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DR. ALEXANDRE FORTES MÉDICO DE FAMÍLIA Síndromes Dolorosas Anamnese da dor Medicina MusculoEsquelética SUMÁRIO 3 5 5 6 9 12 13 14 15 Prefácio Introdução Neurofisiologia da Dor Tipos de Dor Síndorme Dolorosa Miofascial (SDM) Agulhamento Seco X Molhado Funil da Dor Resumindo Referências prefácio As vezes os pacientes falam de suas dores de forma muito prolixa ou não sabem informar de modo organizado jogando milhares de informações e detalhes desnecessários para o médico, mas que na opinião dele, podem vir a servir para alguma coisa. É interessante deixar o paciente falar livremente sem interrupções; mas tudo tem limite. Tem pacientes que, se deixarmos, falam sem parar (geralmente são os ansiosos). Nesse sentido, para facilitar a vida do médico sugeri uma regra mnemônica que aprendi na minha época de emergencista. 3 Medicina Musculoesquelética Anamnese da Dor Lembrando sempre de avaliar os componentes afetivo, cognitivo e somático da neuromatriz relacionados à dor (veremos mais adiante). Quando perguntamos à paciente “que tipo de dor…” estamos pesquisando se é uma dor inflamatória, neuropática, miofascial, funcional ou nociceptiva. Se a dor é inflamatória devemos tratar com AINES (desde que esteja na fase aguda). Se é uma dor crônica (ex: artrose, tendinose) os AINES podem ser uma opção (principalmente nos casos de agudização), mas nem sempre. Se a dor é neuropática ou crônica devemos optar pelos anti-convulsivantes ou anti-depressivos. Podemos ainda pensar nos opióides mas sempre lembrando dos riscos de dependência e tolerância. Se a dor é miofascial, a melhor opção é o agulhamento seco. Pode-se tentar (quando o agulhamento seco não é uma opção) realizar a compressão isquêmica do ponto gatilho (comprimir o ponto gatilho com digito-pressão contínua durante 60-90 seg). Exemplificando: “Dona Maria… 1. COMO foi que começou sua dor? 2. “O quê melhora e o quê que piora as suas dores? Tem alguma posição (sentada, deitada, de pé…)?” 3. “Que tipo de dor que a Sra. sente? É uma pontada, um aperto, uma queimação…” 4. “Essa dor se espalha para algum lugar?” 5. “Essa dor é forte, fraca, mais ou menos ou insuportável?” 6. “Ha quanto tempo que essa dor lhe incomoda”? ONSET Como se deu o início dos sintomas, o que provocou, o que aconteceu Fatores de agravo e de alívio da dor qual o tipo de dor (neuropática, miofascila, inflamatória) Se irradia deve ser neuropática ou miofascial. Se não irradia deve ser inflamatória Gravidade ou intensidade da dor Ha quanto tempo que está doendo (dor aguda, subaguda ou crônica) O PROVOCATIONP QUALITYQ RADIATIONR SEVERITYS TIMET DICA PRÁTICA: ・ Se a dor é uma inflamação articular, toda vez que essa articulação mexer (movimento passivo ou ativo) ela vai doer. ・ Se a dor é uma inflamação no músculo ou tendão, toda vez que esta estrutura esticar ou contrair vai doer ・ Se a dor é uma inflamação no ligamento, toda vez que eu forçar o estiramento deste ligamento ele vai doer ・ Se a dor irradia por um dermátomo ela deve ser de origem radiculopática ou de inflamação neurogênica (alguma lesão ou compressão nervosa) ・ Dor inflamatória não irradia; ela só dói localmente. ・ Dor neuropática e dor miofascial irradiam. A primeira no trajeto de um dermátomo e a segunda 4 Medicina Musculoesquelética tem padrões de irradiação fixos e individuais (cada músculo tem um determinado padrão de irradiação diferentes; com o tempo, isso acaba sendo memorizado da mesma forma que memorizamos os músculos e ossos na anatomia) ・ Hoje em dia dor crônica é considerada uma doença e não um sintoma. A principal causa de dor crônica na APS é dor miofascial. ・ Pacientes com dor crônica frequentemente tem u m a i n t o l e r â n c i a à d o r ( u m e s t a d o d e hipersensibilidade) RESUMINDO: 1. "OPQRST" 2. IDENTIFICAR A SIND. DOLOROSA 3. TESTAR AS ESTRUTURAS ANATÔMICAS (Exame Físico) introdução 5 Medicina Musculoesquelética «A dor é inevitável; o sofrimento é uma opção» Neurofisiologia da dor A compreensão dos mecanismos envolvidos na neurofisiologia da dor é de fundamental importância para a compreensão da dor crônica e seu tratamento. Vejamos então um breve resumo do que é mais importante. A função dos neurônios periféricos ao receber um estímulo (térmico, tátil ou químico) é de transformá- lo num estímulo elétrico (TRANSDUÇÃO), da mesma forma que um microfone transforma ruídos ambientes ou a voz de um cantor num sinal elétrico. Esse sinal elétrico será CONDUZIDO pelas fibras aferentes até a medula espinal aonde este sinal será TRANSMITIDO à um segundo neurônio no corno posterior da medula (equivalente ao fio do microfone que se conecta à um amplificador). Esta TRANSMISSÃO pode ser facilitada ou inibida (falaremos sobre isso mais adiante); chamaremos esse fenômeno de sensibilização ou modulação. No corno posterior da medula este segundo neurônio, que recebeu o estímulo da periferia, precisa levar o sinal de dor (IMPULSO ASCENDENTE) para ser PERCEBIDO no cérebro (córtex somato- sensorial). O cérebro, neste caso seria equivalente as caixas de auto-falantes que recebem o sinal elétrico vindo do amplificador e agora o transformam em um novo sinal sonoro. Nós temos ainda um sistema inibitório descendente da dor que serve para nossa proteção. O mecanismo inibitório descendente (de modo bem resumido), estimula a liberação de encefalina na sinapse entre o 1º e 2º neurônios no corno dorsal da medula. Existem vários tipos de dor e saber diferenciar uma de outra é de extrema importância (principalmente na hora de escolher a forma de tratamento). Por exemplo: as dores inflamatórias agudas, devem ser tratadas com AINES; as dores neuropáticas com anti-convulsivantes ou anti-depressivos e assim por diante. Neurofisiologia de es�mulos nocicep�vos (porque dor não necessariamente implica num es�mulo nocicep�vo); assim como quando eu ligo a tomada a luz do meu quarto acende, quando um es�mulo aciona um neuronio nocicep�vo, este es�mula nossa medula vertebral que, uma vez es�mulada, “fecha o circuito” como o córtex cerebral e a luz acende. 6 Medicina Musculoesquelética C lassicamente são descritos dois tipos principais de dor: a dor inflamatória e a dor neuropática. Um Reumatologista Inglês chamado Anthony Woolf propôs uma classificação um pouco mais elaborada onde ele sugere acrescentar a dor nociceptiva, a dor funcional (ou disfuncional) e a dor somático-referida (ou dor miofascial). Abordaremos agora cada uma delas para o melhor entendimento. A dor nociceptiva é aquela que depende de estímulo nos neurônios nociceptivos. Quanto maior Tipos de dor Seguindo o exemplo da explicação dada na figura anterior sobre a neurofisiologia dos es�mulos nocicep�vos, imaginem uma tomada molhada com bastante água. Vai dar choque! Aquela região é capaz de conduzir es�mulos com muito mais facilidade. É o que acontece quando ha o derramamento de substancias algiogênicas na periferia da lesão �ssular. Isso é denominado “sensibilização periférica”. o estímulo, maior a dor. Se não houver estímulo, não há dor. Exemplos: espetar o dedo num alfinete, encostar a mão numa chapa quente, prender o dedo na porta e etc. A dor inflamatória depende da liberação de c i toc inas inflamatór ias (pros tag land inas , bradcininas, substancia P, CGRP…) que são conseqüência de uma lesão tecidual. Essas citocinas promovem, dentre outras coisas, a sensibilização periférica local (que torna a região toda mais sensível à dor). Um bom exemplo é o de uma tendinite por esforço repetitivo. OBS: Se termina com o sufixo “ite" (tendinite, conjuntivite, bursite, amigdalite…) é porquê é uma inflamação aguda. Se é uma inflamação, haverá sinais flogísticos (dor, rubor, calor e edema). A inflamação também se caracteriza por ser uma dor localizada (sem irradiação),que piora quando a região inflamada for pressionada (digito- pressão) ou manipulada. Com isso em mente, basta revisar a anatomia, prestar atenção na origem e inserção de cada músculo (desta forma pode-se deduzir o movimento realizado para provocar dor - a biomecânica), tendão ou ligamento e testar as estruturas em questão individualmente. Nos casos A função da Encefalina é de bloquear os estímulos nociceptivos vindos do primeiro neurônio. Sendo assim, quanto mais encefalina nesta sinapse, menor a quantidade de estímulos que serão transmitidos ao córtex somato-sensorial. É a modulação inibitória descendente. Então, a dor, na realidade é sentida no cérebro e não na mão que levou uma martelada! Daí a expressão: “No Brain, No Pain” (sem cérebro, sem dor). 7 Medicina Musculoesquelética em que encontramos uma lesão tecidual, a resposta inflamatória desencadeada l ibera grandes quantidade de substancias algiogênicas. Estas substancias promovem uma sensibilização dos neurônios nociceptivos periféricos; em outras palavras, diminuem o limiar de dor e agora, aquilo que antes não me incomodava, já é o suficiente para provocar dor. Isso nós chamaremos de sensibilização periférica. Portanto uma característica marcante de toda reação/dor inflamatória é a sensibilização local à dor. Ex: pense numa unha encravada; basta mexer que dói. Uma unha normal não dói quando mexemos nela. - Uma inflamação articular (ex: Gota, Artrose, Artrite) vai doer toda vez que essa articulação for mexida (tanto faz se o movimento é ativo ou passivo - mexeu, doeu). - Uma lesão inflamatória por ruptura (parcial ou total) de um ligamento (ex: entorse de tornozelo) vai doer toda vez que se fizer o movimento que estica e tenciona o ligamento lesionado. - Uma lesão inflamatória por ruptura (parcial ou total) de um músculo ou tendão vai doer toda vez que o músculo contrair ou esticar. - Uma inflamação em algum nervo periférico (ex: artrose facetária irritando as raízes nervosas adjacentes) vai irradiar pelo trajeto daquele nervo com características de dor neuropática - Uma dica importante no tratamento das dores inflamatórias é que se é uma inflamação crônica (artrose por exemplo), os AINES não serão tão eficazes quanto nas inflamações agudas. Isso não significa que uma inflamação crônica não venha a ter picos de agudização (uma sinovite num joelho que tenha artrose por exemplo). A dor Neuropática é uma anormalidade do sistema nervoso. Existe algum problema em algum lugar no trajeto entre o SNP e o SNC (pode ser na transdução, na condução, na transmissão quanto na percepção da dor). Pode haver o disparo de potenciais de ação espontâneos, pode haver condução aberrante, pode haver sensibilização central da dor (uma espécie de “up-regulation”) tanto no corno posterior da medula quanto no Tálamo. As dores neuropáticas podem ser descritas c lass i camente pe los pac ientes como um “formigamento”, como uma “pontada/alfinetada”, como uma “queimação" ou como um “choque”. São exemplos comuns de dor neuropática a neuropatia As diversas manifestações clínicas da dor neutropá�ca. conhecer elas ajuda o MFC durante a anamnese a entender que �po de dor que o paciente sente. Uma vez compreendido o mecanismo, fica mais fácil escolher a terapêu�ca. 8 Medicina Musculoesquelética diabética nas mãos ou nos pés, a sind. do túnel do carpo, uma radiculopatia por compressão de uma raiz nervosa na coluna e etc. Para cada tipo de dor neuropática há um ou mais medicamentos recomendados, entretanto as respostas aos tratamentos permanece imprevisível²; No caso de neuropatia diabética as opções de tratamento seriam Anti-depressivos tricíclicos (ADT), Gabapentina, Pregabalina, Duloxetina e Venlafaxina como drogas de primeira linha4, 48. Já na neuralgia pós-herpética as drogas de primeira linha são ADT, Gabapentina, Pregabalina e Lidocaína tópica (especialmente em idosos)54; para neuralgia do trigêmeo as melhores opções são Carbamazepina e Oxcarbamazepina 61,62. Já no caso que mais nos interessa (Dor neuropática por radiculopatia) a Pregabalina, ADT e opióides assim como suas combinações são INEFICÁZES ou ligeiramente eficázes 81-83. Gabapentina por outro lado foi considerada a opção mais provável de ter eficácia para o tratamento de radiculopatia crônica7. A dor neuropática é aquela que dói espontaneamente ou quando se estimula uma raíz nervosa inflamada. A dor Funcional (ou disfuncional) é aquela aonde não se encontra nenhuma anormalidade no sistema nervoso periférico ou central, mas a pessoa sente dor. Entende-se hoje que é uma disfunção no sistema inibitório descendente da dor. Este sistema tem um caráter de proteção e sobrevivência. Numa situação de “Luta ou Fuga” onde a vida está sendo ameaçada, nosso corpo faz de tudo para favorecer nossa sobrevivência. Aumenta a freqüência cardíaca, desvia sangue das vísceras para os músculos, promove vasodilatação, dilata as pupilas, dentre outros. A supressão da dor também entra nessa cascata de eventos adaptativos. Um exemplo clássico disso é do soldado que é ferido durante a batalha mas não percebe e continua lutando. Só depois de afastada a ameaça é que ele vai perceber que está ferido e então começa a sentir dor. Nos casos de dor funcional (fibromialgia, sind. do cólon irritável, cefaléia tensional, enxaqueca…) o problema então, está neste sistema inibitório descendente, que não consegue inibir de forma satisfatória (no corno posterior da medula) a TRANSMISSÃO do sinal doloroso vindo da periferia para o segundo neurônio. Essa inibição é feita pela descarga de encefalina (ENK) nesta sinapse. Quanto mais encefalina, menor a passagem do sinal de um neurônio para o outro. Os anti-depressivos atuam justamente neste sistema inibitório descendente. A noradrenalina (Nad) e a Serotonina (5HT) aumentam a liberação de encefalinas na sinapse do corpo posterior da medula. Modelo explica�vo dos mecanismos envolvidos na nocicepção e inibição descendente do corno dorsal da medula via liberação de encefalina. ENK - encefalina; GLU - glutamato; SP - substancia P; PAG - substancia cinzenta periaquegutal; Nad - noradrenalina; 5HT - serotonina; SG - substancia gela�nosa Nesta figura fica claro porque devemos saber diferenciar os diferentes �pos de dor. A dor miofascial do glúteo mínimo com muita freqüência é diagnos�cada como ciatalgia. Pra piorar o quadro, como grande parte das pessoas assintomá�cas apresentam abaulamentos discais e protrusões discais assintomá�cas, nestes casos de dor miofascial, quando o médico desavisado solicita uma RM da coluna lombar e encontra um destes achados, rotula o paciente com hérnia de disco e a par�r deste ponto, toda vez que o paciente apresentar uma nova crise de dor lombar, dirá que é porque tem uma “hérnia”. Dica: na dor miofascial do glúteo mínimo o Laseg é nega�vo! 9 Medicina Musculoesquelética A Síndrome Dolorosa Miofascial é a causas mais comum de dor crônica na população em geral. Estudos recentes de base populacional mostram que sua prevalência é de 87%8. A dor miofascial é pouco conhecida entre a população em geral e também entre a classe médica e por isso não é incluída num possível diagnóstico; consequentemente muitos pacientes são submetidos a exames de imagem à procura de alguma alteração estrutural que possa justificar suas dores. O problema é que até a presente data não há um único exame considerado padrão ouro para se estabelecer de forma confirmatória o diagnóstico de dor miofascial. Sendo assim o diagnóstico ainda é eminentemente clínico e depende muito da habilidade palpatória do médico assim como do conhecimento desse tipo de dor. A SDM acomete essencialmente nossos músculos e as principais causas são sobrecarga, má postura, movimentos repetitivos, processos degenerativos (ex: artrose), inflamatórios,falta de exercício, tensão muscular, depressão e tantos outros. Uma das formas mais eficazes de tratamento é com agulhamento seco (dry needling) dos pontos gatilhos; o diagnóstico depende essencialmente do A dor miofascial do trapézio superior talvez seja a principal causa de dor miofascial na APS e com extrema freqüência é mal interpretada e erroneamente diagnos�cada como migrânea, cefaléia crônica, nucalgia ou outro rótulo. Síndrome Dolorosa Miofascial (SDM) 10 Medicina Musculoesquelética conhecimento clínico e da habilidade palpatória de cada médico. Dor miofascial é uma disfunção muscular caracterizada por dor e sensibilidade muscular localizada, sendo frequentemente apontada como a causa de dor persistente. Pode ser acompanhada de disfunções motoras, autonômicas e sensoriais. Sua avaliação inclui a localização dos pontos gatilho e músculos envolvidos, assim como o reconhecimento dos fatores perpetuantes da dor. Entende-se hoje que a dor miofascial é causada por pontos gatilho ativos situados no músculo acometido e que são responsáveis por um padrão de dor referido à distancia específico de cada músculo (cada músculo tem o seu padrão de dor referida), redução da amplitude de movimento e redução da força (inibição motora). A Dra. Janet Travell, em um estudo publicado em 1999, estima que a causa primária de dor regional em 75% dos casos é miofascial. Dommerhotl, Bron e Franssen (2006) identificaram pontos gatilho e dor miofascial em praticamente cada caso de dor musculoesquelética, incluindo radiculopatias, d i s função a r t i cu la r , pato log ias do d i sco intervertebral, tendinites, disfunção crânio- mandibular, enxaquecas, cefaléia tensional, sind. do túnel do carpo, dor pélvica e outras síndromes urológicas. Mais recentemente (2010) Gerwin indica a dor miofascial e os pontos gatilho como os responsáveis por (ou tem implicação na causa da dor) em até 85% dos casos. Dor miofascial está associada com diversas outras síndromes dolorosas, incluindo por exemplo, neuralgia pós-herpética, síndrome dolorosa regional complexa e cãibras noturnas. A lista continua exaustivamente mas, com os exemplos citados, pode-se ter uma idéia melhor do quanto este assunto é abrangente e mal interpretado. Num músculo qualquer, por diversos motivos d i f e r e n t e s ( m á p o s t u r a , s o b r e c a r g a , descondicionamento, movimentos repetitivos…) uma banda muscular pode perder a sua capacidade de relaxamento e permanecer num estado de contratura muscular involuntária e persistente. Tal fato impede o completo relaxamento de todo aquele músculo (que agora está “encurtado" por aquela banda muscular tensa). Disso se deduz a primeira característica de alguém com dor miofascial: a diminuição da amplitude de movimento (ADM). Os pontos gatilho são zonas hipersensíveis que quando palpados reproduzem um padrão de dor referida (frequentemente à distancia) que o paciente reconhece como “a sua dor” (aquela que vem lhe incomodando há tanto tempo). Outra dica para identificar dor miofascial é conhecer os padrões de referenciamento das músculos mais frequentemente acometidos. Mais uma dica muito interessante de se verificar, é a importante diminuição da força daquele Outra causa bastante comum de dor no ouvido, ver�gem, cefaléia crônica é a dor miofascial do ECOM. 11 Medicina Musculoesquelética músculo envolvido (termo cunhado de “inibição motora”). Tudo isso se reverte tão logo o ponto gatilho seja desativado (por meio de agulhamento seco, compressão isquêmica ou outro meio empregado para sua desativação). A habilidade mais importante a ser desenvolvida quando o assunto é diagnóstico de dor miofascial são as habilidades de palpação muscular. É necessário aprender como palpar cada tipo de músculo (sempre no sentido perpendicular das fibras), qual a pressão que se deve fazer em cada caso, como palpar músculos profundos e superficiais e as técnicas de palpação (pinça ou deslizamento). Depois de muito treino a palpação muscular torna-se algo rotineiro e muito simples dada a freqüência de acometimento deste problema. Resumindo as principais características para o diagnóstico de dor miofascial: 1) Banda Muscular tensa (com dor referida) 2) Redução da ADM 3) Inibição motora (redução da força) 4) Dor espontânea de difícil caracterização (os pacientes com freqüência tem dificuldades em caracterizar o quê sentem; muitas vezes dirão que se trata de uma dor “doida”, “dormente”, “cansada”, “pesada”, “chata”, “esquisita”….) que é reproduzida com a palpação do ponto gatilho; quando se consegue palpar o ponto exato o paciente reconhece a dor como sendo “a sua dor”. A palpação de músculo normalmente não é ensinada nas escolas médicas. Sendo assim é normal certa estranheza pelos que estão iniciando agora nesta nova arte. Em primeiro lugar, é importante lembrar sempre que, o objetivo aqui é a localização de uma banda muscular tensa (como uma corda de violão) no meio da massa muscular. Sendo assim, não devemos deslizar nossos dedos pela pele do paciente e sim “empurra a pele e subcutâneo” no sentido perpendicular das fibras tentando perceber o quê que está passando por baixo de seus dedos. Não se deve ter pressa para fazer isso. Estamos investigando, procurando e explorando aquela musculatura. Também pouco ganharemos de conhecimento se apenas ficarmos “futucando" ou “massageando" em movimentos repetitivos e breves na região afetada. Deve-se repetir o movimento de “vai-e-vem” dos nossos dedos sobre a musculatura afetada até termos a certeza do que estamos palpando. Uma vez identificada a banda tensa, é importante que ao longo desta banda o examinador consiga determinar o local de maior sensibilidade e ao mesmo tempo o ponto que reproduz a dor do paciente. Anatomia Palpatória deve sempre ser realizada no sen�do perpendicular das fibras musculares. O examinador está procurando em primeiro lugar, acessar o tônus muscular basal para depois averiguar se ha alguma contratura muscular. Em seguida procura por bandas tensas e depois disso por pontos ga�lho que reproduzam a dor do paciente. 12 Medicina Musculoesquelética Na década de 50 quando a Dra. Janet Travell começou a tratar seus pacientes, ela infiltrava Procaína nos pontos gatilho e percebia que as dores desapareciam (essa técnica ficou conhecida como agulhamento molhado). Depois dos anos 70 tentaram infiltrar soro fisiológico nos pontos gatilho e observaram que as dores também melhoravam. Em seguida experimentaram o agulhamento sem a infiltração de nenhuma substancia e a dor igua lmente desapareceu . Surg ia ass im o agulhamento seco. Já que não eram as substancias em si que eram injetadas que faziam a diferença e sim o mero fato de agulhar o ponto gatilho, podemos então escolher com que agulha queremos usar. Sendo assim, as agulhas de acupuntura oferecem o melhor conforto pelo seu mínimo calibre. Fibromialgia não é Sind. Dolorosa Miofascial (SDMF); é uma dor funcional (ou disfuncional), ou seja, é proveniente de uma disfunção no controle inibitório descendente. Nada impede que uma pessoa com fibromialgia apresente uma dor Agulhamento Seco X Molhado Todos os pacientes que tem fibromialgia podem em algum momento de suas vidas apresentar uma dor miofascial aqui ou ali, mas nem todos os pacientes que tem dor miofascial tem fibromialgia. Dica prática: quando incerto se está palpando o músculo desejado, peça para o paciente contrair e depois relaxar. Desse jeito, o examinador consegue sentir o músculo e assim delimitar com mais precisão onde ele começa e onde termina. Uma vez identificado e certificando-se que está palpando o músculo certo, peça para o paciente relaxar; nesse momento pode-se avaliar o tônus muscular basal. Compare com o lado contra-lateral para se ter uma noçãose aquele tônus é normal ou está alterado. Alguns músculos (ex: esternocleidomastóideo) são mais facilmente palpáveis usando-se a técnica de “Pinça”. Existem diversas modalidades diferentes para o tratamento da dor miofascial. Dentre elas o agulhamento (o mais eficaz e rápido, mas também doloroso). Para os paciente com fobia de agulhas ou em que o agulhamento não é uma opção, pode-se usar uma “bolinha" para massagear a região acometida. É uma boa técnica de autocuidado que podemos e devemos ensinar nossos pacientes. O objetivo dessa massagem é o de “ordenhar" o sangue isquêmico da zona do ponto gatilho para fora e trazer novo sangue (oxigenado) para essa região facilitando o relaxamento do músculo. 13 Medicina Musculoesquelética Nenhuma manobra semiológica sozinha é confiável para a definição de um diagnóstico. Todas tem uma sensibilidade e especificidade e cada paciente tem uma história, uma anatomia, uma neuromatriz de dor etc. Quando avaliamos nossos pacientes apenas com as manobras semiológicas ortopédicas ("se essa manobra deu positiva, então o diagnóstico é esse”) as chances de um erro diagnóstico aumentam muito. Isso seria como colocar todos os pacientes numa linha de produção industrial e para todos, aplicar os mesmos testes; se o se r humano fos se uma máqu ina , t a l vez conseguiríamos diagnosticar todos com as mesmas manobras seguindo protocolos. Os tratamentos também já seriam categorizados; para doença "1", prescreva o tratamento “A”, para a “2" prescreva o “B" e assim por diante. Entretanto, nem todo paciente com dor, vai melhorar com anti-inflamatórios ou relaxantes musculares ou corticóides. Se não aprendermos que, para cada tipo de dor, existe uma abordagem melhor e se não começarmos a individualizar o tratamento, não conseguiremos diminuir a incidência nem a prevalência de dor crônica no Brasil e no mundo. Não podemos continuar acreditando que, prescrevendo a mesma"receita de bolo” para todos os pacientes (AINES, relaxantes musculares, analgésicos e repouso), estaremos tratando a maioria de nossos pacientes. Isso é o "funil da dor”; todos entram por um lado (a receita de bolo), mas só uma pequena quantidade sai do outro lado (sem dor). Isso porque, de todos que entraram por um lado, só alguns tinham dor inflamatória aguda por exemplo. Os outros com dor miofascial, com dor neuropática, com dor funcional não melhoram. Funil da Dor miofascial , mas quem tem dor miofascial dificilmente vai evoluir para uma fibromialgia. Se acontecer não foi por causa da dor miofascial! Em outras palavras, dor miofascial não causa fibromialgia. Quando o assunto é dor, não adianta “receitas de bolo”. Não podemos con�nuar tratando todos os pacientes com a mesma receita. Para cada �po de dor, ha um �po de tratamento melhor. Se prescrevermos AINES para todos, estaremos ajudando apenas aqueles com dor inflamatória aguda não complicada. 14 Medicina Musculoesquelética A dor nociceptiva só dói quando eu estimulo um neurônio nociceptivo (ex: encostar a mão no fogo, ou no gelo ou na tomada e etc). Tão logo a estimulação termine a dor desaparece. Tem caráter de proteção e sobrevivência. Não requer tratamento. Quanto maior o estímulo, maior a dor. Na dor inflamatória temos a liberação de fatores pró-inflamatórios (PGEs, bradcininas, substancia P, CGRP e etc) que promovem sensibilização local (periférica) fazendo com que os neurônios nociceptivos estejam muito mais sensíveis à dor. Aquilo que antes não me incomodava, agora dói. A dor neuropática é alguma anormalidade na estrutura do sistema nervoso, que pode acontecer tanto na periferia quanto no SNC. É portanto uma disfunção; ou seja, não tem caráter protetor ou influência na sobrevivência. A dor funcional (ou disfuncional) é aquela aonde o estímulo inibitório descendente está alterado ou ineficaz. São pessoas que não tem motivo para sentirem dor, mas sentem (ex: depressão, síndrome do intestino irritável, enxaqueca, fibromialgia e etc) As dores inflamatórias e nociceptivas podem ser tratadas com analgésicos, anestésicos locais ou AINES. Já as dores neuropáticas e funcionais devem ser tratadas com anti-depressivos (duloxetina, amitriptilina, venlafaxina, nortriptilina) ou anti- convulsivantes (gabapentina, pregabal ina, carbamazepina) ou ainda com opióides (codeína, tramadol, oxicodona…). As dores miofasciais doem espontaneamente, independente de posição, atividade, temperatura, repouso ou qualquer outra coisa. Pode doer de manhã, de tarde e de noite, sem aviso prévio. Costuma aliviar com calor local ou massageando o ponto gatilho, mas a dor costuma voltar. Enquanto o ponto gatilho não for desativado, a dor persistirá. A melhor forma de desativar um ponto gatilho é com agulhamento. São as causas mais comuns de dor crônica (porque são muito pouco conhecidas e portanto quase nunca tratadas). Resumindo 15 Medicina Musculoesquelética 1. N. Attala,b, G. Cruccua,c, R. Barona,d, M. Haanpaä ̈a,e, P. Hanssona,f, T. S. Jensena,g and T. Nurmikkoa,h, EFNS guidelines on the pharmacological treatment of neuropathic pain: 2010 revision. European Journal of Neurology 2010, 17: 1113–1123 2. Dworkin RH, OConnor AB, Backonja M, et al. Pharmacologic management of neuropathic pain: evidence based recommendations. Pain 2007; 132: 237–251. (class ISR). 4. Dworkin RH, OConnor AB, Backonja M, et al. Pharmacologic management of neuropathic pain: evidence based recommendations. Pain 2007; 132: 237–251. (class ISR). 5. Jensen MP, Chodroff MJ, Dworkin RH. The impact of neuropathic pain on health-related quality of life: review and implications. Neurology 2007; 68: 1178–1182. 6. OConnor AB. Neuropathic pain. Quality-of-life impact, costs and cost effectiveness of therapy. Pharmacoeconomics 2009; 27: 95–112. 7. Antiepileptic drugs guideline for chronic pain, Provider Bull (August 2005), (PB 05-10) 1–3. 8. Fogelman Y. 2017. Specialized Pain Clinics in Primary Care: Common Diagnoses, Referral Patterns and Clinical Outcomes. Springer, Boston 9. Eisenberg E, McNicol ED, Carr DB. Efficacy and safety of opioid agonists in the treatment of neuropathic pain of nonmalignant origin: systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. JAMA 2005; 293: 3043–3052. (class I SR). 10. Rej SR, Dew MA, Karp JF. Treating concurrent chronic low back pain and depression with low-dose venlafaxine: an initial identification of “easy-to- use” clinical predictors of early response. Pain 2014;15(7):1154–62. 11. 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