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66 67 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS CAPÍTULO 4 USO DIRETO DA MANIPUEIRA EM FERTIRRIGAÇÃO Roberto Antunes Fioretto1 4.1. INTRODUÇÃO Um dos sérios problemas ambientais como um todo é a poluição dos recur- sos de água doce, principalmente se considerados os pequenos cursos d´água onde acontecem os despejos dos resíduos líquidos de indústrias que utilizam raízes de mandioca como matéria-prima. A palavra poluição provém do latim “polluo”, que significa sujar, conspurcar, manchar. Considera-se poluição todo prejuízo aos usos previamente estabelecidos do meio ambiente (solo, água e ar), causados por alterações de suas propriedades físicas, químicas e biológicas, devido à ação de poluentes ou suas combinações. Cada indústria é um caso distinto e, entre indústrias do mesmo tipo, existem despejos diferentes. E possí- vel fazer uma equivalência entre a carga orgânica - DBO de despejos orgânicos gerados pela atividade industrial em relação à contribuição normal “per capita” de esgotos doméstico. Esta relação denomina-se População Equivalente. Consi- derando-se o índice de equivalentes populacionais em DBO (5º dia, 20º C) de 54g/habitante/dia, uma usina que utilize cana-de-açúcar equivale à poluição ocasionada por 300-450 habitantes, para cada tonelada de cana moída. Num grau de tecnologia inferior, mas não menos poluente, destacam-se os efluentes líquidos resultantes do processamento da mandioca para a fabricação de farinha e fécula, os quais podem atingir vazões da ordem de 500 litros de água residual por tonelada de raiz processada. O escoamento dessa água residual pode trazer sérios problemas de poluição em rios. Dessa forma, as indústrias de amido são consideradas altamente poluidoras, de maneira que uma fecularia que utilize uma tonelada de raízes de mandioca /dia, equivale à poluição ocasionada por 1 Professor Doutor da UEL – Universidade Estadual de Londrina – Paraná. fioretto@uel.br 68 69 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS 200-300 habitantes/dia, ao passo que nas farinheiras, cada tonelada de raiz pro- cessada, corresponde a um equivalente populacional de 150-250 habitantes. Conhecidas essas relações, chega-se assim ao principal parâmetro utilizado na avaliação das alterações ecológicas causadas pela poluição, que é o conceito de carga orgânica ou carga de DBO ou ainda carga poluidora. Essa carga depende da concentração de DBO existente no resíduo, isto é, a quantidade de oxigênio consumido, o qual não é diretamente exigido pelo composto orgânico, mas sim resultado da atividade respiratória de microorganismos que se alimentam dessa matéria orgânica; da quantidade de efluente que é lançada por unidade de tem- po, isto é, da vazão, e finalmente, da quantidade de oxigênio dissolvido que o rio transporta por unidade de tempo, o qual dependerá da temperatura da água, da altitude do local e da vazão do rio. 4.2. COMPOSIÇÃO DA MANIPUEIRA A composição química da manipueira é variável, dependendo da variedade utilizada, que por sua vez está correlacionada com as condições edafo-climáti- cas do local onde é cultivada. Uma tonelada de raízes de mandioca pode conter em média 600 litros de água (60% de umidade) como constituinte do suco celu- lar, onde, na operação de prensagem, durante os processos de fabricação de farinha, 20 a 30% dessa água é eliminada. A água da prensa, ou manipueira, é de aspecto leitoso. Caso não haja decantação ou uso de tecidos na prensa, podem conter de 5 a 7% de fécula (parte sedimentável, parte em suspensão coloidal), proteínas, glicose, restos de células, ácido cianídrico, bem como outras substân- cias orgânicas e nutrientes minerais essenciais. Uma estimativa da quantidade de macronutrientes na porção líquida da manipueira, a partir do processamento de uma tonelada de raízes, pode ser visualizada na Tab. 4.1. A Tab. 4.2 apresenta a composição química da manipueira de diferentes ori- gens, onde se pode observar uma predominância do potássio (K) entre os cons- tituintes minerais desse resíduo. Outro elemento essencial na nutrição vegetal é o fósforo, que se apresenta com teores razoável, três vezes maior em relação ao encontrado na vinhaça de caldo de cana, já que esse resíduo tem também sua aplicação na fertirrigação (Tab. 4.3).Portanto, pode-se depreender que a manipueira apresenta-se como um material não esgotado, podendo ser utilizada como fertilizante, de forma aproveitar e reciclar os nutrientes no solo, evitando- se, assim, os despejos nos cursos d´água. Tabela 4.1. Estimativa da composição química da manipueira, a partir dos macronutrientes exportados pelas raízes tuberosas. Designação Quantidade de nutrientes exportados pelas raízes Produção de Raízes 1 TM Umidade = 60% Elementos Extração (1 t raízes) extração (600 l h 2 O) Operação industrial Efluente líquido Elementos Composição química 180 litros Composição química 1 litro TM = toneladas de raízes de mandioca; ppm = partes por milhão (mg/l); meq = equivalente miligra- ma As águas das prensas, ou manipueira, carregam amido. Quando o processo conta com equipamentos eficientes, o amido é todo recuperado, restando ape- nas o amido solubilizado e os açúcares da raiz. Nas industrias pequenas e farinheiras o amido pode ser recuperado em canaletas de decantação, obtendo- se o chamado polvilho, reduzindo-se, assim, as quantidades de sólidos totais, bem como, diminuição da carga orgânica disponível. N P K Ca Mg S (Kg) (Kg) (Kg) (Kg) (Kg) (Kg) 2,12 0,22 1,71 0,66 0,36 0,09 % (ppm) (meq) (meq) (meq) (meq) 0,35 366,67 43.846,15 33.000,00 30.000,00 150 Prensagem Eficiência = 30% Manipueira 180 l Tonelada N P K Ca Mg S % (ppm) (meq) (meq) (meq) (meq) (0,11) (110,00) (13.156,84) (9.900,00) (9.900,00) (45,00) 0,11 110,00 73,08 55,00 50,00 45,00 70 71 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS Tabela 4.2. Composição química da manipueira, segundo vários autores. Elemento Autor Média 1 2 3 4 N (%) 0,15 0,15 0,21 0,09 0,15 P (ppm) 219,00 250,00 354,00 200,20 255,80 K (meq/l) 43,00 56,40 64,48 41,00 51,22 Ca (meq/l) 11,25 13,50 12,00 13,75 12,62 Mg (meq/l) 30,50 45,00 36,00 30,00 35,38 S (ppm) - - 210,00 64,00 (***) 137,00 Fe (ppm) 22,00 - - 11,20 16,60 Zn (ppm) 2,40 - - 5,00 3,70 Mn (ppm) 1,50 - - 9,80 5,65 Cu (ppm) 1,00 - - 0,81 0,90 Na (ppm) - - - 14,00 14,00 M. O (Kg/m3) (**) - 30,00 33,54 57,90 40,50 pH 3,27 (*) 4,20 3,90 4,00 4,03 (*)Acidez titulável (%);(**). Teores expressos no total de resíduo (parte líquida + parte sólida); (***) Sulfetos totais; - Sem informações As características dos despejos agroindustriais também apresentam-se diferentes, especialmente em função da eficiência operacional dos processos industriais. Tabela 4.3. Composição química média dos resíduos líquidos originados na industrialização da mandioca e da cana-de-açúcar. Composição Manipueira Vinhaça de caldo N (%) 0,15 0,03 P (ppm) 255,80 88,00 K (meq/l) 51,22 31,28 Ca (meq/l) 12,62 16,33 Mg (meq/l) 35,38 14,50 S (meq/l) 137,00 435,60 Fe (ppm) 16,60 69,00 Mn (ppm) 5,65 7,00 Zn (ppm) 3,70 2,00 Cu (ppm) 0,90 7,00 M. O (Kg/m3) 40,50 23,44 pH 4,03 3,70 A principal característica física da água residual está no seu conteúdo de sólidos totais, que são compostos de material flutuante (sólidos dissolvidos), material coloidal (sólidos coloidais) e material em solução (sólidos em suspen- são), conforme se verifica na Tab. 4.4. Tabela 4.4. Características dos despejos do processamento de mandioca Características Despejos do lavador (mg/L) Despejos das prensas (mg/L) Sólidos totais 3.000 70.000 Sólidos em suspensão 1.200 25.000 Sólidos dissolvidos 1.800 45.000 Sólidos sedimentáveis 5 50 DBO 1.500 30.000 Ácido cianídrico (HCN) 10 250 Do ponto de vista sanitário, com o lançamento desse tipo de efluente nos rios, principalmentenos pequenos cursos d’água, predominantes nas regiões onde se instalam as pequenas farinheiras ou até “casas de farinha”, tem-se um resíduo altamente poluente, devido não só a elevada carga de DBO, mas tam- bém a uma substância de efeito tóxico – o ácido cianídrico que diferencia esse dos demais resíduos agroindustriais. Essa manipueira apresenta dupla ação poluidora, pois o íon cianeto está presente na matéria-prima, associado a um açúcar como parte de um composto cianogênico, solúvel em água, denominado de linamarina. O ácido cianídrico livre não existe nas raízes antes de colhida, mas forma-se por ação de hidrólise enzimática sobre essa matéria nitrogenada. O processo de hidrólise inicia-se algumas horas após a colheita ou, por qualquer ferimento nos tecidos celulares da planta, colocando as enzimas em contato com o substrato (linamarina). O (CN) produzido é um dos mais violentos vene- nos conhecidos, que, apesar de ser volátil, pode dissociar-se quando dissolvido em águas com pH igual ou maior que 8 formando HCN ou cianeto livre. Eviden- temente, toxidez do íon cianeto é muito maior do que a do ácido cianídrico. Nos cursos d’água natural, o cianeto deteriora-se ou é decomposto por ação bacteriana, diminuindo as concentrações excessivas com o tempo. A degrada- ção bioquímica de cianetos é pouco afetada em temperaturas situadas na faixa de 10 a 35º C. Entretanto, em temperaturas maiores ou menores que esses limi- tes, a velocidade de decomposição é rapidamente aumentada. O limite de toxidez por cianeto para peixes tem sido tomado como 0,025 72 73 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS ppm; os microrganismos são geralmente mais tolerantes. Em função desse fato, os padrões de água potável estabelecem 0,01 ppm de cianeto, expressos em CN, como limite máximo permissível. Os efluentes mais poluentes provêm de indústrias que usam polissacarídeos como matéria-prima, por lançarem grandes quantidades de carboidratos solú- veis em rios. São comparáveis ao esgoto doméstico quanto ao consumo de oxi- gênio dos cursos d’água. A infiltração no solo é o processo de tratamento possí- vel, embora possa ocorrer risco de contaminação do lençol freático. O solo pode absorver bem as águas servidas nos meses secos, período em que se concentra a maior produção de mandioca industrial, coincidindo com uma época de menor precipitação pluviométrica em que a baixa vazão dos cursos d’água acentua os efeitos da poluição. Neste sistema são recuperadas as substâncias minerais ex- traídas pelas culturas, os lodos, e, antes de tudo, a própria água, como forma de reciclagem forçada.Em áreas atingidas pela manipueira, através de vazamentos tóxicos dessa água residual sobre plantas que ali se encontrem, pode ocorrer morte, independente da espécie. Após um certo tempo, a área cobre-se nova- mente de plantas que apresentam um novo vigor. Esse fato gerou a expectativa de se avaliar as conseqüências agronômicas de fertirrigação com esse resíduo, objetivando-se, num sentido amplo, as implicações nas condições químicas e microbiológicas do solo, assim como, a possibilidade de controle de plantas daninhas presentes na área. 4.3. EFEITO DA MANIPUEIRA NA FERTILIDADE DO SOLO A manipueira, apesar de se caracterizar como um efluente industrial, consti- tui-se num resíduo não esgotado, do ponto de vista do aproveitamento agrícola. Aplicada no solo, a manipueira influi no equilíbrio iônico. No presente capítulo apresenta-se a avaliação do efeito da aplicação de duas doses de manipueira sobre um solo do tipo TE (Distrófico, textura argilosa), sob o ponto de vista da dinâmica da ação residual dos nutrientes aplicados. De um modo geral, quando se aplicou a manipueira, observou-se um acréscimo nas concentrações dos ele- mentos no solo. A predominância do íon potássio (K) entre os constituintes minerais da manipueira tem implicação direta no desequilíbrio dos cátions bási- cos no solo, devido ao aumento de saturação desse elemento e da predisposição à lixiviação de cálcio e magnésio. Assim sendo, faz-se necessário o monitoriamento da fertilidade do solo, antes e após a aplicação do efluente. Ressalta-se ainda que a ação residual da dinâmica dos cátions adsorvidos está diretamente ligada a dois fatores importantes, quais sejam: Ø precipitação pluviométrica após a aplicação; Ø dosagens utilizadas. Para dosagem 80 m3/ha e precipitação acumulada de 333 mm, o efeito resi- dual da aplicação foi observado até 60 dias; com o dobro da dose, esse efeito interferiu por mais de 90 dias, podendo causar uma indisponibilidade de magnésio para as plantas, induzida pelo excesso de potássio. Os resultados confirmam a premissa de que a prática da fertirrigação deve ser manejada com cuidado e em solos apropriados para tal, principalmente no que diz respeito ao balanço iônico, uma vez que os incrementos na adsorção de nutrientes em relação à testemunha não foram significativos para as condições de desiquilíbrio em que se encontrava esse solo. Observou-se uma diminuição da absorção do nitrogênio do solo, a qual pode Tabela 4.5. Valores médios referentes aos teores de hidrogênio, alumínio, potássio, fósforo, cálcio, magnésio (em emg/100g T.F.S.A); matéria orgânica (em porcentagem) e valor de pH; em amostras de material de solo tratado com manipueira, coletados numa mesma parcela em diferentes épocas, a duas profundidades pH M.O % H+ Al3+ K+ PO4-3 Ca2+ Mg2+ PH M.O % H+ Al3+ K+ PO4-3 Ca2+ Mg2+ 80 5,53 1,99 6,03 0,56 0,70 0,11 1,85 0,85 5,43 1,96 6,19 0,69 0,49 0,11 1,87 0,78 30 160 5,57 1,79 5,65 0,67 0,89 0,15 1,22 0,79 5,23 1,58 6,61 1,01 0,60 0,13 1,12 0,61 Test. 5,50 1,81 5,52 0,70 0,22 0,13 1,87 0,83 5,20 1,77 5,52 0,70 0,22 0,13 1,87 0,83 80 5,50 2,55 6,72 0,69 0,29 0,08 1,68 0,75 5,50 2,55 6,72 0,75 0,31 0,07 1,72 0,75 60 160 5,40 2,30 6,88 0,93 0,42 0,11 1,08 0,66 5,40 2,37 6,77 0,99 0,32 0,09 1,08 0,61 Test. 5,40 2,55 6,72 0,75 0,23 0,08 1,77 0,67 5,43 2,41 6,45 0,77 0,18 0,07 1,83 0,58 80 5,03 2,51 5,44 0,51 0,26 0,09 2,00 0,81 5,07 2,24 5,44 0,56 0,18 0,06 2,02 0,65 90 160 4,93 2,34 5,71 0,83 0,36 0,11 1,31 0,61 4,77 2,13 5,55 0,93 0,20 0,07 1,45 0,51 Test. 4,70 2,27 5,28 0,40 0,18 0,06 2,18 0,61 5,00 2,27 4,96 0,32 0,15 0,06 2,50 0,63 80 4,90 2,48 5,55 0,61 0,19 0,06 1,79 0,62 4,80 2,20 5,55 0,67 0,13 0,04 1,95 0,56 170 160 4,90 2,24 5,49 0,72 0,27 0,10 1,52 0,68 4,90 2,10 5,55 0,80 0,16 0,07 1,50 0,49 Test. 4,70 2,17 6,40 1,36 0,12 0,05 1,06 0,24 4,60 1,96 6,24 1,36 0,09 0,04 1,06 0,17 PROFUNDIDADE 0 - 15 cm emg/100g T.F.S.A 15 - 30 cm emg/100g T.F.S.A Dias após a aplica- ção Ma ni pu ei ra (m 3/ ha ) 74 75 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS ser devida a uma fixação pronunciada desse nitrogênio, em função do aumento e do crescimento da população microbiana. Uma avaliação da situação microbiológica do solo, antes e após a aplicação de manipueira, pode ser visualizada na Tab. 4.5. Tabela. 4.6. Efeito da aplicação da manipueira sobre alguns grupos de microrganismos do solo. Repetições R1 R2 R3 R4 Média Microrganismos A (*) B (**) A (*) B (**) A (*) B (**) A (*) B (**) A (*) B (**) Contagem padrão x 10 48,20 128,60 125,00 88,30 894,60 1170,40 104,80 805,70 293,15 548,25 Esporos x 10 181,90 38,40 3,90 6,50 1,10 0,30 1,20 3,90 47,02 12,28 Fungos x 10 109,50 43,00 51,80 26,20 21,90 6,50 3,80 5,60 62,33 20,32 Actinomicetos . x 10 4 0,11 0,37 0,43 0,44 27,30 43,41 8,16 19,65 9,00 6,20 Desnitrificantes x 10 2 0,90 2,00 5,60 4,50 7,80 6,90 9,40 13,00 5,92 6,60 Azotobacter x 10 58,00 1260,00 74,50 110,00 13,50 0,00 18,50 29,50 41,12 349,88 Nitrosomonas x 10 25,50 121,75 0,96 240,00 122,25 4,50 0,00 0,00 37,18 91,56 Nitrobacter x 10 0,00 3,00 2,20 2400,00 4,25 0,00 0,00 0,00 1,61 600,75 Umidade solo (%) 23,10 50,30 22,10 32,30 12,30 17,20 17,00 31,00 18,62 32,70 (*) Antes da aplicação da manipueira no solo; (**) Depois da aplicação da manipueirano solo; . 4.4. EFEITO TÓXICO DA MANIPUEIRA SOBRE PLANTAS DANINHAS A sistemática de avaliação do efeito fitotóxico da manipueira sobre o mato foi efetuada por FIORETTO (1985), através do método do Conselho Europeu de Pesquisas em Ervas Daninhas (EWRC). Combinaram-se duas doses de manipueira (D1 = 80m3/ha e D2 = 160m3/ha), em três épocas de aplicação (E1 = aplicação em pré-emergência; E2 = Pós-emergência, 30 dias após E1; E3 = Pós- emergência, 60 dias após E1). Como testemunha, empregou-se parcelas com Alachlor, na dose 2,621. i.a./ha, em pré-emergência. Esses resultados evidenci- am que a manipueira não apresenta ação herbicida sobre a “tiririca”, favorecen- do novo vigor da planta após a aplicação, talvez pela presença do potássio. A aplicação em pré-emergência apresentou efeito semelhante ao herbicida, tam- bém em pré-emergência. A dosagem de 160 m3/ha apresentou ação herbicida mais enérgica quando aplicada em pós-emergência. O poder residual da manipueira, quando aplicada em pré-emergência, foi inferior a 30 dias e, quan- do aplicada em pós-emergência, foi 30 dias. 5.5. EFEITO DA MANIPUEIRA NO RENDIMENTO AGRÍCOLA Na busca de resultados abrangentes, com vistas a avaliar dose e época de aplicação, conduziu-se um experimento para verificação do efeito da manipueira sobre a germinação e produção de algodão (Gossypium hirsutum var. hirsutum, L.) e milho (Zea mays, L). Tabela 4.7. Intensidade média de infestação de plantas invasoras, através de notas, nas parcelas experimentais em relação à faixa de controle, realizadas antes, aos 30 e aos 60 dias após a aplicação da manipueira ÉPOCAS DE APLICAÇÃO Trata- Antes da aplicação 30 dias após aplicação 60 dias após aplicação mentos M T C N G M T C N G M T C N G E1D1 x x x x x 8,00 9,00 x 9,00 x 8,70 9,00 9,00 9,00 9,00 E1D2 x x x x x 8,00 9,00 x x x 9,00 9,00 9,00 9,00 8,00 E2D2 9,00 9,00 x x x 5,70 9,00 4,00 8,50 4,50 9,00 9,00 9,00 9,00 x E2D2 9,00 9,00 x 9,00 x 5,70 9,00 5,30 5,00 2,70 8,70 9,00 8,70 6,30 x E3D1 9,00 9,00 9,00 9,00 9,00 8,30 9,00 5,00 9,00 x 9,00 9,00 9,00 9,00 x E3D2 9,00 9,00 9,00 9,00 9,00 7,30 9,00 1,00 5,00 x 9,00 9,00 9,00 9,00 x T2 x x x x x 8,00 9,00 x 8,50 x 9,00 9,00 9,00 9,00 9,00 M - Capim marmelada (Brachiaria planaginea (Link) Hitch) T - Tiririca (Cyperus rotundus L.) C - Carrapicho de carneiro (Acanthospermum australe (Loeff) D. Kintze) N - Nabiça (Raphanus raphanistrim L.) G - Guanxuma (Sida spp) 76 77 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS Em função dos resultados obtidos no presente trabalho, conclui-se que: Ø em culturas anuais, a manipueira poderá ser aplicada na quantidade limite de 50m3/ha, em uma única dose; Ø doses superiores a 50m3/ha deverão ser aplicadas com antecência mínima de 40 dias do plantio; Ø na área destinada à fertirrigação com manipueira, deverá ser aumentada a densidade de semeadura em aproximadamente 20%. A redução da germinação de sementes que ocorreu pode ser função da com- binação entre a ação letal tóxica do cianeto, somada à concentração salina na solução do solo após a aplicação. Com relação à salinidade do solo, obteve-se um valor médio entre todos os tratamentos de 0,60 mmho/cm a 25ºC, em con- traste com a área testemunha, que representou a condição natural igual a 0,31 mmho/cm a 25ºC. Esses valores de condutividade elétrica foram determinados no final do ciclo das culturas, aproximadamente 150 dias após a aplicação, sen- do que nesse período a precipitação total acumulada foi em torno de 920 mm de água, contribuindo para a redução salina da solução do solo, que retornou ao equilíbrio original. A concentração salina admissível na águas para irrigação depende de vários fatores. De modo geral, quantidades em torno de 700 mg/l de sais são prejudiciais a algumas culturas e teores acima de 2.000 mg/l nocivos à maioria das culturas. Os resultados obtidos mostram que a aplicação de manipueira provoca au- mentos significativos nos teores de potássio trocável do solo, alterando o equi- líbrio da “lei das relações”. Em contrapartida, a manipueira tem sido eficiente para aumentar o teor de fósforo no solo, em comparação com áreas testemu- nhas. Esse fato evidência a viabilidade da fertirrigação com esse resíduo, po- rém, monitorando-se os cátions básicos do solo para maximização dos resulta- dos. Resultados foram obtidos para verificar o efeito da manipueira sobre a pro- dução final da cultura da mandioca. Observou-se um aumento de fitomassa total da cultura (parte aérea + raízes), em função das doses crescentes. Entretanto, verifica-se diminuição significativa no índice de colheita, o qual reflete a exu- berância da planta em desenvolver a parte aérea, em detrimento da produção de raízes tuberosas. Para o caso da cultura da mandioca, um vigoroso crescimento é obtido se a planta for adequadamente suprida com água e nutrientes, especial- mente com nitrogênio. A eficiência das folhas na transformação da energia so- lar em ATP, requerida para a assimilação de fotossintatos, depende considera- Tabela 4.8. Efeito da aplicação de doses crescentes de manipueira sobre os resultados da análise do solo, na camada de 0-20 cm de profundidade. Dose pH Cmolc.dm-3 mg.dm-3 g.dm-3 mmha/cm Época de aplicação (m3.ha-1) CaCl2 Al3+ H + AL Ca2+ Mg+2 K+ P* Carb. CE 25ºC Testem absoluta 0 5,80 0,00 1,94 1,42 0,70 0,17 7,00 7,70 0,31 40 dias antes de plantio 50 6,00 0,00 1,79 1,67 0,76 0,25 9,40 7,90 0,52 100 6,00 0,00 1,79 1,50 0,82 0,35 9,90 7,50 0,60 200 6,30 0,00 1,65 1,57 0,99 0,42 13,50 7,00 1,80 40 dias antes do plantio 50 5,90 0,00 1,79 1,93 0,78 0,45 9,40 7,50 0,64 + no plantio 100 6,10 0,00 1,79 1,55 0,82 0,55 19,30 8,10 0,56 200 6,00 0,00 1,94 1,45 0,94 0,52 31,90 7,70 0,57 No plantio 50 5,90 0,00 1,94 1,67 0,74 0,27 8,00 9,50 0,40 100 5,80 0,00 1,94 1,20 0,61 0,42 8,40 8,10 0,27 200 2,80 0,00 1,94 1,22 0,70 0,45 17,40 7,40 0,40 30 dias após o plantio 50 5,60 0,00 1,94 1,57 0,74 0,22 6,20 8,10 0,28 100 5,80 0,00 1,79 1,52 0,74 0,40 7,50 8,60 0,40 200 5,80 0,00 1,79 1,45 0,70 0,40 8,40 7,00 0,40 * MEHLICH Tabela 4.9. Efeito da aplicação de doses crescentes de manipueira sobre a produção, stand e porcentagem de emergência das plantas de algodão e milho, em relação à testemunha Época de aplicação Dose Algodão em caroço Milho em grãos (m3.ha-1) nº Plantas m2 % Kg/ha nº Plantas m2 % Kg/ha Testem absoluta 0 6,90 100 2058,10 2,20 100 1540,30 40 dias antes de plantio 50 7,00 101 1946,30 1,90 86 1124,00 100 5,80 84 1875,10 1,80 82 1383,00 200 5,20 75 1635,80 1,70 77 912,70 40 dias antes do plantio 50 3,20 46 1687,40 1,10 50 1112,00 + no plantio 100 0,40 6 774,80 0,07 3 48,00 200 0,10 1 0,00 0,00 0 0,00 No plantio 50 5,20 75 1892,50 2,10 95 1696,20 100 0,70 10 798,70 0,80 36 719,70 200 0,00 0 0,00 0,10 4 121,20 30 dias após o plantio 50 3,90 56 1351,70 2,00 91 1280,50 100 1,90 28 776,20 1,80 82 1237,00 200 0,40 6 487,10 1,60 73 724,50 78 79 Volume 4 - Manejo, uso e tratamento de subprodutos da industrialização da mandiocaCULTURAS DE TUBEROSAS AMILÁCEAS LATINO AMERICANAS velmente dos níveis de potássio (K) e fósforo (P). Tudo isso pode ser conseguido com a maipueira. Entretanto, doses muito elevadas (maior que 800Kg K2O/há) podem reduzir o conteúdo de carboidratos dos tubérculos, devido a uma corre- lação negativa entre o conteúdo de potássio e de matéria seca dos tubérculos. Esta relação não só depende da nutrição com potássio, mas também é influenci- ada pela idade fisiológica dos tubérculos. Tubérculos jovens contém teores ele- vados de potássio, baixos de amido e elevados conteúdos de água, enquanto que em tubérculos velhos o recíproco é verdadeiro. O desenvolvimento exuberante apresentado pela parte aérea em relação à testemunha tem correlação direta com a disponibilidade de nitrogênio durante a fase de tuberisaçãoda mandioca. A iniciação da tuberisação é induzida por fitormônio, especialmente as “citocininas” e o “ácido abscísico” (ABA). O “ABA” promove a tuberisação, enquanto as giberelinas (GA), na parte aérea, têm um efeito adverso. A relação ABA/GA controla a formação dos tubérculos; uma alta relação restringe essa iniciação. A relação ABA/GA responde sensilvelmente e rapidamente ao nitrogênio aplicado. O contínuo suprimento de nitrogênio, resulta numa baixa relação ABA/GA, ocorrendo uma inibição no crescimento dos tubérculos. Interrompendo-se o suprimento de nitrogênio ou mesmo esgotando-o do solo, incrementa-se o conteúdo de ABA e a tuberisação tem início. Na prática, esta pode ser a causa da má formação e baixa produção de tubérculos quando se aplica manipueira na cultura, pois incorpora-se ao solo grande quantidade de matéria orgânica. Esse fato sugere que níveis altos de giberelinas nas folhas promove o uso do carboidrato recentemente formado para expansão das brotações. Este processo pode ser revertido por inibidores de gliberelinas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRANCO, S. M. Poluição . Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1972. p.157. BRAILE, P. M.; CAVALCANTI, J. E. W. A. 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