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1 Isadora Silva Clínica Médica Síndromes Nefríticas e Nefróticas Não são doenças propriamente ditas, mas sim consequência de uma outra doença de base. São consideradas glomerulopatias (doenças que acometem os glomérulos). Manifestações renais e sistêmicas causadas por alterações nas funções glomerulares por lesão direta na estrutura dos glomérulos ou por lesão secundária a outras doenças. Essas doenças afetam a barreira de filtração glomerular, permitindo que estruturas que não deveriam passem na filtração (ex. elementos sanguíneos como hemácias e proteínas). Lembrar que a barreira de filtração glomerular é composta por: Capilares glomerulares Membrana basal Podócitos As lesões podem acontecer principalmente por depósitos de imunocomplexos (nosso sistema imune tenta combater o antígeno, mas não consegue, formando uma estrutura composta por principalmente Antígeno e Anticorpo). Para se diferenciar de síndrome nefrítica e nefrótica é o local onde ele vai se instalar. Síndrome nefrítica: aquela em que o paciente tem lesão na barreira de filtração por inflamação local (capilares glomerulares e/ou membrana basal), causando hematúria maciça e proteinúria discreta (já que os podócitos ainda conseguem reter um pouco das proteínas). Síndrome nefrótica: alteração na função glomerular por lesão nos podócitos (afeta um pouco a membrana basal e os capilares), causando proteinúria maciça e hematúria discreta. Acaba sendo mais grave. Síndrome Nefrítica Temos como principais características clínicas: Hematúria maciça Proteinúria discreta Edema Hipertensão Pode causar também: oligúria, perda da função renal Muitas vezes dependendo precisamos levar o paciente para diálise. Doenças que podem causar Sd nefrítica: Fisiopatologia: Na inflamação das paredes de filtração, acontece alteração da polaridade da 2 Isadora Silva membrana, ficando apolar e com isso não permite a passagem de água e sódio ficarão retidos no capilar, podendo causar edemas e alterações de pressão (aumento da PA). A água não passando para filtração e excreção, vai causar retenção da água, causando oligúria. Diagnóstico: clínico e laboratorial. Vamos perguntar sobre doenças prévias, antes de começar com as alterações urinárias. Exame físico é sempre importante (vamos avaliar pressão, mesmo que em crianças, já que acontecem muito com elas). Exames laboratoriais: EAS, urina 24hrs (qualitativo), os exames mais específicos são feitos para analisar a causa base (ex: ASLO para estreptococo, FAN e anti DNA para lúpus...). Em último caso vamos fazer a biópsia renal. Características clínicas: Hematúria macroscópica ou microscópica: mais macro!! Proteinúria discreta: 150 mg- 3,5g (24hrs) Oligúria: ≤400ml/dia adulto e ≤0,5ml/kg na criança. Sintomas de congestão volêmica: hipertensão arterial, edema periorbital matinal, edema em MMII ao final do dia Restringimos água e sódio, e damos diuréticos. Características Laboratoriais: Hematúria glomerular (classificada em cruz) Presença de cilindros hemáticos: hemácias + proteínas Tamm Horsfall (hemácias grudam muito nelas) Hemácias dismórficas: O capilar não se dilata igualmente em toda sua sequência, sendo que as que há dilatação a hemácia consegue passar e no espaço menor, ela se “encolhe” para conseguir passar, ficando dismórfica. Piúria: pus na urina. Proteinúria: discreta Cilindros leucocitários (neutrófilos + proteínas de Tamm Horsfall). 3 Isadora Silva Conduta: Vamos inicialmente descobrir a doença de base que causou a síndrome nefrítica. Vamos acompanhar o paciente de perto, porque tende a evoluir para quadros graves (como é o caso da glomerulonefrite rapidamente progressiva, onde o paciente tem que ser encaminhado para o hospital diretamente, sendo uma urgência médica). GNRP (glomerulonefrite rapidamente progressiva): acontece formação de tecido fibroso na membrana capilar, onde nosso organismo não consegue reabsorver (cicatriza) e não deixa passar mais nada. O glomérulo nesse caso vai perder sua capacidade total, perdendo a capacidade de passar até os elementos para formarem a urina. O rim nesse caso entra em insuficiência por perder sua função. Nesse caso, o paciente vai ter aumento na creatinina e ureia no sangue, por não estarem sendo excretadas na urina. Nesse caso para avaliação se o paciente está evoluindo para insuficiência renal, vamos avaliar creatinina e ureia, já que na síndrome nefrítica estão normais e na GNRP estão aumentadas (temos azotemia- aumento de excretas celulares no sangue). Doenças de base que levam a síndrome nefrítica -Glomerulonefrite pós-estreptococica (GNPE): Inflamação do glomérulo pós infecção por streptococcos βhemolíticos grupo A. Fisiopatologia: Tudo começa com a infecção por esse microrganismo por via aérea superior ou por pele (piodermites). Essa bactéria tem mecanismo para tentar burlar nosso sistema imune e se defender (produzindo Ag e liberando no sangue, onde nosso sistema vai identifica- las e liberar Ac que vai se ligar a ela [formando o imunocomplexo- Ag/Ac/Complemento] e não ataca o microrganismo em si). O imunocomplexo formado vai continuar circulando no sangue e pode chegar até a parede do capilar glomerular ficando entre ele e a membrana basal podendo causar inflamação e afetar a barreira glomerular. Essa doença é muito comum na infância, porque é mais nessa época que pode-se ter infecções de garganta podendo ser por estreptococo. Mas bom lembrar que nem todo paciente que sofrer por infecção com streptococcos βhemolíticos grupo A vai evoluir para glomerulonefrite. As crianças são mais fáceis de se tratar do que idosos, já que nos idosos a função renal é mais comprometida, além dele possuir mais azotemia. Diagnóstico: vamos questionar se houve faringoamigdalite e piodermites recentes e se há sintomas de dispneia, edemas, hematúria, oligúria. No Exame Físico vamos avaliar PA, presença de edemas, congestão pulmonar. Já nos exames complementares vamos avaliar para infecções de trato respiratório superior (ASLO), piodermite (ANTI DNAse B), avaliação de complemento (que é usado para forma imunocomplexo, estando em quantidade baixa por isso), EAS e proteinúria 24hrs. 4 Isadora Silva Pedimos biópsia quando: - O complemento estiver baixo a mais de 8 semanas. - Não há evidências de infecção estreptocócica prévia. - Hematúnia e proteinúria maciça (>3,5g) -Evolução para azotemia Resultados confirmatórios: -Microscopia óptica: depósitos de imunocomplexos (infiltrado inflamatório difuso). -Microscopia eletrônica: depósitos subepiteliais -Imunofluorescência: padrão granular Tratamento: vamos fazer tratamento de suporte, ou seja, tratar seus sintomas: Restringir líquidos para não causar edemas Restringir sódio Se o paciente tiver com edema podemos dar diurético de alça (FUROSEMIDA). Anti-hipertensivo se necessário- IECA melhor, porque inibe a angiotensina e a arteríola eferente não faz vasoconstrição e isso não permite que a haja uma hipertensão glomerular e permita maior saída de hemácias e proteínas na urina. Por isso o IECA é priorizado. Antibioticoterapia- penincilina benzatina Casos mais graves (oligúria refratária e persistente): podemos submeter o paciente a diálise temporária. Vamos continuar avaliando o paciente por que ele pode evoluir para insuficiência renal crônica. Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva (GNRP) Complicação de todas as síndromes nefríticas. Quando há fibrose da membrana capilar e membrana basal, causando um tecido cicatricial que não funciona mais levando a falência.É complicação de uma síndrome nefrítica com evolução para um quadro de falência renal. Há perda rápida da função renal, e por isso é uma urgência médica e devemos levar o paciente correndo ao hospital. Há presença de hematúria maciça. Histologicamente há presença de material na cápsula de Bowman formando um “crescente fibroso”, onde há destruição do glomérulo. 5 Isadora Silva Etiologia: Sd de Goodpasture (pulmão-rim): essa é muito comum e se vermos podemos encaminhar logo o paciente porque a chance é grande de se ter GNRP. Acontece por depósitos de Ac anti membrana basal. Depósito de imunocomplexos: Sd pós estreptocócica, Sd de Berger, secundária a LES. Vasculites sistêmicas: glomerulomatose de Wegner SÍNDROME DE GOODPASTURE: o organismo do paciente produz auto-anticorpos (alteração genética) que vem passando pelas fenestras dos capilares glomerulares e atinge seu principal alvo: a membrana basal. Afeta assim membrana basal e parede do capilar glomerular: causando síndrome nefrítica. Os auto-anticorpos também atingem a membrana existente no pulmão, permitindo que não passe apenas gases nas trocas gasosas, mas hemácias, soros e assim o paciente tem problemas respiratórios também. Atinge mais o sexo masculino e de idade entre 20 e 40 anos. Quadro clínico: Sintomas de síndrome nefrítica: hematúria, hipertensão arterial, oligúria Sintomas pulmonares: hemoptise, dispneia, estertores. Diagnóstico: o padrão vai ser a biópsia renal, sendo o primeiro a ser pedido (procurando fribrose em glomérulo ou fazer também imunofluorescência- padrão linear). Vamos encontrar dismorfismo celular e no RX infiltrados pulmonares. Tratamento: é uma urgência médica e podemos ter cuidado para evolução para glomerulonefrite progressiva. Vamos dar imunossupressores: 1- Corticoides 2- Imunossupressores (ciclofosfamida) 3- Rituximabe (a gente suprime a produção de anticorpos, e nisso o paciente fica exposto para infecções oportunistas, vai ter mais infecções). Podemos também fazer a plamaférese, filtrando todo o plasma par tirar os auto-anticorpos, sendo que esse é um tratamento que temos que ir fazendo, porque a pessoa não vai deixar de produzir auto-anticorpos. Se a evolução foi para a insuficiência renal aguda devemos levar o paciente para diálise (podendo ser temporária). SÍNDROME DE BERGER (nefropatia por IgA): Doença causada por deposição de imunocomplexos de IgA nos espaços intercapilares glomerulares levando a quadros inflamatório local e consequente alteração da função da estruturas próximas. O nosso organismo reconhece essa IgA defeituosa e libera Ac, só que não vai dar conta de destruí- lo, assim, quando o complexo chega, forma assim o imunocomplexo. É a mais comum no mundo (mas não no nosso país que é a pós estreptocócica), e mais comum em homens. 6 Isadora Silva Apresentação clínica (depende da quantidade de imunocomplexos formados): 1- Hematúria macroscópia intermitente: as vezes apresenta sangue na urina e outros momentos não, tendo duração de 1-5 dias com os sintomas. Fatores desencadeantes: infecção, exercícios físicos intensos. Tem bom prognóstico. 2- Hematúria microscópica persistente: paciente não enxerga o sangue na urina, mas visto em exame de urina (persistente). Alguns fatores genéticos fazem com que a produção de IgA defeituoso seja constante, e por isso acontece a persistência da hematúria. 3- Síndrome nefrítica: paciente já evoluiu e apresenta a síndrome propriamente dita com hipertensão, edema e oligúria. 4- Glomerulonefrite rapidamente progressiva: 1-2%. Diagnóstico: é clínico e laboratorial. O paciente tem presença de hematúria macroscópica, edema, hipertensão arterial, oligúria, proteinúria discreta. Laboratoriais: Dosagem de IgA sérica aumentada; EAS e urina 24 hrs Padrão ouro: biópsia renal, mas não vai ser o primeiro exame a ser solicitado, somente em dúvida diagnóstica. Ela te dá certeza de diagnóstico. Tratamento: depende da apresentação clínica, mas vamos acompanhar o paciente, explicar os quadros e continuar o acompanhamento. Em casos de proteinúria vamos dar IECA, e na presença de crescentes glomerulares e azotemia, vamos dar IECA, corticoterapia, imunomodulador, plamaférese. Síndrome Nefrótica A lesão na barreira glomerular aqui acontece nos podócitos e acaba pegando um pouco da membrana basal e capilares glomerulares. Podemos ter hematúria discreta e proteinúria maciça (>3,5g/dia). BOM lembrar: os pedicélos quando não destruídos a nível celular, conseguem ser restituídos. Podócitos possuem carga elétrica negativa assim como as proteínas, e por isso não deixa que elas atravessem. Há perda de 2 mecanismos com a lesão podocitária podendo ser nessa carga anteriormente dita ou na barreira física: 1- Perda da barreira elétrica: proteinúria seletiva (proteínas de baixo peso conseguem passar- ALBUMINA) - paciente entra em quadro de hipoalbuminemia- porque vai estar perdendo ela na urina. O capilar glomerular fica hiposmolar (já que a albumina “segura” a osmolaridade sanguínea) por perder a albumina e vai perder líquido para o terceiro espaço- Isso vai causar anasarca (edema generalizado). 2- Perda da barreira física: proteinúria não seletiva (albumina; proteínas anticoagulantes- eventos tromboembólicos; IgG- imunidade fica 7 Isadora Silva ruim; transferrina- anemia ferropriva, microcítica, hipocrômica). Fisiopatologia: como estamos perdendo proteína na urina, nosso fígado fica encarregado de aumentar a quantidade de proteína sérica, mas não tende a produzir separadamente aquelas necessárias; assim produz todos os tipos, até LDL causando hiperlipidemia, essa “gordura” vai sair na urina e o paciente vai reclamar que ao urinar tem uma “película” de gordura em cima do conteúdo urinário (lipidúria). Forma os cilindros graxos (que se adere as proteínas de Tam Horsfall), que é a gordura grudada na proteína, e isso aparece na análise microscópica da urina. Etiologias: consequência de doenças de base Doenças primárias: atacam diretamente o glomérulo- Doença por lesões mínimas; GESF. Doenças secundárias: secundariamente atacam o rim causando a doença nefrótica- nefropatia diabética, nefropatia lúpica. Características clínicas (tríade praticamente fechamos o diagnóstico): 1- Hipoalbuminemia 2- Proteinúria 3- Anasarca 4- Fenômenos tromboembólicos 5- Infecções recorrentes 6- Anemia ferropriva 7- Dislipidemia 8- Eventos ateroscleróticos 9- Perda da função renal secundária a proteinúria: por lesão na parede dos túbulos, que inflamam reduzindo a luz do vaso e o rim vai perdendo néfron. Demora mais pra acontecer o quadro, lembrar que a glomerulonefrite rapidamente progressiva acontece mais rápido e que é relacionado síndrome nefrítica. Diagnóstico: também é clínico e laboratorial. Paciente apresenta: 1- Anasarca 2- Proteína na urina: espuma na urina 3- Histórico de fenômenos tromboembólicos 4- Histórico de infecções recorrentes Laboratoriais: EAS e urina 24hrs; colesterol elevado (LDL), hemograma (anemia ferropriva), hipoalbuminemia. Tratamento Geral: tratar sintomas -Controle da dieta e da hidratação: diminuir a ingesta hídrica (paciente com anasarca). Dieta hipoproteica. -Proteinúria: IECA ou BRA -Dislipidemia/hipercolesterolemia: estatina -Fenômenos tromboembólicos: antitrombóticos Específicos: descobrir a doença de base e tratá-la. -1º: imunossupressor/ 2º: tratar doença de base. 8 Isadora Silva Doença por lesão mínima: Causa síndrome nefrótica pura com: 1- Proteinúria 2- Anasarca 3- Hipoalbuminúria Doença que causa modificação na barreira elétrica,sendo assim as proteínas de alto peso molecular continuam não passando, só as de baixo peso que passam (por isso o paciente tem albuminúria). Mais comum em crianças de 1-8 anos, de sexo masculino. Nessa doença existe períodos de remissão e aparecimento da doença. Não tem fisiopatologia bem definida, mas sabemos que é uma doença imunomediada. Sabe-se que crianças que tiveram doença por lesão mínima adquiriram Linfoma de Hodgkins. Já se sabe também que o uso indiscriminado de AINES em crianças podem levar o aparecimento de doença por lesão mínima. A complicação mais observada nessa doença é a peritonite bacteriana espontânea, podendo muitas vezes ser caso cirúrgico. Diagnóstico: clínico e laboratorial. Criança em época escolar que a mãe vem trazendo todo edemaciado e com a tríade de Sd nefrótica. Laboratoriais: EAS, urina 24hrs, albumina sérica. Podemos pedir biópsia renal em casos duvidosos. Essa doença tem excelente resposta a corticoide terapêutico (predisolona é bom). Tratamento: A primeira escolha é a corticoterapia (8-12 semanas), mas sendo bom lembrar que não é bom usarmos de forma contínua. Se o paciente for refratário (aquele que volta com os sintomas ou também chamado de corticodependente), devemos usar ciclosporinas (imunodepressor), já que não é bom usar corticoide constante como já foi dito. Para saber se o paciente é corticodependente vamos tratar pela primeira vez, ele vai melhorar e voltar dali 3 dias com sintomas, vamos tratar de novo e novamente ele vai voltar com os sintomas, nesse caso já indicamos trocar para a ciclosporina. Glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF): Doença que leva Sd nefrótica em adultos por volta de 25-40 anos. Paciente tem recidivas da doença (trata e volta). Há destruição da barreira física (destruição dos podócitos), e por essa passagem de mais proteínas temos mais sintomas. É uma sd nefrótica que causa hipertensão (mais vista em sd nefrítica). Aqui a complicação mais grave é a insuficiência renal. Não sabemos muito sua etiologia, mas hoje levamos em conta causas hereditárias e aquelas secundárias: anemia falciforme, obesidade, HIV, uso de drogas como heroína, nefropatia por refluxo (doença que afeta a arteríola eferente por obstrução sendo que o volume de sangue volta para o glomérulo). 9 Isadora Silva Diagnóstico: é feita somente por biópsia renal, onde encontramos presença de esclerose (enrijecido) em um segmento (capilar) do glomérulo. Tratamento: também responde bem a corticoterapia (12-16 semanas), podemos fazer esse tratamento até 2 vezes, mas para não continuar usando, podemos dessa forma pular para o imunossupressor (ciclosporina). Podemos tratar também os sintomas do paciente com: estatinas, IECA.
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