe la sensibi l ização dos m io f i l amentos 
a o C a 2 + através d a in ib ição d a m ios ina fosfatase 
(ver C a p . 4). 
• Os agentes que c a u s a m cont ração p o d e m : 
- l iberar o C a 2 + in t racelular , secunda r i amen te à 
f o rmação de tr i fosfato de inosi to l m e d i a d a por 
receptores ; 
- despo la r i za r a m e m b r a n a e, a s s i m , permit i r a 
en t rada d e C a 2 + através dos cana is d e cálc io 
regu lados por v o l t a g e m ; 
- permit i r a en t rada de C a 2 + através dos cana is de 
cálcio ope rados por receptores. 
• Os agentes que c a u s a m re laxamen to p o d e m : 
- in ibir a en t rada de C a 2 + através dos cana is de 
cálcio regu lados por v o l t a g e m , d i re ta 
(por exemp lo , n i fedipina) ou ind i re tamente 
através da h iperpo lar ização (at ivadores do K + , 
c o m o , por e x e m p l o , c romaca l i na ) ; 
- a u m e n t a r a concent ração in t race lu lar de c A M P e 
c G M P ; o c A M P causa inat ivação da q u i n a s e da 
cade ia leve de m ios ina e pode faci l i tar o ef luxo de 
C a 2 + ; o c G M P opõe-se a a u m e n t o s d a [ C a 2 + ] | 
induz idos por agon is tas . 
Aesculapius
O SISTEMA V A S C U L A R 
Oxido nítrico. O fator de relaxamento derivado 
do endotélio (EDRF, endothelium-derived relaxing 
factor) foi descoberto por Furchgott & Zawadzki , 
em 1980, e identificado subseqüentemente como 
oxido nítrico (NO) pelos grupos de M o n c a d a e de 
Ignarro (ver Fig. 14.2). O reconhecimento deste 
mediador (ver Cap. 14) expandiu enormemente a 
compreensão do papel desempenhado pelo endo-
télio. O NO ativa a guanilato ciclase. Mostra-se 
particularmente importante nos vasos de resistên-
cia em virtude da liberação contínua, produzindo 
um tonus vasodilatador e contribuindo para o con-
trole fisiológico da pressão arterial. Além de cau-
sar relaxamento vascular, o NO inibe a prolifera-
ção de células musculares lisas vasculares, a adesão 
e agregação plaquetárias e a adesão e migração dos 
monócitos; por conseguinte, pode proteger os va-
sos sangüíneos contra o desenvolvimento de ate-
roma e trombose (ver Caps. 19 e 20). 
Peptídios. O endotélio secreta diversos peptídios 
vasoativos. O peptídio C natriurético, que está rela-
cionado ao peptídio natriurético atrial (Cap. 17), e 
a adrenomedulina (um peptídio vasodilatador origi-
nalmente descoberto num tumor supra-renal - o 
feocromocitoma - , porém expresso em muitos teci-
dos, incluindo o endotélio vascular) são vasodilata-
dores. A angiotensina II, formada pela enzima con-
versora de angiotensina ( A C E , angiotensin-conver-
ting enzyme) sobre a superfície das células endoteli-
ais (ver adiante), e a endotelina são potentes peptí-
dios vasoconstritores derivados do endotélio. 
Fator(es) de hiperpolarização derivado(s) do endotélio 
(EDHF, endothelium-derived hyperpolarising factor(s)) 
a dilatação dependente do endotélio, que ocorre em 
resposta a vários mediadores (incluindo acetilcolina 
e bradicinina), pode persistir, a despeito da inibição 
completa da síntese de prostaglandinas e de N O . Este 
relaxamento é acompanhado de hiperpolarização en-
dotélio-dependente do músculo liso vascular e aboli-
do por uma combinação incomum de bloqueadores 
dos

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