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PRÁTICA PROCESSUAL CIVIL Daniel Ustarroz Agravo de instrumento na prática Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar os requisitos para a interposição do agravo de instrumento. Elaborar um agravo de instrumento. Analisar decisões do Superior Tribunal de Justiça que tratem da ad- missibilidade do agravo de instrumento. Introdução O agravo de instrumento é um recurso amplamente utilizado. Ele é re- gulado pelo Código de Processo Civil (CPC), no Livro III — Dos Processos nos Tribunais e dos Meios de Impugnação das Decisões Judiciais, Título II — Dos Recursos, Capítulo III — Da Apelação (arts. 1.015 a 1.020). O agravo de instrumento serve para atacar as decisões interlocutórias que geram dano grave e de difícil reparação à parte, permitindo que o tribunal conheça o processo e o tema imediatamente. Neste capítulo, inicialmente você vai estudar o regime procedimental do agravo de instrumento no CPC de 2015, a fim de identificar os requisitos para a interposição desse recurso, bem como o seu procedimento em segundo grau de jurisdição. Em seguida, você vai conhecer as principais orientações do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a respeito da interpretação do agravo de instrumento. Ao fim, vai ler sobre o polêmico tema da possibilidade de susten- tação oral no julgamento do recurso, assunto de enorme relevância prática. 1 Procedimento O CPC de 2015 inovou em relação ao tema do agravo de instrumento em comparação com o CPC anterior (de 1973). A partir da recepção de críticas formuladas pelos operadores e de orientações jurisprudenciais importantes consolidadas nas últimas décadas, o agravo de instrumento sofreu alterações que merecem a atenção do operador, como você vai verifi car. Inicialmente, considere que a principal função do agravo de instrumento é permitir a imediata revisão das decisões interlocutórias, por meio da pronta atuação dos tribunais de justiça e dos tribunais regionais federais. Por meio do recurso de agravo de instrumento, essas cortes realizam ampla análise fática e jurídica acerca da correção das decisões interlocutórias. Trata-se de recurso de fundamentação livre, isto é, que permite a abordagem dos fatos relevantes da causa, bem como do direito aplicável. Paula ingressa com uma ação de alimentos gravídicos contra Mauro, o qual, segundo a petição inicial, é o pai de seu filho. Postula, na forma prevista na Lei nº 11.804, de 5 de novembro de 2008, de forma liminar, a concessão de pensão alimentícia para que Mauro seja condenado a suportar uma parcela das despesas com que vem arcando durante a gestação, em especial a assistência médica e os exames terapêuticos. Paula alega que a gravidez foi diagnosticada como de risco, razão pela qual precisou pedir licença não remunerada de seu emprego. Ao despachar a petição inicial, o magistrado indeferiu a liminar, sob o fundamento de que não teria convicção formada a respeito da paternidade do bebê, a despeito de reconhecer, a partir da prova documental, o relacionamento afetivo entre as partes e a alta probabilidade da paternidade alegada. Essa é uma decisão corriqueira e de extrema relevância na vida das pessoas. Caso não se possa revertê-la imediatamente, Paula arcará sozinha com todas as despesas durante a gestação. É por isso que a Lei dos Alimentos Gravídicos (Lei nº. 11.804/2008) determina que a liminar seja concedida mediante a demonstração de indícios de paternidade. Para levar o caso diretamente ao tribunal, Paula dispõe de agravo de instrumento, recurso que permite a imediata revisão da decisão judicial proferida liminarmente. O agravo de instrumento deve ser interposto no prazo de 15 dias úteis, conforme o art. 1.003 do CPC, diretamente no tribunal de justiça (BARROSO; LETTIERE, 2016). Isto é, você deve dirigir o recurso diretamente ao tribunal, que mediante sorteio define o relator para o processamento e a apreciação. Contudo, ao contrário do CPC de 1973, que permitia ampla recorribilidade das decisões interlocutórias, o CPC de 2015 limita o cabimento do agravo de instrumento a apenas algumas das decisões proferidas ao longo do procedi- mento pelo juiz de primeiro grau. Portanto, quando você for elaborar um agravo de instrumento, deverá indicar um dos permissivos do art. 1.015 do CPC. Veja: Agravo de instrumento na prática2 Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I — tutelas provisórias; II — mérito do processo; III — rejeição da alegação de convenção de arbitragem; IV — incidente de desconsideração da personalidade jurídica; V — rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação; VI — exibição ou posse de documento ou coisa; VII — exclusão de litisconsorte; VIII — rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio; IX — admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; X — concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução; XI — redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º; XII — (VETADO); XIII — outros casos expressamente referidos em lei. Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões in- terlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário (BRASIL, 2015, art. 1.015, documento on-line). Ou seja, na peça de agravo de instrumento, você deve indicar ao tribunal qual dos incisos autoriza a interposição do recurso, sob pena de não conheci- mento. Quanto a esse ponto, a jurisprudência dos tribunais é bastante restritiva, como se vê neste julgamento do STJ: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE, NO CASO, FIXOU PONTO CONTROVERTIDO E DEFERIU A PRODUÇÃO DE PROVAS. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 356, I E II, § 5º, C/C O ART. 1.015, II, DO CPC/2015. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO § 4º DO ART. 1.021 DO NCPC. NÃO CABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. [...] 3. No caso, conforme asseverou o acórdão re- corrido, a decisão do Juízo singular não ingressou no mérito, justamente porque entendeu pela necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial. Logo, não havendo questão incontroversa que possibilitasse a prolação de decisão de mérito, inviável se falar, por conseguinte, na impugnação do referido decisum por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada a hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015 (BRASIL, 2019, documento on-line). Portanto, o primeiro passo para a redação do agravo de instrumento é a identificação de sua hipótese de cabimento. Na última seção deste capítulo, você vai estudar detalhadamente esse tema delicado. Caso não seja possível 3Agravo de instrumento na prática a interposição do agravo de instrumento, a parte deverá, com amparo no art. 1.009, § 1º, do CPC, aguardar a prolação de sentença e impugnar a decisão em preliminar de apelação (BRASIL, 2015). A redação do agravo de instrumento deve observar a estrutura preconizada pelo art. 1.016 do CPC: Art. 1.016. O agravo de instrumento será dirigido diretamente ao tribunal competente, por meio de petição com os seguintes requisitos: I — os nomes das partes; II — a exposição do fato e do direito; III — as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão e o pró- prio pedido; IV — o nome e o endereço completo dos advogados constantes do processo (BRASIL, 2015, art. 1.016, documento on-line). No Direito Processual Civil, a parte tem o ônus de fundamentar as suas insurgências. É essencial expor o fato e o direito relevante, pois o tribunal ainda não teve contato com o processo, cuja tramitação ocorre em primeiro grau. De acordo com o princípio da dialeticidade, você deve indicar, concretamente, as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão. O pedido, ao final da peçaformulado, deve ser coerente com a fundamentação. Por exemplo: se você alegou que foi equivocada a decisão de primeiro grau que rejeitou a alegação de convenção de arbitragem (inciso III), você deverá pedir a extinção do processo. Entretanto, se você alegou que foi equivocada a decisão que excluiu um litisconsorte (inciso VII), você deverá postular a reforma da decisão e a continuação do processo com a participação do litis- consorte indevidamente afastado pelo juízo de primeiro grau. Outro cuidado que você deve ter diz respeito à instrução do agravo de instrumento. Muitos tribunais da federação contam com sistema eletrônico, o que facilita o trabalho do agravante, na medida em que as peças já estão digitalizadas e disponíveis. Em alguns estados, todavia, ainda tramitam re- cursos na forma física. Em qualquer caso, você deverá atentar ao art. 1.017: Art. 1.017. A petição de agravo de instrumento será instruída: I — obrigatoriamente, com cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestivi- dade e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado; II — com declaração de inexistência de qualquer dos documentos referidos no inciso I, feita pelo advogado do agravante, sob pena de sua responsabi- lidade pessoal; Agravo de instrumento na prática4 III — facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis. § 1º Acompanhará a petição o comprovante do pagamento das respectivas custas e do porte de retorno, quando devidos, conforme tabela publicada pelos tribunais. § 2º No prazo do recurso, o agravo será interposto por: I — protocolo realizado diretamente no tribunal competente para julgá-lo; II — protocolo realizado na própria comarca, seção ou subseção judiciárias; III — postagem, sob registro, com aviso de recebimento; IV — transmissão de dados tipo fac-símile, nos termos da lei; V — outra forma prevista em lei. § 3º Na falta da cópia de qualquer peça ou no caso de algum outro vício que comprometa a admissibilidade do agravo de instrumento, deve o relator aplicar o disposto no art. 932, parágrafo único. § 4º Se o recurso for interposto por sistema de transmissão de dados tipo fac-símile ou similar, as peças devem ser juntadas no momento de protocolo da petição original. § 5º Sendo eletrônicos os autos do processo, dispensam-se as peças referidas nos incisos I e II do caput, facultando-se ao agravante anexar outros docu- mentos que entender úteis para a compreensão da controvérsia (BRASIL, 2015, art. 1.017, documento on-line). Depois da interposição perante o tribunal, você deverá juntar aos autos de primeiro grau de jurisdição: cópia do recurso, do comprovante de sua inter- posição e da relação de documentos que o instruíram (art. 1.018 do CPC). O ordenamento, com tal diretriz, propicia retratação do juízo de primeiro grau. Se ela ocorrer, o recurso ficará prejudicado (MARINONI; MITIDIERO; ARENHART, 2017a, 2017b). No segundo grau, o relator, ao receber o recurso, poderá julgá-lo monocra- ticamente, desde que as hipóteses do art. 932 do CPC estejam presentes. Veja: Art. 932. Incumbe ao relator: I — dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes; II — apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal; III — não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; IV — negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; 5Agravo de instrumento na prática V — depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; VI — decidir o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando este for instaurado originariamente perante o tribunal; VII — determinar a intimação do Ministério Público, quando for o caso; VIII — exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal. Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator con- cederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível (BRASIL, 2015, art. 932, docu- mento on-line). Se não for caso de aplicação do art. 932, III e IV, do CPC, então o relator poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando a sua decisão ao juiz. Em seguida, ele ordenará a intimação do agravado, por carta com aviso de recebimento, quando não houver procurador constituído, ou pelo Diário da Justiça, ou ainda por carta com aviso de recebimento dirigida ao advogado do agravado. A intimação é para que o agravado responda no prazo de 15 dias, facultando-lhe juntar a documentação que considerar necessária ao julgamento do recurso. Se for o caso, o relator determinará a intimação do Ministério Público, preferencialmente por meio eletrônico, para que se manifeste no prazo de 15 dias (BRASIL, 2015, art. 1.019). Por fim, estando devidamente instruído o recurso, o relator solicitará dia para julgamento. A jurisprudência admite a interpretação extensiva do comando contido no inciso X do art. 1.015 do CPC para que se reconheça a possibilidade de interposição de agravo de instrumento nos casos de decisão que indefere o pedido de efeito suspensivo aos embargos à execução. Para saber mais, faça uma busca na internet pelo Recurso Especial (REsp) nº 1.694.667 - PR, julgado em 5 de dezembro de 2017. Agravo de instrumento na prática6 2 Orientações do STJ Os operadores do Direito devem conhecer e estudar as orientações adotadas pelo STJ a respeito do procedimento do agravo de instrumento. Em geral, após a defi nição dos principais temas pelo STJ, os demais tribunais, como os de justiça e os regionais federais, uniformizam a sua atuação. Os advogados, por sua vez, fundamentam as suas petições com os julgados do STJ. Portanto, todos os profi ssionais que atuam na jurisdição contenciosa dedicam-se ao estudo das orientações uniformizadoras fi xadas pelo STJ. Agora, você vai conhecer três orientações importantes para o operador do Direito. A mais importante delas é a definição da natureza do rol do art. 1.015 do CPC, o qual disciplina as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento (BRASIL, 2015). Portanto, o agravante deve indicar o inciso que permite a interposição do recurso. A seguinte decisão é ilustrativa: SERVIDOR PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CON- TRA ATO JUDICIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXPEDIÇÃO DE RPV EM SEPARADO. HIPÓTESE INSERIDA NO ROL TAXATIVO DO ART. 1.015 DO CPC. MATÉRIA PASSÍVEL DE RECURSO PRÓPRIO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER A SER AMPARADO PELA VIA MANDAMENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE PROSSEGUIMENTO DO MANDAMUS. 1. Do exame da prova pré-constituída não se verifica o preenchimento de condições de processamento do mandamus, haja vista a ausência de demonstração de qualquer ilegalidade ou abuso de poder a ser amparado por ação mandamental. 2. O atual CPC restringiu significativa- mente as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento, eliminandoa possibilidade de se impugnar, por meio desse específico recurso, inúmeras decisões interlocutórias não abarcadas pela referida previsão legal. Entretanto, o parágrafo único do art. 1.015 do CPC garante a interposição de agravo de instrumento contra decisões proferidas em cumprimento de sentença, pelo que o ato judicial hostilizado também não poderá ser combatido pela via do writ. 3. Não se presta o mandado de segurança como sucedâneo recursal. Matéria pacificada no Supremo Tribunal Federal, que editou o verbete nº 267 da sua Súmula a respeito do tema. PETIÇÃO INICIAL INDEFERIDA. DECISÃO MONOCRÁTICA (RIO GRANDE DO SUL, 2020, documento on-line). Quando foi sancionado, o CPC surpreendeu muitos operadores pela opção de estipular na lei as hipóteses de cabimento. Até então, era a jurisprudência que fixava quando o agravo de instrumento poderia ser interposto. Inicial- 7Agravo de instrumento na prática mente, a maioria dos tribunais se pronunciou considerando a natureza do rol taxativa. Contudo, em um artigo publicado em 24 de novembro de 2017 no site do STJ, o ministro Luis Felipe Salomão defendeu que, mesmo sem previsão no CPC de 2015, caberia agravo de instrumento contra decisão interlocutória relacionada à competência (BRASIL, 2017a). Diante do grande impacto da decisão, o STJ selecionou um recurso repre- sentativo da controvérsia para julgamento, pelo rito dos recursos repetitivos, tomando a seguinte decisão: PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SELEÇÃO. AFETAÇÃO. RITO. ARTS. 1.036 E SS. DO CPC/15. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMEN- TO. CONTROVÉRSIA. NATUREZA. ROL DO ART. 1.015 DO CPC/15. 1. Delimitação da controvérsia: definir a natureza do rol do art. 1.015 do CPC/15 e verificar possibilidade de sua interpretação extensiva, para se admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre hipóteses não expressamente versadas nos incisos de referido dispositivo do Novo CPC. 2. Afetação do recurso especial ao rito do art. 1.036 e ss. do CPC/2015 (BRASIL, 2018a, documento on-line). O caso atraiu a atenção da comunidade jurídica. A sua resolução impactou todos os tribunais e praticamente todos os operadores, uma vez que, à luz do CPC, os acórdãos do STJ elaborados pelo rito dos recursos repetitivos vinculam todos os juízes da federação. Após amplo debate, o STJ concluiu que a taxatividade prevista na lei deveria ser mitigada. Foi fixada a seguinte tese: “[...] o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação [...]” (BRASIL, 2019, documento on-line). A ementa do acórdão é elucidativa: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREI- TO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO ROL DO ART. 1.015 DO CPC/2015. IMPUGNAÇÃO IMEDIATA DE DECISÕES INTERLOCU- TÓRIAS NÃO PREVISTAS NOS INCISOS DO REFERIDO DISPOSITIVO LEGAL. POSSIBILIDADE. TAXATIVIDADE MITIGADA. EXCEPCIO- NALIDADE DA IMPUGNAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. REQUISITOS. 1. O propósito do presente recurso especial, processado e julgado sob o rito dos recursos repetitivos, é definir a natureza jurídica do rol do art. 1.015 do CPC/15 e verificar a possibilidade de sua interpretação extensiva, analógica ou exemplificativa, a fim de admitir a interposição de Agravo de instrumento na prática8 agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre hipóteses não expressamente previstas nos incisos do referido dispositivo legal. 2. Ao restringir a recorribilidade das decisões interlocutórias proferidas na fase de conhecimento do procedimento comum e dos procedimentos especiais, exceção feita ao inventário, pretendeu o legislador salvaguardar apenas as “situações que, realmente, não podem aguardar rediscussão futura em eventual recurso de apelação”. 3. A enunciação, em rol pretensamente exaustivo, das hipóteses em que o agravo de instrumento seria cabível revela-se, na esteira da majoritária doutrina e jurisprudência, insuficiente e em desconformidade com as normas fundamentais do processo civil, na medida em que sobrevivem questões urgentes fora da lista do art. 1.015 do CPC e que tornam inviável a interpretação de que o referido rol seria absolutamente taxativo e que deveria ser lido de modo restritivo. 4. A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria taxativo, mas admitiria interpretações extensivas ou analógicas, mostra-se igualmente ineficaz para conferir ao referido dispositivo uma interpretação em sintonia com as normas fundamentais do processo civil, seja porque ainda remanescerão hipóteses em que não será possível extrair o cabimento do agravo das situações enunciadas no rol, seja porque o uso da interpretação extensiva ou da analogia pode desnaturar a essência de institutos jurídicos ontologica- mente distintos. 5. A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria meramente exemplificativo, por sua vez, resultaria na repristinação do regime recursal das interlocutórias que vigorava no CPC/73 e que fora conscientemente modificado pelo legislador do novo CPC, de modo que estaria o Poder Judiciário, nessa hipótese, substituindo a atividade e a vontade expressamente externada pelo Poder Legislativo. 6. Assim, nos termos do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fixa-se a seguinte tese jurídica: O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação. 7. Embora não haja risco de as partes que confiaram na absoluta taxatividade com interpretação restritiva serem surpreendidas pela tese jurídica firmada neste recurso especial repetitivo, eis que somente se cogitará de preclusão nas hipóteses em que o recurso eventualmente inter- posto pela parte tenha sido admitido pelo Tribunal, estabelece-se neste ato um regime de transição que modula os efeitos da presente decisão, a fim de que a tese jurídica somente seja aplicável às decisões interlocutórias proferidas após a publicação do presente acórdão. 8. Na hipótese, dá-se provimento em parte ao recurso especial para determinar ao TJ/MT que, observados os de- mais pressupostos de admissibilidade, conheça e dê regular prosseguimento ao agravo de instrumento no que tange à competência. 9. Recurso especial conhecido e provido (BRASIL, 2018a, documento on-line). Portanto, o STJ passou a tolerar a interposição do agravo de instrumento em situações não expressamente previstas no rol do art. 1.015 do CPC. Cum- prirá ao interessado, contudo, convencer o relator acerca da “[...] urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação [...]” (BRASIL, 2018a, documento on-line). 9Agravo de instrumento na prática Outra orientação importante do STJ é a determinação para que o agravante comunique ao primeiro grau a interposição do agravo quando a tramitação dos autos não for eletrônica. Considere o seguinte julgado: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO CONHE- CIDO. § 2º DO ART. 1.018 DO NCPC. DESCUMPRIMENTO NA ORIGEM. OBRIGATORIEDADE DE INFORMAR O JUÍZO DE ORIGEM A INTER- POSIÇÃO DO RECURSO. PROCESSO ELETRÔNICO TRAMITANDO NA ORIGEM. 1.(Enunciado Administrativo nº 3) 2. A finalidade dos parágrafos do art. 1.018 do NCPC, é a de possibilitar que o juiz de primeiro grau exerça juízo de retratação sobre suas decisões interlocutórias e o exercício do con- traditório da parte adversária, impondo que necessariamente eles tenham efetivo e incontroverso conhecimento do manejo do agravo de instrumento. 3. A melhor interpretação do alcance da norma contida no § 2º do art. 1.018 do NCPC, considerando-se a possibilidade de ainda se ter autos físicos em algumas Comarcas e Tribunais pátrios, parece ser a de que, se ambos tramita-rem na forma eletrônica, na primeira instância e no TJ, não terá o agravante a obrigação de juntar a cópia do inconformismo na origem. 4. Tendo em conta a norma do parágrafo único do art. 932 do NCPC, os Princípios da Não Decisão Surpresa e da Primazia do Mérito e, que o agravante, ao menos, comunicou o Juízo a quo sobre a interposição do agravo de instrumento, o acórdão recorrido deve ser cassado, com determinação para que o e. desembargador relator do Tribunal conceda o prazo de 5 (cinco) dias para que a recorrente complemente a documentação exigida no caput do art. 1.018 do mesmo diploma legal, sob pena, aí sim, de não conhecimento do recurso. 5. Recurso especial parcialmente provido (BRASIL, 2018b, documento on-line). Como você pode observar, no exercício profissional, o conhecimento da jurisprudência do STJ, no que toca ao agravo de instrumento, é extremamente importante. Utilize o seu site de buscas favorito para encontrar o acórdão do STJ relativo ao Agravo Interno no Recurso Ordinário em Mandado de Segurança (RMS) nº 62.046 - SP, julgado em 29 de abril de 2020. Esse acórdão trata sobre o cabimento de mandado de segurança contra atos judiciais, em especial contra decisões que não são passíveis de revisão em agravo de instrumento. Agravo de instrumento na prática10 3 Possibilidade de sustentação oral Na vida prática dos profi ssionais, um momento extremamente importante ocorre no julgamento dos recursos. Os tribunais, cientes dessa relevância, concedem a palavra aos procuradores das partes para que, no prazo de 15 minutos, realizem a “sustentação oral”, isto é, manifestem as razões pelas quais o interesse de seu cliente deve preponderar. A matéria está regulada no CPC, no art. 937: Art. 937. Na sessão de julgamento, depois da exposição da causa pelo relator, o presidente dará a palavra, sucessivamente, ao recorrente, ao recorrido e, nos casos de sua intervenção, ao membro do Ministério Público, pelo prazo improrrogável de 15 (quinze) minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões, nas seguintes hipóteses, nos termos da parte final do caput do art. 1.021: I — no recurso de apelação; II — no recurso ordinário; III — no recurso especial; IV — no recurso extraordinário; V — nos embargos de divergência; VI — na ação rescisória, no mandado de segurança e na reclamação; VII — (VETADO); VIII — no agravo de instrumento interposto contra decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência; IX — em outras hipóteses previstas em lei ou no regimento interno do tribunal. § 1º A sustentação oral no incidente de resolução de demandas repetitivas observará o disposto no art. 984, no que couber. § 2º O procurador que desejar proferir sustentação oral poderá requerer, até o início da sessão, que o processo seja julgado em primeiro lugar, sem prejuízo das preferências legais. § 3º Nos processos de competência originária previstos no inciso VI, caberá sustentação oral no agravo interno interposto contra decisão de relator que o extinga. § 4º É permitido ao advogado com domicílio profissional em cidade diversa daquela onde está sediado o tribunal realizar sustentação oral por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que o requeira até o dia anterior ao da sessão (BRASIL, 2015, art. 937, documento on-line). A lei, portanto, limita a sustentação oral em agravo de instrumento quando a decisão recorrida versa sobre tutela provisória, pois esse tipo de decisão tende a ser relevante para a parte. Contudo, a doutrina e alguns tribunais consideram 11Agravo de instrumento na prática que a sustentação oral também deveria ser admitida na hipótese do agravo de instrumento contra uma decisão interlocutória de mérito. Afinal, embora o recurso seja de agravo, ele enfrenta o mérito da causa. A Jornada de Direito Processual, organizada pelo Conselho da Justiça Federal, editou o Enunciado nº. 61: “Deve ser franqueado às partes sustentar oralmente as suas razões, na forma e pelo prazo previsto no art. 937, caput, do CPC, no agravo de instrumento que impugne decisão de resolução parcial de mérito (art. 356, § 5º, do CPC).” (BRASIL, 2017b, p. 8). Em sede doutrinária, Almeida (2020, p. 182–183) afirmou o seguinte: Embora não expressamente prevista em lei, parece-me inegável a possibilidade de sustentação oral em agravo de instrumento interposto em face de decisão interlocutória que julgou parcial e antecipadamente o mérito. Nessa hipótese, prevista no art. 356 do CPC, a decisão interlocutora se equivale a uma sentença parcial, porquanto julgou a questão de forma definitiva. Assim, o agravo de instrumento corresponde a uma apelação, permitindo-se a sustentação oral de agravante e agravado. Se não admitida a sustentação oral nesse caso, haverá evidente violação à isonomia, já que os demais pedidos julgados por sentença poderão ser discutidos oralmente quando do reexame em apelação. Além disso, o CPC permite a sustentação oral em agravo de instrumento que tratam do mérito em caráter provisório (art. 937, inc. VII). Mais uma razão para a possibilidade de sustentação oral em agravo de ins- trumento que trata do mérito de forma definitiva (art. 356). Alguns tribunais da federação já disciplinaram o tema. Veja, por exemplo, o que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina prevê em seu regimento interno: Art. 175. Feito o relatório, o presidente dará a palavra, sucessivamente, ao autor, recorrente, peticionário ou impetrante, e ao réu, recorrido ou impetrado, para a sustentação de suas alegações por seu procurador. § 1º Cada uma das partes falará pelo tempo máximo de: I — 10 (dez) minutos: a) no recurso em sentido estrito; b) no agravo em execução penal; e c) na apelação interposta da sentença em processo por contravenção ou crime a que a lei comine pena de detenção; II — 15 (quinze) minutos: a) no recurso de apelação cível; b) na ação rescisória; c) no mandado de segurança, na sessão de julgamento do mérito ou do pedido liminar; Agravo de instrumento na prática12 d) na reclamação; e) no agravo de instrumento interposto: 1. contra decisão interlocutória que verse sobre tutela provisória de urgência ou tutela da evidência; 2. contra decisão parcial de mérito; e 3. contra decisão que decretar a falência (SANTA CATARICA, 2018, art. 175, documento on-line). Agora veja a previsão do Tribunal de Justiça da Bahia em seu regimento interno: Art. 187. A parte, por seu Advogado, poderá sustentar suas razões oralmente pelo prazo: I — de 15 (quinze) minutos nos julgamentos de apelação cível, ação rescisória, mandado de segurança, reclamação, agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória que resolva parcialmente o mérito ou verse sobre tutela provisória e agravo interno interposto contra decisão do Relator que extinguiu ação de competência originária do Tribunal de Justiça [...] (BAHIA, 2020, art. 187, documento on-line). O Tribunal de Justiça de Pernambuco também aborda o tema em seu regimento interno: Art. 181. Depois da exposição da causa pelo relator, o Presidente facultará a palavra, sucessivamente, ao recorrente, ao recorrido e, nos casos de sua intervenção, ao membro do Ministério Público, pelo prazo improrrogável de 15 (quinze) minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões, nas seguintes hipóteses: I — no recurso de apelação; II — no agravo de instrumento interposto contra decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência; III — no agravo de instrumento interposto contra decisão de mérito [...] (PER- NAMBUCO, 2017, documento on-line). Dado o impacto dessa previsão na vida profissional, especialmente dos advogados, há uma tendência a se admitir a sustentação oral em agravos mais relevantes, com amparo em interpretação finalística do art. 937 do CPC (BRASIL, 2015). 13Agravo de instrumento na prática Imagine que o juiz de primeiro grau da Justiça Estadual admiteindevidamente a sua competência para discutir uma demanda relativa ao fornecimento de medicamen- tos pela União. Embora o CPC seja omisso em relação ao cabimento de agravo de instrumento por erro na análise da competência, o STJ considera essencial definir a competência no início do processo, evitando a prática de atos processuais inúteis pe- rante juízo incompetente. O interessado poderá, então, deduzir agravo de instrumento contra a decisão do juízo estadual que indevidamente se considerou competente no caso, uma vez que apenas o juiz federal pode apreciar eventual obrigação da União de fornecer medicamentos. ALMEIDA, D. R. Recursos cíveis. 2. ed. Salvador: Juspodium, 2020. BAHIA. Tribunal de Justiça. Regimento interno. Salvador: TJ-BA, 2020. Disponível em: http://www5.tjba.jus.br/portal/wp-content/uploads/2020/01/REGIMENTO-INTERNO- -ATUALIZADO-EM-08012020.pdf. Acesso em: 11 jun. 2020. BARROSO, D.; LETTIERE, J. F. Prática processual no novo processo civil. 7. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. BRASIL. Justiça Federal. Conselho da Justiça Federal. Centro de Estudos Judiciários. I jornada de direito processual civil. Brasília: Justiça Federal, 2017b. BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília: Presidência da República, 2015a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 11 jun. 2020. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº 1.411.485 - SP. Relator: Min. Marco Aurélio Bellizze, 06 ago. 2019. Disponível em: https:// www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/228e338fddcdf62a8065 110d0b5f87fb. Acesso em: 11 jun. 2020. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mesmo sem previsão no novo CPC, cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória relacionada à competência. Brasília: STJ, 2017a. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias- -antigas/2017/2017-11-24_09-22_Mesmo-sem-previsao-no-novo-CPC-cabe-agravo- -de-instrumento-contra-decisao-interlocutoria-relacionada-a-competencia.aspx. Acesso em: 11 jun. 2020. Agravo de instrumento na prática14 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Proposta de Afetação no Recurso Especial nº 1.704.520 – MT. Relator: Min. Nancy Andrighi, 28 fev. 2018a. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/juris- prudencia/550644093/proposta-de-afetacao-no-recurso-especial-proafr-no-resp-1704520- -mt-2017-0271924-6/inteiro-teor-550644114?ref=juris-tabs. Acesso em: 11 jun. 2020. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.696.396 – MT. Relator: Min. Nancy Andrighi, 10 abr. 2019. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquis a/?src=1.1.2&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_re- gistro=201702262874. Acesso em: 11 jun. 2020. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.708.609 – PR. Relator: Min. Moura Ribeiro, 24 ago. 2018b. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurispruden- cia/617597758/recurso-especial-resp-1708609-pr-2017-0287693-6. Acesso em: 11 jun. 2020. MARINONI, L. G.; MITIDIERO, D.; ARENHART, S. L. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017a. MARINONI, L. G.; MITIDIERO, D.; ARENHART, S. L. Novo curso de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017b. PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Regimento interno. Recife: TJ-PE, 2017. 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Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Agravo de instrumento na prática16
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