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História e Tradições Religiosas Professora Me. Laís Azevedo Fialho APRESENTAÇÃO Professor Me. Laís Azevedo Fialho ● Mestre em História, Cultura e Narrativas (Universidade Estadual de Maringá). ● Especialista em História da África e Cultura Afro-brasileira (Universidade Estadual de Maringá). ● Licenciada em História (Universidade Estadual de Maringá). ● Tutora Educacional no Centro Universitário Cidade Verde (UniFCV). ● Professor Conteudista na UniFatecie. ● Experiência como professora de História da Rede básica de Educação em 2016. ● Atuou como Pesquisadora Bolsista Capes em 2018 e 2019. ● Coordenou e organizou diversos Projetos de Extensão abordando as Religiões e Religiosidades Afro-brasileiras, na Universidade Estadual de Maringá, entre 2015 e 2019. ● É integrante do Laboratório de Religiões e Religiosidades da Universidade Estadual de Maringá (LERR/UEM). ● É integrante do Coletivo Yalodê-badá. Áreas de concentração: História das Religiões e Religiosidades com ênfase nas Práticas Afro-brasileira; História Cultural, Epistemologias Anti-racistas. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/8724898233397030 APRESENTAÇÃO DA APOSTILA Seja muito bem-vindo(a)! Prezado(a) estudante(a), iniciamos agora uma jornada pelo mundo das ideias, crenças, práticas religiosas e religiosidades. Se você chegou até aqui já é motivo de muita alegria, denota seu interesse pelo tema. Espero que possamos construir juntos esse processo formativo. Tais conteúdos foram pensados para aperfeiçoar sua formação na área de História das Religiões e Tradições Religiosas. Nosso debate parte de categorias analíticas, e apontamentos teóricos produzidos nas Ciências Humanas, desenrolando-se no debate científico contemporâneo, de modo interdisciplinar. Nosso objetivo instrumentalizar o(a) leitor(a) para compreender a historicidades das práticas, crenças e discursos religiosos. Analisando-os em seu contexto histórico, social, político e econômico, além de percebê-los dentro de uma lógica própria do fenômeno religioso. Na unidade I trataremos dos mitos. Buscaremos estabelecer as disputas conceituais em torno dos mitos cosmogônico e os mitos de origem. Apresentaremos os tipos de mitos conceituados no campo de estudo das religiões e religiosidades e algumas possibilidades de abordagens teóricas metodológicas das mitologias na pesquisa científica e docência. De modo didático selecionamos também algumas narrativas mitológicas que fazem parte da cultura brasileira para narrá-las em diálogo com os conceitos. Já na unidade II pensaremos os símbolos. Vamos estabelecer as disputas conceituais em torno desse objeto nas Ciências Humanas. Analisaremos de que modo tem sido sistematizado o estudo dos símbolos no campo das religiões e religiosidades. Apresentaremos algumas possibilidades de abordagens teórico metodológicas para o uso dos símbolos na pesquisa científica e no âmbito escolar. Depois, nas unidade III e IV vamos pensar as histórias da/de fé e os ritos, partindo da mesma abordagem. Ou seja, conceituando-os de modo interdisciplinar e apresentando possibilidades de abordagens teórico- metodológicas e pedagógicas. Me alegro com a sua participação nesse processo e reforço o convite para que que realize o exercício da reflexão juntamente comigo sobre tantos assuntos abordados no presente material. Esperamos contribuir para seu crescimento pessoal e profissional. Muito obrigada e bom estudo! UNIDADE I MITO FUNDADOR Professora Me. Laís Azevedo Fialho Plano de Estudo: • Mitos - Sentidos e significações, algumas conceituações do termo. • Mitos Cosmogônicos e Mitos de Origem, definições e disputas. • Os mitos e as possibilidades de abordagens teórico-metodológicas na pesquisa e docência. • Mitos Afro-brasileiros e Indígenas no âmbito escolar. Objetivos de Aprendizagem: • Estabelecer as disputas conceituais em torno dos mitos cosmogônico e os mitos de origem, bem como de suas funções e estruturas. • Identificar os tipos de mitos conceituados no campo de estudo das religiões e religiosidades. • Apresentar as possibilidades de abordagens teórico metodológicas das mitologias na pesquisa científica e docência. • Conceituar e contextualizar algumas narrativas mitológicas que fazem parte da cultura brasileira. INTRODUÇÃO Olá, estudante da disciplina de História e Tradições Religiosas. Fico muito feliz em compartilhar com você esse conteúdo que foi produzido pensando unicamente no seu processo de formação. Essa disciplina é bastante significativa, espero que ela proporcione ferramentas teórico-metodológicas relevantes para sua atuação como pesquisador(a) e/ou educador(a). Proponho que esse seja um espaço de partilha e aprendizado. Convido você para essa imersão no mundo dos mitos e das diversas explicações possíveis sobre a origem do mundo e das coisas que ele contém. Considerando a relevância do estudo dos mitos para a disciplina de História e Tradições Religiosas, organizamos esta unidade com o objetivo de estabelecer as disputas conceituais em torno do mito, compreendendo os tipos de mitos conceituados no campo de pesquisa especializado, e conceituando e contextualizando algumas narrativas mitológicas que fazem parte da cultura brasileira. Para isso, apresentaremos alguns conceitos e definições sobre os mitos cosmogônicos e os mitos de origem, bem como das suas estruturas e funções. Iremos também elencar algumas possibilidades teórico-metodológicas para adotar o mito como objeto ou fonte de uma pesquisa historiográfica. Além disso, apresentaremos, também, modos de se utilizar a mitologia como recurso educativo no âmbito escolar. Bons estudos! 1 MITOS - SENTIDOS E SIGNIFICAÇÕES, ALGUMAS CONCEITUAÇÕES DO TERMO No presente tópico buscamos refletir sobre os estudos dos mitos nas Ciências Humanas e os múltiplos sentidos e significações para esse conceito. Mais do que elaborar um panorama da historiografia especializada, sistematizamos diversas abordagens, produzidas em diferentes tempos, espaços e culturas. Iremos explorar algumas correntes teóricas passando por pesquisadores conceituados do tema, que balizam até o presente momento as noções conceituais de mito. O filósofo Ernst Cassirer, autor clássico desse objeto, explica que a noção de linguagem é considerada um dos primeiros modos de representação e comunicação entre os seres humanos no período pré-histórico. A pintura e a gravura seriam tidas, em seguida, como modos de fixar essas representações. Por conseguinte, o mito passa a ser componente da relação entre o homem com o meio social. A linguagem e o mito são parentes próximos. Nos primeiros estágios da cultura humana, sua relação é tão íntima e sua cooperação tão óbvia que é quase impossível separar um do outro. São brotos diferentes de uma mesma raíz. Sempre que encontramos o homem, vemo-lo em possessão da faculdade da fala e sob a influência da função de fazer mito (CASSIER, 2001, p. 181). Em uma sociedade sem escrita, marcada pela oralidade, a memória coletiva torna-se um cantar mítico da tradição. Obedece, em geral, a três princípios: diz respeito aos anos de existência coletiva do grupo, que se funde nos mitos de origem (idades do ouro, prata, bronze e ferro etc.); relaciona-se às genealogias, manifestando a autoridade dos grupos dominantes; e conecta-se aos saberes técnicos, transmitidos por fórmulas práticas mescladas à magia religiosa. Nesse sentido, o aparecimento da escrita foi um dos fatores fundamentais na transformação da memória coletiva. Cassier (2001) destaca em sua análise a relação entre mito e religião e como essas estruturas interferem na existência do homem e no desenvolvimento de suas atividades cotidianas. Eliade (1972), mitólogo reconhecidoem nosso campo, denomina os homens do período sem escrita como arcaicos ou primitivos. Nesse conteúdo utilizaremos tais palavras sem valoração moral, mas como reprodução da categoria histórica que o pesquisador adota. Conforme o historiador, o mito é muito importante nas sociedades arcaicas, porque ensina as "histórias" exemplares que fundaram sua existência. Demonstra os eventos míticos que afetam sua noção de si e forma de estar no Cosmo. Nesse sentido, o homem arcaico sente a necessidade não somente de conhecer os mitos de sua sociedade, mas também de reatualizá-los. Essa seria, para o autor, uma diferença fundamental entre o homem arcaico e o homem moderno, a possibilidade de reviver uma temporalidade. Um tempo mítico existiria somente para o primeiro, enquanto o segundo estaria condicionado ao tempo histórico: “o ritual abole o tempo profano, cronológico, e recupera o tempo sagrado do mito. Torna o homem contemporâneo das façanhas que os deuses efetuaram in illo tempore” (ELIADE, 1972, p. 124). Era uma prática do homem arcaico distinguir narrativas míticas de fabulações sem valor sagrado. A legitimidade atribuída à algumas narrativas as diferenciavam de outras a partir do que era considerado verdadeiro no discurso, admitindo que o próprio discurso cria realidades. Assim, o mito é fruto de uma produção coletiva, que pertence a toda uma comunidade. O fato de ouvintes aceitarem uma narrativa demanda estarem adequadas a um conjunto de ideais do público. A audiência torna-se coautora da fabulação mítica, porque, sem ela, não teria valoração (ELIADE, 1972). Conforme Eliade (1972), os mitos do politeísmo euroasiático, que são as primeiras civilizações históricas, demonstram um interesse progressivo pelo que se passou depois da criação do mundo e do homem. O interesse passa a se concentrar no que aconteceu com os deuses, ao invés do que eles criaram. O historiador destaca que sempre se evidencia o “criador” nas sagas divinas, mas que paulatinamente é a sequência dos episódios e não mais o resultado dessa aventura o que mais interessa. As inumeráveis aventuras de Baal, de Zeus, de Indra ou de seus colegas nos respectivos panteões, representam os temas mitológicos mais "populares". Mencionemos igualmente os mitos dos jovens Deuses que morrem assassinados ou por acidente (Osiris, Tamuz, Atis, Adônis, etc.) e algumas vezes ressuscitam, ou de unia deusa que desce aos Infernos (Ishtar), ou de uma Donzela divina que é forçada a descer ao Hades (Perséfone) [...] As grandes mitologias — consagradas por poetas como Homero e Hesíodo e pelos bardos anônimos do Mahâbhârata, ou elaboradas pelos ritualistas e pelos teólogos (como no Egito, na Índia e na Mesopotámia) — são cada vez mais solicitadas a narrar os gesta dos Deuses. E, em determinado momento da História, sobretudo na Grécia e na Índia, mas também no Egito — uma elite começa a perder o interesse por essa história divina e chega (como na Grécia) a não acreditar mais nos mitos, embora pretendendo ainda acreditar nos deuses (ELIADE, 1972, p. 87). Em Heródoto, grego erudito nascido no século V a.C. e considerado pai da História, é encontrada algumas menções ao conceito mythos (mito). Marcel Detienne (1992, p. 97) nos diz que: “A palavra mito é empregada duas vezes nos nove livros do rapsodo viajante a quem os historiadores mais convictos atribuem, hoje como outrora, a paternidade de seu saber”. A sua primeira citação diz respeito a reflexões em torno das fontes do Rio Nilo e suas inundações. No contexto de elaboração de tais noções, Heródoto estava frustrado com a falta de informações dos sacerdotes egípcios sobre as nascentes e a formação do Nilo. Buscando entre os próprios gregos, pessoas sábias que detivessem aquele conhecimento, encontrou algumas versões. Duas delas, segundo Heródoto, nem mereciam discussão, uma tentava demonstrar que as cheias do Nilo ocorriam devido aos “ventos estivais”, que desviariam as águas, impedindo-as de desaguarem no mar. A outra, adotava a ideia de que a Terra estaria envolta pelo mar Oceano e que o Nilo estaria sujeito às enchentes, porque vem do Oceano. Ao negar essas explicações, Heródoto afirma que recorrem a uma fábula (mythos) obscura e não mereciam sequer serem refutadas. “Por mim, não conheço rio algum que se possa denominar Oceano, e penso que Homero ou algum outro poeta mais antigo, tendo inventado esse nome, introduziu-o na poesia” (HERÓDOTO, 2001, p. 23). O mito era, para os gregos do período, recorrentemente associado a algo fabuloso e poético, como o que não pode ser visto, investigado e comprovado. Sobre isso, o historiador Hartog (2003, p. 37) afirma o seguinte: “Como reconhecer e rejeitar um mythos? Usando uma noção de eikós (plausível, provável) como ferramenta crítica, de modo geral, o termo eikós ajudava a escolher entre diferentes versões propostas e proporcionava um meio de organizar a lógica da narrativa”. Para Heródoto, as fronteiras entre os termos mythos e lógos não eram totalmente delimitadas. Nota-se, em suas histórias, a significação da lógos como narrativa, em oposição a mythos (fábula, mentira, discurso enganoso). Contudo, ao criticar Hecateu de Mileto, autor das Genealogias, denomina-o como logopoiós (fazedor de lógos): “Assim fala (mytheitai) Hecateu de Mileto: escrevo isso como me parece ser verdadeiro; pois os relatos (lógoi) dos gregos são, como me parecem, muitos e ridículos” (HARTOG, 2003, p. 41). Quando Heródoto utiliza o termo logopoiós para fazer uma crítica a Hecateu, assim como o fez também com Esopo, os designa como fazedores de mitos. Isso demonstra que, para o historiador grego, a divisão entre os dois termos não era bem definida – mythos e lógos – e que o sentido empregado dependia de outros fatores e contexto ao qual ele referia-se. Cabe destacar que a escrita de Heródoto está situada no período de transição entre o mythos e o lógos. Os sentidos atribuídos aos mitos, por Heródoto, e essa linha tênue sustentada por ele com o lógos, devem ser localizados em seu momento histórico (entre 480/420 a.C.), de efervescência cultural, e relacionados à mentalidade grega do século V, na qual incidia a herança do imaginário social dos helenos. [...] nas investigações de Heródoto, o mito também não é um objeto; é apenas um simples resto, às vezes rumor excitado, palavra de ilusão, sedução enganadora, às vezes narrativa incrível, discurso absurdo, opinião sem fundamento. O mito permanece apenas uma palavra, como um gesto apontando o que ele denuncia como incrível, o que ele repele ou descarta (DETIENNE, 1992, p. 101-102). No final do século V, o mito encontra o seu estudioso mais intransigente. Tucídides, que viveu entre 460 e 400 a.C., e sendo historiador, registrou a Guerra do Peloponeso, se posiciona duramente contra o mito. Mesmo que o autor continuasse reproduzindo narrativas épicas em seus escritos e apresentasse resquícios dos poemas homéricos, no discurso que demonstra sua metodologia de pesquisa ele descredibiliza o mito. A luz da evidência apresentada até agora, todavia, ninguém erraria se mantivesse o ponto de vista de que os fatos na antigüidade foram muito próximos de como descrevi, não dando muito crédito, de um lado, às versões que os poetas cantaram, adornando e amplificando os seus temas, e de outro considerando que os logógrafos compuseram as suas obras mais com a intenção de agradar aos ouvidos que de dizer a verdade uma vez que suas estórias não podem ser verificadas, e eles em sua maioria enveredaram, com o passar do tempo, para a região da fábula (mythos), perdendo, assim, a credibilidade (apístos) (TUCÍDIDES, 2001, p. 21). Refletindo sobre o processo histórico de desmitificação, o Mitólogo Mircea Eliade (1972) aponta que os gregos são os primeiros na história das religiões a progressivamente buscar esvaziar o mitode seu caráter religioso. Para demonstrar tal afirmação, ele aponta alguns trabalhos de Xenófanes, filósofo grego pré-socrático que viveu entre 565 e 470 a.C. “Em contraposição ao logos; assim como, posteriormente, a história, o mythos acabou por denotar tudo o que não pode existir realmente” (ELIADE, 1972, p. 6). O autor chama a atenção para o fato histórico de que nas culturas arcaicas já haviam mitos despojados de um significado religioso, transformados em lendas ou contos infantis. Contudo, destaca que nessas sociedades muitos mitos continuavam vivos. Para ele, é diferente do que ocorreu na Grécia dos pré-socráticos, marcado por um fenômeno cultural ordenado e seus incontáveis desdobramentos. O historiador aponta que esse processo impossibilitou que as mitologias representassem para as suas elites algo que haviam representado para os seus antepassados. Isso porque as elites citadas não procuravam mais o “essencial” em uma narrativa dos Deuses, mas sim em uma situação primordial. Ou seja, os gregos passaram a buscar suas explicações de mundo em um constante “voltar atrás”. Progressivamente substituíram seus rituais pela força do pensamento. “Pode-se dizer que as primeiras especulações filosóficas derivam das mitologias: o pensamento sistemático esforça-se por identificar e compreender o ‘princípio absoluto’ de que falam as cosmogonias” (ELIADE, 1972. p. 81). No século XIX, período marcado pela difusão de noções iluministas surgidas no século anterior, os intelectuais ocidentais passaram a conceber o mito por uma perspectiva que contrasta sensivelmente com a do século XVIII. Esse período também se destaca por essa modificação dos significados atribuídos à mitologia. Nesse momento, o mito passa a ocupar o lugar de uma história verdadeira, exemplar, primordial e singular por seu caráter sagrado, e não mais como fábula, invenção ou ficção, como era considerada por eruditos do século anterior influenciados também pela filosofia grega. Para os Historiadores da Religião da contemporaneidade, o mito conta uma história verdadeira, sagrada e que dá sentido à existência humana. A sua função ética norteia o sujeito social em sua interpretação da vida e sua interação com seu meio. Assim, os especialistas comumente reforçam que o mito é uma realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada através de perspectivas múltiplas e complementares. Alguns são enérgicos ao dizer que não se deve incorrer no erro de considerar o mito uma fábula, uma mentira ou mesmo algo primitivo. Para eles, por mais que o mito tenha surgido em tempos longínquos, caminha conjuntamente com a ética que é o lhe atribui significado e valor em uma realidade social. Apontam que um mito não seria norteador de um grupo social se não lhe fosse atribuído sentidos próprios daqueles que o compõem. Joseph Campbell (1990), pesquisador famoso por seus estudos sobre mitologia e história comparada, defende que os mitos em geral, independente da cultura em que são produzidos, apresentam uma estrutura comum, com semelhanças marcantes. À essa busca por comunalidades o autor conceitua como monomito. Considerando essa categoria teórico-metodológica que admite os arquétipos do herói, o pesquisador analisa sua convocação para a jornada de aventuras, sua aproximação com o velho sábio, a prova heroica e as incumbências e o grande desafio final. Veremos nos tópicos seguintes, de modo um pouco mais detalhado, como se dá o estudo das mitologias comparadas. A história das religiões é bastante interdisciplinar por considerar outras áreas do conhecimento importantes para noções conceituais dos nossos objetos. Se, para realizar uma pesquisa em História, utiliza-se principalmente métodos formulados por outros historiadores – no trato com as fontes, na análise documental, na construção da narrativa –, do ponto de vista teórico, temos mais abertura para dialogar com outros campos das Humanidades. Digo isso para justificar o recorte em que trago Carl Gustav Jung, psiquiatra e psicoterapeuta suíço, que fundou a psicologia analítica e dedicou-se também aos estudos dos mitos. Para ele, os mitos são um conjunto de símbolos inventados inconscientemente. O pesquisador postula que eles são moldados conforme o seu uso na vida dos indivíduos, a partir de uma elaboração racional e também emocional. Os indivíduos em grupos sociais, relacionando suas ambições e significações, estão sempre à mercê dos mitos e símbolos que são gerados nesse processo (JUNG, 2008). Já Roland Barthes (2001), crítico literário francês, admite o mito não como um objeto encerrado em si, uma ideia, mas como um modo de significação. Ou seja, ele defende que o material do mito demanda um significante consciente, e por ele raciocina-se ao enquanto desconsidera-se sua substância, compondo um modelo integrado por três dimensões: o sinal, o significante e o significado. Não seria possível nos debruçar profundamente no que cada um desses autores produziu sobre os mitos ou o modo como atribuiu sentido a eles. Contudo, buscamos demonstrar nesse tópico como existe um longo e amplo debate em torno do mito e como é possível se apropriar de noções teóricas distintas quando falamos de mitologia. O historiador das religiões tem um rico e amplo campo de pesquisa quando considera as minúcias, as diferenças e semelhanças no modo como o mito foi significado em diversas culturas e sociedades, além da forma como os próprios teóricos adotam esse vocábulo como categoria analítica. Em geral, é consenso no nosso ofício postular que o mito é um conjunto de representações que fundamentam um modelo de vida, um modelo que define o que é sucesso, o que é reconhecimento e o que realmente vale a pena. Essa esfera de influências é passível de ser mitologizada, como afirma Campbell (1990). No próximo tópico continuaremos nossos estudos buscando entender um pouco melhor as estruturas e tipologias dos mitos. Será que em pleno século XXI os mitos continuam sendo relevantes para entender a cultura humana? Te convido a fazer essas reflexões comigo nos próximos tópicos. SAIBA MAIS “As narrativas da criação de Pandora e de Eva têm como elemento central a produção de um corpo. Mas, se a carne é o traço significativo para a compreensão do corpo da mulher na narrativa cristã, o mesmo não acontece na narrativa hesiódica. Nesta, o corpo da mulher não é criado, mas fabricado, e, para sermos precisos, é fabricado sob encomenda por Zeus, a fim de ‘presentear’ os homens. Esse corpo vem do barro, é moldado como a argila por um artesão habilidoso. O fato das duas narrativas enfatizarem o surgimento de um corpo para fundamentar a existência de dois seres - o homem e a mulher - levanta a questão da relação entre corpo e gênero”. Fonte: Ilva e Andrade (2009, s.p.) #SAIBA MAIS# REFLITA Caro(a) estudante, você já havia parado para refletir sobre a herança grega no uso habitual da palavra mito como sinônimo de mentira? É comum dizer que algo é um mito quando na verdade se quer dizer que algo é uma fábula ou uma invenção. Quando estudamos história compreendemos um pouco mais sobre a bagagem histórica das palavras. #REFLITA # 2 MITOS COSMOGÔNICOS E MITOS DE ORIGEM, DEFINIÇÕES E DISPUTAS. Olá, querido(a) estudante! Nesse tópico iremos estudar algumas perspectivas metodológicas usais para o estudo dos mitos cosmogônicos e dos mitos de origem. Também iremos elencar algumas posturas teóricas dentro dos estudos de Religiões e Religiosidades. Nesse sentido, é importante compreender que produzir um mito pode significar construir uma explicação fenomenológica para uma cultura, um grupo ou um povo, em um determinado tempo e lugar. É esse caráter que atribui historicidade às narrativas mitológicas, o fato de que elas ganham roupagens diferentes em tempos distintos, por mais que, por vezes, mantenhamalgumas estruturas fundamentais em comum, o que já citamos anteriomente, que Cambpell (1990) denomina como Monomito. Para o mitólogo Eliade (1972), os mitos são narrativas que explicam a origem do mundo e a criação de todas as coisas que ele contém, tais como a fauna, a flora, o ser humano. Além disso, os mitos seriam também os responsáveis por fundar os acontecimentos primordiais que explicam como o homem se transformou no que é nos dias atuais: alguém que sabe da finitude da vida, que se reproduz sexualmente, que se organiza em sociedade, que trabalha para sobreviver, obedece um conjunto de regras para organizar-se coletivamente etc. “Se o Mundo existe, se o homem existe, é porque os Entes Sobrenaturais desenvolveram uma atitude criadora no ‘princípio’.” (ELIADE, 1972, p. 13). Conforme o pesquisador, após a criação do cosmos, do ser humano e dessa realidade, denominada como cosmogonia, sucederam outros episódios míticos que fundamentam diretamente a condição humana. Ou seja, a partir dessa compreensão, o ser humano, tal como o conhecemos hoje, é fruto de episódios que o antecederam, que ocorreram em um tempo primordial e exemplar. Esses eventos são o motivo pelo qual o homem é um ser mortal, por exemplo: Ele é, mortal porque algo aconteceu in illo tempore. Se esse algo não tivesse acontecido, o homem não seria mortal — teria continuado a existir indefinidamente, como as pedras; ou poderia mudar periodicamente de pele, como as serpentes, sendo capaz, portanto, de renovar sua vida, isto é, de recomeçá-la indefinidamente. Mas o mito da origem da morte conta o que aconteceu in illo tempore, e, ao relatar esse incidente, explica por que o homem é mortal (ELIADE, 1972, 13). Conforme a teoria defendida pelo historiador, existem distinções entre os mitos cosmogônicos e os mitos de origem. Enquanto os primeiros buscam explicar a origem do universo, da vida e de quando tudo passou a existir, os outros, explicam o nascimento da fauna, da flora e da natureza num geral. Eliade (1972) defende que seria possível investigar o mito cosmogônico sem considerar a cosmogonia, mas não o contrário. Para os estudos das Religiões e Religiosidade, os mitos cosmogônicos somente podem ser captados em sua totalidade por meio de um foco sobre a mitologia como um todo, como é o caso dos itans cosmogônicos iorubanos: Olodumare-Olofim vivia só no infinito, cercado apenas de fogo, chamas e vapores, onde quase nem podia caminhar. Cansado desse seu universo tenebroso, cansado de não ter com quem falar, cansado de não ter com quem brigar, decidiu pôr fim àquela situação. Libertou as suas forças e a violência. Delas fez jorrar uma tormenta de águas. As águas debateram-se com rochas que nasciam e abriram no chão profundas e grandes cavidades. A água encheu as fendas ocas, fazendo-se mares e oceanos, em cujas profundezas Olocum foi habitar (PRANDI, 2001, p. 380). O mundo foi criado por Olorum e sua mulher Olocum. Eles tinham a mesma idade. Da união de Olocum com Aiê, a Terra, nasceu Iemanjá. Da união de Iemanjá e Aganju nasceram os outros deuses (PRANDI, 2001, p. 403) Nessas narrativas africanas e afro-brasileiras, catalogadas pelo sociólogo Reginaldo Prandi na obra Mitologia dos orixás, identificamos o mito cosmogônico em sua estrutura, como representação da origem da vida, do cosmo e do universo. Como o tempo no qual a realidade passou a existir a partir dos orixás, divindades africanas cultuadas pelos povo étnico-linguístico denominados como iorubas e pelos adeptos do culto dos orixás no Brasil. A partir dessa existência, o que se sucede é denominado como mito de origem e teogonia. A teogonia designa o momento mítico em que os deuses passam a existir em uma concepção de genealogia. Seria a junção do mito cosmogônico e do mito de origem. Nessa perspectiva, as divindades são criadoras e criaturas, pois compõem o Cosmos, e são classificadas, ao mesmo tempo, como elementos da natureza, por isso, também de origem. Desse modo, teogonia corresponde à uma classificação de personagens que podem criar outros seres e gerações. Se considerarmos a mitologia grega, o Caos e a Terra seriam os seres teogônicos e cósmicos, já que a Terra teria produzido outros deuses por defluência. Inicialmente por cissiparidade e em seguida por cruzamento com seu filho Céu. A terra representaria o assentamento dos mortais e imortais. O Caos, por sua vez, daria início à criação produzindo por cissiparidade Érebos e Noite. Conforme a Teogonia de Hesíodo e a Biblioteca de Apolodoro, Gaia (Terra) teria emergido do Caos e gerado, de modo espontâneo, três descendentes: Uranos (o Céu), as Montanhas e Pontos (o Mar). Em seguida, da união de Gaia e Uranos nasceram os Titãs, os Ciclopes e os Hecatonquiros. Devido ao caráter violento de seus filhos, Uranos os isolava e os mantinham distantes da criação, nas entranhas da Terra. Descontente com a condição subordinada de seus filhos, Gaia arquiteta um atentado contra o deus-Céu. [...], convence os Titãs que ataquem o pai e fornece a Cronos uma foice de aço. Eles todos, exceto Oceano, o atacaram; Cronos cortou os testículos do pai e os jogou no mar [...]. E depois de destronarem Uranos, {os Titãs} fizeram voltar do Tártaro os seus irmãos e entregaram o governo a Cronos (HESÍODO, 1996, Teogonia: L. II, 4). Conforme Eliade (1972), a mitologia grega localiza esse evento como ocorrido em um tempo mítico, período em que as forças celestes e telúricas se encontram pela primeira vez e constituem as primeiras criaturas viventes. Assim, para o mitólogo, a cosmogonia é anterior ao tempo, anterior a tudo, pois é exatamente o momento em que uma realidade passa a existir. Para exemplificar sobre a estrutura dos mitos cosmogônicos utilizando mitos de outras culturas, elencamos a mitologia nórdica. Os mitos cosmogônicos nórdicos, relatados no Poema Voluspá da Edda Poética, contam que no princípio não havia nada além de um enorme abismo mágico e duas regiões isoladas. A primeira dela, Niflheimr, era representada pelo gelo e a neblina e relacionada ao mundo dos mortos de onde corriam 11 rios, a segunda, Múspel, era representada como a claridade e a luz, era também protegida pelo gigante Surtr. Quando o gelo de de Niflheimr derreteu devido ao calor de Múspel emergiu o grande Ymire, a vaca nutridora Auðhumla. Ao passo que o animal lambia o gelo nasciam três seres: Oðinn, Vile e Vé. Eles exterminaram o gigante Ymirque, ao sangrar demais, causou o afogamento de todos os gigantes. Apenas um deles escapou da morte, acompanhado de sua mulher, no entanto seu corpo desmembrado passou a constituir toda a estrutura do universo. “De sua carne formaram a terra, seus ossos deram origem aos rochedos, de seus cabelos foram formadas as nuvens; do sangue derramado surgiu o mar e do seu crânio o firmamento” (LANGER, 2009, p. 133). A narrativa é comparada por alguns historiadores ao mito bíblico da origem do Universo, registrado no livro de Gêneses. A narrativa conta que no princípio não havia nada, só o verbo que era Deus, e todas as coisas se formaram em sete dias, a partir da sua palavra. Ainda cabe destacar que mitos cosmogônicos que se baseiam no suplício pelo esquartejamento do corpo de um gigante em um tempo mítico, para origem do céu, terra, montanhas, rios e mares são identificados em outras culturas. Um exemplo é o Rigveda da Índia antiga, na figura de Purusa (Homem primordial), nos mitos de Tiamat e de P’na-ku (ELIADE, 1972). Essa postura analítica que busca encontrar estruturas comuns em narrativas mitológicas de culturas diferentes é uma abordagem metodológica encontrada nas mitologias comparadas, amplamente utilizada por historiadores e cientistas das Religiões da contemporaneidade, como Cruz (2007, p. 2), para quem: Os mitos cosmogónicos apresentam uma série de diversidades, mas as suas estruturas são semelhantes,ou seja, são triádicos. Eles partem de um ponto unitário original, de onde emergem em dois elementos que se contrapõem, um ativo (masculino) e o outro passivo (feminino). Esta contraposição de elementos (masculino/feminino – ativo/passivo) repete-se em todos seres do cosmo, e todos eles tendem a buscar a unidade perdida. A pesquisadora Rosa Maria Marangon (2007) parte do mesmo pressuposto teórico de Eliade ao admitir que os mitos cosmogónicos se diferem dos mitos de origem. Para ela, os primeiros revelam o surgimento do Universo, enquanto os outros fundam uma situação nova. Na perspectiva adotada, estes últimos servem para continuar e integrar o mito cosmogónico e, como estão contidos nele mesmo, quase sempre se iniciam com uma descrição da cosmogonia. Os mitos cosmogónicos são geralmente atualizados nos rituais por remeterem a um tempo original, forte, sagrado. O mito de origem só tem sentido quando explicado através da cosmogonia que seria o seu estado anterior. Qualquer coisa se origina depois que o mundo já estava formado. A origem de qualquer coisa está intimamente ligada à ideia de criação desta coisa (MARANGON, 2007, p. 4) A pesquisadora Ocean Malandra (2015) defende que, independentemente dos mitos serem histórias verdadeiras ou não, sua função é transportar uma sabedoria que opera como uma verdade metafórica. Para ela, os mitos são ilustrações de verdades no fazer, o que pode significar a personificação de objetos e/ou forças que em outras realidades seriam consideradas inanimadas. Ela destaca que o mito não somente explica, mas também atribui um significado existencial para os eventos básicos da vida. É o que também postula a pesquisadora Davidson. A mitologia de um povo é muito mais que uma coletânea de fábulas bonitas ou assustadoras recontadas em estilo articulado às nossas crianças na escola. É o comentário de homens de uma era ou civilização específica sobre os mistérios da existência e da mente humana, seu modelo para um comportamento social e a tentativa de definir, em histórias de deuses e demônios, sua percepção das realidades interiores. Podemos aprender muito com as mitologias dos povos antigos, se tivermos a humildade de respeitar estilos de pensamentos muitos diferentes dos nossos. Em muitos aspectos podemos ser mais inteligentes que eles, mas não necessariamente mais sábios (DAVIDSON, 2004, p. 7). Neste tópico buscamos conceituar os mitos cosmogônicos e os mitos de origem, a partir de noções teórico metodológicas difundidas nas pesquisas de História das Religiões e Religiosidades. Elucidamos que é amplamente utilizada a perspectiva analítica de que esses mitos se diferem e são classificados de modo distinto, sendo o segundo tipo dependente e extensão do primeiro. No próximo tópico abordaremos algumas funções sociais dos mitos, bem como os modos como eles são operados analiticamente em nosso campo de atuação. SAIBA MAIS Caro(a) estudante, você já havia parado para pensar que podemos considerar a teoria do Big Bang, produzida pela ciência atual, como um mito cosmogônico? Segundo esta teoria, o Universo teria surgido de uma grande explosão há cerca de 13 bilhões de anos. É uma narrativa tão verdadeira e explicativa da criação do Universo como outras. Agora que já compreendemos que o mito não é uma fábula ou uma mentira, podemos dizer que a ciência é um tipo de mito, sem desconsiderar sua credibilidade e importância para a humanidade. #SAIBA MAIS# REFLITA “A história é nosso mito”, “combina o ‘pensável’ e a origem, de acordo com o modo pelo qual uma sociedade se compreende”. Fonte: Certeau (1982, p. 33) #REFLITA# 3 OS MITOS E A HISTÓRIA CULTURAL, POSSIBILIDADES DE ABORDAGENS METODOLÓGICAS Olá, prezado(a) estudante! Nesse tópico iremos elencar algumas posturas teóricas e metodológicas acerca das estruturas e funções dos mitos, a partir dos estudos de Religiões e Religiosidades. Refletiremos também sobre como a História Cultural tem se apropriado dos mitos como fonte para pesquisa de diferentes temas em tempos e espaços distintos. Desse modo, apresentaremos como pesquisadores desse campo têm sistematizado o conhecimento acerca dos usos sociais dos mitos e os classificados a partir de contextos sociais, culturais, políticos e religiosos. Iniciamos esse estudo destacando que, utilizando o método da mitologia comparada e privilegiando os mitos gregos, solidificaram-se estudos marcadamente eurocêntricos, que focam em elementos tais como a vida agrícola, o poder, a realeza e a guerra. Para alguns críticos, isso é problemático, porque tais planos são pertinentes à cultura eleita como modelo, mas podem não ser quando aplicadas a civilizações historicamente distintas. Por exemplo, o mito agrário não se adapta às sociedades caçadoras (VERNANT, 1995, p. 49). Tendo isso em vista, é importante destacar que o historiador das Religiões deve sempre levar em consideração não somente as estruturas mitológicas de sociedades antigas entre si, mas suas estruturas econômicas, políticas, culturais, religiosas. É o que defende Detienne (2004) na obra Comparar o incomparável. Nesse trabalho o historiador advoga na defesa de uma construção de elementos comparáveis de um modo experimental. O pesquisador helenista Jean-Pierre Vernant e o historiador norte- americano Moses Finley, em algum momento de suas carreiras profissionais, se dedicaram à mitologia comparada também, mas a rejeitam à posteriori diante das limitações metodológicas e optam por continuar uma pesquisa dentro dos quadros de uma história nacional. A esse respeito, Detienne (2004) indica que o exercício da comparação deve iniciar-se pela escolha de um elemento específico que não seja muito particular. Desse modo, pode aplicar-se a contextos distintos. Comparamos entre historiadores e antropólogos para construir comparáveis, analisar microssistemas de pensamento, esses encadeamentos que decorrem de uma escolha inicial, uma escolha que temos a liberdade de apresentar ao olhar de outros, escolhas exercidas por sociedades que, no mais das vezes, não se conhecem entre si (DETIENNE, 2004, p. 65). Vejamos o exemplo de alguns mitos iorubás para tratar de tal questão, a importância de localizar a narrativa mitológica em seu contexto. Um deles narra que Obatala, a grande divindade criadora, veio a existir da contração de uma Ia Mi Oxorongá, que seria o próprio ventre universal e a expressão da totalidade. Ela seria a interioridade e a absorção, ele seria a exterioridade e a atividade, por isso ocuparia o mundo como a sabedoria criativa na criação (CARNEIRO DA CUNHA, 1984). É possível atestar que algumas perspectivas da cultura iorubá não se dobram à noção de complementaridade do feminino com o masculino, mas sim sobre o feminino, pois considera o masculino o próprio feminino, apenas com uma função diferencial. José Marianno Carneiro da Cunha (1984, p. 9) afirma que a Iá Mi Oxorongá: [...] é o poder em si, ela tem tudo dentro de seu ser. Ela pode tudo. Ela é um ser autossuficiente, ela não precisa de ninguém, é um ser redondo primordial, esférico, contendo todas as oposições dentro de si. Elas são andróginas, elas têm em si o bem e o mal. [...] Elas têm a feitiçaria, antifeitiçaria, elas têm absolutamente tudo. O antropólogo Pierre Verger (1994, p. 16) aponta que “na região ioruba, as atividades das feiticeiras [Iá Mi Oxorongá] ligam-se aos orixás, e aos mitos da criação do mundo”. Ou seja, o grande criador do mundo só existe porque elas sempre existiram. Podemos conjecturar que muitas dessas noções ontológicas e cosmológicas da mitologia ioruba foram apagadas na difusão cultural para dar lugar ao masculino, por influência das disputas e hierarquizações de gênero que privilegiam a cultura patriarcal. Do mesmo modo, a retomada das narrativas mitológicas que atribuem grande importância ao femininodeve-se às disputas de conferir maior importância à mulher na sociedade contemporânea. Não só o papel desempenhado pelas Iá Mi na mitologia, mas também das guerreiras Obá, Oxum e Iansã, por exemplo, o feminino é associado à fertilidade, força, astúcia e independência. Iansã é definida como aquela que, além de lutadora aguerrida, é capaz de se disfarçar de animais e comandar tempestades. De acordo com os mitos, ela é a grande guerreira que comanda os ventos: “É livre e violenta como a tempestade que ela comanda” (AUGRAS, 1983, p. 150). Mitos como “Oiá recebe o nome de Iansã, mãe dos nove filhos (PRANDI, 2001, p. 294), “Oiá transforma-se num búfalo” (PRANDI, 2001, p. 297), “Oiá é disputada por Xangô e Ogum” (PRANDI, 2001, p. 307) demonstram o feminino associado a aspectos como poder, transformação e fertilidade. Isso se dá porque, na organização social ioruba, as mulheres desempenhavam diversas funções na vida pública, dividindo espaços de poder com os homens (VERGER, 2002). Elucidar esses valores socioculturais e políticos presentes na sociedade ioruba nos auxilia a compreender melhor a respeitável posição feminina na mitologia dos orixás. Tais aspectos, diferente dos sentidos atribuídos às representações judaico-cristãs, como o mito da Mãe de Jesus, não são associadas somente à virgindade, pureza ou submissão. Os mitos narrados em uma cultura correspondem ao que ela considera pertinente à vida, em um tempo e espaço específicos e em sua roupagem, portanto, condizente ao ambiente e à condição histórica. Eles aparelham questões universais no tocante à existência humana e influenciam a vida de todos, legando procedimentos para um bom viver. A mitologia se apresenta por meio de narrativas que se articulam entre si e que se repetem ao longo dos tempos, fornecendo símbolos à humanidade. Servem de metáforas para as preocupações e anseios humanos (CAMPBELL; MOYERS, 1990). A História Cultural tem sido um terreno fecundo para o estudo das mitologias na contemporaneidade. Esse campo da história objetiva reconhecer a maneira como, em diferentes espaços e temporalidades, certa realidade social é produzida, observada, dada a ler. Nesse contexto, se inserem as representações sociais. Podemos conceber uma história cultural que “tome por objetivo a compreensão das representações do mundo social, que o descrevem como pensam que ele é ou como gostariam que fosse” (CHARTIER, 1990, p. 19). As representações são dispostas de acordo com as orientações dos grupos sociais que as concebem e com suas visões de mundo. Elas são manifestadas por padrões, normas, instituições e imagens. Constituem-se em objetos capazes de substituir na memória o outro ausente, ao mesmo tempo que revelam sua presença como a apresentação pública de algo ou alguém (CHARTIER, 1990). As narrativas mitológicas são tomadas pelos historiadores das religiões como fonte para identificar questões fundamentais de uma cultura. Não somente por ser um resultado de reflexos sociais, mas também para compreensão sobre como elas podem ser compreendidas e ressignificadas em seu tempo histórico. Ou seja, a roupagem que uma mitologia assume em um tempo, espaço e cultura definida indica uma perspectiva de verossimilhança, efeito de real e encarnam noções de imaginários possíveis das divindades e seu caráter, por exemplo. É o que Sandra Pesavento (2006, s.p.) denomina como verdade do simbólico. A literatura é narrativa que, de modo ancestral, pelo mito, pela poesia ou pela prosa romanesca fala do mundo de forma indireta, metafórica e alegórica. Por vezes, a coerência de sentido que o texto literário apresenta é o suporte necessário para que o olhar do historiador se oriente para outras tantas fontes e nelas consiga enxergar aquilo que ainda não viu. A pesquisadora Malandra (2015) afirma que a função dos mitos não é somente outorgar uma sequência de fatos explicativos do começo do cosmos e da sociedade, mas oferecer um contexto harmonioso e significativo que justifique as circunstâncias do presente. Conforme a autora, o mito opera como lição alegórica e como aviso que determina uma conduta adequada. Para demonstrar isso, ela cita diversas narrativas, inclusive a do Jardim do Éden, na qual se sublinha a liberdade do ser humano em escolher comportar-se de forma desarmoniosa relativamente à criação original. Em sua visão, esses mitos funcionam tal qual uma telenovela divina, em que as ações harmoniosas e desarmoniosas entre deuses servem de metáfora para as razões que explicam certos eventos da esfera mundana. Ainda sobre as funções dos mitos, passamos ao mitólogo Campbell (1990), que as sistematiza em quatro principais. São elas: a Função Mística ou Metafísica, a Função Cosmológica, a Função Sociológica e a Função Psicológica ou Pedagógica. A primeira designa a função religiosa da mitologia, que desperta na psique humana um sentimento de assombro. Quer concebamos a mitologia em termos da afirmação do mundo como ele é, da negação do mundo como ele é ou da restauração do mundo ao que deve ser, a primeira função da mitologia é de despertar na mente um sentimento de assombro perante essa situação mediante uma entre três formas de participar dela: exteriorizando, interiorizando ou efetuando uma correção (CAMPBELL, 1990, p. 18). A segunda é da ordem cosmológica, e liga o ser humano à realidade por meio de uma imagem consistente do universo, apresentando as sociedades como pertencentes à ordem cósmica. A terceira função de ordem sociológica, legitima e respalda uma ordem moral específica: “por meio desta terceira função, a mitologia reforça a ordem moral moldando a pessoa às exigências de um grupo social específico geográfica e historicamente condicionado” (CAMPBELL, 1990, p. 20). A última função, chamada de psicológica ou pedagógica possibilita: [...] conduzir o indivíduo através dos vários estágios e crises da vida, isto é, ajudar as pessoas a compreender o desdobramento da vida com integridade. Essa integridade supõe que os indivíduos experimentarão eventos significativos a partir do nascimento, passando pelo meio da existência até a morte em harmonia, primeiramente com eles mesmos, em segundo lugar com sua cultura, em terceiro lugar com o universo e, finalmente, com aquele que transcende a eles próprios e a todas as coisas (CAMPBELL, 1990, p. 20). O mito permite entender que o mundo, o homem e a vida têm todos uma origem e uma história e que é através dele que dado indivíduo pode sair da contemporaneidade, do tempo cronológico e introduzir-se no tempo primordial, vivendo e experienciando pela primeira vez um certo evento. Essa história transforma-se, assim, em algo relevante e inspirador. Para apresentar ainda outra perspectiva teórica sobre as funções dos mitos convocamos Bronislaw Malinowski (apud CRIPPA, 1975, p. 16), para quem: O mito, quando estudado ao vivo, não é uma explicação destinada a satisfazer uma curiosidade científica, mas uma narrativa que faz reviver uma realidade primeva, que satisfaz a profundas necessidades religiosas, aspirações morais, a pressões e a imperativos de ordem social, e mesmo a exigências práticas. Nas civilizações primitivas, o mito desempenha uma função indispensável: ele exprime, enaltece e codifica a crença; salvaguarda e impõe os princípios morais; garante a eficácia do ritual e oferece regras práticas para a orientação do homem. O mito, portanto, é um ingrediente vital da civilização humana; longe de ser uma fabulação vã, ele é ao contrário uma realidade viva, à qual se recorre incessantemente; não é absolutamente uma teoria abstrata ou uma fantasia artística, mas uma verdadeira codificação da religião primitiva e da sabedoria prática. Conforme os estudos de Religiões e Religiosidades, as pessoas comumente relacionam o mito a algo distante de suas realidades, como a fantasia que só os menos intelectualizadosvivenciam ou vivenciaram. Contudo, de acordo com a teoria apresentada até o momento, cabe posicionar muitas narrativas míticas ao cotidiano contemporâneo, ainda que esses mitos sejam atualizados pelas modificações sociais, econômicas, políticas e até mesmo religiosa. A obra A psicanálise na Terra do Nunca: ensaios sobre a fantasia, de autoria de Diana Corso e Mario Corso, nos auxilia nessa compreensão. Um exemplo disso é o mito de João e Maria, que se relaciona à economia. Conta-se que as duas crianças foram abandonadas na floresta porque eram muito gulosas. Tendo comido até as paredes da própria casa, foram punidas com o abandono. A questão da fome e do abandono infantil era muito mais presente no período medieval do que apressadamente cogita o senso comum. A noção de infância nesse período não era como a que temos nos dias atuais, as crianças eram tidas como pequenos adultos. Ainda podemos verificar nessa narrativa algumas doutrinas religiosas que indicam que o ser humano não pode ser guloso e que a gulodice é pecado, devendo ser evitada, assim como qualquer forma de excesso (CORSO, D.; CORSO, M., 2011). Outro exemplo que a pesquisadora aponta é o do mito da Terra do Nunca: A Terra do nunca pode ser um lugar existente e muito ativo, capaz de ir ao encontro de seus visitantes, mas ao mesmo tempo eles sentem-se participantes dele antes mesmo de colocar seus pés ali. A familiaridade com essa terra mágica é comum para qualquer criança que brinque e para as pessoas crescidas que tiveram infância. Frequenta-se esse lusco fusco entre o que está fora e dentro da nossa cabeça toda vez que se brinca e sempre que se sonha (CORSO, 2011, p. 24). Para explorarmos um pouco mais sobre as narrativas míticas na contemporaneidade trazemos a obra fílmica Novíssimo Testamento (que poderia inclusive ser utilizada como recurso para discutir o tema em sala de aula). O filme é narrado em primeira pessoa, por Ea, que busca transformar o mundo em que vive. Ela é filha de Deus, o todo poderoso, quem decide sobre o futuro da humanidade com um comando do seu computador. Esse também teria sido o modo como ele criou o universo, mais por tédio do que para ter uma criação para cuidar. Sua esposa é maltratada por ele, passiva e submissa, J.C. o filho mais velho foi embora, sua filha não aceita a naturalização da violência e invade o computador para mudar a história do mundo. Para isso conta com ajuda de algumas pessoas, os discípulos, que possuem uma conduta moral nada exemplar. Em seguida ela foge de casa, seu mundo, para o convívio das pessoas do mundo externo, coisa inédita em sua vida. A historiadora Vanda Fortuna Serafim (2017) utiliza o filme como narrativa que reatualiza mitos judaico-cristãos e revela algumas questões sobre as crenças contemporâneas. Destaca também o retorno da Deusa como aspecto cada vez cada vez mais presente nos mitos. Ao ir para o mundo atrás de Ea, os poderes de Deus são anulados, ele é um simples humano que para os demais, pensa que é Deus. Já não onipotente, onisciente e onipresente. É fraco, franzino, estúpido, arrogante e prepotente. Suas contínuas tentativas de ser Deus sendo homem geram o riso [...] Nos divertimos com a desgraça de Deus, uma vez que ele seria responsável pelas nossas desgraças. Deus não é o todo poderoso, ele sequer tem poderes, não consegue fazer milagres. A sua autoridade está na manipulação por meio de um computador e na intervenção destruidora na vida das pessoas. Como um Deus assim se mantem no poder? Dentro de uma família patriarcal, onde a mãe, anteriormente Deusa, sofre abusos constantes e é silenciada. O filho, Jesus Cristo, tenta desafiar o pai, mas não se desvincula totalmente deste. É a filha, Ea, ocultada das narrativas que toma as dores da mãe, do irmão e de si mesmo, após ser espancada pelo pai pelo fato de questioná-lo, que subverte a ordem do pai. Ao instaurar ao caos, ela abre espaço para que a mãe reassuma o poder e se inicie uma nova era, mais colorida e leve (SERAFIM, 2017, p. 100). Tendo discutido no presente tópico: as diversas funções dos mitos, a depender da postura teórica que se assume para analisá-los; a prática metodológica de perceber as comunalidades ou particularidades dos mitos, como a mitologia comparada; a História Cultural como exemplo de abordagem historiográfica contemporânea que atribui importância ao estudo dos mitos, tidos como representação do imaginário da sociedade que o produz; alguns exemplos de reatualização dos mitos na contemporaneidade, concluímos a reflexão destacando que o historiador não é orientado a olhar para os mitos preocupando-se em assumi-los como verdade ou mentira, mas para entender como quem os produziu acredita que são expressivos e pertinentes. Agora que temos algumas premissas básicas sobre o tema, passaremos no próximo tópico por alguns mitos que reverberam em nossa cultura nacional. SAIBA MAIS Muitos historiadores utilizam o cinema como fonte histórica para pensar os mitos e as suas funções na cultura. A obra fílmica tem sua legitimidade como fonte porque é uma construção histórica e cultural, como texto passível de ser utilizado como instrumento de compreensão de diversas questões. Além disso, o texto fílmico pode ser utilizado como poderoso recurso didático-pedagógico para auxiliar na compreensão de conceitos e ideias baseados em textos convencionais. #SAIBA MAIS# REFLITA “Uma das características do mito é seu caráter muitas vezes liminal. Com isto queremos dizer que o mito é de tal natureza que, sob o prisma destes conceitos, pode mesmo justapô-los. O filme The Matrix pode ser um exemplo conhecido disto no qual, em meio à uma série de motivos religiosos ao longo do filme, inclusive escatológicos, o herói Neo repete o destino religioso do Cristo crucificado e inaugura uma nove era”. Fonte: Rosário (2007, p. 9). #REFLITA# 4 MITOS AFRO-BRASILEIROS E INDÍGENAS NA SALA DE AULA Olá, caro(a) estudante, retomamos nossos estudos no presente tópico nos aproximando de narrativas míticas de diferentes culturas. Considerando a formação étnico racial do Brasil, os processos de hierarquização de tais saberes que legitima as bases eurocêntricas em detrimento de outras, e as leis que evocam o estudo da cultura afro-brasileira (10.639/2003) e indígena (11.645/2008), daremos maior enfoque aos mitos dessas populações, refletindo também sobre como eles estão presentes e norteiam crenças em nossa sociedade. Para dar início ressaltamos que falta de conhecimento sobre as religiões afro- brasileiras e a cristalização de uma imagem negativa de suas expressões, amplamente associadas à feitiçaria, foi um recurso utilizado historicamente para marginalizá-las. Por isso, falar das divindades africanas enquanto personagens míticos afro-brasileiros ainda se apresenta como um grande desafio. As narrativas míticas afro-brasileiras foram esquecidas e silenciadas. É perceptível como os mitos africanos e também os indígenas não têm o mesmo reconhecimento social ou desdobramentos que tiveram os mitos nórdicos e greco-romanos na cultura ocidental. Sua difusão ficou limitada aos terreiros e aldeias, o que as impossibilitou de obter um caráter de embasamento filosófico e epistemológico, como ocorrem com narrativas míticas de regiões europeias e orientais. Para os adeptos das tradições iorubas, o mito é a chave para alcançar não apenas o passado, mas também o presente e o futuro. O mito ensina quem são as divindades, quais são seus poderes e regências, de onde elas vieram, quais são as suas preferências e interdições e como o homem religioso deve se relacionar com elas. No imaginário iorubano tradicional de mundo, a mitologia fornece sentidos fundamentais para a vida na terra. É ela quem organiza e estrutura a religião dos orixás. Os orixás são os ancestrais divinizados, e os mitos, as narrativas que se repetemciclicamente de geração em geração na vida de seus descendentes (PRANDI, 2001). Os iorubas acreditam que o homem descende dos orixás e cada ser humano tem uma linhagem que se refere a um ancestral específico. Cada um herda do seu orixá os seus atributos, predisposições e intentos, de acordo com o que conta os mitos. Os orixás se regozijam e se entristecem, perdem e vencem, avançam e retrocedem, amam e odeiam. Essas narrativas míticas estão bastantes presentes na estrutura do candomblé, pois se trata de uma oralidade oriunda da Costa Ocidental da África, disseminada para regiões de outros continentes, inclusive o Brasil, na diáspora provocada pelo tráfico escravista (PRANDI, 2001). Os mitos itans em ioruba foram disseminados no Brasil, e se constituem também como mitos Afro-brasileiros, a partir da memória coletiva de homens e mulheres, na condição de escravos. A mitologia foi um dos elementos transmitidos por esse grupo, detentor de uma gama de conhecimentos litúrgicos e ritualísticos, que daria posteriormente origem ao culto dos orixás no país. O primeiro exercício de sobrevivência efetuado pelos africanos deportados no Brasil, assim como em toda diáspora, foi talvez o de buscar recompor o tecido cultural africano que se desteceu pelos caminhos, recolher fragmentos, traços, vestígios, acompanhar pegadas na tentativa de reelaborar, de compor uma cultura de exílio refazendo a sua identidade de emigrante nu[2] (GLISSANT, 1996, p. 15). Conforme a escritora Conceição Evaristo (2009, p. 3), “nas sociedades ágrafas, a poesia conta/canta a tradição, os mitos de fundação, as histórias, os provérbios, a sabedoria. O canto poético planta e rega a memória coletiva”. O candomblé, como uma ferramenta de disseminação dessa memória coletiva, se constituiu a partir de tradições orais, baseadas nos mitos, ritos e símbolos, e não em uma sistematização teórica de suas manifestações espirituais. Conforme Sérgio Paulo Adolfo (2000, p. 2), “As cantigas revelam a composição do enredo do Orixá ou do Inkice, enumeram as suas qualidades, tecem loas aos seus feitos e às suas habilidades e vitórias”. Por isso, para conhecermos alguns aspectos dessa religião, reconhecermos sua legitimidade, mesmo sendo historicamente marginalizada, é importante conhecer os mitos dos orixás. Esses itans são poemas seculares que narram sobre a vida em sociedade, elementos da natureza, a criação do mundo e sua divisão entre orixás (PRANDI, 1999). A importância do mito, segundo essa cosmovisão, é que ele ajuda a interpretar o presente e produz o futuro nessa vida e nas outras. Os mitos dão voz às experiências vividas pelos ancestrais, colaboram na construção da identidade religiosa e constroem uma memória coletiva a partir das vivências partilhadas. O mito opera categorias do tempo forte, longínquo e do tempo do sagrado e está imerso na vida dos adeptos da religião, cotidianamente, cuja concepção aproxima o profano e o sagrado (PRANDI, 2001). No caso do Brasil, conjectura-se que a mitologia ioruba é a mais disseminada, porque esse grupo étnico-linguístico foi um dos últimos a serem trazidos para o país, no ciclo da Costa da Mina, no século XVIII, e no ciclo da baía de Benin, entre 1770 e 1850 (VERGER, 1987). Os iorubas também teriam sido empregados em setores urbanos e domésticos, em sua maioria, na cidade de Salvador. Isso teria lhes dado alguma facilidade, em relação aos bantus, para preservar sua língua e religião. O que, na visão dos intelectuais do período, configurou uma superioridade dos iorubas (CASTRO, 2001). O arcabouço narrativo e poético de matriz africana interage no cotidiano dos afro-brasileiros até os dias atuais. Com a inserção em religiões Afro-brasileiras o neófito passa gradativamente a conhecer os mitos que dão sentidos aos ritos que participa. Tradicionalmente repassados de modo oral, os mitos podem ter diferentes versões, não sendo uma mais legítima que a outra. Mas sim, tendo modos diferentes de contar uma mesma saga mítica. Mitologia dos orixás é a coletânea com maior número de mitos registrados no Brasil pelo sociólogo Reginaldo Prandi (2001), contém 301 mitos de orixás. É uma obra de grande importância para a formação docente comprometida com a diversidade e o respeito às diferenças culturais e religiosas. Na obra citada cada divindade recebe um capítulo no qual são narrados seus itans. São em média 16 orixás que constituem o panteão dos orixás no Brasil. Eles estão todos presentes na obra, que colabora com a construção de sentido atribuído a eles, são: Exu (o mensageiro), Ogum (o general e ferreiro), Oxóssi (o caçador), Ossaim (dono das plantas), Obaluaiê (senhor da cura), Oxumaré (que se manifesta no arco íris), Iansã (rainha dos raios e tempestades), Xangô (senhor da justiça), Oxum (dona da fertilidade), Logun Edé (senhor da pesca e da caça), Obá (amazona guerreira), Ewá (dona dos horizontes), Yemanjá (mãe de todos), Nanã (senhora da morte), Oxaguiã (guerreiro do branco) e Oxalá (senhor da paz). Figura 1 - Dezesseis orixás mais conhecidos do Panteão Afro-brasileiro Fonte: Lifestyle (2018). Um modo de trabalhar tal questão em sala de aula é estudando cada um deles focando em suas características gerais, como as cores que os representam, símbolos, ferramentas, elementos da natureza, dia da semana em que são cultuados, comida associada à cada um, dentre outras especificidades. Partindo do mesmo pressuposto, destacamos a importância do conhecimento acerca das mitologias indígenas. Para pensar sobre a mitologia indígena, em especial tendo como referência os Guarani, é de suma importância considerar a dimensão poética. Os mitos cosmogônicos desse grupo étnico-racial narram que o mundo foi criado misteriosamente entre o vazio e o silêncio. Tupã Tenondé, o Grande Pai Primeiro, é Espírito-Música, gerador de vidas e manifestado na forma de um colibri: “Ñande Ru Pa-paTenondé guete rã ombo-jerapytuymagui. Nosso Pai Primeiro criou-se por si mesmo na Vazia Noite iniciada” (JECUPÉ, 2001, p. 25). Na obra Tupã Tenondé, do escritor Kaká Werá Jecupé, encontramos revelações das palavras do que para os Guarani é vivenciado e transmitido pelos grandes pajés em torno da fogueira. Jecupé, descendente de um grupo Tapuia e não tendo nascido Guarani, tornou-se por meio de processos iniciáticos. Escritor, político e ambientalista, Jecupé discursa sobre a importância da demarcação de terras indígenas como meio de assegurar o equilíbrio da natureza e a qualidade de vida não somente local, mas sim global. Kaká Werá Jecupé propõe o ensino de história e cultura indígena nas escolas através da vivência dos mitos, cantos e danças. Segundo Kaka Werá Jecupé (2001), a sabedoria ancestral deve ser difundida e transmitida pelas palavras que falam do Universo, da Terra e do Homem de uma maneira poética e profunda, inerente à tradição oral indígena. Ayvurapyta rã i oguero-jera i mavy, mborayú petei i oguero-jera i mavy, o yvárapymba’ekuaágui, o kuaa-ra-ravymamba’e-a’ãrapyta petei i oguero-jera. Yvyoikoeỹre, pytũymambytere, mba’ejekuaáeỹremba’e-a’ã petei i oguero-jeraojeupe. Os fundamentos do ser desabrocham-se, havendo criado de uma pequena porção de amor, da sabedoria contida em sua própria divindade e em virtude de sua sabedoria criadora, e tendo originado um som sagrado de sua sagrada solidão. Antes de existir a terra, em meio à Noite Primeira e antes de ter-se conhecimento das coisas, originou-se um som sagrado criado da bem-aventurada solidão (JECUPÉ, 2001, p. 44). Conforme Kaka Werá Jecupé (2001), os Tupy-Guarani influenciaram múltiplos grupos étnico culturais e se concentravam em um território que ia da Amazônia ao litoral brasileiro. Palavras da linguagem tupi estão inseridas em outras línguas indígenas e muitas delas também compõem o dicionário português. Na cultura brasileira, ainda que fora das comunidades indígenas,encontram-se costumes, culinária, práticas curativas e “noventa por cento das fábulas, lendas e mitos conhecidos são de origem tupi” (JECUPÉ, 1998, p. 47). Desse modo, deve-se reconhecer que o Tupy-Guarani é uma base cultural importante na construção histórica do povo brasileiro, que apesar das violências estruturais, do massacre e da imposição de culturas europeias preserva até os dias atuais mitos que reatualizam seus valores e a sua cosmovisão sagrada. Para essa cultura, o desenvolvimento das culturas e das civilizações se dá com base na afinidade umbilical que interliga socialmente as pessoas aos reinos animal, vegetal e mineral, numa forma ampla de concepção familiar em que tudo se conecta na grande teia da vida. O pulsar de uma estrela na noite é o mesmo do coração. Homens, árvores, serras, rios e mares são um corpo, com ações interdependentes. Esse conceito só pode ser compreendido através do coração, ou seja, da natureza interna de cada um (JECUPÉ, 1998, p. 61). A visão de mundo para os Guarani considera a origem do cosmos, da natureza, do homem, do tempo, do espaço, dos fundamentos do ser. É história, numa concepção diferente da historiografia tradicional e religião diversa das concepções religiosas trazidas pelos não-índios ao Brasil. Dentro dessa cosmovisão existe o mito de Nandecy, a Mãe Terra, e os ciclos regidos por Jakaíra, Deus da névoa; Tupã, Deus do trovão e das águas; Karai Ru Ete, Deus do fogo; e Namandu, divindade responsável pela terra e por criar unidade entre os ciclos, que, por sua vez, mantêm a relação entre a natureza, o homem e o divino. Segundo Jecupé (1998, p. 58) “o índio surgiu desses ancestrais sagrados: sol, lua, arco-íris, terra, água, fogo e ar. Dos reinos vegetal, animal, mineral”. Para eles o mundo espiritual é dividido em quatro moradas: Tabela 1 – Demonstrativo da divisão do mundo espiritual para os Tupi Ambá Namandu Morada dos Espíritos Anciões Ambá Jakairá Morada dos Espíritos Brumas Ambá Karai Morada dos Espíritos Fogos Ambá Tupá Morada dos Espíritos Trovões Fonte: a autora. Para tentar compreender um pouco do modo de ser indígena, é necessário que o não-índio se dispa de sua lente etnocêntrica. Não cabe tentar fazer comparações ou medir valores conforme um modo de vida outro. A composição social, hierárquica e a relação com o espiritual, com o sagrado, são únicos de cada povo indígena, diversos entre e si e com pontos em comum também. Didaticamente, podemos utilizar os mitos em sala de aula para abordar a diversidade, os múltiplos modos de se compreender a história do mundo, bem como homens de diferentes tempos, espaços e culturas atribuem sentido a si mesmo e ao mundo. Nesse sentido é possível estabelecer alguns objetivos para esse trabalho: Identificar mitos africanos e indígenas em obras literárias; Descrever mitos e arquétipos das divindades africanas e indígenas em personagens da trama; Estabelecer correlação entre a narrativa mítica de origem africana e indígena e a lógica Ocidental de compreensão do mundo, relatando em que se aproximam e se distanciam; Perceber a mitologia africana e indígena impressa na literatura como condição de resistência de tais grupos. Tal atividade poderia promover uma práxis escolar que valorize a diversidade que existe em nossa sociedade. A seguir encontra- se uma imagem de grafismo indígena que também poderia ser utilizado em sala de aula para apreensão de seus símbolos associados aos mitos. Figura 2 - O alfabeto em Tupi-Guarani Fonte: Pinterest (2019). Nessa perspectiva, o trabalho incorreria de forma a reafirmar a identidade, problematizar os preconceitos e possibilitar uma nova configuração da realidade, pautada em princípios de equidade, como nos diz Machado (2007, p. 10) em seu artigo Mitos afro-brasileiros e vivências educacionais: Acreditamos que trabalhar com os mitos como prática educativa, pode se constituir em uma das possibilidades de se fazer configurar, finalmente, a identidade e a consciência pluricultural na escola, que atingirá seu objetivo de construir cidadãos autônomos e coletivos. SAIBA MAIS “Com Mitologia dos orixás, Reginaldo Prandi apresenta a maior coleção de mitos iorubanos e afro-americanos já publicada até hoje. Esta obra é resultado de um trabalho meticuloso de mais de dez anos, que envolveu uma vasta pesquisa bibliográfica (cerca de cem títulos) e também uma longa experiência de campo. Nada menos do que 42 histórias míticas foram colhidas pelo autor. No total, Prandi conseguiu reunir 301 mitos ¾ dos quais 106 seriam originários da África, 126 do Brasil e 69 de Cuba” Fonte: Hofbauer (2001, p. 251). #SAIBA MAIS# REFLITA A intérprete Elza Soares gravou, em 2015, uma música intitulada Exu nas Escolas. Existem alguns trabalhos que refletem sobre essa canção como uma reivindicação por uma educação democrática, que considere todas as formas de crenças. Contextualizando na crítica, por exemplo, a presença de símbolos como bíblias e crucifixos judaicos cristãos em espaços públicos. Se o estado é laico e as escolas públicas, um espaço de estudo da religião de modo não confessional, não seria plausível considerar que houvesse representações materiais de todas as religiões? #REFLITA# CONSIDERAÇÕES FINAIS Caro(a) estudante, concluímos aqui a incursão sobre o estudo dos mitos, proposto para a primeira unidade. Identificamos que existem diversos modos de se pensar e viver o mito como uma realidade complexa, como uma história verdadeira que funda o mundo e dá sentidos para ele. Compreendemos também que o mito de origem pode ser compreendido como uma continuidade do mito cosmogônico. No corpo desta unidade buscamos abordar diversas teorias e metodologias utilizadas para a análise do mito. Desde as contribuições mais específicas para a o uso das mitologias na historiografia, como Eliade (1972), Camplbell (1990) e Detienne (2004) entre outros, a estudos mais específicos de mitos de diferentes culturas, como Prandi (2001) e Jecupé (1998). Abordamos também a importância de se pensar o mito na escola e, desse modo, apreender e difundir um pouco mais sobre as múltiplas estruturas que sustentam a cosmovisão de diferentes grupos culturais. Sobretudo, destacamos a importância do estudo dos mitos Afro-brasileiros e Indígenas, bastante apagados na difusão cultural em detrimento das narrativas europeias. Com isso, concluímos nossa proposta inicial que foi estabelecer as disputas conceituais em torno do mito, compreender os tipos de mitos conceituados no campo de estudo das religiões e religiosidades e conceituar e contextualizar algumas narrativas mitológicas que fazem parte da cultura brasileira. Esperamos que, como esse conteúdo inicial, o tema suscite seu interesse e que busque outras obras e autores que possibilitem o seu desenvolvimento intelectual e uma formação sólida e singular. Bons estudos! LEITURA COMPLEMENTAR ● BENISTE, J. Mitos Yorubás: o outro lado do conhecimento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. ● GOMES, N. L. Alguns termos e conceitos presentes no debate sobre relações raciais no Brasil :uma breve discussão. In: GOMES, N. L. Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal nº10.639/03. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005, p. 39-64. ● ÒSÓSI, M. S. de. Òsósi: O Caçador de Alegrias. Salvador: Secretaria da Cultura e Turismo, 2006. ● PADILHA, L. C. A palavra africana e as memórias antigas. In: GONÇALVES, M. A. R. (Org.). Educação, Arte e Literatura Africana de Língua Portuguesa: contribuições para a discussão da questão racial na escola. v. 2. Rio de Janeiro: Quartet: NEAB - UERJ (Sempre Negro), 2007. ● PETROVICH, C.; MACHADO, V. IrêAyó: Mitos Afro - brasileiros. Salvador: EDUFBA,2004. LIVRO Título: Mitologia dos orixás Autor: Reginaldo Prandi Editora: Companhia das Letras Sinopse: Mitologia dos orixás, do sociólogo Reginaldo Prandi, é a mais completa coleção de mitos da religião dos orixás já reunida em todo o mundo. São 301 relatos mitológicos, histórias que contam, por meio de imagens concretas e não de ideias abstratas, como são, o que fazem, o que querem e o que prometem os deuses desse riquíssimo panteão africano que sobreviveu e prosperou em países da América – em particular no Brasil e em Cuba – e que nos últimos anos tem sido exportado para a Europa. Ao narrar episódios em que se envolveram deuses como Exu, Ogum, Iemanjá e Iansã, Mitologia dos orixás chama a nossa atenção para sentidos vitais profundos e nos aproxima do vasto patrimônio cultural dos negros iorubás ou nagôs. O livro é ricamente ilustrado, com fotos coloridas de todos os orixás que se manifestam em cerimônias do candomblé no Brasil e ilustrações do artista plástico Pedro Rafael. FILME/VÍDEO Título: O novíssimo testamento Ano: 2014 Sinopse: Deus (Benoît Poelvoorde) está vivo, mora em Bruxelas e é um senhor rabugento e malvado, com uma filha de 10 anos de idade. Cansada da natureza abusiva do pai, a menina invade o computador dele e envia para todos os habitantes do planeta as datas de suas respectivas mortes, ação que gera consequências inimagináveis. REFERÊNCIAS ADOLFO, S. P. A contribuição iorubana na ficção de Jorge Amado. Mar Morto: o mito recriado. X Congresso Internacional da ALADAA, 2000, Rio de Janeiro. Anais do X Congresso Internacional da ALAADA – Cultura, poder e tecnologia: África e Ásia face à globalização. Rio de Janeiro, p. 1-9, 2000. AUGRAS, Monique. O duplo e a metamorfose. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1983. BARTHES, R. Mitologias. 11. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. CAMPBELL, J. O herói de mil faces. São Paulo: Palas Athena, 1990. CAMPBELL, J.; MOYERS, B. O poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 1990. CASSIER, E. Ensaio sobre o homem: introdução a uma filosofia da cultura humana. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2001. CASTRO, Y. P de. Falares africanos na Bahia: um vocabulário afro-brasileiro. Rio de Janeiro: Topbooks, 2001. CERTEAU, M. de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982. CHARTIER, R. A História Cultural: Entre Práticas e Representações. Rio de Janeiro: Bertrand, 1990. CORSO, Diana Lichntenstein; CORSO, Mário. A psicanálise na terra do nunca: ensaios sobre a fantasia. Porto Alegre: Penso, 2011. CRIPPA, A. 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Objetivos de Aprendizagem: • Estabelecer as disputas conceituais em torno dos símbolos nas Ciência Humanas. • Analisar de que modo tem sido sistematizado o estudo dos símbolos no campo das religiões e religiosidades. • Apresentar algumas possibilidades de abordagens teórico metodológicas para o uso dos símbolos na pesquisa científica. • Conceituar e contextualizar símbolos que fazem parte da cultura religiosa
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