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SEM DATA VENIA Um Olhar Sobre o Brasil e o Mundo Luís Roberto Barroso ➢ Resenha de leitura – Capítulo “Direito” O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, no capítulo de sua obra que dedicou ao direito, o autor discute o papel do direito penal, o lugar da religião no mundo contemporâneo, o papel do Supremo Tribunal Federal entre o direito e a política, as causas da judicialização da vida no Brasil e quinze decisões históricas do Supremo Tribunal Federal. Existem os mais variados problemas no Brasil, dos quais Barroso aborda a legalização das drogas, criminalização do aborto, a proteção aos anencéfalos, o reconhecimento da união homoafetiva, entre outros, afirmando ser a busca de uma solução um grande desafio jurídico. O primeiro tema abordado se referiu à religiosidade, onde o autor relata brevemente sua convivência com diversas religiões, tais como judaísmo, catolicismo, muçulmanismo dentre outras, aprendendo desde cedo a conviver e respeitar a pluralidade ao seu redor. Ressalta Barroso que o sentimento religioso acompanha a evolução da condição humana e das civilizações desde o início dos tempos, tanto para o bem quanto para o mal, reforçando a necessidade de separação Igreja-Estado, tornando-se verdadeiramente laico. Diante dessa realidade, o Estado deve desempenhar dois papéis decisivos na sua relação com a religião, como assegurar a liberdade religiosa, e conservar uma posição de neutralidade no tocante às diferentes religiões, sem privilegiar ou desfavorecer qualquer uma delas. Na prática isso não ocorre, visto que a religião norteia princípios e costumes sociais que por sua vez norteiam a criação das leis, gerando diversos desafios à um estado que se intitula como laico. Passa-se então à análise do Estado em seu dever de judicialização, fenômeno onde juízes e tribunais são chamados a decidir as contendas sociais, como por exemplo, se é legítimo o casamento entre pessoas do mesmo sexo; se uma mulher deve ter reconhecido o seu direito de interromper gestação indesejada durante o primeiro trimestre de gravidez; se a lei pode autorizar pesquisas com células-tronco embrionárias, o que importa na destruição de embriões congelados que sobraram dos procedimentos de fertilização in vitro, sendo uma lista longa de questões controvertidas a serem apreciadas pelo judiciário, que não pode se esquivar de tal prerrogativa. Nessa toada, o STF apreciou a validação da lei que autorizou pesquisas com células-tronco embrionárias, sendo esse caso um dos primeiros em que se confrontaram a visão secular e a visão religiosa da vida. A controvérsia se originou no projeto de lei apresentado pelo senador Eduardo Girão, que visava proibir, para quaisquer fins, a utilização de células-tronco obtidas de embriões humanos — que são células capazes de transformar-se em qualquer tipo celular de um indivíduo adulto. À época, a Lei de Biossegurança (Lei 11.105, de 2005), permitia o uso dessas células para fins de pesquisa e terapia. O principal argumento utilizado pelo senador baseava-se no argumento de que a vida se inicia com a concepção, ou seja, com a junção do espermatozoide com o óvulo e que, a partir desse momento, o embrião é um novo indivíduo com sua própria vida e merece ter sua integridade protegida, se aplicando, igualmente, aos embriões gerados por fertilização in vitro. No julgamento realizado pelo STF, reforçou-se a ideia de que a Constituição Federal não dispõe sobre o início da vida humana ou o preciso instante em que ela começa, todavia, veio à tona a ideia de que seria constitucional a proposição de que toda gestação humana principia com um embrião igualmente humano. Considerou-se, entretanto, que nem todo embrião humano desencadeia uma gestação igualmente humana, em se tratando de experimento "in vitro", o que seria o caso das células tronco embrionárias. Assim, o STF entendeu que as pesquisas com células-tronco embrionárias não violam o direito à vida, tampouco a dignidade da pessoa humana, desde que as pesquisas científicas com embriões humanos resultantes dos procedimentos de fertilização in vitro, estivessem inviáveis ou congelados há mais de três anos. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11105.htm#:~:text=1%C2%BA%20Esta%20Lei%20estabelece%20normas,o%20descarte%20de%20organismos%20geneticamente Outra decisão importante tomada pelo STF foi a equiparação das uniões homoafetivas às uniões estáveis heteroafetivas, onde mais uma vez o sentimento religioso dominava o entendimento jurisdicional, buscando assim pacificação de entendimento pelo Supremo. Por mais uma vez, levou-se em consideração o caráter laico do Estado, que impede que a moral religiosa sirva de parâmetro para limitar a liberdade das pessoas de constituir família, independentemente de orientação sexual ou identidade de gênero. Assim, decidiu o STF, com unanimidade, por equiparar as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres, ou seja, na prática, a união homoafetiva foi reconhecida como um núcleo familiar como qualquer outro. Outra questão apreciada pelo STF foi a legitimidade das cotas raciais em favor de negros para ingresso em universidades públicas e em cargos públicos, que foi considerada pelo órgão como constitucional. A oposição, através do PL 1.531/19, argumenta que se os brasileiros devem ser tratados com igualdade jurídica, pretos, pardos e indígenas não deveriam ser destinatários de políticas públicas que criam, artificialmente, divisões entre brasileiros, com potencialidade de criar indevidamente conflitos sociais desnecessários, ou seja, se o disposto na Carta Magna se aplica a todos os âmbitos, não se deve dar tratamento legal diferenciado para a questão racial para o ingresso na educação pública federal de nível médio e superior. Argumentos da oposição estes foram desconsiderados pelo STF, por entender serem tais políticas de promoção de maior acesso de pessoas negras aos bancos de universidades públicas necessárias para corrigir distorções culturais históricas existentes no Brasil. Passando-se à mais uma decisão importante tomada pelo STF, tem-se a interrupção da gestação na hipótese de anencefalia ou durante o primeiro trimestre de gestação. Acerca da interrupção da gestação na hipótese de anencefalia, para sete dos dez ministros que participaram do julgamento, não se trata de aborto porque não há a possibilidade de vida do feto fora do útero. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2194298 Concluiu-se que para interromper a gravidez de feto anencéfalo, as mulheres não precisam mais de decisão judicial que as autorize, bastando o diagnóstico de anencefalia do feto, portanto, médicos que fazem a cirurgia e as gestantes que decidem interromper a gravidez nessa hipótese não cometem qualquer espécie de crime. No que tange à interrupção da gestação durante o primeiro trimestre de gestação, no julgamento de um caso concreto levado à corte, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu por descriminalizar o aborto no primeiro trimestre da gravidez, entendendo o colegiado que são inconstitucionais os artigos do Código Penal que criminalizam o aborto. Ressalta-se que o entendimento vale apenas para o caso concreto julgado pelo grupo. Mais uma questão avaliada pelo tribunal foi a respeito da criminalização da homofobia, onde o STF decidiu pela criminalização da homofobia e da transfobia, com a aplicação da Lei do Racismo (7.716/1989), tornando-se um marco na luta pela diversidade no Brasil. Como ressalva, foi esclarecido não seria criminalizado dizer em templo religioso que é contra relações homossexuais, todavia, seria criminalizado incitar ou induzir em templo religioso a discriminação ou o preconceito. Em voto de oposição à criminalização tem-se o argumento de que não cabe ao STF definirem qual crime os atos devem ser enquadrados porque isso é função do Poder Legislativo. Mais uma vez veio o sentimento religioso ao julgamento, onde a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), que representa igrejas evangélicas disse que, em geral, todas as religiões consideram a homossexualidade "ontologicamente como pecado ou contra seus valores e princípios morais". Acertadamente, protegendo a laicidade do Estado, o STF considerou como crime a homofobia. Além dos casos emblemáticos abordados pelo autor Luís Roberto Barroso, outros 10 casos foram abordados, os quais passam-se à análise. No ano de 2008 o STF tornou a contratação de parentes de até terceiro grau em cargos de confiança proibida nos três poderes, nas esferas federal, estadual e municipal, editando a 13ª Súmula Vinculante, aprovada por unanimidade. Com a proibição do nepotismo nos três Poderes, também ficou vedado o nepotismo cruzado, que ocorre quando dois agentes públicos empregam os familiares um do outro, como troca de favor. Outro ponto importante debatido pelo Supremo versou sobre a abolição simbólica da censura, com a derrubada da Lei de Imprensa do regime militar. É certo que o Decreto-Lei nº 1.077, de 21 de janeiro de 1970 instituiu a censura prévia, exercida de dois modos: ou uma equipe de censores instalava-se permanentemente na redação dos jornais e das revistas, para decidir o que poderia ou não ser publicado, ou os veículos eram obrigados a enviar antecipadamente o que pretendiam publicar para a Divisão de Censura do Departamento de Polícia Federal, em Brasília. O controle sobre a imprensa já havia sido regulamentado pela Lei nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967, a Lei de Imprensa, que obviamente restringia a liberdade de expressão. A censura vigorou no país durante o período do Regime Militar (1964-1985) e era aplicada em diferentes esferas da sociedade com base em critérios morais e políticos. O STF observou que a Lei de Imprensa foi concebida e promulgada num período autoritário, regime esse patentemente inconciliável com os ares da democracia resgatada e proclamada na atual Carta Magna. Assim, decidiu o STF em não recepcionar a referida lei no ordenamento atual. Seguindo ainda a lógica baseada em liberdade de expressão e derrubada da lei de imprensa, tem-se o entendimento do STF na inexigibilidade de prévia autorização para divulgação de biografias. O Projeto de Lei 393/2011 visava a alterar a aplicação do artigo 20, do Código Civil, para que tornasse desnecessária a autorização prévia para publicação de escritos ou divulgação de imagens sobre um indivíduo, sob o argumento de que a aplicação desse artigo seria um resquício da época ditatorial, restringindo o direito à informação e à produção cultural. http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/128588/lei-de-imprensa-lei-5250-67 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988 A alteração desse artigo contraria todo o ordenamento jurídico a respeito da inviolabilidade da vida privada e dos direitos da personalidade, como o direito à honra, à intimidade, à privacidade, à imagem, entre outros previstos dentre os direitos fundamentais da pessoa humana. Dentro desse embate, a questão de publicação de biografias não autorizadas tornou-se um assunto polêmico, e foi apreciado pelo STF que afastou a exigência de autorização prévia para a realização de publicações de biografias, baseada na consonância com os direitos fundamentais à liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença de pessoa biografada, relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas). A Suprema Corte realizou também o julgamento da Ação Penal conhecida como “Mensalão”, qual seja, a ação Penal 470, a qual se averiguava um suposto esquema de compra de votos no Congresso, conhecido como mensalão. Trata-se de escandaloso esquema de corrupção flagrado no país submetido ao julgamento do Supremo Tribunal Federal, que puniu e condenou, pela primeira vez, uma autoridade por corrupção. O processo apurou a responsabilidade de 38 pessoas pela prática de sete tipos de crime, qual seja, formação de quadrilha, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro. No total, 25 réus do escândalo foram condenados por participar da mais criminosa trama de corrupção já montada num governo brasileiro, entre eles líderes do PT e do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda na temática política, o STF decidiu dar nova interpretação ao foro por prerrogativa de função, sendo agora o foro aplicado apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados à função desempenhada. O autor da obra, ministro Barroso, no julgamento elaborou teses no sentido de que o foro por prerrogativa de função seria limitado aos crimes cometidos no exercício da função do cargo, relacionadas às funções desempenhadas, e que, após o final da instrução processual e alegações finais, a competência para julgar as ações penais não https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/754614/questao-de-ordem-na-acao-penal-ap-qo-470-mg seriam mais afetadas em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixa o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. Ainda nessa toada, o Supremo Tribunal Federal definiu o rito que seria aplicado ao pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. A corte optou por manter o mesmo caminho seguido em 1992, no processo contra o então presidente Fernando Collor, deixando nas mãos do Senado o poder para decidir sobre o afastamento. Falando sobre eleições, o STF julgou dois temas de considerável relevância, quais sejam a proibição do financiamento eleitoral por empresas privadas e a destinação de pelo menos 30% dos recursos dos fundos partidário e eleitoral para candidaturas de mulheres. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de proibir doação por PJ teve como objetivo último reduzir o peso do dinheiro nas eleições, entendido como a parte dos votos recebidos pelo candidato associada ao seu gasto de campanha. Entendeu o Plenário do Supremo Tribunal Federal ser inconstitucional a regra que liberava o financiamento eleitoral praticado por pessoas jurídicas. Ressaltou serem os limites fixados pela legislação brasileira para doação de empresas a campanhas eleitorais são insuficientes para coibir a captura do político pelo poder econômico, criando indesejada “plutocratização” do processo político. O Supremo Tribunal Federal (STF) também decidiu, em 2018, que a distribuição do financiamento de campanhas eleitorais deveria ser proporcional aos candidatos de acordo com o gênero, respeitando o limite mínimo de 30% para mulheres. Assim, o STF garantiu a proporcionalidade na utilização dos recursos financeiros eleitorais. Entrando na esfera de violações de direitos que atingem a coletividade, o STF apreciou o pedido de Habeas Corpus coletivo em favor de mães, gestantes e lactantes, concedendo HC coletivo em nome de todas as mulheres presas grávidas e mães de crianças com até 12 anos de idade. Os ministros estenderam a decisão às adolescentes em situação semelhante do sistema socioeducativo e mulheres que tenham sob custódia pessoas com deficiência. O último caso trazido pelo autor em sua obra se referiu à proteção às comunidades indígenas contra a pandemia da Covid-19, onde o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o governo federal adotasse medidas de contenção do avanço da Covid-19 nas comunidades indígenas. Os ministros referendaram decisão cautelar concedida parcialmente na ADPF 709, em que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, em conjunto com seis partidos políticos (PSB, PSOL,PCdoB, Rede, PT, PDT), argumentam que há falhas e omissões do governo federal no combate ao coronavírus nas aldeias indígenas. A maioria dos ministros concordou com todas as medidas deferidas na cautelar, como a criação de barreiras sanitárias e sala de situação, a retirada de invasores e a apresentação de plano de enfrentamento. Observa-se que o autor ao abordar as importantes decisões e entendimentos pacificados pela Suprema Corte, tem o objetivo de frisar o desempenho de um papel muito importante que tem sido realizado pelo tribunal no que diz respeito à manutenção e segurança de garantias e direitos de índole constitucional.
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