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Ana Luiza Bittencourt DIREITO EMPRESARIAL II Estabelecimento Art. 1.142 a 1.149 Conceito - Por definição do art. 1.142 do CC, é todo complexo de bens organizado para exercício da empresa, por empresário ou sociedade empresária. É o conjunto de bens tangíveis e intangíveis que permitem o desenvolvimento de determinada atividade empresária. Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. § 1º O estabelecimento não se confunde com o local onde se exerce a atividade empresarial, que poderá ser físico ou virtual. § 2º Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for virtual, o endereço informado para fins de registro poderá ser, conforme o caso, o endereço do empresário individual ou o de um dos sócios da sociedade empresária. § 3º Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for físico, a fixação do horário de funcionamento competirá ao Município, observada a regra geral prevista no inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019. - Na teoria da empresa, o estabelecimento se diferencia tanto do empresário (quem) quanto da empresa (atividade). - O estabelecimento é o instrumento de atividade do empresário, representando parte do patrimônio da empresa. - É a reunião de bens singulares (que embora reunidos mantêm sua característica) cujo fim é o exercício da empresa. - Atividade exercida deverá ser, necessariamente, empresária (art. 1.142). Não será estabelecimento se a atividade não constituir empresa. Ex.: mesmo que um médico reúna bens de forma organizada para o exercício de sua profissão, não será ele considerado empresário, tampouco o complexo de bens será considerado um estabelecimento. - Poderá ser físico ou virtual, por meio de nome de domínio. - É ≠ de “ponto” = local físico = localização geográfica > esse é apenas um ângulo do que é o estabelecimento. Composição do estabelecimento - O estabelecimento é composto por bens: 1) Bens corpóreos móveis e imóveis: mercadorias, balcões, veículos, instalações, depósitos, edifícios, terrenos etc. 2) Bens incorpóreos/imateriais (compreendem coisas intangíveis): nome empresarial, título de estabelecimento, “know how”, contratos, clientela, aviamento (sua capacidade de gerar lucro em razão da boa conjunção e organização dos elementos que a integram), patentes de invenção, registro de marcas e desenhos industriais, o ponto comercial. Obs.: aviamento é um atributo do estabelecimento, é a aptidão de um estabelecimento de produzir riquezas, de ser lucrativo. Decorre de causas diversas: • Eficiente coordenação funcional dos bens materiais do estabelecimento; • Bons serviços dos colaboradores do empresário; • Notoriedade das marcas dos produtos; • Acertada localização do estabelecimento; • Prestígio pessoal do empresário etc. Em razão da conjunção de tais causas, a CLIENTELA se torna um fator do aviamento, e não um bem incorpóreo próprio/distinto do aviamento. Natureza jurídica - O CC consagra a natureza jurídica do estabelecimento como uma universalidade de fato: o conjunto de bens singulares corpóreos e incorpóreos ligados entre si pela vontade humana (do empresário) para a consecução de um fim. - Por ser uma universalidade de fato, seu titular pode aliená-lo ou dá-los, total ou parcialmente. Negócios com o estabelecimento - O estabelecimento, sendo uma universalidade de fato, pode ser objeto de direitos e negócios jurídicos, sejam translativos (compra, venda ou doação) ou constitutivos (hipoteca, penhor, usufruto). - A transferência onerosa (a venda) do estabelecimento empresarial é juridicamente chamada de TRESPASSE (comumente conhecido pela expressão “passar o ponto”). • Alienante/vendedor: trespassante. • Adquirente: trespassatário. ATENÇÃO: trespasse e venda da sociedade diferenciam-se: • TRESPASSE: há troca da titularidade do estabelecimento, ou seja, há modificação do titular que pode, inclusive, ser outra sociedade. • VENDA DA SOCIEDADE: é a venda/alienação das cotas do capital; há a troca do quadro societário (entra novos sócios). PARTICULARIDADES DA ALIENAÇÃO DO ESTABELECIMENTO - A alienação do estabelecimento comercial está sujeita à observância de cautelas específicas, criadas para assegurar os interesses dos credores. - Condições para alienação do estabelecimento: art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação. Assim, o alienante possui duas opções para a eficácia da alienação (a inobservância dos preceitos do art. 1.145 constitui crime falimentar): • Pagar todos os credores; • Se o patrimônio do alienante (aquele que vende) não for suficiente para pagar todos os credores, deverá obter o consentimento destes (expressa ou tacitamente), no prazo de 30 dias do recebimento da notificação > caso contrário não terá eficácia a alienação do estabelecimento. - Isso ocorre pois o empresário pode estar insolvente ou ter dado o estabelecimento em garantia para credores. - É conveniente inserir no contrato disposições sobre o passivo e o ativo. Caso não haja pactuação sobre o passivo fica entendido que o adquirente/comprador sucede o alienante pelo pagamento dos débitos anteriores, desde que regularmente contabilizados. Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento. Isto é: o adquirente sucede o alienante pelo pagamento dos débitos anteriores, desde que contabilizados, mas o alienante continua solidariamente responsável, por 1 ano, a contar: • Quanto aos débitos vencidos: da publicação • Quanto ao vincendo: do vencimento - A responsabilidade pelos débitos anteriores inclui: • Credores trabalhistas: art. 10 e 448 da CLT (responsabilidade subsidiária) > mesmo que não contabilizados. • Credor tributário: art. 133 CTN (responsabilidade subsidiária) > mesmo que não contabilizados. • Salvo disposição contratual específica, a transferência de estabelecimento não libera o alienante, que poderá ser demandado pelos credores, solidariamente com o adquirente, pelo prazo de 1 ano a contar dos vencimentos dos créditos já vencidos ou do vencimento daqueles a vencer quando do trespasse (art. 1.146). A transferência do estabelecimento importa na substituição (sub-rogação) do adquirente nos contratos firmados, salvo quando tiverem caráter pessoal. Os contratos firmados com caráter pessoal poderão ser rescindidos pelos terceiros em 90 dias, a contar da publicação. Obs.: no caso 1 e 2 o adquirente responde apenas de forma subsidiária (e não solidária). Quanto aos débitos do CC a responsabilidade do adquirente é solidária. - EFEITO QUANTO A TERCEIROS: conforme o art. 1.144 a alienação do estabelecimento somente terá efeitos contra terceiros após averbação à margem da inscrição do empresário (na junta comercial) e de publicado na imprensa oficial. Art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. - CLÁUSULA DE NÃO RESTABELECIMENTO: prevista no art. 1.147, é implícita em qualquer contrato de alienação de estabelecimento. O alienante/trespassante não poderá estabelecer-se na mesma praça, em idêntico ramo de atividade comercial, nos 5 ANOS subsequentes, salvo autorização expressa em contrário:Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes à transferência. Parágrafo único. No caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato. - CONTRATOS COM TERCEIROS: previsto no art. 1.148, a transferência do estabelecimento importa na substituição (sub-rogação) do adquirente nos contratos firmados para a exploração do estabelecimento, SE NÃO TIVEREM CARÁTER PESSOAL. Os contratos que possuem caráter pessoal poderão ser rescindidos pelos terceiros em 90 dias, a contar da publicação do trespasse. Art. 1.148. Salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante. Proteção ao estabelecimento empresarial - O Direito Civil e o Penal compreendem normas pertinentes à proteção dos bens corpóreos; - O Direito Industrial (legislação extravagante) tutela a propriedade da marca, invenções etc; - A Lei de Locações protege o ponto explorado pelo comerciante; - O Direito Empresarial tradicionalmente preocupou-se com a tutela dos bens incorpóreos. Ponto Comercial CONCEITO: “ponto” é o local específico em que o empresário se encontra, nele se estabelecendo > é a localização geográfica. - Se locado, o empresário goza de especial proteção legal que lhe assegurará preservação do ponto (art. 51 da Lei de Locação), chamado de DIREITO DE INERÊNCIA AO PONTO. Essa proteção consiste em: o direito de obter, sob certas condições, a renovação do contrato de locação ou à percepção de uma indenização pela perda do ponto comercial. • Esse direito evita que o locador possa retomar o imóvel e nele se estabelecer, se favorecendo da clientela gerada pelo locatário. • Tutela/protege o próprio aviamento, impedindo que fique à escolha do locador as condições da locação. • A renovação será judicialmente concedida no mesmo prazo e base do contrato anterior, pelo prazo de 5 anos, mesmo que o contrato seja firmado por períodos maiores (10, 15 ... anos). • STJ: “a renovação na hipótese de acessio temporis (soma dos períodos dos diversos contratos), independentemente do prazo do último contrato, dar-se-á pelo prazo de 5 anos.” • Tal proteção está justificada nos seguintes fatores: O estabelecimento é fator essencial para a obtenção de lucro; Muitas vezes a perda do ponto comercial acarreta a perda do próprio estabelecimento; A atividade dota o imóvel de um atributo que antes não possuía, acrescendo-lhe o valor imaterial do estabelecimento da empresa. PRESSUPOSTOS/REQUISITOS DA AÇÃO RENOVATÓRIA: para ser considerada empresarial e fazer jus à ação renovatória a locação deverá preencher cumulativamente os seguintes requisitos (art. 51, Lei 8245): • Contrato anterior e por ESCRITO com TEMPO DETERMINADO. Obs.: apesar de haver previsão de necessidade de contrato escrito a jurisprudência tem aceito um pequeno interregno de tempo desde que comprovada a continuidade do vínculo locatício entre as partes. • Contrato ANTERIOR ou a SOMA DOS PRAZOS ANTERIORES DE NO MÍNIMO 5 ANOS. • Exploração do MESMO RAMO DE ATIVIDADE ECONÔMICA E ININTERRUPTA POR 3 ANOS, à data da propositura da ação renovatória (indicando a formação de uma freguesia e clientela que mereçam proteção legal). - Preenchidos os requisitos acima o locatário pode pedir judicialmente a renovação do contrato de aluguel, caso não seja possível fazê-lo amigavelmente. - A ação judicial cabível é chamada RENOVATÓRIA e deve ser aforada de 6 MESES A 1 ANO ANTES do termo FINAL do prazo contratual (nos primeiros 6 meses do último ano, sob pena de DECADÊNCIA do direito. Ex.: se o contrato possui 8 anos, deve-se postular a ação renovatória do 7º ano ao 7º ano e meio. RETOMADA DO IMÓVEL PELO LOCADOR: o locador pode retomar sua propriedade nas seguintes hipóteses (mesmo quando o empresário/locador fizer jus à ação renovatória): • Insuficiência da proposta de renovação (LL, art. 72, II) Art. 72. A contestação do locador, além da defesa de direito que possa caber, ficará adstrita, quanto à matéria de fato, ao seguinte: II - não atender, a proposta do locatário, o valor locativo real do imóvel na época da renovação, excluída a valorização trazida por aquele ao ponto ou lugar; § 1º No caso do inciso II, o locador deverá apresentar, em contraproposta, as condições de locação que repute compatíveis com o valor locativo real e atual do imóvel. • Proposta melhor de terceiro (LL, art. 72, III c/c art. 75, para exploração de ramo que não poderá ser o mesmo do locatário – art. 72, IV, §2º LL, cabendo indenização ao locatário - solidária do proprietário e de quem faz melhor oferta); III - ter proposta de terceiro para a locação, em condições melhores; § 2º No caso do inciso III, o locador deverá juntar prova documental da proposta do terceiro, subscrita por este e por duas testemunhas, com clara indicação do ramo a ser explorado, que não poderá ser o mesmo do locatário. Nessa hipótese, o locatário poderá, em réplica, aceitar tais condições para obter a renovação pretendida. Art. 75. Na hipótese do inciso III do art. 72, a sentença fixará desde logo a indenização devida ao locatário em consequência da não prorrogação da locação, solidariamente devida pelo locador e o proponente. • Reforma substancial no prédio locado (que deve começar em até 3 meses): por determinação do poder público ou iniciativa do locador. Art. 52. O locador não estará obrigado a renovar o contrato se: I - por determinação do Poder Público, tiver que realizar no imóvel obras que importarem na sua radical transformação; ou para fazer modificações de tal natureza que aumente o valor do negócio ou da propriedade; • Para uso próprio ou transferência de “fundo de comércio” de seu cônjuge, ascendente, descendente, titulares de estabelecimento empresarial a mais de 1 ano, sendo vedada a exploração do mesmo ramo do locatário salvo se a locação também envolver as instalações e pertences. Ex.: posto de gasolina. Também quando o próprio locador, seu cônjuge, ascendente ou descendente forem detentores da maioria do capital social de uma sociedade. Obs.: fundo de comércio se refere ao conjunto de bens corpóreos e incorpóreos que foram adquiridos no exercício da atividade para o estabelecimento, compreendendo a valorização do ponto comercial como um todo. - A má-fé na utilização de tais prerrogativas, o emprego de subterfúgios especulativos por parte do locador, acarretará o dever de indenizar o locatário. INDENIZAÇÃO DO PONTO COMERCIAL: há casos onde o empresário (locatário) deverá ser indenizado pelo valor que acresceu ao bem (como por exemplo na hipótese do art. 52, §3º da LL): • Quando o locador pede o imóvel e não dá a destinação alegada, devendo responder pelos danos emergentes e lucros cessantes decorrentes da mudança. • Indenizações decorrentes da mudança, lucros cessantes, perda do ponto e desvalorização do estabelecimento (§3º, art. 52): se o locador, no prazo de 3 meses de entrega do imóvel, não der a destinação alegada para a retomada ou iniciar as obras determinadas pelo poder público ou que declarou realizar. OBSERVAÇÃO GERAL: clientela e freguesia são elementos fundamentais do aviamento e se distinguem: • FREGUESIA: conjunto de pessoas que adquirem produtos ou serviços de determinado estabelecimento por razões subjetivas de conveniência, tais como: localização, vizinhança, horário de funcionamento. Passam diante do estabelecimento, podendo se tornar cliente. A freguesia é protegida por meio da legislação aplicável ao ponto empresarial e sua relevância no aviamento. • CLIENTELA: conjuntode pessoas que adquirem produtos ou serviços de determinado estabelecimento por razões subjetivas da qualidade da empresa ou de seu titular, tais como: atendimento personalizado, produtos exclusivos... É protegida pelo direito concorrencial, ao nome, título de estabelecimento etc.
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