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TECNOLOGIA DE BEBIDAS AULA 2 Profª Adriana Helfenberger Coleto Assis 2 CONVERSA INICIAL Estocagem e processo de conservação Na transformação e produção de bebidas, é essencial prezar pela qualidade e conservação da matéria-prima, insumos e dos produtos gerados. Para isso, é necessário usar processos de conservação baseados na eliminação total ou parcial dos agentes microbianos, a fim de garantir características iniciais. Isso é possível por meio da intervenção sobre um ou mais fatores essenciais como quantidade de água, acidez, oxigênio etc. O objetivo desta intervenção é fazer com que o meio se torne não propicio a qualquer proliferação microbiana. Os métodos mais comuns estão associados ao controle de temperatura, e planos de higiene e sanitização; outros métodos procuram dificultar a multiplicação, como no caso o uso de cloreto de sódio, de açúcar e a retirada do ar. Nesta etapa, vamos conversar a respeito da estocagem e dos processos de conservação, sobre fermentação, temperatura e qualidade, constituintes de conservação e armazenamento. TEMA 1 – ESTOCAGEM E PROCESSO DE CONSERVAÇÃO: PROCESSO DE PRODUÇÃO As matérias-primas de origem vegetal, independente da procedência, podem apresentar uma microbiota natural extremamente variável, concentrada principalmente na região superficial. Essa população microbiana inclui células vegetativas e esporos de muitos tipos de fungos e bactérias, que contaminam a superfície durante o desenvolvimento e maturação das frutas, cereais e outros insumos. Estes são influenciados pelo meio ambientes e pelas condições de colheita e armazenamento (Uboldi, 1996). São poucos os fungos capazes de atacar o fruto ainda no pé. O processo de amadurecimento aumenta a susceptibilidade de invasão ao fruto, principalmente pelo contato com insetos. Frutos colhidos no chão apresentam 3 uma biota mais variada do que os apanhados na árvore, porque a queda causa machucaduras, potencializando a contaminação pelo contato com o solo. As frutas com atividade de água (Aa) maior que 0,98 são muito susceptíveis à deterioração por bactérias, bolores ou leveduras. Isso ocorre porque o metabolismo microbiano precisa de água para as reações químicas e a reprodução (Abreu; Nunes; Oliveira, 2003). No caso dos fungos unicelulares, conhecidos como leveduras, a reprodução vegetativamente por meio de brotamento das células confere a essa espécie a capacidade de multiplicar-se rapidamente em ambientes líquidos, o que favorece a dispersão das células. É importante enfatizar que, neste caso, o desenvolvimento pode ocorrer em presença ou ausência de oxigênio. Mesmo com a possibilidade de crescimento vegetativo, os fungos multiplicam mais lentamente do que as bactérias. Estes não competem bem em ambientes que permitam o desenvolvimento bacteriano, ou seja, condições de alta atividade de água com pH próximo ao neutro (6,5 a 7,5) e temperaturas ótimas (5°C a 47°C), que proporcionam maior desenvolvimento bacteriano (Taniwaki, 2001). A multiplicação de leveduras é normalmente acompanhada da produção de dióxido de carbono (CO2) e etanol (C6H12O6). No entanto, pode manifestar-se pela formação de película, turvação, floculação, e, em alguns casos, esses microrganismos produzem pectinesterases que atacam a pectina e comprometem a turvação natural dos sucos (ICMSF, 1980). Vamos exemplificar com o suco de laranja não pasteurizado. A tubidez deste suco ocorre pela ação da enzima pectinesterase sobre a pectina presente na fruta. Esta enzima (pectina metil esterase) acelera a hidrólise das ligações éster-metílicas na molécula de pectina, conforme reação abaixo: 𝑅 − 𝐶𝑂𝑂 − 𝐶𝐻3 + 𝐻2𝑂 → 𝑅 − 𝐶𝑂𝑂𝐻 + 𝐶𝐻3 − 𝑂𝐻 Desta forma, os complexos insolúveis formados precipitam, arrastando outras fontes coloidais próprias do suco, provocando uma separação de fases, e perda de turbidez original. As leveduras mais comuns em alimentos são: Candida glabrata, C. sake, C. tropicalis, C. versatilis, Cryptococcus albidus, Debaryomyces hansenii, Issatchenkia orientalis, Kluyveromyces marxianus, Pichia anomala, P. fermentans, P. guilliermondii, P. membranaefaciens, Rhodotorula glutinis, R. 4 mucilaginosa, Saccharomyces cerevisiae, S. exiguus, Sporobolomyces roseus, Torulaspora delbrueckii, Zygosaccharomyces bailii e Z. rouxii (Deak; Beuchat, 1986). Para obtenção de bebidas, em muitas situações, é necessário seguir, no mínimo, as etapas produtivas as quais veremos a seguir. 1.1 Recepção e armazenagem de matéria-prima Se a bebida for à base de frutas, estas devem ser colhidas em tempo certo e transportadas de maneira apropriada, a fim de garantir as condições físicas. Devem ser pesadas e selecionadas quanto ao seu ponto de maturação, sendo que aquelas sem condição de despolpamento devem ser dispensadas momentaneamente. Nesta fase, as frutas são expostas sobre mesas ou esteiras apropriadas, onde são avaliadas quanto à maturação, à firmeza, às machucaduras, aos defeitos causados por fungos, roedores e insetos. São retiradas todas aquelas que venham comprometer a qualidade do produto final. Esse procedimento pode ser visual e manual ou através do uso de células fotoelétricas. Algumas bebidas necessitam de frutas com características específicas, o que requer uma preparação prévia de descasque, retirada de talos e de sementes. Outra situação consiste na retirada da polpa do fruto por meio do esmagamento de suas partes comestíveis, muito utilizados na produção de vinho, processado em centrífuga horizontal. Para despolpar, utilizam-se peneiras com furos a partir de 1,0 mm. Deve ser realizada em equipamentos fabricados em aço inox e materiais apropriados. Após a extração da polpa, pode ser necessário um refinamento para melhorar o seu aspecto visual, podendo ser feito utilizando-se a despolpadeira com peneiras de furos pequenos (1,0 mm ou menor), onde serão retiradas as impurezas da polpa (fibras, pedaços de semente etc.). Em situações específicas de produção de bebidas, é possível produzir polpa congelada. Neste procedimento, o produto não é submetido a nenhum outro tratamento, visando a inibição de reações químicas e enzimáticas e/ou redução da atividade de microrganismos que possam levar à perda de qualidade. Portanto, deve ser efetuado o mais rápido possível, para manter as características da fruta fresca. Para isso, utiliza-se o emprego de câmaras de congelamento com ventilação forçada, com temperatura recomendada p na faixa 5 de - 23 ± 5º C, com tempos não superiores a 8 horas. A temperatura de -18°C deverá ser atingida em um tempo máximo de 24 horas e deve ser mantida durante todo o tempo de armazenamento e transporte até o momento do consumo. 1.2 Limpeza A higienização para produção de bebidas é essencial. Ela que pode ocorrer por banho/imersão ou aspersão e por métodos mecânicos, dependendo das características associadas. Na primeira, a matéria-prima é submetida à imersão em água com elevadas concentrações de solução de detergente e bactericida, por um determinado tempo. Este método é bastante usado para limpeza de frutas colhidas ao invés de catadas. A segunda é usada para a remoção das impurezas remanescentes, além da retirada do excesso de agentes residuais, sendo necessário usar a água tratada em quantidades ideais. E a terceira consiste no uso de escovas de nylon, cujo objetivo é potencializar a lavagem, removendo as incrustações mais intensas. A higiene e a sanitização são necessárias, também, nos instrumentos, equipamentos e recipientes finais e são, sem dúvida, operações fundamentais no controle sanitário em indústrias de bebidas. Os detergentes, por meio das chamadas substâncias tensoativas, são muito úteis na remoção dos resíduos aderidos às superfícies, uma vez que atuam na solubilização deresíduos de origem minerais, como terra e areia; tem ação peptizante sobre resíduos proteicos; ação saponificante e emulsificante sobre resíduos gordurosos e ação sequestrante sobre minerais como Cálcio e Magnésio, responsáveis pela dureza das águas Esses agentes sanitizantes devem ser atóxicos, baratos e pouco poluentes, sendo bastante difícil agregar as três características em um mesmo produto. Em linhas gerais, os principais detergentes são segregados em grupos: • Detergentes alcalinos fortes – têm elevado poder dissolvente sobre resíduos orgânicos (de carne, leite, pescado), sendo alta ou moderadamente irritantes tóxicos e corrosivos (ex.: hidróxido de sódio, orto e sesquisilicatos de sódio); 6 • Detergentes alcalinos suaves ou de uso geral (general purpose cleaners) – têm moderada ação dissolvente sobre resíduos orgânicos, pouco irritantes e corrosivos (ex.: formulações complexas envolvendo o uso de sesquilicatos, fosfato trissódico, carbonato de sódio, tensoativos e sequestrastes); • Detergentes neutros – não corrosivos, não irritantes, indicados para limpeza de superfícies delicadas e com resíduos fracamente aderidos (ex.: tensoativos, geralmente aniônicos, adicionados ou não de polifosfatos); • Detergentes ácidos suaves – moderados ou pouco corrosivos, pouco irritantes; indicados para remoção de resíduos inorgânicos (pedras) e alguns orgânicos (amido, oxalato de cálcio) (ex.: ácidos orgânicos como hidroxiacético e inibidores de corrosão); • Detergentes ácidos fortes – tóxicos, corrosivos, indicados para limpeza mecânica (cip – cleaning in place) de equipamentos de aço inoxidável. A limpeza pode ocorrer por meio de contato direto e intenso da solução de detergente com o resíduo a ser removido (ação molhante ou penetrante), deslocamento dos resíduos sólidos ou líquidos da superfície a ser limpa (ação saponificante, peptizante, dissolvente, emulsificante etc.) e dispersão completa do resíduo na solução de limpeza (ação de suspensão e dispersante). Ainda com relação ao uso de detergentes, diz respeito à concentração do princípio ativo, ao período de contato do detergente com o resíduo, temperatura da solução, agitação ou turbulência da solução, natureza do resíduo a ser removido; tipo de material utilizado na construção dos equipamentos, utensílios e superfícies; método a ser empregado na limpeza (manual ou mecânico); características químicas, principalmente dureza, da água utilizada no preparo das soluções e na limpeza. Sempre na escolha de um determinado sanitizante, é necessário fazer uma análise detalhada, levando em conta os seguintes aspectos: qual legislação permite o uso do sanificante, qual a toxicidade, qual o poder corrosivo, qual o efeito residual sobre o alimento, qual o efeito ambiental e quais os custos associados ao tratamento dos efluentes gerados. Basicamente, as opções de produtos ou procedimentos associados à limpeza da matéria-prima, insumos e equipamentos poderiam ser subdivididas nos seguintes grupos: 7 • agentes químicos, pelo emprego de compostos de cloro (gás cloro, hipoclorito de sódio ou cálcio, compostos orgânicos de cloro e dióxido de cloro), compostos de iodo orgânico (iodóforos), compostos de amônia quaternária, compostos ácido aniônicos, ácido peracético e biguanidas poliméricas. • agentes físicos, compreendendo o uso do calor, na forma de vapor ou água aquecida e, mais raramente, o emprego da radiação UV, em comprimento de onda germicida (240-280 nm). 1.3 Envaze É realizado em sistema semiautomático, em que a bebida é colocada no tanque dosador. Para preenchimento adequado, regula-se a máquina para a medida desejada. O recipiente usado na embalagem depende do mercado ao qual o produto vai ser encaminhado, podendo utilizar: tambores de 50, 100 e 200 litros, principalmente para a exportação (muito comum no caso de sucos concentrados); latas de 190, 350 e 1000 ml; recipientes plásticos (politereftalato de etileno) de 200, 600, 1000, 1500ml; garrafas de vidro de 900 mL; entre outras. TEMA 2 – FERMENTAÇÃO A fermentação alcoólica ocorre por decomposição dos açucares presentes por ação microbiana. Esse processo tecnológico de produção se desenvolve em fases: obtenção dos açúcares da matéria-prima; fermentação alcoólica dos açúcares; e destilação e retificação do álcool contido no mosto (no caso de bebidas destiladas) resultante da fermentação, no caso das bebidas ditas destiladas. A fermentação pode ocorrer em diferentes tipos de biomassa: as matérias ricas em açúcares (cana-de-açúcar, melaço de cana, beterraba, melaços cítricos etc.), as ricas em amido (mandioca, milho, casca de babaçu, batata etc.) e as ricas em celulose (madeira, resíduos agrícolas etc.). A grande vantagem das matérias ricas em açúcares consiste no fato de os hidratos de carbono (constituídas por carbono, oxigênio e hidrogênio, também conhecidos como carboidratos 𝐶𝑛𝐻2𝑛𝑂𝑛) já se apresentarem na forma de açúcar simples fermentável. No caso da cana-de-açúcar, por exemplo, é suficiente moê- 8 la para extrair o caldo rico em sacarose e os açúcares redutores, estando convenientemente diluída para sofrer a fermentação alcoólica. O caldo obtido pela moagem da cana-de-açúcar apresenta como características principais (Tabela 1). Tabela 1 – Características cana-de-açúcar Substância Concentração Água 78-86% Sacarose 10-20% Açúcares redutores 0,1-2% Cinzas 0,3-0,5% Outros (compostos nitrogenados) 0,5-1,0% pH 5,2 a 6,8 Fonte: Assis, 2022. As concentrações dos mostos são comumente expressas em graus Brix, diluindo-se os melaços para graduação entre 15 e 25°Brix, com médias de 18- 20°Brix. No caso de matérias-primas ricas em amido ou celulose, que contém carboidratos de maior complexidade molecular, impõe-se inicialmente a conversão destes em açúcares mais simples e fermentescíveis. Os amidos são reduzidos a açúcares simples através de um processo de sacarificação. A mandioca, por exemplo, contém de 25 a 30% de amido nas raízes, que, ao serem tratadas (lavadas, descascadas e trituradas), têm o amido exposto, que se decompõe em açúcar fermentável pela adição de enzimas (amilase e gluco-amilase). A sacarificação pode ocorrer por via química ou biológica. A sacarificação biológica se faz por ação enzimática ou pela ação microbiana de certos fungos. O malte pode ser produzido através de diversos cereais, como a cevada, milho, etc. As espécies microbianas mais usadas na produção industrial de álcool e aguardentes são: Saccharomyces cerevisiae e Saccharomyces uvarum, que utilizam, como elementos nutritivos, carbono, nitrogênio, fosfatos, sais de magnésio, potássio e cálcio. Elementos como o cobalto e o manganês atuam favoravelmente em suas atividades vitais, e suas fontes mais importantes de 9 carbono são os carboidratos. O nitrogênio encontra-se no material proteico e nos produtos de sua degradação e fornece-se através de sais amoniacais. Essas leveduras são mesófilas, sendo que a temperatura ideal de vida se situa na faixa de 26-35°C, com média de 30°C. Vale ressaltar que existem leveduras alcoólicas para produção de cerveja com bom desempenho em temperaturas inferiores ao mínimo citado. O pH ótimo situa-se entre 4 e 5, mas existem fermentações alcoólicas que se desenvolvem bem em substratos com poder-tampão elevado, como os melaços, cujo pH ótimo é 5,8 - 5,9. Para controlar o problema das contaminações, usam-se antissépticos para criar um ambiente favorável ao desenvolvimento das leveduras e desfavorável a outros micro-organismos. Esses agentes antissépticos atuam de maneira diferente, agindo sobre um ou mais grupos de micro-organismos. O uso de 4 mg de hexaclorofeno por litro de mosto ou pentaclofenol na proporção de 0,01 a 0,05 g/litro de substrato proporciona boas fermentações. Da mesma maneira, é possívelusar o ácido sulfúrico tanto para a correção do meio quanto como antisséptico. É importante entender que é comum o emprego de antibióticos nas fermentações industriais, principalmente para a produção de etanol, em função da ação esterilizante por propriedades bacteriostáticas. A penicilina revela-se um bom inibidor de contaminações bacterianas. Pode-se usar também cloranfenilcol, tetraciclina e clorotetraciclina, mas a penicilina mostra-se mais recomendável economicamente. Os mostos amiláceos passam por esterilização, e, usualmente, adiciona- se fosfatos, mais comumente o superfosfato em sua fração solúvel na proporção de 1 g por litro de substrato. Se necessário, corrige-se a acidez com ácido sulfúrico. Para substratos de melaço, normalmente faz-se apenas a diluição. Em casos especiais, adiciona-se fosfatos e sais de amônio na proporção de 1g por litro de mosto. Quando se trabalha com caldo de cana direto, faz-se uma correção cuidadosa com o uso de fosfatos, sais de amônio sais de magnésio/cobalto (0,1 g por litro) e vitaminas. É comum que as destilarias de aguardentes adicionem superfosfatos, sulfato de amônio e farelos de arroz na quantidade de 1g por litro de mosto (fonte de vitaminas e de proteínas). Lembre-se que, além da diluição e dos nutrientes, adicionam-se os antissépticos e antibióticos e ajusta-se a temperatura. 10 TEMA 3 – TEMPERATURA E QUALIDADE Em condições naturais, as alterações das condições ambientais provocam efeitos seletivos, algumas vezes letais, aos microrganismos; tudo depende das proporções desta condição. Essa possibilidade é potencializada em técnicas de esterilização por calor. O calor é considerado o método mais prático e eficiente de esterilização, podendo ser aplicado de forma seca ou úmida, sendo que a eficiência está relacionada com o tempo e temperatura ao que o produto foi exposto. Altas e baixas temperaturas desempenham papel importante no controle microbiano. No caso do processo de calor seco, a esterilização ocorre por oxidação e desidratação. Esse é adequado para esterilização de frascos e recipientes de vidro e metal, óleos e substâncias que podem oxidar na presença de vapor. Pelo fato de não ser tão penetrante, utiliza-se temperaturas mais elevadas na esterilização a seco, o que impossibilita o uso em produtos termossensíveis. Outro fator que deve ser considerado é o fato de este processo agir de maneira mais lenta, o que requer um tempo de exposição mais prolongado, podendo variar de 120 minutos a 170°C e 240 minutos se exposto a 140°C. O calor a seco pode ser aplicado em estufas de ar quente (Figura 1) ou por meio de outras técnicas: flambagem, fornos e raios infravermelhos. 11 Figura 1 – Calor seco usado na torrefação de café Crédito: Svitlana Hulko/Shutterstock Na esterilização por calor úmido, o vapor saturado sob pressão age por desnaturação e coagulação das proteínas das células microbianas, acelerada pela ação da água na destruição das membranas e enzimas e indução da eliminação das ligações de hidrogênio. Essa versatilidade faz deste método um processo eficiente e de fácil aplicação. Usualmente aplicadas em autoclaves (Figura 2), o material fica exposto ao vapor de água sobre pressão e temperatura de 121°C por aproximadamente 15 min. 12 Figura 3 – Autoclave, esterilização por calor úmido Crédito: Natatravel/Shutterstock Os materiais devem ser embalados de forma que o contato com o vapor proporcione vácuo, facilitando que a temperatura seja alcançada de forma eficiente e permita a penetração do calor em todos os espaços do material. O inconveniente é que, apesar de tantas vantagens, o processo apresenta a limitação de não servir para esterilizar pós, líquidos e produtos que não resistem a altas temperaturas. Outro método de esterilização por calor é o tindalização (muito utilizada para esterilizar soluções açucaradas e com gelatina). Neste método, o material é submetido a três sessões de esterilização por exposição a vapor de água a 100°C por intervalos de 20 a 45 minutos, depois 45 minutos e, por fim, de 20 a 45 minutos, com repousos de 24 horas entre cada situação. Desta forma, os esporos resistentes tornam-se células vegetativas ativas e vulneráveis, sendo destruídas por um novo aquecimento. TEMA 4 – CONSTITUINTES DE CONSERVAÇÃO Os processos de conservação são baseados na eliminação total ou parcial dos agentes que alteram os produtos ou na modificação ou suspensão 13 de um ou mais fatores essenciais, de modo que o meio se torne não propício a qualquer desenvolvimento vital. Isso ocorre por destruição total ou parcial dos micro-organismos capazes de alterar o alimento, ou na modificação ou eliminação de um ou mais fatores (intrínsecos ou extrínsecos) que são essenciais, de modo que o alimento não se torne favorável ao crescimento microbiano, sendo possível também a incorporação de substâncias inibidora. O calor elimina as células microbianas quando submetidas a uma temperatura letal. Essa temperatura varia de acordo com a espécie do micro- organismo e com a forma em que se encontra. As células vegetativas dos micro- organismos são destruídas à 60°C. Os esporos são inativados em temperaturas superiores a 100°C. A alteração da temperatura proporciona a inativação das células vegetativas e dos esporos em função da desnaturação da proteína incapacitando a célula de se multiplicar. O calor seco age nas células por oxidação dos componentes celulares. Os esporos são mais resistentes em função de seu maior grau de desidratação. O calor é utilizado em vários métodos de conservação e preparo dos alimentos, tais como: cocção, pasteurização, esterilização, secagem e concentração. • Cocção: é um processo de uso de temperaturas elevadas que ocorre principalmente por fervura, muito usado na produção de xaropes e bebidas lácteas. • Pasteurização: tratamento térmico que elimina parte da flora microbiana presente no alimento, empregando T< 100°C, sendo utilizado nos seguintes casos: a) Visando eliminar os germes patogênicos – que é o caso do leite pasteurizado. O tratamento é feito a 72 -75 °C por 15 – 20 min. (HTST – alta temperatura baixo tempo) ou a 60 – 65 °C por 30 min (LTLT – baixa temperatura alto tempo). Visa-se a eliminação da Coxiella burnetii, destruição de bactérias do grupo coliforme, redução da contagem de outros micro-organismos não patogênicos. b) Visando eliminar deteriorantes e patogênicos capazes de se desenvolver no produto – é o caso dos alimentos ácidos (pH entre 4,0 e 4,5; ex.: tomate; cogumelos; palmitos) e dos muitos ácidos (pH < 4,0; ex.: picles e sucos de frutas). Nesses alimentos, os micro-organismos 14 patogênicos não sobrevivem ou não se desenvolvem. Os deteriorantes, como leveduras, bolores, bactérias láticas e acéticas, são destruídos pelo calor (faixa 60 – 90 °C). Em deteriorantes como Bacillus coagulans e certas espécies de Clostridium, os esporos são resistentes e podem se desenvolver no produto. Nestes casos, são usadas temperaturas de 100°C (banho Maria). • Secagem: ocorre a eliminação da água pelo calor, que pode ser conduzido através do ar quente, muito utilizado na desidratação de vegetais ex: secagem de folhas de erva-mate (45 a 100°C) grão de café (180 – 230°C). • Concentração: é um processo que remove parte da água (30 – 60%) dos alimentos, diminuindo a Aa, usada na produção de sucos concentrados. • Resfriamento: o frio é bastante utilizado na conservação dos alimentos perecíveis, tanto os de origem animal como vegetal. Não pode ser considerada como forma de eliminação de micro-organismo. • Congelamento: utilizam-se temperaturas mais baixas do que na refrigeração (-10°C à -40°C). No processo de congelamento, ocorre uma redução da populaçãomicrobiana. A morte dos micro-organismos decorre, principalmente, dos cristais de gelo formados na célula, da desnaturação das enzimas, da perda de gases da célula, do abaixamento da Aa. • Uso do Açúcar: funciona aumentando a pressão osmótica, diminuindo a Aa, criando um ambiente desfavorável para multiplicação das bactérias e para alguns bolores e leveduras, por exemplo refrigerantes e xaropes. • Fermentação: ocorre alteração da acidez (ácido lático, ácido acético, etanol), o que interfere no crescimento da maioria dos micro-organismos (vinho, cerveja, iogurte). • Uso de aditivos: são substâncias aprovadas para serem utilizadas nos alimentos em diversas modalidades: melhorar sua coloração, textura, aroma, bem como conservá-los por um tempo maior. Exemplo: ácido benzóico, ácido sórbico, nitritos e nitratos e propionatos. • Irradiação: as radiações na faixa do ultravioleta (200 – 280 nm) inativam micro-organismos da parte superficial dos alimentos, de embalagens, ou mesmo de superfícies que entram em contato com os alimentos. 15 É essencial entender que, para alimentos, os perigos referem-se às condições e/ou aos contaminantes que podem causar mal-estar ou dano ao consumidor, por meio de lesão ou doenças, podendo ser classificados em biológicos, químicos e físicos. • Perigo biológico – é representado por bactérias; fungos; vírus e parasitas. • Perigo químico – consiste na presença de contaminantes tóxicos como resíduos de fertilizantes e pesticidas, metais pesados, lubrificantes, desinfetantes, micotoxinas, resíduos veterinários (antibióticos e esteróides) e aditivos alimentares tóxicos. • Perigo físico – consiste na presença de objetos estranhos como vidros, metais, madeira, plástico, insetos, ossos, cabelo etc. TEMA 5 – ARMAZENAMENTO O estabelecimento que produz bebida deve seguir as exigências legais associadas a cada tipo de bebida. Mas, de uma forma geral, a lei estabelece a necessidade de uma infraestrutura básica, com localização e espaço adequado à natureza das atividades; edificações com iluminação; piso revestido de material cerâmico; e paredes revestidas de material liso, impermeável e resistente. São bastante distintas as matérias primas usadas para a produção de bebidas, sendo que algumas, como frutas e hortaliças, precisam de processamento imediato (pode chegar a 48 horas). No entanto, isso não acontece com muita frequência, porque o processo produtivo é em batelada, e um pequeno estoque de matéria-prima é sempre utilizado. Sendo assim, podemos afirmar que as condições de armazenamento variam muito em função das características do produto vegetal. O armazenamento de frutas deve seguir alguns cuidados, principalmente no que se refere ao empilhamento, o que pode provocar rupturas. As câmaras frias são ideais para frutas mais sensíveis, como morangos, amoras, mirtilos e uvas. Nestes espaços, ocorre um rigoroso controle de temperatura e umidade, permitindo que sejam conservados por mais tempo, sem perder peso ou decomposição. Quando as frutas são mais resistentes, como as cítricas, a matéria-prima chega em caminhões, sendo transportada por correias laminadas 16 emborrachadas. Pode ocorre uma pré-seleção inicial e encaminhamento da matéria-prima, por meio de transportadores de caneca, até silos de estocagem. Os silos são construções mistas com subdivisões e fechadas de modo a permitir a circulação do ar e limitar o peso de umas sobre as outras. A matéria-prima é disposta de maneira que seja possível identificar e acessar os diferentes lotes. As partidas de matéria-prima são analisadas com relação à acidez, à quantidade de sólidos solúveis (Brix) e aos rendimentos. Isso permite a mistura de diferentes lotes de maneira a obter-se um produto uniforme. A matéria-prima permanece no depósito apenas o tempo necessário para se manter o equilíbrio produtivo. No caso de grãos (produção de cerveja e destilados), ocorre a colheita, secagem e estocagem em silos pulmão. Na sequência, ocorre o transporte via rodoviária, hidroviária e ferroviária até a cooperativa ou indústria produtora. Após a chegada, os grãos são armazenados em silos. No caso dos silos para grãos, temos a denominação de unidades armazenadoras, formadas por células ou compartimento hermético ou semi- hermético, o que possibilita o mínimo de incidência ou trocas com o meio externo. Esses silos têm diferentes capacidades e características produtivas. O armazenamento ocorre em condições que inibam o crescimento microbiano e a presença de insetos que causem a deterioração. Para isso, é feito o controle de fatores como: umidade, temperatura, quantidade de oxigênio, pH do meio e tempo de armazenamento. Normalmente, estes silos de armazenamento contam com homogeneizadores de grãos, que consistem em uma rosca sem fim que mistura os grãos do fundo com os recém-chegados. Isso permite a homogeneização e evita a formação de caminhos preferenciais de poeira, o que possibilitaria o aquecimento das paredes internas do silo e, consequentemente, o crescimento microbiano. Os estabelecimentos que industrializam bebidas dietéticas, como sucos e refrigerantes, devem dispor de área própria e controlada para guardar os edulcorantes. Conforme legislação, a empresa deve manter um responsável técnico, com respectivo registro no Conselho Profissional, o qual terá a responsabilidade de não manter substância que possa mudar as características da bebida, ressaltando os que participam do processo de maneira idônea, que 17 deverão ser mantidos em local apropriado sobre controle. No caso de substâncias tóxicas necessárias às atividades, estas deverão ser mantidas sob rigoroso controle e em local isolado. NA PRÁTICA • Exercício 1 – Em situações específicas de produção de bebidas, é possível produzir polpa congelada. Neste procedimento, o produto não é submetido a nenhum outro tratamento, visando a inibição de reações químicas e enzimáticas e/ou redução da atividade de micro-organismos que possam levar à perda de qualidade. Como deve ser o acondicionamento da matéria-prima? • Exercício 2 – Os grãos usados na produção de cerveja e destilados são colhidos, secos e estocados em silos pulmão. Na sequência, ocorre transporte via rodoviária, hidroviária e ferroviária até a cooperativa ou indústria produtora, e, após a chegada, os grãos são armazenados. Onde deve ocorrer esse armazenamento? Explique. • Exercício 3 – A fermentação pode ocorrer em diferentes tipos de biomassa. Cite algumas fontes de rica em açúcares e explique por que os hidratos são mais usados. FINALIZANDO As questões associadas à produção de bebidas envolvem alimentos que são suscetíveis à degradação microbiana e à contaminação química e física, sendo, portanto, essencial desenvolver métodos de controle de processo e armazenamento, permitindo que a matéria-prima não sofra decomposição, e as características organolépticas sejam conservadas. 18 REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria Interministerial n. 42, de 16 de abril de 1999. Dispõem sobre o uso e a instalação do óxido de etileno. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 abr. 1999. _____. Resolução RDC n. 216, de 15 de setembro de 2004. Estabelece procedimentos de Boas Práticas para serviço de alimentação, garantindo as condições higiênico-sanitárias do alimento preparado. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 15 set. 2004. _____. Ministério da Saúde/Anvisa. Resolução RDC n. 218, de 29 de julho de 2005. Regulamento técnico de procedimentos higiênico-sanitários para a manipulação de alimentos e bebidas preparados com vegetais. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 29 jul. 2005. CAPUTO, A. R.; ROHN, K. J.; MASCOLI, C. C. Recovery of Biological Indicator Organisms After Sublethal Sterilization Treatment. J. Parenter. DrugAssoc., Philadelphia, v. 34, n. 5, p. 394-397, 1980. EVANGELISTA, J. Tecnologia de alimentos. Rio de Janeiro: Livraria Atheneu, 652 p., 1989. GRAY, W. The relation of fungi to human affairs. New York: Holt, 1959. KORMENDY, I.; MOHÁCSI-FARKAS, C. Heat Treatment and the Defective Units’ratio: surviving active spores in pea puree. Journal of food engineering, v. 45, p. 225-230, 2000. LEWIS, M. J. Oropiedades físicas de los alimentos e de los sistemas de procesado. Zaragoza: Acribia, 1993. SÃO PAULO (Estado). Portaria n. 2619/11. Regulamento Técnico de Boas Práticas Manipulação de Alimentos. Diário Oficial [do] Estado de São Paulo, 6 dez. 2011. UBOLDI, E. M. N. Microbiologia de frutas e hortaliças desidratadas. In: AGUIRRE, J. M.; GASPARINO FILHO, J. (Coord.). Desidratação de frutas e hortaliças. Campinas: Instituto de Tecnologia de Alimentos, 1996, p. 6.1-6.26. VESSONI PENNA, T. C. Validação de processos de esterilização: conceitos básicos. Laes & haes, São Paulo, v.15, n. 88, p. 46-48, 1994. 19 WAITZBERG, D. L. Nutrição oral, enteral e parental na prática clínica. 4. ed. São Paulo: Atheneu, 2009. 20 GABARITO • Exercício 1: o processamento deve ser efetuado o mais rápido possível para manter as características da fruta fresca. Para isso, utiliza-se o emprego de câmaras de congelamento com ventilação forçada, com temperatura recomendada p na faixa de - 23 ± 5º C, com tempos não superiores a 8 horas. • Exercício 2: No caso dos silos para grãos, temos a denominação de unidades armazenadoras, que são formadas por células ou compartimento hermético ou semi-hermético para que ocorra troca com o meio externo. Esses silos têm diferentes capacidades e características produtivas. O armazenamento ocorre em condições que inibam o crescimento microbiano e a presença de insetos que causem a deterioração. São espaços onde umidade, temperatura, quantidade de oxigênio, pH do meio e tempo de armazenamento são controlados. Normalmente, estes silos de armazenamento contam com homogeneizadores de grãos, que consistem em uma rosca sem fim que mistura os grãos do fundo com os recém-chegados. Isso permite a homogeneização e evita a formação de caminhos preferenciais de poeira, o que possibilitaria o aquecimento das paredes internas do silo e, consequentemente, o crescimento microbiano. • Exercício 3: Cana-de-açúcar, melaço de cana, beterraba, melaços cítricos, mandioca, milho, casca de babaçu, batata, madeira, resíduos agrícolas etc. A grande vantagem das matérias ricas em açúcares consiste no fato de os hidratos de carbono, que são constituídos por carbono, oxigênio e hidrogênio, também conhecidos como carboidratos 𝐶𝑛𝐻2𝑛𝑂𝑛, já se apresentarem na forma de açúcar simples e fermentáveis.
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