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Introdução à modelagem usando equações diferenciais e aproximações usando elementos finitos - Hilkias Jordão de Souza(UNICAMP)

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Universidade Estadual de Campinas
INSTITUTO DE MATEMÁTICA, ESTATÍSTICA E COMPUTAÇÃO CIENTÍFICA
Dissertação de Mestrado
Introdução à modelagem usando equações
diferenciais e aproximações usando
elementos finitos
por
Hilkias Jordão de Souza
Mestrado Profissional em Matemática - Campinas - SP
Orientador: Profa. Dra. Maria Cristina de Castro Cunha
Co-Orientador: Prof.Dr. Pérsio L. de Almeida Barros
i
ii
iii
Dedico este trabalho, à minha esposa Lourdes Maria, às minhas fi-
lhas Flávia e Milena, ao meu filho Vitor Davi, e ao pequeno Rodrigo
meu neto.
v
Agradecimentos
1 Primeiramente, agradeço a Deus pela vida, pela família e pelos amigos.
2 À minha orientadora, Profa. Dra. Maria Cristina de Castro Cunha pela orientação,
segurança e competência, dando-me estímulo e confiança ao longo deste trabalho.
3 À Profa. Dra. Sueli I. Rodrigues Costa Coordenadora do Mestrado Profissional em
Matemática pela sua atitude amiga e motivadora.
4 A todos os Professores do Mestrado Profissional em Matemática promovido pela
UNICAMP em Convênio com a UEMA e o CEFET-MA.
vii
Resumo
Este trabalho está dividido em três partes. Na primeira, apresentamos os conceitos de
modelo e modelagem matemática, bem como a utilização da modelagem matemática
como estratégia de ensino e aprendizagem e finalizamos com um relato histórico das
funções trigonométricas, visando mostrar modelos matemáticos utilizados por nossos
antepassados. Na segunda parte apresentamos a construção de algumas equações diferen-
ciais como modelos matemáticos para princípios físicos e desenvolvemos detalhadamente
um modelo para placas elásticas. Na terceira parte comentamos as dificuldades de ob-
tenção de soluções analíticas para equações diferenciais e apresentamos uma introdução
ao método dos elementos finitos como ferramenta para construir soluções aproximadas
de problemas bidimensionais.
Palavras-chave: Modelo matemático, Equações diferenciais, Método dos elementos finitos.
ix
Abstract
This work is divided in three parts. In the first one, we are going to show the concepts
of models and mathematical modeling, as well as the use of the mathematical modeling
as a teaching and learning strategy and we are going to finish, with a historical report
of the trigonometrical functions in order to show mathematical models used by our
ancestors. In the second part, we are going to show a construction of some differential
equations as mathematical models for physical principles and we are going to develop
detailedly a model for elastic plates. In the third and last one, we are going to comment
the difficulties of obtaining analytical solutions to differential equations and we are going
to present an introduction to the finite element method as tool to construct solutions by
approximation of two-dimensional problems.
Key words: Mathematical model, Differential equations, Finite element method.
xi
Sumário
Introdução 1
1 MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS 3
1.1 O que é Matemática? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.2 Modelos matemáticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
1.3 Modelagem matemática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.4 Modelagem matemática como estratégia de ensino e aprendizagem no ensino
superior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.5 Como usar a modelagem matemática na sala de aula . . . . . . . . . . . . . 17
1.6 Um pouco de história . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.6.1 As funções trigonométricas — trigonometria . . . . . . . . . . . . . . 18
2 EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EM MODELOS PARA PRINCÍPIOS FÍ-
SICOS 33
2.1 A corda vibrante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.2 A membrana vibrante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
2.3 Ondas em um meio elástico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
2.4 O modelo de gravitação de Newton - potencial gravitacional . . . . . . . . . 44
2.4.1 A lei de gravitação de Newton . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
2.4.2 O potencial gravitacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
2.4.3 A equação de Poisson . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
2.5 Modelo matemático da placa elástica - placa delgada . . . . . . . . . . . . . 51
2.5.1 Hipóteses simplificadoras para construção do modelo de cálculo . . . 51
2.5.2 Esforços, deformações e deslocamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
xiii
xiv SUMÁRIO
2.5.3 Equação diferencial da placa em coordenadas cartesianas . . . . . . . 58
2.5.4 Condições de contorno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
2.5.5 Analogia da membrana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
3 MÉTODO DOS ELEMENTOS FINITOS EM PROBLEMAS BIDIMEN-
SIONAIS 65
3.1 Considerações gerais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
3.1.1 Solução analítica de uma equação diferencial parcial . . . . . . . . . . 66
3.1.2 Soluções por aproximações numéricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
3.2 Método dos elementos finitos - notícia histórica . . . . . . . . . . . . . . . . 72
3.3 Conceitos básicos do método dos elementos finitos . . . . . . . . . . . . . . . 73
3.3.1 Discretização em elementos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
3.3.2 Equação associada a um elemento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
3.3.3 Montagem ou reunião das equações dos elementos e solução . . . . . 75
3.3.4 Convergência e estimativa do erro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
3.4 Formulação do método dos elementos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
3.4.1 Formulação variacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
3.4.2 Formulação em elementos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
3.4.3 Funções de interpolação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
3.4.4 Algorítmo-método dos elementos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
3.4.5 Considerações sobre a convergência, completude e conformidade do
método dos elementos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
Conclusão 93
Referências Bibliográficas 95
Lista de Figuras
1.1 O “seqt” egípcio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.2 O Teorema de Ptolomeu. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
1.3 O “Jiva” hindu. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
1.4 O raio unitário de Al Battani. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
1.5 Fórmula para calcular a tabela de Al Battani. . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
1.6 Correspondência entre um número real e seu seno através de um ponto do
círculo trigonométrico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.1 Corda Vibrante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
2.2 Membrana Vibrante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
2.3 Ondas em um meio elástico - volume elementar . . . . . . . . . . . . . . . . 40
2.4 Partícula m sofre uma força de atração gravitacional na direção de M . . . . 45
2.5 Atração gravitacional produzida por um corpo extenso. . . . . . . . . . . . . 46
2.6 Superfície arbitrária com uma massa m no seu interior. . . . . . . . . . . . . 49
2.7 Esforços internos na superfície mediana do elemento. . . . . . . . . . . . . . 53
2.8 Secção antes e depois da deflecção. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
2.9 Distorções angulares. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
2.10 Esforços atuantes em um elemento da membrama. . . . . . . . . . . . . . . . 63
3.1 Representação de um círculo por elementos finitos. (a) Discretização por
elementos finitos. (b) Elemento finito típico. (c) Erro de aproximação na
fonteira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . 74
xv
xvi LISTA DE FIGURAS
3.2 Discretização por elementos finitos retangulares e triangulares, e convergência
das soluções. (a) Malha de elementos retangulares. (b) Malha de elementos
retangulares e triangulares. (c) Convergência da solução por elementos finitos. 76
3.3 Domínio Ω dividido em quatro elementos finitos retangulares Ωe. Pontos
nodais em cada elemento são quatro, num total de nove. Condições de contorno. 78
3.4 Nó Pk = (xi, yj) no domínio Ω discretizado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
3.5 Elemento Finito número 1: Cálculo de Q(e)l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
Introdução
É consenso que a Matemática, e em especial o Cálculo Diferencial e Integral, é componente
importante nos Cursos Superiores nas áreas das ciências exatas e tecnologia. Nesse contexto
as equações diferenciais têm um papel fundamental na física e na engenharia, onde apare-
cem naturalmente quando são utilizados os recursos do cálculo para estudar a aplicação de
princípios físicos a problemas reais. O resultado são equações diferenciais como modelos
matemáticos para os processos físicos em estudo.
A construção de modelos matemáticos é objeto da disciplina Modelagem Matemática
que inserida no campo da Matemática Aplicada também trata da solução do problema
matemático (equação diferencial) bem como da interpretaçao desta ssolução e verificação
de sua validade. Por outro lado a Modelagem Matemática também pode ser vista como
metodologia de aprendizagem no ensino. Em particular no ensino superior sua utilização é
uma realidade reconhecida pedagogicamente.
Os aspectos comentados acima nos motivaram a trabalhar uma dissertação que rela-
cionasse modelagem matemática e equações dferenciais. Dessa forma traçamos os seguintes
objetivos:
1. apresentar um estudo sobre modelos e modelagem matemática, mostrando a modela-
gem como método de pesquisa e como estratégia de ensino e aprendizagem, bem como
aspectos históricos de funções que se tornaram básicas por serem modelos matemáticos
usados por nossos antepassados.
2. apresentar através de exemplos, equações diferenciais como modelos matemáticos ob-
tidos a partir da utilização de princípios físicos em problemas reais de interesse nas
ciências e na tecnologia.
1
2 Introdução
3. apresentar uma introdução ao método dos elementos finitos para solução de problemas
bidimensionais (equação de Poisson) como alternativa de solução por aproximação
numérica, considerando as dificuldades existentes na obtenção de soluções analíticas.
Esperamos que o trabalho possa ser útil, tanto aos que ensinam quanto aos que
trabalham na área de tecnoçogia.
Capítulo 1
MATEMÁTICA E MODELOS
MATEMÁTICOS
“Sem saber o rumo o sonho é mera fantasia.”
(Francisco Gomes de Matos)
Neste capítulo inicial, procuramos construir uma resposta para uma pergunta que
sempre está presente na mente de alunos e demais pessoas que necessitam estudar e/ou
trabalhar com a Matemática: “O que é Matemática?”
A busca da resposta a essa pergunta torna-se importante, uma vez que a presente
Dissertação integra o Programa do Mestrado Profissional, que se caracteriza por uma forte
preocupação com o ensino de Matemática. Em particular, neste trabalho buscamos a elabora-
ção e utilização de Modelos Matemáticos como recursos no processo de ensino e aprendizagem
de conteúdos matemáticos e afins.
Assim sendo, tratamos também neste capítulo de conceituar e caracterizar o que são
Modelos Matemáticos, bem como suas utilizações, tanto no ensino como na pesquisa, em
matemática e em outras ciências. E por outro lado, focar aspectos históricos que revelam
o uso de modelos matemáticos por estudiosos que contribuíram e contribuem na solução de
problemas do cotidiano da humanidade, relacionados à matemática, às ciências e a tecnologia.
3
4 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
1.1 O que é Matemática?
“O Universo foi escrito no idioma da
matemática e seus símbolos são triângulos,
círculos e outras figuras geométricas sem as
quais é humanamente impossível entender uma
única palavra do seu texto.”
(Galileu Galilei, II Saggiatore - 1623)
Para responder a pergunta: “O que é Matemática?,” consultamos a Enciclopédia
Barsa [8] e encontramos: Conjunto de disciplinas lógicas que tratam das relações existentes
entre grandezas e operações, reúne métodos pelos quais essas relações são dedutíveis de
outras conhecidas ou supostas. É, em suma, a ciência das relações de grandeza, ordem,
forma, espaço e continuidade.
Por outro lado, seguindo os passos de Richard Courant e Herbert Robbins em seu
clássico livro “What is Mathematics?”[19], podemos entender que a Matemática, como ex-
pressão da mente, reflete a vontade ativa, a razão contemplativa e o desejo da perfeição
estética. Seus elementos básicos são a lógica e a intuição, a análise e a construção, a ge-
neralidade e a individualidade. Mesmo que diferentes culturas e suas tradições possam dar
ênfase a diferentes aspectos, que lhes pareçam importantes em face de suas necessidades, é
somente através da interação recíproca destas antíteses e a busca incessante por sua síntese
que traduzem a vida, a utilidade e o supremo valor da ciência Matemática.
Os primeiros registros que podemos considerar como matemática foram encontrados
no Oriente onde por volta de 2000 a.C. os povos babilônios em suas placas cuneiformes
colecionaram uma grande quantidade de material que nos dias de hoje seriam enquadrados
como Álgebra Elementar. Entretanto, como ciência no sentido moderno, a Matemática
somente vai aparecer na Grécia Antiga, especificamente nos séculos V e VI a.C., através de
uma maior troca de informações entre os gregos o os povos do oriente, a partir do Império
Persa e culminando no período posterior às conquistas de Alexandre, O Grande, que permitiu
aos gregos incorporarem a matemática e a astronomia dos babilônios.
Como é do conhecimento geral nas ciências, o pensamento filosófico desenvolvia-se
1.1. O QUE É MATEMÁTICA? 5
sobremaneira na Grécia Antiga e portanto a Matemática foi logo submetida à discussão pelos
filósofos gregos. Assim procedendo, os formuladores do pensamento grego, se envolveram e
puderam ficar conscientes das dificuldades específicas associadas aos conceitos matemáticos
de continuidade, movimento e infinito, bem como ao problema da medição de quantidades
quaisquer, fixada uma unidade de comparação.
Nesse contexto, os pensadores gregos enfrentaram o desafio de forma corajosa e
admirável, coroando-se o resultado com o trabalho de Eudóxio (408-347 a.C) do contínuo
geométrico, trabalho esse que só encontrou paralelo mais de vinte séculos depois, com a
moderna Teoria dos Números Irracionais. A matemática dedutiva e postulacional, iniciada
na época de Eudóxio, encontrou nos Elementos de Euclides, sua consolidação.
Mesmo considerando que a metodologia teórica e postulacional da mtemática grega
continue sendo uma de suas facetas importantes e, de fato, tenha exercido grandiosa influên-
cia não apenas na Matemática mas também em outras ciências de um modo geral, não é
possível afirmar que a utilização prática e conexão com a realidade vivencial, tiveram uma
participação igualmente significativa na Matemática da Antiguidade. E cumpre ressaltar
que em várias ocasiões, uma forma de abordagem mais flexível que a euclidiana era mais
procurada. Os matemáticos gregos mergulharam na complexa geometria axiomática, o que
pode ter acontecido em face às dificuldades que encontraram ao tratar com quantidades
incomensuráveis. O resultado desse comportamento dos pensadores gregos é que por apro-
ximadamente dois mil anos, aí incluída toda a Idade Média e seu obscurantismo, o fardo
da tradição geométrica dos gregos não permitiu a evolução do conceito de número e da
manipulação algébrica que constitui um dos fundamentos da ciência moderna.
Foi necessário então, um longo período de tempo e uma vagarosa fase de preparação
até que na Matemática, e nas ciências deum modo geral, iniciou-se uma época de revolução
fabulosa no século XVII, com a Geometria Analítica de René Descartes (1596-1650) e Pierre
Fermat (1601-1665) e a invenção do Cálculo Diferencial e Integral de Newton (1643-1727) e
Leibniz (1646- 1716). Ainda que a geometria grega, mantivesse um lugar de destaque, nos
séculos XVII e XVIII a formulação enfaticamente axiomática e a dedução sistemática cons-
tantes no ideal grego foram abandonadas. Os novos construtores da Ciência Matemática,
6 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
consideravam aparentemente irrelevantes raciocínios logicamente precisos que se iniciavam
com definições claras e sem ambigüidades e ainda axiomas simples e evidentes. Típico de
gênios, em um notório processo de trabalho criativo e de adivinhação, onde a intuição res-
salta sobremaneira, segue-se o raciocínio lógico perfeito, combinado com um misticismo sem
explicação e com uma segurança insofismável na capacidade sobre-humana do procedimento
formal. Esses grandes homens da ciência, construíram um mundo matemático de inesgotável
frutificação.
Após as grandes conquistas da Matemática, alcançadas nos séculos XVII e XVIII,
paulatinamente ao ímpeto dos avanços vai amadurecendo a carência de uma autocrítica, ou
seja, de uma avaliação criteriosa das conquistas já materializadas. Segue-se então, impulsi-
onada pelos ideais da Revolução Francesa que delinearam a necessidade de consolidação e o
desejo de maior qualidade e segurança na extensão de conhecimentos mais avançados, a rea-
lização de uma revisão dos fundamentos sobre os quais estava assentada a nova Matemática,
e em especial, os fundamentos do Cálculo Diferencial e Integral. Dessa forma, o século XIX
ficou marcado, tanto por novos e importantes avanços na Matemática, quanto pela revisão
criteriosa dos fundamentos do Cálculo Diferencial e Integral, revisão essa em que se destaca
o nome do matemático francês Cauchy (1789-1857) e que nos permite ainda dizer que o
século XIX trouxe de volta para a Matemática o bem sucedido ideal clássico da precisão e
da demonstração rigorosa caracterizando-se por avanços para a lógica pura e também para
a abstração.
Observando o atual momento, percebemos que a Matemática continua evoluindo
conforme os ideais clássicos da precisão e das demonstrações rigorosas. Confirmando esta
observação, podemos citar a recente demonstração (1995) do Último Teorema de Fermat pelo
matemático britânico Andrew Wiles (1953), que tendo apresentado sua demonstração inicial,
após exame pela Comissão nomeada para analisar e dar parecer quanto a sua perfeição,
teve que efetuar correções, que demandaram dois anos de trabalhos, até que fosse obtida a
demonstração precisa e rigorosa que resolveu o problema que desafiou grandes matemáticos
por aproximadamente três séculos e meio.
Registramos ainda que na atualidade vivemos um período de estreita relação entre
1.1. O QUE É MATEMÁTICA? 7
a Matemática e as demais ciências em face das necessidades tecnológicas e de mercado
que norteiam as pesquisas científicas nos dias atuais. As simplificações alcançadas com
fundamento na compreenção mais nítida dos objetivos da Matemática como Ciência, torna
possível dominar a teoria matemática sem perder de vista as aplicações em outras ciências
e na tecnologia, tendo como objetivo o bem da humanidade. O estabelecimento definitivo
da união orgânica entre a Ciência pura e aplicada e um bom equilíbrio entre a generalidade
abstrata e a individualidade concreta, pode determinar muito bem, a finalidade suprema da
Matemática no presente e no futuro.
Vamos agora considerar alguns aspectos relacionados com a Filosofia na Matemá-
tica. Sempre que se lança um olhar filosófico, tem-se a impressão de que existe um grande
perigo na ênfase excessiva, que se sobrepõe ao caráter postulacional-dedutivo da Matemá-
tica. Não resta dúvida que o elemento de invenção construtiva de direcionar e motivar a
intuição, tende a fugir de qualquer formulação filosófica. Entretanto ela se mantém como o
cerne de qualquer realização matemática, mesmo nos campos mais abstratos estudados. Se
na pesquisa matemática a forma dedutiva consolidada é o objetivo final, a intuição natural e
a conseqüente construção podem ser consideradas as forças propulsoras do processo criativo.
Para muitos vale a assertiva de que a Matemática nada mais é do que um sistema de conclu-
sões extraídas de definições e postulados que podem ser criados de forma consistente porém
livremente pelos matemáticos; isto em si, constitui uma perigosa ameaça à vida da Ciência
como um todo. Se essa concepção fosse verdade, a Ciência Matemática não teria nenhum
atrativo que motivasse as mentes brilhantes. Seria simplesmente um jogo de definições, re-
gras e silogismos, sem atrativo motivacional, objetivo ou alvo. Trata-se de uma verdade
parcial a convicção de que o intelecto humano, pode por mero capricho ou desejo, construir
sistemas postulacionais significativos relacionados com a realidade universal. Somente regida
pela ordem e disciplina do compromisso com o todo orgânico pode a mente humana livre
obter resultados de valor cientifíco.
É claro que o aspecto contemplativo da análise lógica não corresponde ao todo
da Matemática; entretanto ele tem contribuído para uma compreenção mais aprofundada
dos fatos matemáticos e de sua interdependência, e ainda uma compreenção mais nítida da
8 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
essência dos conceitos matemáticos, característica de um comportamento cientifico universal.
Independente de qual seja nossa corrente filosófica, para todas as finalidades da
observação científica de um objeto em estudo, este se esgota, no que tange às possíveis
relações existentes entre os pares: objeto e observador ou objeto e instrumento de medição.
Não resta dúvida que a simples percepção de um fato, não constitui em si , conhecimento ou
perspicácia; é necessária coordenação e interpretação relativa a alguma entidade subjacente;
uma “coisa em si”, que não pode ser observada fisicamente de forma direta, pertence à
metafísica. Porém, no âmbito do procedimento científico, é importante eliminar todos os
elementos de caráter metafísico, e considerar sempre fatos observáveis, como recursos últimos
de noções, conceitos e construções. A decisão de abandonar o objetivo de compreender “o
objeto em si”, de descobrir e saber “a verdade absoluta”, de decodificar a essência mais íntima
do universo, pode ser uma sofrida decepção para muitos entusiastas menos avisados, mas de
fato essa atitude representa uma das mais significativas e frutíferas revoluções no pensamento
moderno. A Matemática e as ciências atuais não se envolvem mais com o porquê das coisas;
elas cuidam de obter respostas às perguntas: “o que acontece?,” “e como acontece?,” deixando
para a filosofia os problemas gerais da origem dos fatos e fenômenos, ou seja, deixa para a
filosofia a pesquisa do porquê das coisas.
Através dos tempos os matemáticos têm considerado seus objetos, tais como núme-
ros, pontos, etc., como coisas em si próprias. Isto porque estas entidades sempre tinham
desafiado tentativas de uma descrição coerente e adequada. Manifestou-se então no século
XIX a forte convicção de que a questão do significado destes objetos como coisas em si não
fazia sentido dentro do universo da Matemática ou mesmo nas ciências de um modo geral.
As únicas assertivas relativas a eles não dizem respeito à realidade, elas traduzem apenas as
inter-relações entre “objetos indefinidos” matematicamente e as regras governando as opera-
ções com eles. O que pontos, retas, números, “efetivamente” são, não precisa ser discutido
na Matemática. O que de fato é importante e o que corresponde a fatos “verificáveis” é a
estrutura e as relações entre os objetos: que dois pontos determinam uma reta, que números
se combinam de acordo com certas regras para formar outros números, etc. Decorre então
uma percepção muito clara de que não são necessáriosos conceitos da chamada matemá-
1.2. MODELOS MATEMÁTICOS 9
tica elementar, o que tem sido um dos mais importantes, significativos e úteis resultados do
desenvolvimento postulacional moderno.
A Matemática e a Ciência têm avançado de maneira fantástica nos dias atuais,
porque mentes brilhantes e criativas são capazes de esquecer crenças filosóficas dogmáticas
sempre que o apego a elas não permite realizações construtivas; prevalece o senso objetivo e
prático. Portanto, podemos dizer, tanto para os mais eruditos quanto para os leigos, que não
é a filosofia, mas a experiência ativa na própria matemática que pode responder à questão:
“O que é Matemática?”
1.2 Modelos matemáticos
A palavra modelagem, conforme os dicionários, traduz a ação de modelar, ou seja, traçar,
delinear, conformar, dar forma a um objeto que se deseja reproduzir por imitação ou ainda
a representação em escala reduzida de um objeto, que se pretenda analisar, interpretar ou
ainda construir em tamanho real. A esse objeto reduzido, damos o nome genérico de modelo.
Porém, as palavras acima expressas, referem-se a um modelo qualquer. Entretanto, estamos
interessados em Modelos Matemáticos. Segue-se então a pergunta: o que é um Modelo
Matemático?
Segundo Santaella [36] a Matemática como ciência, se utiliza da observação, posto
que é capaz de construir objetos ideais na imaginação. Isso, “de acordo com preceitos abs-
tratos, passando então, a observar esses objetos imaginários, para neles encontrar relações
entre as partes que não estavam especificadas no preceito da construção”.
A observação não é um recurso exclusivo da Matemática, pois a Ciência de um
modo geral se utiliza da observação, e o faz por intermédio de modelos, que representam a
realidade do fenômeno.
Subsiste, portanto, à noção de modelo, a idéia de analogia, a saber, certa correlação
de forma e estrutura entre o modelo proposto e o fenômeno em estudo. Sob a ótica do
estudioso e pesquisador, naquele momento de caracterização, entretanto, sempre existe uma
diferença entre a observação e a realidade, o que é traduzido através da expressa equivalência
10 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
parcial entre entidades e aspectos, que de um modo geral podem parecer distintos. Fica
claro que construir analogias é um processo que tem como objetivo comparar entidades e
aspectos que guardam, de alguma maneira equivalência. O procedimento envolve a busca de
semelhanças bem definidas entre o modelo e os objetos, entre os fenômenos observados no
cotidiano e sua caracterização através de relações matemáticas, seja com auxílio de gráficos
e diagramas, seja com auxílio de uma equação que descreve a trajetória de um objeto sob a
ação do campo gravitacional terrestre, por exemplo uma trajetória balística, definindo uma
correspondência entre uma situação, ou estado, e uma abordagem em linguagem formal que
procura caracterizar esses fenômenos.
Para o professor Bassanezi [2], um modelo é um conjunto de símbolos e relações
matemáticas que representam de alguma forma o objeto estudado. A estas primeiras consi-
derações, acrescenta: “Quando se procura refletir sobre uma porção da realidade, na tentativa
de explicar, de entender, ou de agir sobre ela - o processo usual é selecionar no sistema, argu-
mentos ou parâmetros considerados essenciais e formalizá-los através de um sistema artificial
: o modelo.”
Podemos assim, perceber uma importante e fundamental característica de um mo-
delo: evidenciar de maneira aproximadamente formal, conforme leis e normatização da repre-
sentação pictórica, geométrica, espacial etc., as várias relações, muitas vezes não percebidas
pelo observador, entre as diversas partes do objeto em estudo a ser representado.
Convém ainda destacar, que os modelos são elaborados em conformidade com os
fenômenos ou situações analisadas, podendo ser classificados considerando-se o tipo de ma-
temática utilizada. Assim, ao estudar os alvéolos das abelhas e considerar a forma geométrica
hexagonal para abordar o problema, aparece o modelo dito estático. Por outro lado, para
estudar o crescimento populacional de uma cultura de bactérias, são utilizados os modelos
ditos dinâmicos. Um modelo é dito dinâmico, se é capaz de simular variações de estágios do
fenômeno; caso contrário é dito estático.
1.3. MODELAGEM MATEMÁTICA 11
1.3 Modelagem matemática
Volvendo o olhar para a evolução da ciência e da tecnologia, podemos observar que até o
século XIX, a Matemática manteve-se mais estreitamente ligada à física e à engenharia em
suas várias áreas de atuação, participando de forma decisiva e contínua na elaboração de
aplicações da Matemática ao estudo e resolução de problemas desses campos da Ciência e da
Tecnologia. A partir do século XX a Matemática Aplicada se caracteriza por duas atividades
importantes e essenciais na evolução do conhecimento humano nas mais diversas áreas: a
Modelagem Matemática e o emprego de métodos e técnicas matemáticas.
A Matemática Pura e seu abstratismo se utilizada sem a conseqüente dedução mate-
mática das conseqüências e comparações com as observações é apenas uma parte do trabalho.
As técnicas e métodos matemáticos, assim utilizadas, podem produzir resultados estéreis Ka-
pur [27]. Reforçando essa afirmativa, encontramos em McLone [30], a observação de que a
grande maioria dos estudantes de Matemática são submetidos ao desenvolvimento de teorias
com elevado grau de formalização em campos ou áreas bem particulares e ao domínio de
um grande número de métodos e técnicas matemáticas. Decorre então que o estudante não
tem, por exemplo, a oportunidade de ver como Newton pesquisou, trabalhou e desenvolveu
a gravitação universal que hoje constitui uma teoria consolidada. E ainda nessa linha de
raciocínio constatamos que o estudante não tem a sua atenção dirigida para a importância
desse modelo matemático na solução de problemas práticos, que serão enfrentados por ele no
futuro quando já profissional. Dessa maneira, permanece a impressão de que a aplicação da
Matemática se reduz basicamente em encontrar e aplicar fórmulas adequadas para encontrar
determinadas respostas.
Do ponto de vista de Kapur [27] a modelagem matemática é considerada uma arte e
portanto, deve ser ensinada e aprendida como arte. Dessa maneira a pedagogia da modela-
gem matemática deve encontrar sua fonte de inspiração na pedagogia das nobres Artes e da
Música, muito mais do que nas ciências naturais como a Física e a Química, por exemplo.
Tudo indica que a Música e a Pintura, entre outras, parecem exigir, mais arte, mais sensi-
bilidade e mais interpretação que a Física e a Química. Ainda nessa abordagem, o autor
12 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
citado, destaca, que a modelagem matemática é aprendida através da ação, ou seja, através
da construção de modelos matemáticos e da aplicação dedicada na busca da melhoria e aper-
feiçoamento desses modelos. Somente a experiência e a prática podem conduzir à confiança
na construção de modelos. A partir dos mais simples e grosseiros modelos, adquirimos a
qualidade para a prática da modelagem matemática.
A Paleontologia nos revela, que a modelagem matemática tem sido praticada desde
a pré-história. O homem vive cada instante da vida na busca constante de conhecer e
compreender o meio ambiente ao seu redor. Para explorá-lo e conhecê-lo, o homem lança
mão de suas faculdades físicas e mentais, de seus instintos e de sua razão. Ao raciocinar,
refletir e pensar, o homem foi capaz de questionar sobre a natureza e seus fenômenos naturais
como a chuva, o vento, as frentes frias, os terremotos, a eletricidade, a radiação e outros.
O homem começou a desenvolver sua ciência na medida em que procurou conhecer
esses fenômenos. Entretanto essa ciência estava sempre associada ao contexto do mundo da
época, bem como dos aspectos social, político e religioso da cada povo. Dessa forma, ciências
como a Matemática e a Astronomia, alcançaram maior desenvolvimento.A Matemática recebendo contribuições desde a antiguidade, tem um progresso deci-
sivo e culminante com a invenção do Cálculo Diferencial e Integral por Newton (1642-1727)
e Leibniz (1646-1716), o que determinou uma verdadeira revolução na Ciência de tal forma
que o seu estudo e desenvolvimento veio a constituir-se no principal elemento propulsor dos
progressos alcançados pela matemática moderna [46].
Desta maneira, a Matemática tornou-se uma ferramenta poderosa a ser usada pelo
homem no estudo da natureza e de seus fenômenos. Usando esse conhecimento, o homem
passou a agir basicamente de duas maneiras: num primeiro momento, buscando atenuar os
efeitos destrutivos de fenômenos tais com chuvas, frentes frias, ventos, furacões, terremotos,
maremotos etc.; e num segundo momento, a faculdade do ser humano de pensar, raciocinar,
questionar e criar, associadas ao ímpeto de investigar, bem como a disponibilidade da fer-
ramenta matemática já desenvolvida, possibilitando ao homem explorar seu meio ambiente,
modelando-o para melhor conhecê-lo e dele melhor utilizar-se.
A modelagem matemática, constitui-se portanto de um conjunto de regras e pro-
1.3. MODELAGEM MATEMÁTICA 13
cedimentos, cujo objetivo é construir um paralelo para tentar explicar matematicamente os
fenômenos presentes no cotidiano do ser humano, auxiliando-o a fazer predições e a tomar
decisões.
A modelagem matemática “consiste na arte de transformar problemas da realidade
em problemas matemáticos e resolvê-los, interpretando suas soluções na linguagem do mundo
real” [2]. Ela permite a realização de previsões e tendências, e é eficiente a partir do momento
da tomada de consciência de que estamos trabalhando sobre representações de um sistema
ou parte dele. É um processo dinâmico, onde, partindo-se de um problema real associado a
um conjunto de hipóteses é obtido um modelo que forneça possíveis soluções para o problema
em estudo.
As últimas décadas têm se caracterizado por um crescente fluxo de interesse em
modelagem matemática, motivado por uma nova identidade e uma nova unidade à Matemá-
tica Aplicada, enfatizando os campos da indústria em geral e o segmento de armamentos,
possibilitando oportunidades de trabalho para matemáticos com habilidades em modelagem
matemática.
Como método de pesquisa científica, a disciplina modelagem matemática, tem uma
orientação metodológica a ser utilizada. Com essa finalidade, foram desenvolvidos vários
esquemas descrevendo as etapas pertinentes a um processo de modelagem matemática. Um
esquema, que frequentemente é encontrado na literatura existente entre as quais citamos [3],
[4], [26] é composto pelas seguintes etapas:
1a - Definição do problema:
A partir de uma situação real é identificado o problema a ser estudado e devemos
obter os dados necessários para sua modelagem.
2a - Simplificação e formulação de hipóteses:
Os dados são examinados e selecionados de modo que preservem as características
do problema visando uma simplificação.
3a - Dedução do modelo matemático:
Nesta etapa, substituimos o problema por uma descrição matemática coerente.
4a - Resolução do problema matemático:
14 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
É a fase em que utilizamos métodos matemáticos na busca da solução do problema
formulado.
5a - Validação:
Nesta fase a aceitação do modelo proposto é analisada. Assim, os dados reais são
comparados com os dados fornecidos pelo modelo. Caso não haja compatibilidade devemos
retornar à formulação de hipóteses e simplificações e reiniciar o processo.
6a - Aplicação do modelo:
Caso seja considerado válido, o modelo é utilizado para compreender, explicar, ana-
lisar, prever ou decidir sobre a realidade em estudo. Esta é a fase que possibilita o intervir,
o exercitar, o manejar situações associadas ao problema estudado.
O esquema acima apresentado e suas etapas, não representam uma receita rígida a
ser seguida, mas estabelece uma seqüência de procedimentos norteadores, que podem pro-
porcionar a obtenção de melhores resultados no estudo de problemas por meio da modelagem
matemática.
1.4 Modelagem matemática como estratégia de ensino e
aprendizagem no ensino superior
A utilização da modelagem matemática no contexto do ensino da Matemática exige algumas
mudanças no que diz respeito à organização e objetivos. A essência de um processo de mode-
lagem matemática, está na transposição de um problema real para um universo matemático.
Se o objetivo é o ensino e o processo de construção e utilização de modelos se desenvolve em
sala de aula, devemos considerar especial atenção ao cenário pedagógico, isto é, aos aspectos
relacionados ao ensino e à matemática integrante do currículo estabelecido [5].
A modelagem matemática tem seu lugar reconhecido como alternativa pedagógica na
condução do processo de ensino e aprendizagem em cursos regulares submetidos a programas
e cronogramas bem determinados [6].
Para justificar e sugerir a criação de um ambiente que inclua atividades de modela-
1.4. MODELAGEM MATEMÁTICA COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO E APRENDIZAGEM NO ENS
gem atemática na estrutura curricular de Matemática podemos citar os seguintes argumentos:
1o - Certificação do papel da Matemática na sociedade:
A Matemática, como ciência exata, tem sido bastante utilizada como suporte para
apresentar sugestões e propostas de soluções a vários problemas da sociedade. É reconhecida
a importância do seu papel, em face de dados estatísticos e outros resultados numéricos que
fundamentam argumentações para tomada de decisões. Esta capacidade da Matemática de
deter argumentos para decisão é subsidiada pelo que se conhece por “ideologia da certeza” [7].
Depreendemos então, ser importante que todo cidadão reconheça o papel da Matemática na
vida, tanto nos aspectos profissionais quanto sociais. Assim, encontramos em [32], o seguinte
destaque “se a Matemática é tão importante na sociedade, parece natural que no ensino da
Matemática se mostre o porquê e como”.
2o - Desenvolvimento de qualidades sociais:
As divergências e choques de interesses decorrentes da interação dos indivíduos pode
gerar benefícios mútuos às pessoas que desfrutam de um mesmo patamar de desenvolvimento
cognitivo mas que avaliam uma determinada situação com perspectivas diferentes. As ativi-
dades desenvolvidas em grupos permitem o desenvolvimento do senso de responsabilidade, a
auto-estima, a cooperação e a capacidade de crítica. Para esses grupos são valorizadas qua-
lidades sociais, tais como: capacidade de negociar, de comunicar-se na linguagem do grupo,
de participar responsabilidades e de trabalhar em equipe. Qualidades essas proporcionadas
num ambiente de modelagem matemática [22].
3o - Incorporação de conceitos matemáticos e suas aplicações:
As grandes dificuldades registradas no aprendizado da Matemática mostram que
esse aspecto ultrapassa os limites do ensino fundamental e ensino médio, chegando ao ensino
superior. Essa ocorrência determina um elevado grau de desistência e reprovação nas dis-
ciplinas de Matemática e de outras que exigem pré-requisitos de Matemática. Observamos
também que se o aluno, durante sua vida acadêmica não teve a possibilidade de participar de
forma significativa da elaboração e solução de situações problemas, fazendo pesquisa e coleta
de dados, sugerindo hipóteses, encontrando a solução, este provavelmente encontrará em sua
vida profissional, grande dificuldade de solucionar os problemas que lhe forem apresentados.
16 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
Dessa maneira, é necessária uma educação em todos os níveis, que possibilite e incentive
a resolução de problemas, mostrando de forma clara e objetiva, onde e como se aplica a
Matemática.
A utilização de conceitos matemáticos em situações do dia-a-dia pré-supõe que essa
habilitação seja desenvolvida e que o professor deva trabalhar em sua sala de aula com
“verdadeiras situações problemas” [42]. Uma atividade de modelagem matemática, pode
dar suporteaos alunos na aquisição e compreenção dos conteúdos matemáticos, bem como
promover atividades e habilidades, que estimulem a criatividade e a solução de problemas
[31]. A apresentação de novos conceitos a partir de problemas reais, pode ser uma base
concreta para desenvolver os conceitos, bem como representar relevante papel motivador.
4o- Desenvolvimento do conhecimento reflexivo :
“A Matemática está formatando nossa sociedade” [39]. Acrescenta o autor que a Ma-
temática, como disciplina, intervem na realidade quando prporciona não apenas discussões
de fenômenos mas possibilita também a construção de modelos para a evolução de com-
portamentos. Afirma ainda que nós, seres humanos, agimos de acordo com a Matemática,
tornando-se necessário desenvolver uma capacidade crítica nos alunos que torne possível li-
dar com o desenvolvimento social e tecnológico que estamos presenciando nos dias atuais.
Essa forma particular de saber, está relacionada com o conhecimento reflexivo que se refere
“à competência de refletir sobre o uso da Matemática e avaliá-lo” [40].
5o- Processos cognitivos desenvolvidos pelos alunos:
“O conhecimento construído através de modelos é um saber contextualizado e com
significado” [25]. O aluno é agente do processo de construção, onde observa, coleta dados,
procura soluções e toma decisões. Se o conceito for construído pelo aluno, será facilmente res-
gatado, quando necessário. Alguns aspectos cognitivos foram desenvolvidos por um grupo de
alunos e observados [14]: compreenção de situações extra matemáticas, atribuição de signi-
ficado aos aspectos matemáticos, aplicação de conhecimentos, introdução de novos conceitos
e elaboração de estratégias próprias.
1.5. COMO USAR A MODELAGEM MATEMÁTICA NA SALA DE AULA 17
1.5 Como usar a modelagem matemática na sala de aula
Em um ambiente de ensino e aprendizagem os trabalhos de modelagem matemática podem
ser desenvolvidos de forma gradativa com os alunos, respeitando diferentes momentos [23]:
1o momento:
Abordar com todos os alunos as situações que estão em estudo considerando os
aspectos relacionados à dedução, utilização, análise e exploração de um modelo matemático
a partir de uma situação problema já estabelecida.
2o momento:
O professor sugere uma situação problema já estabelecida, juntamente com um
conjunto de informações e os alunos realizam a formulação de hipóteses e a dedução do
modelo durante uma investigação e finalmente validam o modelo encontrado para o problema
em estudo.
3o momento:
Os alunos, já divididos em grupos, são incentivados a conduzir um processo de
modelagem a partir de uma situação problema por eles escolhida, com assessoria do professor.
Uma vez estabelecido o problema, os alunos procedem a coleta dos dados e informações
necessárias para tornar possível uma solução. O processo de validação do modelo possibilita
ao aluno analisar, tomar decisões, discutir, descobrir, explorar, experimentar o novo [23].
Esta forma de encaminhar as atividades de modelagem matemática em sala de
aula, embora não constitua uma prescrição rigorosa, tem-se mostrado bastante adequada na
prática em diferentes níveis de ensino. Mesmo em cursos regulares, com limitação de tempo
e conteúdos programáticos, é possível desenvolver as atividades de modelagem matemática
e proporcionar grande eficiência no processo de aprendizagem dos alunos [24].
1.6 Um pouco de história
Vamos falar de funções importantes da matemática que se tornaram básicas por serem mo-
delos usados por nossos antepassados.
18 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
A noção de função foi construída e aperfeiçoada ao longo de vários séculos. É possível
detectar sinais de que os babilônios já teriam uma idéia ainda que vaga de função através das
tábuas de quadrados, cubos e de raízes quadradas utilizadas por aquele povo na antiguidade.
As funções matemáticas que hoje utilizamos foram desenvolvidas a partir da solução
de problemas práticos. Assim as funções polinomiais surgiram a partir das equações algé-
bricas construídas para solucionar problemas que conhecemos como do primeiro, segundo e
terceiro graus. Problemas financeiros ligados a juros e amortizações conduziram às funções
logarítmicas e exponenciais. As funções trigonométricas tiveram sua origem em problemas
de astronomia e agrimensura.
Para Leibniz (1646-1716), o primeiro a utilizar a palavra “função” e para os matemá-
ticos do século XVIII, a idéia de uma relação funcional estava mas ou menos identificada com
a existência de uma fórmula matemática simples expressando a natureza exata da relação.
Esse conceito mostrou ser demasiadamente limitado para as exigências da Física Matemá-
tica, e a idéia de função foi submetida a um longo processo de generalização e esclarecimento
até atingir a forma atualmente utilizada.
Muitas funções são básicas na Matemática e não seria possível tratar de todas nestas
poucas páginas. Por sua importância selecionamos as funções funções trigonométricas, que
ilustram como a modelagem matemática esteve presente em seu desenvolvimento.
1.6.1 As funções trigonométricas — trigonometria
A trigonometria como ciência analítica estudada atualmente teve sua origem no século XVII,
após o desenvolvimento do simbolismo algébrico. Se levarmos em consideração a Geometria
associada à Astronomia, suas origens remontarão aos trabalhos de Hiparco no século II a.C.,
embora existam registros anteriores de seu uso. Por outro lado, se considerarmos como
“medidas no triângulo”, sua origem será deslocada para o terceiro milênio antes de Cristo.
O estudo da história das funções trigonométricas, permite também observar o sur-
gimento e o progresso da Álgebra e da Análise, áreas da Matemática nela contidas de forma
embrionária. Podemos destacar que a trigonometria, mais do que qualquer outra área da Ma-
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 19
temática, desenvolveu-se no mundo antigo a partir de necessidades práticas, principalmente
relacionadas à agrimensura, à astronomia e à navegação.
Origens da trigonometria
Os rudimentos da trigonometria surgiram no Egito e na Babilônia a partir do cálculo de
razões entre números e entre medidas de lados de triângulos semelhantes.
Figura 1.1: O “seqt” egípcio.
Utilizado no Egito antigo, isto pode ser conhecido graças ao papiro Ahmes, também
conhecido como papiro Rhind de 1650 a.C., que contém 84 problemas, dos quais quatro
citam o “seqt” de um ângulo, reconhecido hoje como a cotangente do ângulo formado pelo
plano da base de uma pirâmide com o plano de uma face lateral. Na construção de uma
pirâmide egípcia, era essencial manter constante a inclinação das faces laterais, fato que
levou os construtores e matemáticos egípcios a introduzirem o conceito de “seqt” de um
ângulo. Além da utilização da trigonometria na medição e construção de pirâmides, surgiu
no Egito por volta de 1500 a.C., a idéia de relacionar as sombras de uma vareta vertical
com sequências de números, associando seus comprimentos com as horas do dia: o relógio
de sol. As idéias dos construtores do relógio de sol para medir o tempo e as necessidades
práticas de medir alturas e distâncias, fundamentaram posteriormente a construção das
funções trigonométricas tangente e cotangente.
O povo babilônio alcançou um grande desenvolvimento na Astronomia que exerceu
uma forte influência em várias outras civilizações posteriores. Eles construiram no século
20 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
XXVIII a.C., durante o reinado de Sargão um calendário astrológico que chegou até os dias
de hoje [41], atestando a validade dos modelos elaborados por estes nossos antepassados. Na
China foram encontrados registros de uma trigonometria primitiva por volta do ano 1110
a.C., época do imperador Chóu-pei Suan King. Eram utilizados triângulos para calcular
distâncias e existem evidências de que conheciam as razões trigonométricas, o conceito de
ângulo e de como medi-los.
A trigonometria dos gregos
A primeira contribuição documentadados gregos para a Trigonometria surgiu por volta 180
a.C., quando Hipsícles, possivelmente influenciado pelos babilônios, dividiu o zodíaco em 360
partes. Essa idéia foi depois generalizada para um círculo qualquer por Hiparco (180-125
a.C.) [21].
Usando semelhança de triângulos e razões trigonométricas, Eratóstenes (276-196
a.C.), realizou a mais notável medida na antiguidade para a circunferência terrestre, realiza-
ção que levou o Sábio de Cirene a perceber a necessidade de relações mais sistemáticas entre
ângulos e cordas.
Um marco na história da trigonometria e das funções trigonométricas aconteceu
na segunda metade do século II a.C., quando Hiparco, inspirado nos conhecimentos dos
babilônios dividiu a circunferência em 360 partes e a cada parte atribuiu o nome de arco
de um grau. Ele também dividiu cada arco de um grau em 60 partes, obtendo o arco de
um minuto. Sua trigonometria estava fundamentada em uma única “função”, na qual a cada
arco de circunferência de raio arbitrário, era associada a respectiva corda. Hiparco construiu
o que foi possivelmente a primeira tábua trigonométrica com os valores das cordas de uma
série de arcos de 0o a 180o com auxílio de interpolação linear. Também observou que para
um dado círculo, a razão arco/corda diminui quando o arco diminui desde 180o até 0o e
resolveu associar a cada corda de um arco, o ângulo central correspondente, o que significou
um grande avanço para a Astronomia, sendo por isso agraciado com o título de “Pai da
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 21
Trigonometria”. Em linguagem atual esse resultado corresponde a:
lim
x→0
sen(x)
x
= 1;
Segue-se então, o surgimento da obra mais importante da trigonometria da antiguidade no
século II em Alexandria, “Syntaxis Mathemática”, conhecida como Almagesto, em árabe
“A Maior”, do grande Cláudio Ptolomeu. O Almagesto é uma referência, um Modelo de
Astronomia que perdurou até o século XVI, quando Nicolau Copernico estabeleceu o Modelo
Heliocêntrico e alavancou a astronomia moderna e a mecânica celeste. Ptolomeu no seu
Almagesto compilou e sintetizou todo conhecimento disponível em sua época e em especial, os
trabalhos de Hiparco. O Almagesto sobreviveu e por isso temos suas tabelas trigonométricas
e também uma exposição dos modelos e métodos usados por Ptolomeu que são importantes,
pois muito conhecimento daquela época foi perdido.
O trabalho de Ptolomeu não contém tabelas das “funções” seno e cosseno, mais
sim, a função corda do arco x, embora naturalmente estes termos não apareçam em seus
escritos. A “função” corda do arco x, era definida como sendo o comprimento da corda que
corresponde a um arco de x graus em um círculo de raio 60. A tabela tinha três colunas, a
primeira para o arco x, a segunda para o comprimento da corda correspondente e a terceira
para a variação média da corda por minuto, usada para interpolações.
Encontramos no Almagesto:
1 - Uma tabela com ângulos de meio em meio grau, de 0o a 180o, mais completa que
a calculada por Hiparco.
2 - Uso da base sexagesimal, circunferência dividida em 360 graus e o raio em 60
partes e frações decimais, não só para expressar ângulos, mas para qualquer tipo de cálculo,
onde aplicável.
3 - O teorema, hoje conhecido como teorema de Ptolomeu, que tem o seguinte
enunciado: “Para todo quadrilátero convexo inscrito em um círculo, o produto das diagonais
é igual à soma dos produtos dos lados opostos”.
Com auxílio desse teorema e operações envolvendo as cordas dos arcos, Ptolomeu
foi capaz de obter o que vamos chamar de “relações” equivalentes às conhecidas fórmulas
22 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
para soma e subtração de arcos, ou seja, sen(a + b) e sen(a − b). Em particular, utilizou a
fórmula para a corda da diferença de dois arcos para calcular sua tábua trigonométrica.
Figura 1.2: O Teorema de Ptolomeu.
4 - Avaliação do seno do arco metade, também com auxílio de cordas.
Analisando o trabalho de Ptolomeu no Almagesto, podemos reconhecer o valor de
sua contribuição para a ciência, na medida em que através de seus modelos astronômicos
e das ferramentas matemáticas disponíveis, entre elas a Trigonometria, ele mostrou que
uma descrição matemática dos fenômenos naturais é possível, desejável e capaz de fornecer
predições confiáveis [1].
Tratando das funções trigonométricas em suas origens, sucintamente veremos o de-
senvolvimento do conceito de função. Os gregos não desenvolveram o conceito de função
propriamente dito, porém com Aristóteles (384-322 a.C.) aparecem idéias de quantidades
variáveis e nos trabalhos de Arquimedes de Siracusa (287-212a.C.) e Apolônio de Pérgamo
(262-190a.C.) sobre as cônicas, encontramos o conceito de “Sympton” de uma curva, que é
definido como a condição para que um ponto pertencesse à cônica, o que evidência de certa
forma a idéia de função. A Matemática na antiguidade clássica não foi capaz de estabelecer
a idéia geral de quantidade variável ou de função; em toda metodologia e na manipulação
de quantidades não havia preocupação com a generalização. Na astronomia por exemplo, o
objetivo era representar em tabelas relações entre quantidades discretas.
A trigonometria do povo hindu
Após a queda do império romano, a Índia passou a centralizar a cultura no mundo de
então, quando notáveis contribuições foram incorporadas à trigonometria através de textos
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 23
denominados Siddhanta, cujo significado é sistemas de astronomia. Chegou até os nossos dias
o Surya Siddhanta, sistemas do sol, datado de aproximadamente 400 d.C. Trata-se de um
trabalho em versos com poucos esclarecimentos e nenhuma demonstração, não necessárias,
pois reza a tradição, que foi escrito por um Deus [9].
O grande significado do Surya Siddhanta para a Matemática de hoje é que ele
criou novos caminhos para a Trigonometria por não adotar o modelo de Ptolomeu, que
relacionava as cordas de um círculo com os ângulos centrais correspondentes. Para fazer
aplicações da “função” corda na astronomia era sempre necessário duplicar o arco antes de
usá-lo na tábua de cordas. Portanto, era mais conveniente dispor de uma tábua na qual o
próprio arco desempenhava o papel de variável independente. No Surya Siddhanta, a relação
utilizada chamada de “Jiva”, era calculada entre a metade da corda e a metade do ângulo
central correspondente. Essa forma de abordar o problema possibilitou a visualização de um
triângulo retângulo na circunferência como mostramos na figura abaixo.
Figura 1.3: O “Jiva” hindu.
Os hindus definiam o “Jiva” como sendo a razão entre o cateto oposto e a hipotenusa:
jiva
θ
2
=
cateto oposto
hipotenusa
sen
θ
2
=
c/2
r
=
c
2r
=
1
2r
crdθ.
A metade da corda dividida pelo raio do círculo é o seno da metade do arco (ou da
metade do ângulo central correspondente a todo o arco). Com a contribuição do povo hindu
as principais “funções” trigonométricas foram introduzidas na Matemática e os métodos de
tabulação se aperfeiçoaram, em particular interpolações quadrática e linear. O matemático
hindu Aryabhata (475-550 d.C.) por volta do ano 500 d.C., já calculava semicordas e usava o
sistema decimal, desenvolvido aproximadamente em 600 d.C. Quando os matemáticos hindus
24 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
introduziram os conceitos de semicorda e de seno, foram capazes de demonstrar algumas
identidades trigonométricas, e encontramos nos trabalhos de Varahamihira, em 505 d.C., a
expressão equivalente de sen2(x) + cos2(x) = 1 [20].
A trigonometria dos povos árabes e persas
O império árabe viveu extraordinário avanço nos diversos campos das ciências e das artes
no período compreendido entre os séculos VIII e XI com notável destaque no século IX. A
grande expansão da cultura árabe ou mulçumana encontra explicação, principalmente em
função da difusão da língua árabe, que substituiu o grego como língua internacional. Graças
ao emprego da língua árabe foi possível a preservação e a fixação de muitas obras antigas
importantes,que foram traduzidas e difundidas entre os intelectuais mulçumanos.
Figura 1.4: O raio unitário de Al Battani.
A grande influência árabe teve início com a criação da Escola de Bagdad, no século IX,
tendo como um de seus maiores expoentes o príncipe da Síria Mohamed-ben-Geber, também
chamado de Al Battani (850-929 d.C.). Al Battani, também conhecido por Albategnius
nas traduções latinas, é chamado o Ptolomeu de Bagdad e seus trabalhos permitiram que
a trigonometria hindu fosse adotada pelos árabes principalmente a partir de sua idéia de
introduzir o círculo de raio unitário e com isso demonstrar que a razão jiva é válida para
qualquer triângulo retângulo independentemente do valor da medida da hipotenusa conforme
relações abaixo, ver figura 1.4.
jiva =
cateto oposto
1
=
BC
1
sen
θ
2
=
BC
1
Se um triângulo retângulo tem um ângulo agudo
θ
2
então, quaisquer que sejam as
medidas do cateto oposto e da hipotenusa (ver figura 1.5), podemos afirmar que:
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 25
△ABC ≈ △AB1C1
No △ABC temos sen θ
2
=
jiva
1
Pelo teorema de Tales, temos
jiva
1
=
BC
AB
=
B1C1
AB1
Logo sen
θ
2
=
B1C1
AB1
=
jiva
1
.
Figura 1.5: Fórmula para calcular a tabela de Al Battani.
Depois de Al-Battani, merece registro entre os matemáticos árabes Abû’l Wêfa (940-998)
que em 980 tratou da organização e da sistematização de provas e teoremas de trigonometria.
Destacamos também o astrônomo persa Nasîr ed-dên al-Tûsî (1201-1274) autor do primeiro
trabalho no qual a trigonometria apareceu como uma ciência por ela própria, desvinculada
da astronomia. Isto seria retomado na Europa no século XV, quando Regiomontanus (1436-
1476) estabeleceu a trigonometria como um ramo da Matemática. Com o declínio da Escola
de Bagdad o centro das atividades intelectuais deslocou-se para o sul da Europa na Península
Ibérica e com ele o estudo da trigonometria. A cidade de Toledo tornou-se o mais impor-
tante centro de cultura a partir de 1085 após sua libertação pelos cristãos do domínio mouro.
Isto ocorreu porque para ela se deslocaram os estudiosos ocidentais visando adquirir o saber
mulçumano. O século XII na história da Matemática é conhecido como um século de tradu-
tores, dos quais destacamos Platão de Tivoli (viveu em Barcelona de 1134-1145), Gerardo
de Cremona (1114-1187), Adelardo de Bath (1075-1160) e Robert de Chester, que viveu na
Espanha por volta de 1150. O trabalho desses tradutores permitiu à Europa incorporar a
matemática dos árabes e absorvendo assim o conhecimento grego preservado [20].
26 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
O conhecimento árabe e os europeus
Diversos astrônomos árabes foram trabalhar na Espanha e repassaram seus conhecimentos.
Os mais importantes foram Ibrâhîm ibn Yahyâ al Naqqâsh (1028-1087), conhecido como
Arzachel, que viveu em Córdoba, sendo autor de um conjunto de tábuas trigonométricas
publicadas em 1050 e Jabir ibn Aflah (1100-1150) que viveu em Sevilha e cujos estudos
divulgados em 1145 se mostraram tão interessantes que séculos mais tarde (1543) foram
publicados em Nuremberg.
O matemático europeu mais destacado do século XII foi Fibonacci (1170-1250). Ele
estudou no norte da Àfrica e depois viajou pelo Oriente como mercador, quando sofreu
grande influência dos árabes. Sua obra “Practica Geometriae” de 1220 é uma aplicação da
trigonometria na resolução de problemas de agrimensura.
Em 1250 o rei Alfonso X de Castela ordenou aos estudiosos de Toledo a tradução
dos livros de astronomia e modernizassem as tábuas trigonométricas árabes. Em 1254 foram
concluídas as Tábuas Afonsinas, que junto com “Os Libros del Saber” se tornaram de grande
valia para as navegações espanholas e portuguesas realizadas nos séculos XV e XVI.
A trigonometria no continente europeu a partir do século XIV
Na Europa do século XIV ocorreram importantes avanços para o desenvolvimento da Ma-
temática. Pela primeira vez as noções de quantidades variáveis e de função são expressas
e, tanto na Escola de Filosofia Natural do Merton College de Oxford, quanto na Escola de
Paris, chegou-se à conclusão de que “a Matemática é o principal instrumento para o estudo
dos fenômenos naturais.” Com o início do estudo da velocidade instantânea ou pontual e
a atenção especial dada ao movimento, tornou-se necessário o desenvolvimento de um novo
suporte matemático [20].
Paralelamente ao desenvolvimento da Trigonometria, que já ocorria na Europa desde
o século XI, a partir da retomada do conhecimento árabe, ocorreu o desenvolvimento das
funções. Nesse campo detacamos Nicole Oresme (1323-1382) com seu “Treatise on the confi-
guration of Qualities and Motions” no qual introduziu a representação gráfica que explicita
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 27
a noção de funcionalidade entre variáveis (velocidade e tempo). Os trabalhos de Oresme
influenciaram Galileu (1565-1642) e Descartes (1596-1650) e deram início à consolidação do
conceito de função.
No século XV o inglês Peurbach (1423-1461) retomou a obra de Ptolomeu e construiu
uma nova tábua de senos muito conhecida dos estudiosos europeus. Peurbach foi professor
de Regiomontanus (1436-1475), um dos maiores matemáticos do século XV, cujo trabalho
exerceu grande influência, estabelecendo a Trigonometria como uma ciência independente
da Astronomia.
Regiomontanus escreveu um Tratado sobre Triângulos em cinco livros, contendo
uma trigonometria completa. A invenção dos logaritmos e alguns dos teoremas demons-
trados por Napier (1550-1617) mostram que a trigonometria de Regiomontanus não difere
basicamente da que utilizamos hoje em dia. Em seu Tratado Regiomontanus calculou novas
tábuas trigonométricas, aperfeiçoando as do seno de Peurbach, e introduziu na trigonometria
européia o uso das tangentes, que incluiu em suas tábuas. Podemos dizer que foi ele quem
estabeleceu os fundamentos para os futuros trabalhos nas trigonometrias plana e esférica.
Nicolau Copérnico (1473-1543) também desenvolveu estudos em trigonometria ao
completar em 1520 alguns trabalhos de Regiomontanus que incluiu em um capítulo de seu
trabalho “De Lateribus et Angulis Triangulorum,” publicado em separado por seu discípulo
Rhaeticus em 1542.
Com a invenção da imprensa por Guttemberg no século XV surge o primeiro tra-
balho impresso em trigonometria, a “Tabula Directionum” de Regiomontanus, publicado em
Nuremberg por volta de 1485.
Em 1551 na cidade de Leipzig, Joachim Rhaeticus (1514-1576) publica “Canon Doc-
trinae Triangulorum”, onde pela primeira vez as seis funções trigonométricas foram definidas
como funções do ângulo em vez de funções do arco e subentendidas como razões, embora
ele não tenha dado nomes para seno, cosseno ou cossecante. Rhaeticus refez as tábuas de
Regiomontanus de 1464, com maior rigor nos cálculos, aumentando a precisão para onze
casas decimais e os senos, cossenos, tangentes e secantes foram calculados de minuto em
minuto para os arcos do primeiro quadrante e de dez em dez segundos para o arco de 1o (um
28 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
grau). Ele foi o primeiro a adotar a organização das tábuas de semiquadrantes, dando os
valores dos senos, cossenos e tangentes de ângulos até 45o e completando a tabela com o uso
da igualdade sen(x) = cos(π
2
− x). Deve-se também a Rhaeticus a introdução das secantes
na trigonometria européia e os cálculos do sen nθ em termos de sen θ, que foram retomados
e aprimorados por Jacques Bernoulli (1654-1705).
Neste breve resumo histórico registramos ainda o francês Francois Viète (1540-1603),
que introduziu o tratamento analítico na trigonometria em 1580 e foi o primeiro matemático
a usar letras para representar coeficientes gerais, fato que representou grande avanço no
campo da álgebra. Viète também construiu tábuas trigonométricas, tendo calculado sen 1′
com treze casas decimais e iniciou o desenvolvimento sistemático de cálculo de medidas de
lados e ângulos nos triângulos planos e esféricos aproximados até minutos, com ajuda de
todas as seisfunções trigonométricas. Além disso, foi ele quem introduziu métodos gerais de
resolução em matemática. É dele a idéia de decompor em triângulos retângulos os triângulos
oblíquos para determinar as medidas de todos os lados e ângulos, conforme está descrito em
sua obra “Canon Mathematicus.” Em seu livro “Variorum de rebus mathematics” aparece
um equivalente da conhecida lei das tangentes
tg (A + B)
tg (A − B) =
a + b
a − b, com A e B ângulos e
a e b os arcos respectivos. Na verdade, esta relação só foi publicada em Basel no ano de
1583 pelo dinamarquês Thomas Fincke em seu trabalho “Geometria Rotundi,” apesar de ser
devida a Francois Viète.
Destacamos agora por seus notáveis trabalhos em trigonometria Bartholomaeus Pi-
tiscus (1561-1613), que publicou um tratado em 1595 no qual corrigiu as tábuas de Rhaeticus
e modernizou o tratamento do assunto. A palavra trigonometria aparece pela primeira vez,
como título de um livro.
Por outro lado, dando seqüência aos avanços na trigonometria, registramos os tra-
balhos do britânico Napier que estabeleceu regras para os triângulos esféricos, que foram am-
plamente aceitas numa época na qual sua maior contribuição, os logaritmos, ainda não eram
reconhecidos como válidos. Suas considerações sobre os triângulos esféricos foram publicadas
posteriormente no “Napier Analogies” do “Constructio” no ano de 1619, em Edinburgh.
Outra importante contribuição na trigonometria foi dada por Oughtred (1575-1660),
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 29
que em seu trabalho de 1657 deu ênfase ao desenvolvimento do ponto de vista simbólico.
Entretanto o simbolismo algébrico ainda estava em seu estágio inicial e a idéia não foi bem
aceita, até que Euler desenvolvesse esse aspecto no século XVIII.
Citamos também John Newton (1622-1678) que apoiado nos trabalhos dos autores
que o antecederam publicou em 1658 o tratado “Trigonometria Britannica” considerado o
mais completo livro de trigonometria de sua época.
Um passo importante na trigonometria foi dado por John Wallis (1616-1703) ao
expressar as fórmulas trigonométricas através de equações, substituindo assim as tradicionais
proporções e também por trabalhar com séries infinitas.
Finalizando estas considerações, registramos que Issac Newton (1642-1727) também
contribui na trigonometria pois, paralelamente aos seus estudos de cálculo infinitesimal apoi-
ados fortemente na geometria do movimento, trabalhou com séries infinitas, tendo expandido
arcsenx em séries e, por reversão, obtido a série para senx. Por outro lado, obteve a fórmula
geral para sen(nx) e cos(nx) e assim criou as condições para o senx e o cos x surgirem como
números e não mais como grandezas. O alemão Abraham Kästner (1719-1800) foi o primeiro
matemático a definir as funções trigonométricas em números puros no ano de 1759.
A trigonometria incorporada pela análise matemática
A trigonometria que estudamos nos dias atuais teve seu início quando Euler (1707-1783)
adota a medida do raio de um círculo como unidade e define funções aplicadas a um número
e não mais a um ângulo como acontecia nessa época. A passagem das conhecidas razões
trigonométricas para as funções periódicas começou com Viète no século XVI; em seguida
teve um novo crescimento com a criação do Cálculo Infinitesimal no século XVII e teve
sua conclusão com os trabalhos de Euler no século XVIII. Uma das idéias de Euler foi a
criação da função E, que denominamos aqui de função trigonometria de Euler, função essa
que associa para cada número real, um ponto de uma circunferência C1 de raio unitário
com centro na origem do plano cartesiano. Seu domínio é o conjunto dos números reais R e
seu contradomínio é C1. A função E : R −→ C1, associa a cada x ∈ R, um ponto P ∈ C1,
P = (m,n) pertence a C1, se e somente se m2 +n2 = 1. Na figura 1.6 ilustramos a associação
30 CAPÍTULO 1. MATEMÁTICA E MODELOS MATEMÁTICOS
entre um número real e o seu seno através do ponto P correspondente no conhecido ciclo
trigonométrico.
Figura 1.6: Correspondência entre um número real e seu seno através de um ponto do círculo
trigonométrico.
Como a função E estabelece a correspondência entre cada número real x e um
ponto da circunferência C1, logo ao número zero corresponde o ponto A = (1, 0) e, para
cada x ∈ R, x > 0, medimos a partir desse ponto A no sentido anti-horário um arco de
comprimento x e assim obtemos o ponto P = E(x). Tudo se passa como se o efeito da função
E consistisse no enrolamento da reta real R, como se esta fosse um fio inextensível sobre
circunferência C1, como se esta fosse um carretel. A partir da correspondência estabelecida
pela função E, foi possível definição das funções seno e cosseno de um número real x e não
mais de um ângulo, como anteriormente acontecia. Com relação à função E encontramos
em [28]: “A função E : R −→ C1, que possibilita encontrar sen x e cos x, como função
de uma variável real x, abriu para a trigonometria as portas da análise matemática e de
inúmeras aplicações às ciências físicas”. Em 1748 Leonard Euler publicou o livro “Introductio
in Analysin Infinitorum,” onde o seno deixou de ser uma grandeza e adquiriu o status de
número obtido pela coordenada de um ponto de um círculo unitário, ou o número definido
pela série infinita sen x = x − x
3
3!
+
x5
5!
− x
7
7!
+ . . . . Euler mostrou que senh x =
eix − e−ix
2i
e cosh x =
eix + e−ix
2
, onde i é a unidade imaginária possibilitando a extensão das funções
1.6. UM POUCO DE HISTÓRIA 31
seno e cosseno no campo complexo [20].
Portanto a trigonometria que nos primórdios era uma auxiliar da agrimensura e
da astronomia, tornou-se autônoma e transformou-se em uma parte da análise matemática.
Foi um longo caminho da humanidade até a trigonometria que hoje ensinamos aos nossos
alunos. Aqui, buscamos apresentar parte dessa trajetória. Deixamos uma mensagem para
quem ensina trigonometria ou matemática de um modo geral, que discuta com seus alunos
questões que objetivamente esclareçam que o conhecimento matemático não surgiu pronto
e acabado e que a evolução desse conhecimento pode ser acompanhada e ter a participação
deles.
Capítulo 2
EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EM
MODELOS PARA PRINCÍPIOS
FÍSICOS
“A mecânica é o paraiso das ciências
matemáticas, porque nela se chega ao fruto
matemático.”
(Leonardo da Vinci)
Em muitas ocasiões a parte mais complexa na utilização da Matemática para es-
tudar um problema associado a um fenômeno físico, é a transladação da realidade para o
formalismo matemático. Essa transladação torna-se difícil, pois envolve a conversão de hipó-
teses imprecisas face às simplificações, em equações e fórmulas precisas matematicamente. A
modelagem matemática é portanto uma arte difícil, e como em toda arte, a melhor maneira
de obtermos bons resultados é praticando. Em seguida, apresentamos em alguns exemplos,
a dedução de equações diferenciais, bem como relacionamos as hipóteses simplificadoras,
ilustrando esseas etapas da modelagem matemática.
33
34CAPÍTULO 2. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EM MODELOS PARA PRINCÍPIOS FÍSICOS
2.1 A corda vibrante
Simples e de ocorrência freqüente em vários campos da ciência aplicada, o estudo da corda
vibrante constitui um exemplo clássico em que o emprego da mdelagem matemática resulta
na análise e solução de uma equação diferencial.
Considerando então uma corda de comprimento l fixada em suas extremidades, o
problema se reduz a determinar a equação do movimento que caracteriza a posição de um
ponto da corda de abscissa x, no instante t, u(x, t) após uma determinada perturbação
ocorrida no instante inicial t0 = 0.
Afim de obtermos uma equação simples adotamos as seguintes hipóteses simplifica-
doras iniciais:
1. A corda é flexível e elástica, não resiste a momento fletor e portanto a tensão é sempre
tangente à curva definida pela corda em cada ponto considerado.
2. Não existe deformação de cada elemento da corda e portanto pela lei de Hooke (1635-
1703) a tensão é constante ao longo de toda a corda.
3. O pesoda corda é pequeno em comparação com a tensão aplicada na corda.
4. A deflexão é pequena em comparação com o comprimento da corda.
5. A declividade da corda em movimento em qualquer ponto é pequena em comparação
com a unidade.
6. Existe apenas vibração transversal.
Consideremos agora um elemento ∆s da corda, seja T a tensão tangente à corda
atuando nas extremidades do elemento ∆s, conforme indicamos na Figura 2.1.
A resultante das forças atuantes no elemento ∆s na direção vertical é
FR = Tsinβ − T sen α. (2.1)
De acordo com a segunda lei de Newton, FR = massa x aceleração, segue-se então em cada
ponto (x, t),
2.1. A CORDA VIBRANTE 35
T sen β − T sen α = ρ.∆s.utt(x, t),
onde ρ = densidade linear da corda e utt(x, t) = aceleração =
∂2u
∂t2
(x, t).
Como a declividade é pequena, durante o movimento podemos considerar
∆s ≈ ∆x,
como os ângulos α e β são pequenos podemos escrever
sen α ≈ tg α e sen β ≈ tg β.
Portanto, com essas aproximações simplificadoras a expressão anterior toma a forma
tg β − tg α = ρ∆x
T
utt(x, t). (2.2)
Mas do cálculo diferencial sabemos que
tg α = ux(x,t) e tg β = ux(x+∆x,t).
Logo podemos escrever a equação (2.2) como a seguir:
1
∆x
[ux(x+∆x,t) − ux(x,t)] =
ρ
T
utt(x, t).
Usando o limite desta última expressão, quando ∆x → 0 obtemos
lim
∆x→o
1
∆x
[ux(x+∆x,t) − ux(x,t)] = lim
∆x→o
ρ
T
utt(x, t) =⇒ utt(x, t) =
T
ρ
uxx(x, t).
Figura 2.1: Corda Vibrante
36CAPÍTULO 2. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EM MODELOS PARA PRINCÍPIOS FÍSICOS
Finalmente, fazendo
T
ρ
= c2 obtemos
utt(x, t) = c
2uxx(x, t). (2.3)
Esta equação diferencial parcial é conhecida como equação da corda vibrante ou equação
de onda unidimensional e representa o modelo matemático para o problema das vibrações
transversais de uma corda: encontrar a posição de um ponto (x, t), u(x, t) satisfazendo a
equação diferencial parcial.
A equação (2.3) ainda pode ser escrita na forma
∂2u
∂t2
= c2
∂2u
∂x2
. (2.4)
A diferença entre (2.3) e (2.4) é apenas a notação matemática para as derivadas uxx e utt.
Se existir uma força externa f por unidade de comprimento ao longo da corda as equações
(2.3) e (2.4) tomam as formas
utt = c
2uxx + f
(∗) (2.5)
ou
∂2u
∂t2
= c2
∂2u
∂x2
+ f (∗), (2.6)
onde (f (∗) =
f
ρ
), f pode ser uma pressão, gravitação, uma resistência, etc.
2.2 A membrana vibrante
A membrana vibrante também representa um modelo interessante, pois embora simples,
encontra várias aplicações práticas na engenharia. Por exemplo, placas delgadas sujeitas
a vibrações mecânicas podem ser analisadas com auxílio desse modelo matemático. Na
oceanografia, a membrana vibrante encontra utilização no estudo das ondas do mar que
ocorrem na superfície da água, interpretada como uma membrana.
Para a obtenção do modelo matemático da membrana vibrante, suposta com densi-
dade superficial ρ constante, adotamos as seguintes hipóteses simplificadoras:
1. A membrana é flexível e elástica, ou seja, não resiste à flexão e a tensão tem sempre a
direção da tangente à superfície da membrana em cada ponto.
2.2. A MEMBRANA VIBRANTE 37
2. Não existe deformação de cada elemento da membrana e então pela lei de Hooke, a
tensão é constante em intensidade.
3. O peso da membrana é pequeno em comparação com a tensão na membrana.
4. A deflexão é pequena em comparação com a menor dimensão da membrana.
5. A declividade da membrana deslocada em um ponto qualquer é pequena em compara-
ção com a unidade.
6. Só existe vibração transversal.
Com as hipóteses acima, seja ∆a um elemento da membrana. Como a deflexão e a
declividade são pequenas, podemos com aproximação avaliar a área de elemento por:
∆a = ∆x.∆y.
Se T é a tensão por unidade de comprimento nas direções x e y, então as forças atuantes
nas bordas do elemento ∆a, são T∆x e T∆y, como ilustramos Figura 2.2 abaixo.
Figura 2.2: Membrana Vibrante
A força resultante na direção vertical tem como expressão:
FR = T∆xsen β − T∆xsen α + T∆ysen δ − T∆ysen γ.
38CAPÍTULO 2. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EM MODELOS PARA PRINCÍPIOS FÍSICOS
Como as declividades são pequenas, podemos usar as aproximações:
sen α ≈ tg α
sen β ≈ tg β
sen δ ≈ tg δ
sen γ ≈ tg γ.
Obtemos então para força resultante a expressão:
FR = T∆x(tg β − tg α) + T∆y(tg δ − tg γ).
Pela segunda lei de Newton, a resultante das forças é igual ao produto da massa pela acele-
ração e podemos então escrever a equação:
FR = T∆x(tg β − tg α) + T∆y(tg δ − tg γ) = ρ∆autt(x, y, t), (2.7)
onde ρ é a densidade superficial (massa por unidade de área), ∆a ≈ ∆x.∆y é a área do
elemento considerado, e utt(x, y, t) é a aceleração avaliada em algum ponto (x, y) da região
considerada no instante t.
Mas do cálculo diferencial, nós temos que:
tg α = uy(x1, y, t)
tg β = uy(x2, y + ∆y, t)
tg γ = ux(x, y1, t)
tg δ = ux(x + ∆x, y2, t),
onde x1 e x2 são os valores de x entre x e x + ∆x e y1 e y2 são os valores de y entre y e
y + ∆y. Substituindo esses valores na equação (2.7), obtemos:
T∆x
[
uy(x2, y+∆y, t)−uy(x1, y, t)
]
+T∆y
[
ux(x+∆x, y2, t)−ux(x, y1, t)
]
= ρ∆x∆yutt(x, y, t).
Dividimos agora por ρ∆x.∆y e obtemos,
T
ρ
[uy(x2, y + ∆y, t) − uy(x1, y, t)
∆y
+
ux(x + ∆x, y2, t) − ux(x, y1, t)
∆x
]
= utt(x, y, t). (2.8)
2.3. ONDAS EM UM MEIO ELÁSTICO 39
Usando o limite quando ∆x → 0 e ∆y → 0, obtemos uma equação diferencial para a função
deslocamento u(x, y, t):
utt =
T
ρ
(uxx + uyy).
Colocando
T
ρ
= c2, temos
utt = c
2(uxx + uyy) (2.9)
Esta equação representa o modelo matemático para as vibrações de uma membrana,
sendo chamada de equação da membrana vibrante ou equação de onda bi-dimensional. Ha-
vendo uma força externa f por unidade de área atuando na membrana, a equação (2.9) toma
a forma:
utt = c
2(uxx + uyy) + f
∗,
onde f ∗ =
f
ρ
.
2.3 Ondas em um meio elástico
O som e outros fenômenos ondulatórios se propagam nos meios materiais supostos elásticos,
dessa forma o modelo matemático para a propagação de ondas nos meios materiais encontra
inúmeras aplicações de interesse da vida humana e citamos como exemplos o sonar dos
submarinos e os sismógrafos. Vejamos então esse importante modelo matemático.
Se uma pequena perturbação é originada em um ponto de um meio elástico, as
partículas da vizinhança entram em movimento e o meio material fica submetido a um
estado de tensão. Consideramos que o movimento das partículas se propaga em todas as
direções, que os deslocamentos do meio são pequenos e que não são consideradas rotações
ou translações do meio material como um todo.
Consideramos ainda que o corpo material em estudo é homogêneo e isotrópico, isto
é,as propriedades independem das direções. Seja ∆V um volume elementar do corpo e sejam
as tensões atuantes nas faces do volume respectivamente: τxx, τyy, τzz, τxy, τxz, τyx,
τyz, τzx e τzy. As três primeiras tensões são chamadas de tensões normais e as restantes
40CAPÍTULO 2. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EM MODELOS PARA PRINCÍPIOS FÍSICOS
recebem o nome de tensões tangenciais ou de cisalhamento, conforme indicamos na Figura
2.3.
Figura 2.3: Ondas em um meio elástico - volume elementar
Vamos ainda admitir que o tensor das tensões τij é simétrico, ou seja, τij = τji; i, j =
x, y, z, condição necessária ao equilíbrio à rotação do elemento ∆V [38]. Desprezando-se o
peso do corpo e quaisquer outras forças que atuem sobre ele, a resultante de todas as forças
que atuam no elemento de volume ∆V na direção do eixo x é dada por
[τxx(x+∆x) − τxx(x)]∆y∆z + [τxy(y+∆y) − τxy(y)]∆z∆x + [τxz(z+∆z) − τxz(z)]∆x∆y.
Pela segunda lei de Newton, essa resultante oriunda das tensões é igual ao produto da massa
do elemento ∆V pela sua aceleração, obtemos então:
[τxx(x+∆x)−τxx(x)]∆y∆z+[τxy(y+∆y)−τxy(y)]∆z∆x+[τxz(z+∆z)−τxz(z)]∆x∆y = ρ∆x∆y∆zutt,
onde ρ é a densidade do corpo e u é a componente do deslocamento na direção do eixo x.
Agora usando o limite quando ∆V → 0, obtemos
∂τxx
∂x
+
∂τxy
∂y
+
∂τxz
∂z
= ρ
∂2u
∂t2
. (2.10)
Procedendo de forma análoga, obtemos as equações correspondentes às direções dos eixos y
e z:
∂τyx
∂x
+

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