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A) A infância a qual conhecemos hoje não é igual a que se entendia na antiguidade, esse conceito foi desenvolvido ao decorrer de muitos anos para ser o que se entende atualmente, a perspectiva de ser criança se sucedeu da total falta de noção e importância atribuída a elas, passado os anos, foi evidenciada as ideias de uma criança que precisava ser corrigida pelo adulto, para libertá-las da malignidade natural, também a de que ela era um ser asexuado e imaturo e não possuía vontade individual; Com o capitalismo em ascensão as crianças também foram atribuídas como mão de obra barata, usadas para obter lucro, porém foi no século XIX que se iniciou a preocupação de que houvesse uma educação mais formal para a criança. “Portanto, dentro de uma perspectiva histórica, podemos observar que partimos de um momento no qual predominou um total desconhecimento da criança e que, no decorrer dos séculos, os discursos ideológicos sobre a infância, foram modificados.[...]” (Terezinha, 2007) Philippe Ariès foi um historiador francês e fez um estudo na europa sobre a evolução da infância desde a idade média até o século XX, através das artes produzidas como pinturas, e a iconografia, essas produções serviram como modelo de comparação para análise durante o passar dos anos, observando a evolução das estruturas familiares e a grande influência do ser cristão no meio social, por meio dos quadros produzidos pelos artistas. A idade média foi marcada pelo período onde as crianças eram caracterizadas como mini adultos e eram vestidas como tal, participavam de brincadeiras, jogos, no entanto, não eram consideradas dignas de terem um cuidado especial, já durante o século XVIII traziam consigo a necessidade de apresentar ao mundo a imagem da criança como um ser puro e desprovido de sexualidade, predominando a noção da inocência presente na infância, pintadas como anjos e personificadas na imagem de Jesus. O panorama histórico sobre o conceito de Infância dos dias atuais e dos séculos passados é muito distinto, permitindo a visualização gradativa através das obras produzidas ao longo dos anos, as divergências entre os períodos e a evolução sociocultural. O ser criança nos tempos atuais significa ser merecedor e digno de direitos, como a saúde, educação, lazer e cuidados de qualidade, todavia, existem marcadores sociais básicos, que definem o que é infância, pois, infelizmente, ainda que existam leis criadas em prol do bem estar infantil, a realidade é bem diferente daquela que é desejada, muitas crianças se encontram em situações de fome, abandono, trabalho escravo, abusos sexuais, entre outras barbaridades. A pandemia não impactou apenas na saúde física das pessoas, mas também a mental, impedindo o convívio social, crianças que vivem em residências preenchidas por violência tem apenas o colégio como refúgio, porém, com o inicio do ensino e do trabalho remoto, tanto os pais como as crianças começaram a passar mais tempo em casa. O stress diário de se estar em período pandêmico e das demais responsabilidades, provoca o cenário perfeito para mais abusos, pois, os canais de denúncia, que elas tinham, foram interditados, nem todas as crianças têm acesso a diversas tecnologias, como celulares e/ou computadores, a exemplo das famílias de classe D, que além dos problemas causados pelo covid, tem que se preocupar com a questão financeira, ficando cada vez mais tristes, ansiosos e sobrecarregados, refletindo toda essa negatividade em seus filhos, por consequência disto, entende-se que a infância não é um conto de fadas onde todas as crianças são felizes e amadas, muita delas sofrem abusos e agressões dentro das próprias casas, lugar que deveria fornecer carinho e proteção. B) A pandemia do coronavírus tem afetado globalmente a vida social, alcançando todas as dimensões coletivas e/ou individuais, alterando significativamente o convívio das pessoas, refletindo também no âmbito da saúde mental. Compreende-se que em situações de epidemias, a quantidade de pessoas afetadas mentalmente é considerável ao número de pessoas contaminadas. Revisão de estudos sobre situações de quarentena apontou alta prevalência de efeitos psicológicos negativos, especialmente humor rebaixado e irritabilidade, ao lado de raiva, medo e insônia, muitas vezes de longa duração (BROOKS et al., 2000). Além das modificações na estrutura coletiva, o covid também remodelou a dinâmica das maternidades, impedindo o contato físico dos recém-nascidos com seus pais, no caso de que algum se encontre contaminado, ainda que o contato físico com a mãe seja altamente recomendado e que o “mamãe-canguru” esteja entre os mais competentes métodos de aprimorar as chances de sobrevivência de um bebê prematuro, o risco de se contaminar com o vírus permanece. Winnicott foi psicanalista e teórico do campo do desenvolvimento infantil, sua teoria resultou no início do estudo do ambiente, após perceber as semelhanças entre pacientes psicóticos e crianças, para ele a base da saúde mental de um indivíduo se sucede a partir dos primeiros anos de vida do bebê. O ambiente, para Winnicott, é constituído pelas pessoas que são responsáveis pela criança, sendo ele essencial para o desenvolvimento psíquico, suprindo todas as necessidades da criança, antes que ela perca as esperanças de ser atendida e inicie o processo de desintegração psíquica, logo, se houver alguma falha no ambiente a transgressão vem por parte da família, todavia, neste caso em específico, a culpa dessas falhas ambientais se dá, por meio da interferência causada pela pandemia, impossibilitando o contato pele a pele do recém-nascido com seu seio familiar, pois, se não existe ninguém ali para cumprir o papel de mãe, o amadurecimento emocional do bebê se torna difícil, porque, para Winnicott quando um bebê vê a mãe ele não enxerga o rosto dela, mas sim o dele, não existindo a separação “eu” nem a do “não-eu” o andamento desse percurso é delicado, por isso o contato com os familiares é tão importante. A obra “Virando gente: A história do nascimento psíquico” descreve o ponto de vista do bebê e a trajetória da gestação psíquica, abordando a necessidade da presença dos pais para o nascimento do “eu” e o trajetória do descobrimento da existência de um “não-eu” depois do nascimento o toque do recém-nascido com a mãe é tão profundo que ele se sente como se ambos fossem um só, e sucessivamente ele vai se individualizando, é comum haver angústias corporais durante o início da vida, como a sensação de que seu corpo vai se desfazer enquanto tomam banho ou que vão cair para sempre, porém é nesse momento que a presença dos pais é indispensável, pois, quando a criança entende que está acompanhada e amparada ela consegue se sentir sustentada emocionalmente e aos poucos vai conseguindo dar continuidade a sua existência e reduzir as angústias primitivas sozinho, quando o bebê não tem uma mãe suficientemente boa, ele não consegue amadurecer emocionalmente sozinho, portanto, a preocupação dos profissionais sobre o distanciamento social é real, porque o que os bebês entendem como amor nessa fase da vida é validado corporalmente e a integração do ego é solidificado no decurso dos três fenômenos: o holding, cuidado e o toque, o handling, a interação que auxilia a formação psiquica da criança e o object-presinting, permite que a criança inicie a interação com o mundo real, através dos objetos. O bebê que sofreu uma quebra durante o processo de amadurecimento psíquico, como aqueles que foram afastados de suas mães, com intuito de evitar a contaminação viral, podem se tornar indivíduos desintegrados mentalmente na fase adulta. REFERÊNCIAS Aries, Philippe. História social da criança e da família. Translated by Dora Flaksman, LTC, 2006. Costa, Teresinha. Psicanálise com crianças. Jorge Zahar Editor, 2007. LIMA, ROSSANO CABRALDistanciamento e isolamento sociais pela Covid-19 no Brasil: impactos na saúde mental. Physis: Revista de Saúde Coletiva [online].2020, v. 30, n. 02 [Acessado 8 Outubro 2022] , e300214. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0103-73312020300214>. Epub 24 Jul 2020. ISSN 1809-4481. https://doi.org/10.1590/S0103-73312020300214. OMS, OPAS. Nova pesquisa destaca riscos de separar recém-nascidos de suas mães durante pandemia de COVID-19. 2021. Fontes, Ivanise. Virando Gente, Ideias e Letras, 2014, p. 71. D.W.Winnicott - o ambiente e os processos de maturação(2007, Artmed) Donald Winnicott- O brincar e a realidade (1975,Imago) https://doi.org/10.1590/S0103-73312020300214
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