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14/03/2021 1 Direito das Obrigações Professor Alex Ribeiro Campagnoli FIPAR - 2021 – Introdução - Além de disciplina mais extensa, peço licença aos colegas professores para afirmar que o Direito Civil é também a matéria mais importante do curso jurídico por duas grandes razões: Primeiro: porque o Direito em si, como ciência, passou a ser estudado através do Direito Civil. Foi a evolução do Direito Civil que levou à Teoria Geral do Direito e à Introdução ao Estudo do Direito. Segundo: porque o Direito Civil é o direito de nós todos, de João, José, de Maria e de cada cidadão. 14/03/2021 2 Explico: - o Direito Tributário e Administrativo é o direito do governo, - o Direito Penal é o direito do bandido, - o Direito Comercial é o direito do empresário, - o Direito Processual é mais processo do que direito, - o Direito do Trabalho é o direito do trabalhador, e de qualquer modo, o Direito do Trabalho é filho do Direito Civil. - Igualmente o Direito do Consumidor, é filho também do Direito Civil. O próprio Direito Comercial teve muitas de suas normas incorporadas pelo Código Civil de 2002. Finalmente, - o Direito Constitucional tem mais princípios gerais do que normas de aplicação direta. Já as atividades do nosso cotidiano são todas reguladas pelo Direito Civil. Nós todos hoje, para estarmos aqui agora, já celebramos alguma relação civil, até porque nós todos temos nome, família e domicílio. E usamos um transporte para chegar de casa até a universidade. E somos proprietários de nossas roupas e objetos pessoais. E falamos no telefone e compramos um chiclete antes de entrar na sala de aula. Quer dizer, alguém pode viver décadas e nunca se enquadrar no Código Penal, Processual ou na CLT, mas com certeza nossas vidas passam pelo Código Civil. O que vocês acham? Reflitam! 14/03/2021 3 Bem, voltando ao cível, hoje vocês começam o estudo da parte especial do Direito Civil, e durante quatro anos serão estudados os quatro grandes temas cíveis: obrigações, reais, família e sucessões. � 1º ano – parte geral � 2º ano – obrigações e contratos � 3º ano – direitos reais � 4º ano – direito de família � 5º ano – sucessões e resp. civil I - O direito pode ser dividido em dois grandes ramos: a) os direitos não patrimoniais - concernentes à pessoa humana, como os direitos da personalidade (CC, arts. 11 a 21) e os de família; b) os direitos patrimoniais - que, por sua vez, se dividem em. - Reais (direito das coisas); - Obrigacionais, pessoais ou de crédito; O Direito das Obrigações, o Direito das Coisas e o Direito das Sucessões integram a chamada autonomia privada, ou seja, é o campo do Direito Civil onde os particulares se relacionam entre si, com grande liberdade, na celebração de contratos e na apropriação de bens que lhes interessam, para a formação de um patrimônio que será transferido aos familiares após a morte. 14/03/2021 4 Se no Direito Público só se pode fazer o que a lei permite, no Direito Civil pode-se fazer tudo o que a lei não proíbe, ou seja, a liberdade aqui é bem maior. Dos quatro ramos do Direito Civil, só o Direito de Família sobra deste raciocínio. Uma vez que no Direito de Família as questões econômicas não predominam tanto quanto no resto do Direito Civil, afinal o que alimenta a família é o afeto, vínculos pessoais e não o patrimônio. Em suma, o Direito de Família integra o Direito Civil, mas não integra a autonomia privada. Teoria Geral das Obrigações O desenvolvimento do Direito das Obrigações liga-se mais proximamente às relações econômicas, é por meio das “relações obrigacionais que se estrutura o regime econômico, sob formas definidas de atividade produtiva e permuta de bens”, como já salientou ORLANDO GOMES. Em objetiva definição, trata-se do conjunto de normas e princípios jurídicos reguladores das relações patrimoniais entre um credor (sujeito ativo) e um devedor (sujeito passivo) a quem incumbe o dever de cumprir, espontânea ou coativamente, uma prestação de dar, fazer ou não fazer. 14/03/2021 5 Evolução Histórica No Direito Romano não se conhecia o termo “obrigação”, mas o equivalente: nexum (uma forma primitiva de empréstimo) que era o ato que legitimava o credor cobrar o devedor. Havia normas regulamentares que autorizavam a “coisificação” do devedor, sua redução à escravização pelo credor, que poderia vendê-lo pelo valor da dívida, obtendo assim o ressarcimento. No caso de pluralidade de credores, a lei autorizava a partilha do seu corpo em tantos pedaços quanto se dividisse o débito. Lei das XII TÁBUAS - TÁBUA TERCEIRA Dos direitos de crédito - l. Se o depositário, de má fé, praticar alguma falta com relação ao depósito, que seja condenado em dobro. - 2. Se alguém colocar o seu dinheiro a juros superiores a um por cento ao ano, que seja condenado a devolver o quádruplo. - 3. O estrangeiro jamais poderá adquirir bem algum por usucapião. - 4. Aquele que confessar dívida perante o magistrado, ou for condenado, terá 30 dias para pagar. - 5. Esgotados os 30 dias e não tendo pago, que seja agarrado e levado à presença do magistrado. - 6. Se não pagar e ninguém se apresentar como fiador, que o devedor seja levado pelo seu credor e amarrado pelo pescoço e pés com cadeias com peso máximo de 15 libras; ou menos, se assim o quiser o credor. - 7. O devedor preso viverá à sua custa, se quiser; se não quiser, o credor que o mantém preso dar-Ihe-á por dia uma libra de pão ou mais, a seu critério. 14/03/2021 6 8. Se não houver conciliação, que o devedor fique preso por 60 dias, durante os quais será conduzido em três dias de feira ao comitium, onde se proclamará, em altas vozes, o valor da dívida. 9. Se não muitos os credores, será permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o corpo do devedor em tantos pedaços quantos sejam os credores, não importando cortar mais ou menos; se os credores preferirem poderão vender o devedor a um estrangeiro, além do Tibre. A lex Poetelia Papiria (326 A.C) - afastou a carga da pessoa do devedor, transferindo-a aos seus bens, passando ao Estado o exercício da jurisdição, substituindo-se o direito da força pela força do Direito. Não resta dúvida de que, já no Direito Romano, a imputação de penalidade sobre o corpo e a vida do devedor foi abominada, levando à uma reflexão sobre os limites da punibilidade em casos de inadimplência. A grande evolução do conceito moderno de “obrigação” é exatamente a não responsabilização do corpo do credor pela sua dívida, deslocando-se a garantia da pessoa do devedor para o seu PATRIMÔNIO. 14/03/2021 7 Essa modificação, muito bem vinda, valoriza a dignidade humana e possibilitou a transmissibilidade das obrigações, ato esse, não admitido pelos Romanos. CÓDIGO DE NAPOLEÃO DE 1804 Art. 2.093. Os bens do devedor são a garantia comum de seus credores (“les biens du débiteur sont le gage commun de ses creanciers”). CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor. DIREITOS PESSOAIS X DIREITOS REAIS: No Direito das Obrigações vocês vão conhecer as normas que tratam das relações das pessoas entre si, é por isso que o Direito das Obrigações é também conhecido como Direito Pessoal. As obrigações entre as pessoas se originam de vários modos, especialmente do contrato. Já no Direito Real serão estudadas as normas que tratam das relações das pessoas com os bens, sendo também chamado de Direito das Coisas. Existem vários direitos reais (art. 1.225) e o principal deles é a propriedade. 14/03/2021 8 DIREITOS REAIS DIREITOS OBRIGACIONAIS a) Quanto ao sujeito Há somente sujeito ativo (proprietário). Sujeito passivo é toda a comunidade. Oponibilidade erga omnes. Sujeito determinado ou determinável. Sujeito ativo = credor. Sujeito passivo = devedor (solvens). a) Quanto ao objeto Incidem sobre uma coisa (res). Objeto de propriedade. Objeto: material e intelectual, por ex., autoria, marca etc. Há direito de sequela, ex. art. 1.228, CC. Exigem o cumprimento de determinada prestação. Uma obrigaçãode dar, fazer ou não fazer. a) Quanto à duração São perpétuos, não se extinguem pelo não uso, exceto os casos previstos em lei. Ex.: desapropriação, usucapião etc. Propriedade: plena e exclusiva (art. 1.231, CC/2002). São transitórios e se extinguem pelo cumprimento ou por outros meios, ex. morte. a) Quanto à formação Só podem ser criados pela lei, sendo seu número limitado e regulado por esta (numerus clausus), vide art. 1. 225, CC/2002. Resultam da vontade das partes, sendo ilimitado o número de contratos inonimados (numerus apertus). Pode resultar também da lei. a) Quanto ao exercício São exercidos diretamente sobre a coisa, sem necessidade de existência de um sujeito passivo. Exige uma figura intermediária, que é o devedor. a) Quanto à ação Pode ser exercida contra quem quer que detenha a coisa. A ação pessoal é dirigida somente contra quem figura na relação jurídica como sujeito passivo. Oponibilidade intra partes. Figuras híbridas entre Direitos Pessoais e Reais (também denominadas obrigações ambulatórias ou de cunho real) Obrigação propter rem: é a que recai sobre uma pessoa, por força de determinado direito real. Só existe em razão da situação jurídica do obrigado, de titular do domínio ou de detentor de determinada coisa (Vide art. 1.277, CC/2002). Exemplos: 1) obrigação imposta aos proprietários e inquilinos de um prédio de não prejudicarem a segurança, o sossego e a saúde dos vizinhos (CC, art. 1.277); 2) pagamento de condomínio (cota condominial); 3) a obrigação de o proprietário de um imóvel de indenizar o terceiro que, de boa- fé, realizou benfeitorias sobre o mesmo; 4) IPTU, IPVA etc. 14/03/2021 9 - OBRIGAÇÕES COM EFICÁCIA REAL - Obrigações com eficácia real são as que, sem perder seu caráter de direito a uma prestação, transmitem-se e são oponíveis a terceiro que adquira direito sobre determinado bem. - Exemplo de eficácia real é a que resulta de compromisso de compra e venda, em favor do promitente comprador, quando não se pactua o arrependimento e o instrumento é registrado no Cartório de Registro de Imóveis, adquirindo este direito real à aquisição do imóvel e à sua adjudicação compulsória (CC, arts. 1417 e 1418). - Título de crédito ao portador: o crédito adere ao título passando a ser exigível por quem o porte. Então o portador tem a determinação inicial do credor. O credor será aquele que, portando o título no momento oportuno, exige aquele crédito. Por isso, diz-se que há ambulatoriedade excepcional. Importância do direito das obrigações É por meio das relações obrigacionais que se estrutura o regime econômico. O direito das obrigações retrata a estrutura econômica da sociedade e compreende as relações jurídicas que constituem alicerce para a autonomia privada na esfera patrimonial, estendendo-se a todas as atividades de natureza patrimonial, desde as mais simples às mais complexas. 14/03/2021 10 Características principais do direito das obrigações O direito das obrigações tem por objeto direitos de natureza pessoal, que resultam de um vínculo jurídico estabelecido entre: I) o credor, como sujeito ativo; II) o devedor, na posição de sujeito passivo... ...liame este que confere ao primeiro o poder de exigir do último uma prestação. Também denominados direitos de crédito, os direitos pessoais ou obrigacionais regem vínculos patrimoniais entre pessoas, impondo ao devedor o dever de prestar, isto é: I) “de dar”; II) “de fazer”; III) ou “não fazer” ... Fonte das Obrigações são os fatos jurídicos que dão origem aos vínculos obrigacionais, em conformidade com as normas jurídicas. 1 – Fontes Imediatas (primária) Lei – pois todos os vínculos obrigacionais são relação jurídica 2 – Fontes Mediatas – Fatos Jurídicos 2.1 - Fato Natural – ocorre sem intervenção da vontade humana 2.2 - Vontade Humana – decorre de contrato (vontade conjugada) ou de ato unilateral da vontade (promessa de recompensa, titulo ao portador.). Pode ser: 2.2.1 - Voluntário – produz fatos queridos pelo agente. Ato Jurídico (em sentido estrito) – mera realização da vontade do agente; Negócio jurídico – cria normas que regula os interesses entre as partes – autonomia privada. 2.2.2 - Involuntário – consequência jurídica alheia a vontade do agente. Ato Ilícito – se constituem através de uma ação ou omissão culposa ou dolosa do agente, causando dano a outrem. Diretas do comportamento humano infringente de um dever legal ou social. 14/03/2021 11 São três as fontes segundo o Código Civil, vejamos: 1 – Contratos: esta é a principal e maior fonte de obrigação. Através dos contratos as partes assumem obrigações (ex: compra e venda, onde o comprador se obriga a pagar o preço e o vendedor se obriga a entregar a coisa). No próximo semestre serão estudados com detalhes os inúmeros contratos (ex: locação, doação, empréstimo, seguro, transporte, mandato, fiança, etc). 2 – Atos unilaterais: segundo nosso Código, são os quatro capítulos entre os arts. 854 e 886, com destaque para a promessa de recompensa (ex: perdi meu cachorro e pago cem a quem encontrá- lo, obrigando-me perante qualquer pessoa que cumpra a tarefa). Não temos aqui um contrato, mas um ato unilateral gerador de obrigação, como será visto no próximo semestre. 3 – Atos ilícitos: já estudados no semestre passado, revisem o art. 186 (ex: João bate no carro de Maria e se obriga a reparar os prejuízos). O estudo dos atos ilícitos deve ser aprofundado na importante disciplina Responsabilidade Civil (927). Conceito: Todos temos obrigações na nossa vida, seja para com o país (ex: serviço militar, votar nas eleições, pagar impostos) seja para com a família (1.566). O vocábulo obrigação, deriva do Latim Obligatio, Obligationis, que significa ato de obrigar; o fato de estar obrigado a; dever; preceito; lei. Vínculo jurídico em que uma pessoa está obrigada a dar, a fazer ou não fazer alguma coisa, em proveito de outra 1 . Mas a obrigação que nos interessa neste curso é a obrigação civil. Num conceito mais simples, a obrigação é o direito do credor contra o devedor. 14/03/2021 12 Num conceito mais completo, a obrigação é um vínculo jurídico transitório em virtude do qual uma pessoa fica sujeita a satisfazer uma prestação econômica em proveito de outra. Expliquemos: - vínculo jurídico: o vínculo é o motor da obrigação e precisa interessar ao Direito; um vínculo apenas moral (ex: ser educado, ser gentil, dar “bom dia”) ou religioso (ex: ir a missa todo Domingo) não tem relevância jurídica; - transitório: a obrigação é efêmera, tem vida curta (ex: uma compra e venda de balcão dura segundos), podendo até ser duradoura (ex: alugar uma casa por um ano), mas não dura para sempre. Inclusive um direito de crédito se extingue quando é exercido (ex: José bate no carro de Maria, quando Maria cobra o prejuízo e José paga, a obrigação se extingue). Já os Direitos Reais são permanentes, e quanto mais exercidos mais se fortalecem (ex: a propriedade sobre uma fazenda passa por gerações de pai para filho, e quanto mais a fazenda for usada mais cumprirá sua função social, ficando livre de invasões e desapropriação). - prestação: é o objeto da obrigação e se trata de uma conduta ou omissão humana, ou seja, sempre é dar uma coisa, fazer um serviço ou se abster de alguma conduta. Dar, fazer e não-fazer, estas três são as espécies de obrigação, voltaremos a elas abaixo. 14/03/2021 13 - econômica: toda obrigação precisa ter um valor econômico para viabilizar a responsabilidade patrimonial do inadimplente se não for espontaneamente cumprida. Em outras palavras, se uma dívida não for paga no vencimento o credor mune-se de uma pretensão e a dívida se transforma em responsabilidade patrimonial. Que pretensão é esta de que se arma, de que se mune o credor? É a pretensão a executar o devedor para atacar/tomar seus bens através do Juiz (391, 942). E se o devedor/inadimplente não tiver bens? Então não há nada a fazer pois, como dito, a responsabilidade é patrimonial e não pessoal. Ao credor só resta espernear, é o chamado na brincadeira“jus sperniandi”. Realmente já se foi o tempo em que o devedor poderia ser preso, escravizado, esquartejado e morto por dívidas, pois isto hoje atenta contra a dignidade humana. O único caso atual de prisão por dívida e na pensão alimentícia, assunto de Direito de Família. 14/03/2021 14 Em objetiva definição, O Direito das Obrigações trata-se do conjunto de normas (regras e princípios jurídicos) reguladoras das relações patrimoniais entre um credor (sujeito ativo) e um devedor (sujeito passivo) a quem incumbe o dever de cumprir, espontânea ou coativamente, uma prestação de dar, fazer ou não fazer. Elementos das obrigações As obrigações são constituídas de elementos subjetivos, objetivos e de um vínculo jurídico. I - elemento subjetivo: formado pelos envolvidos: credor(sujeito ativo) e devedor(sujeito passivo). II - elemento objetivo: formado pelo objeto da obrigação: a prestação a ser cumprida. III - vínculo jurídico: determinação que sujeita o devedor a cumprir determinada prestação em favor do credor. 14/03/2021 15 Elementos da obrigação: são três: a) duplo sujeito: o Direito das Obrigações trata das relações entre pessoas, então toda obrigação tem dois sujeitos, um ativo, chamado credor, e um passivo, chamado devedor. Não existe relação obrigacional com apenas um sujeito (381). Pode haver num dos pólos mais de um credor e mais de um devedor (257). Ambos podem ser pessoa natural como jurídica. Devem ser: - determinados ou, ao menos, determináveis (no momento do cumprimento devem ser conhecidos) (promessa de recompensa C.C. art. 854; - contrato de doação - o donatário, às vezes, é indeterminado, mas determinável no momento de seu cumprimento, pelos dados nele constantes, etc.). - Capazes - se não forem, deverão ser representados ou assistidos por seus representantes legais, dependendo ainda, em alguns casos, de autorização judicial.- - Legitimados. Numa relação simples, sabe-se exatamente qual das partes é a credora e qual é a devedora (ex: José bate no carro de Maria, então José é devedor e Maria é credora), mas numa relação complexa ambos os sujeitos são simultaneamente credores e devedores (ex: contrato de compra e venda, onde o comprador deve o dinheiro e é credor da coisa, e o vendedor deve a coisa e é credor do dinheiro). 14/03/2021 16 Tais obrigações complexas são também chamadas de sinalagmáticas. Os sujeitos precisam ser bem identificados para que o devedor saiba a quem prestar, e o credor saiba de quem receber. Excepcionalmente o devedor pode ser desconhecido (ex: qualquer pessoa que adquira imóvel hipotecado responde pela dívida, apesar de não ter originariamente assumido a obrigação; 303, mais detalhes em Civil 5) e o credor também pode ser desconhecido (ex: o credor faleceu ou desapareceu, deve então o devedor pagar na Justiça para se livrar da obrigação, 334; outro ex: 855). b) vínculo jurídico: o vínculo liga os sujeitos ao objeto da obrigação. O vínculo é a força motriz da relação obrigacional. O vínculo seria qualquer acontecimento relevante para o direito capaz de fazer nascer uma obrigação (ex: um acidente de trânsito gera um ato ilícito, um acordo de vontades produz um contrato, etc). Divide-se em: - débito: também chamado de vínculo espiritual ou pessoal, une o devedor ao credor e exige que aquele cumpra pontualmente a obrigação. - responsabilidade: também chamado de vínculo material, confere ao credor não satisfeito o direito de exigir judicialmente o cumprimento da obrigação, submetendo àquele os bens do devedor. 14/03/2021 17 c) objeto: atenção com o objeto! O objeto da obrigação não é uma coisa, mas um fato humano/uma conduta ou omissão do devedor chamada prestação. Esta é o objeto imediato. Ocorre que, podemos verificar também a existência do objeto da prestação (que se descobre indagando: dar, fazer ou não fazer o quê?) este é o objeto mediato da obrigação. A prestação possui três espécies: dar, fazer, ou não-fazer. Na obrigação de dar o objeto da prestação é uma coisa (ex: dar dinheiro, dar uma TV), mas o objeto da obrigação é a ação de entregar a coisa, não a coisa em si. Na obrigação de fazer o objeto da prestação é um serviço (ex: o cantor realiza um show, o advogado redige uma petição, o professor ministra uma aula). Finalmente, na obrigação de não-fazer, o objeto da prestação é uma omissão/abstenção (ex: o químico da fábrica de perfume é demitido e se obriga a não revelar a fórmula do perfume). 14/03/2021 18 EX: Como o objeto da obrigação é a prestação, mesmo na obrigação de dar o credor não tem poder sobre a coisa, mas sim sobre a prestação (ex: compro uma geladeira e a loja promete me entregar em casa, mas a loja não cumpre, não posso por isso invadir a loja e pegar a geladeira à força, devo sim exigir perdas e danos, 389 – trata-se da responsabilidade patrimonial do devedor, como dito acima). As obrigações de dar e de fazer são positivas, e a de não- fazer é a chamada obrigação negativa. O objeto da obrigação para ser válido precisa ser: - lícito (ex: comprar drogas, contratar o serviço de um “pistoleiro”, etc),; ser lícito: objeto lícito é o que não contraria a lei, a moral e os bons costumes. Quando o objeto jurídico da obrigação é imoral os tribunais por vezes aplicam o princípio de direito que ninguém pode valer-se da própria torpeza. (art. 150 e 883 do C.C.) Ex.: Estado da federação outorgou concessão a um particular para exploração de jogos de azar no respectivo território; contratos que tenham por objeto a comercialização de órgãos humanos para transplante. 14/03/2021 19 - possível (ex: viagem no tempo, procurar um anel no mar, encontrar um dinossauro vivo), - se impossível, o negócio é nulo. Lembrando que a impossibilidade pode ser: I - física: emana de leis físicas, naturais, ultrapassa as forças humanas. CUIDADO: a impossibilidade deve ser absoluta!!! ou seja, alcançar a todos indistintamente, a relativa, que atinge somente o devedor e não outras pessoas não é obstáculo à realização do negócio. C.C. art. 106 (Ex.: Colocar toda a água dos oceanos em um copo d’água; aeronave que leve passageiros (seres humanos) a plutão; venda de pedaço de terra no céu, etc.); II - jurídica: quando o ordenamento jurídico proíbe, expressamente, negócio a respeito de determinado bem, como a herança de pessoa viva (C.C. art. 426), o bem público (C.C. art.100) e os gravados com cláusula de inalienabilidade, por exemplo. A ilicitude é mais ampla. - determinado ou determinável: (a coisa devida precisa ser identificada, 243) e; - será determinada a prestação quando perfeitamente individualizado o objeto (Ex.: automóvel x, chaci número xxxxx licença xxxxxx). - Será determinável quando a identificação é relegada para o momento do cumprimento, existindo critérios fixados na lei ou na convenção para identificação. 14/03/2021 20 Obrigações genéricas (C.C. art. 243 e 874). Admite-se contrato a respeito de safra futura cuja extensão e valor serão apurados posteriormente (C.C., arts. 458 e 459). De qualquer forma, a generalização comporta limitações porque, de outro modo, inexistiria a obrigação, como no caso em que o devedor se obrigasse a dar algum café, sem precisar, no entanto, o gênero e a quantidade. NULA será a obrigação se o objeto for ilícito, impossível ou indeterminável (art. 166, II do C.C.) - ter valor econômico - para viabilizar o ataque ao patrimônio do devedor em caso de inadimplemento (947). Acrescentem “valor econômico” ao art. 104, II, do CC. - exige-se, também, que o objeto da prestação seja economicamente apreciável. Obrigações jurídicas, mas sem conteúdo patrimonial (como o dever de fidelidade entre os cônjuges e outros do direito de família), são excluídas do direito das obrigações. 14/03/2021 21 - Elemento objetivo: a prestação Neste ponto, chegamos ao coração da relação obrigacional. Em princípio, deve-se salientar que a obrigação possui dois tipos de objeto: a) objeto direto ou imediato; b) objeto indireto ou mediato. O objeto imediato da obrigação(e, por consequência, do direito de crédito) é a própria atividade positiva (ação) ou negativa (omissão) do devedor, satisfativa do interesse do credor. Tecnicamente, essa atividade denomina-se prestação, que terá sempre conteúdo patrimonial. Nesse sentido, já advertia ANTUNES VARELA: “Tendo principalmente em vista as obrigações com prestação de coisas, os autores costumam distinguir entre o objeto imediato e o objeto mediato da obrigação. O primeiro consiste na atividade devida (na entrega da coisa, na cedência dela, na sua restituição etc.); o segundo, na própria coisa, em si mesma considerada, ou seja, no objeto da prestação”17. Conforme já mencionamos, o objeto indireto ou mediato da obrigação é o próprio bem da vida posto em circulação jurídica. Cuida-se, em outras palavras, da coisa, em si considerada, de interesse do credor. 14/03/2021 22 Tecnicamente, essa atividade denomina-se prestação, que terá sempre conteúdo patrimonial. Sobre o tema, conclusivas são as palavras de ANTUNES VARELA: “A prestação consiste, em regra, numa atividade, ou numa ação do devedor (entregar uma coisa, realizar uma obra, dar uma consulta, patrocinar alguém numa causa, transportar alguns móveis, transmitir um crédito, dar certos números de lições etc.). Mas também pode consistir numa abstenção, permissão ou omissão (obrigação de não abrir estabelecimentos de certo ramo de comércio na mesma rua ou na mesma localidade; obrigação de não usar a coisa recebida em depósito; obrigações de não fazer escavações que provoquem o desmoronamento do prédio vizinho)”10. Posto isso, já se pode observar que as prestações, que constituem o objeto direto da obrigação, poderão ser: 14/03/2021 23 Dentre as prestações de dar coisa certa, poderíamos referir aquela pactuada para a entrega de determinado veículo (um caminhão, por exemplo), por força de um contrato de compra e venda. Já a prestação de dar coisa incerta, por sua vez, existirá quando o sujeito se obriga a alienar determinada quantidade de café, sem especificar a sua qualidade. A prestação de fazer, por sua vez, se refere a uma prestação de conduta comissiva, como, por exemplo, pintar um quadro ou cantar uma ária italiana em apresentação pública. Finalmente, temos, ainda, as prestações de não fazer, que consistem, sinteticamente, em abstenções juridicamente relevantes. Assim, quando, por força de um contrato, uma parte se obriga perante o seu vizinho a não realizar determinada obra em seu quintal ou um ex-empregado se obriga a não manter vínculo empregatício com outra empresa concorrente da ex-mpregadora (cláusula de não concorrência), estaremos diante de uma prestação de fato negativa. 14/03/2021 24 Elemento ideal: o vínculo jurídico entre credor e devedor Cuida-se do elemento espiritual ou abstrato da obrigação, consistente no vínculo jurídico que une o credor ao devedor. Consoante já se disse, a obrigação só poderá ser compreendida, em todos os seus aspectos, se a considerarmos como uma verdadeira relação pessoal — originada de um fato jurídico (fonte) —, por meio da qual fica o devedor obrigado (vinculado) a cumprir uma prestação patrimonial de interesse do credor. O fato jurídico, fonte da obrigação, por sua vez, não deverá integrar esse elemento ideal, uma vez que, por imperativo de precedência lógica, é anterior à relação jurídica obrigacional. Aliás, a obrigação é a própria consequência jurídica do fato, com ele não se confundindo. Assim, o contrato de compra e venda, por exemplo, é o fato jurídico determinante do vínculo obrigacional existente entre credor e devedor. É, portanto, a causa genética da obrigação em si. Assim, nas relações obrigacionais mais simplificadas, o sujeito passivo (devedor) obriga-se a cumprir uma prestação patrimonial de dar, fazer ou não fazer (objeto da obrigação), em benefício do sujeito ativo (credor). Note-se, outrossim, a existência de relações jurídicas complexas, nas quais cada parte é, simultaneamente, credora e devedora uma da outra. É o caso da obrigação decorrente do contrato de compra e venda: o vendedor é credor do preço e devedor da coisa; ao passo que o comprador é credor da coisa e devedor do preço. 14/03/2021 25 CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES Preferimos apresentá-la em duas partes. Primeiramente, a classificação básica, presente em toda e qualquer modalidade de relação jurídica obrigacional, segundo a prestação que as integra. Depois, uma classificação especial, que leva em consideração modalidades específicas de obrigações, independentemente da sua positivação. CLASSIFICAÇÃO BÁSICA As obrigações, apreciadas segundo a prestação que as integra, poderão ser: Essa é a classificação básica das obrigações, que, inspirada no Direito Romano (dare, facere, non facere), foi adotada pela legislação brasileira desde o esboço de Teixeira de Freitas. SÍLVIO DE SALVO VENOSA observa que: “Ambos os Códigos brasileiros ativeram-se, sem dúvida, a essa classificação romana, tendo distribuído as obrigações igualmente em três categorias: obrigações de dar (coisa certa ou coisa incerta), obrigações de fazer e obrigações de não fazer. Assim, afastou-se o Código somente das obrigações de ‘prestar’, termo que era ambíguo. Essa estrutura é mantida integralmente no novo Código” 14/03/2021 26 ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO São três, duas positivas (dar e fazer) e uma negativa (obrigação de não-fazer). 1 – obrigação de dar: conduta humana que tem por objeto uma coisa, subdividindo-se em três: obrigação de dar coisa certa, obrigação de restituir e obrigação de dar coisa incerta. 1.1 – obrigação de dar coisa certa: vínculo jurídico pelo qual o devedor se compromete a entregar ao credor determinado bem móvel ou imóvel, perfeitamente individualizado. O que vai caracterizar a obrigação de dar coisa certa é porque o objeto da prestação é coisa única e preciosa, ex: a raquete de Guga, o capacete de Ayrton Senna, a camisa dez de Pelé, etc. (235). O devedor obrigado a dar coisa certa não pode dar coisa diferente, ainda que mais valiosa, salvo acordo com o credor (313 – mais uma norma supletiva). - A obrigação não gera direito real (jus in re – direito sobre a coisa), mas apenas direito pessoal (jus ad rem – direito à coisa) ( = sobre a conduta). O contrato de compra e venda, por exemplo, tem natureza obrigacional. O vendedor apenas se obriga a transferir o domínio da coisa certa ao adquirente; e este, a pagar o preço. A transferência do domínio depende de outro ato: a tradição, para os móveis (CC, arts. 1.226 e 1.267); e o registro, que é uma tradição solene, para os imóveis (arts. 1.227 e 1.245). 14/03/2021 27 Excepcionalmente, admite-se efeito real caso a coisa continue na posse do devedor (ex: A combina vender a B o capacete de Ayrton Senna, B paga mas depois A recebe uma oferta melhor e termina vendendo o capacete a C; B não pode tomar o capacete de C, mas caso estivesse ainda com A poderia fazê-lo através do Juiz; esta é a interpretação do art. 475 do CC que vocês estudarão em Civil 3). Então o 389 é a regra e o 475 (execução forçada do contrato) é a exceção. Artigo 389 - Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. IMPOSSIBILIDADE DE ENTREGA DE COISA DIVERSA, AINDA QUE MAIS VALIOSA Na obrigação de dar coisa certa o devedor é obrigado a entregar ou restituir uma coisa inconfundível com outra, está assim adstrito a cumpri-la exatamente do modo estipulado, a consequência fatal é que o devedor da coisa certa não pode dar outra, ainda que mais valiosa, nem o credor é obrigado a recebê-la. Dispõe, com efeito, o art. 313 do Código Civil: “O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa”. A entrega de coisa diversa da prometida importa modificação daobrigação, denominada novação objetiva, que só pode ocorrer havendo consentimento de ambas as partes. Do mesmo modo, a modalidade do pagamento não pode ser alterada sem o consentimento destas. 14/03/2021 28 Em contrapartida, o credor de coisa certa não pode pretender receber outra ainda de valor igual ou menor que a devida, e possivelmente preferida por ele, pois a convenção é lei entre as partes. A recíproca, portanto, é verdadeira: o credor também não pode exigir coisa diferente, ainda que menos valiosa. E se a obrigação não gera direito real, o que vai gerar? Resposta: a tradição para as coisas móveis e o registro para as coisas imóveis. Tradição e registro são assuntos de Direitos Reais mas que já devo adiantar. Tradição é a entrega efetiva da coisa móvel (1226 e 1267), então quando compro uma geladeira, pago a vista e aguardo em casa sua chegada, só serei dono da coisa quando recebê-la. Ao contrário, se compro um celular a prazo e saio com ele da loja, o aparelho já será meu embora não tenha pago o preço (237). Por sua vez, o registro é a inscrição da propriedade imobiliária no Cartório de Imóveis, de modo que o dono do apartamento não é quem mora nele, não é quem pagou o preço ou quem tem as chaves. O dono da coisa imóvel é aquele cujo nome está registrado no Cartório de Imóveis (1245 e § 1º). Mais detalhes sobre tradição e registro em Civil 4. No direito brasileiro o contrato, por si só, não basta para a transferência do domínio. Por ele criam-se apenas obrigações e direitos. Dispõe, com efeito, o art. 481 do Código Civil que, pelo contrato de compra e venda: “um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e, o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro”. Código Civil: Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição. Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código. Desse modo, enquanto o contrato que institui ou contém promessa de transferência do domínio de imóvel, não estiver registrado no Cartório de Registro de Imóveis, existirá entre as partes apenas um vínculo obrigacional. 14/03/2021 29 1.2 – obrigação de restituir: é também chamada de obrigação de devolver. Difere da obrigação de dar, pois nesta a coisa pertence ao devedor até a tradição, enquanto na obrigação de restituir a coisa pertence ao credor, apenas sua posse é que foi transferida ao devedor. Posse e propriedade são conceitos que serão estudados em Direitos Reais, mas dá para entender que quando se aluga um filme, a locadora continua sendo proprietária do filme, é apenas a posse que se transfere ao cliente. Então na locação o cliente/devedor tem a obrigação de restituir o bem ao locador após o prazo acertado (569, IV). Como se vê, na obrigação de restituir a prestação consiste em devolver uma coisa cuja propriedade já era do credor antes do surgimento da obrigação. Igualmente se eu empresto um carro a meu vizinho, eu continuo dono/proprietário do carro, apenas a posse é que é transferida, ficando o vizinho com a obrigação de devolver o veículo após o uso. Locação e empréstimo são exemplos de obrigação de restituir, ficando a coisa em poder do devedor, mas mantendo o credor direito real de propriedade sobre ela. Como a coisa é do credor, seu extravio antes da devolução trará prejuízo ao próprio credor (240), enquanto na obrigação de dar o extravio antes da tradição traz prejuízo ao devedor. 2 - Obrigação de Dar Coisa Incerta 1 – obrigação de dar coisa incerta: nesta espécie de obrigação a coisa não é única, singular, exclusiva e preciosa como na obrigação de dar coisa certa, mas sim é uma coisa genérica determinável pelo gênero e pela quantidade (243). Ao invés de uma coisa determinada/certa, temos aqui uma coisa determinável/incerta (ex: cem sacos de café; dez cabeças de gado, um carro popular, etc). - Indicação – É indispensável nas obrigações de dar coisa incerta a indicação de gênero e quantidade, já que, sem qualquer desses elementos, a indeterminação será absoluta e a avença não gerará obrigação eis que o devedor não pode ser compelido à prestação genérica. - Exemplos de Indeterminação absoluta “... entregar sacas de café ...” (quantas????) “...entregar dez sacas ...” (de quê???) ■ Faltam quantidade e gênero 14/03/2021 30 Essa indeterminação absoluta não pode ser objeto de prestação, e o contrato, com tal objeto, não será capaz de gerar obrigação. Pois o objeto tem que determinável. - Obrigação de dar coisa incerta hígida. “Obrigação de dar 10 bois” ■ A indeterminação é apenas relativa. O objeto da prestação é incerto porém suscetível de determinação futura. Há determinação do gênero (bois) e de quantidade (dez) Resta individualizar que bois serão entregues A coisa incerta não é qualquer coisa, ou coisa completamente indeterminada. É coisa parcialmente determinada, suscetível de completa determinação oportunamente, mediante a escolha da qualidade ainda não indicada Esta escolha chama-se juridicamente de concentração. Conceito: processo de escolha da coisa devida, de média qualidade, feita via de regra pelo devedor (244). é aquilo que se realiza no ato de cumprimento da obrigação, aquele momento em que é determinada ou individualizada a res debita. A concentração implica também em separação, pesagem, medição, contagem e expedição da coisa, conforme o caso. O estado de indeterminação da coisa é transitório e cessa com essa escolha Notificado o credor, a coisa que era indeterminada torna-se certa Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor. A escolha da qualidade caberá ao devedor, se o contrário não for convencionado Pode-se, no contrato, convencionar que a escolha caberá ao credor ou a um terceiro Na omissão do contrato, a escolha pertencerá ao devedor Tratando-se este artigo 244 de uma norma supletiva, que apenas completa a vontade das partes em caso de omissão no contrato entre elas. 14/03/2021 31 - Critério da coisa intermediária – Quando a escolha couber ao devedor, ele não poderá escolher a pior qualidade, entretanto, também não será obrigado a entregar a melhor qualidade. O legislador optou pelo princípio da qualidade média nos casos de escolha pelo devedor. E se houver apenas duas qualidades? Se existirem apenas duas qualidades, e a escolha couber ao devedor, o critério lógico seria poder escolher qualquer delas, entretanto a lei é omissa nesse caso. As partes podem convencionar que um terceiro, alheio à relação obrigação, faça a escolha, funcionando como um árbitro. Cabendo a escolha ao credor, será ele citado para essa finalidade, sob pena de perder o direito da escolha, que passará ao devedor. Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente. Qual era a seção antecedente? SeçãoIDas Obrigações de Dar Coisa Certa Após a concentração a coisa incerta se torna certa (245). Pela importância da concentração, o credor deve ser cientificado quando o devedor for realizá-la, até para que o credor fiscalize a qualidade média da coisa a ser escolhida. - A OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA E A TEORIA DO RISCO - A interrupção na relação jurídica obrigacional apontada no Código Civil, no artigo 246, indica que não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito, pois o gênero não perece (genus nunquam perit). Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. Podemos citar como exemplo desta hipótese, quando o devedor se obriga a entregar dez sacas de milho, ainda que se percam todas as sacas, deverá obter o produto prometido ecumprir a prestação estabelecida na avença. 14/03/2021 32 Adotamos o mesmo posicionamento de Caio Mário (2005, p. 57) quanto à teoria dos riscos aplicada na obrigação de dar coisa incerta: entendemos que tal teoria deve ser compreendida em duas fases distintas. Na primeira fase, até que se efetive a concentração, por meio da notificação ou pela oferta, a obrigação deve ser considerada de gênero, e não versa objeto especificado. Indicada a coisa apenas pela espécie, não comporta alegação de perecimento ou deterioração, pois que o devedor tem de prestar uma coisa, dentro da espécie acordada. A obrigação persiste, enquanto houver possibilidade de ser encontrado exemplar da coisa, na quantidade estipulada, sendo que apenas por via excepcional desaparece todo a espécie. Na segunda fase, realizada a escolha pelo credor, pelo devedor ou por terceiro (indicado no título, como dispõe o artigo 485 do CC), perde a prestação o caráter de indeterminação, que será considerada de dar coisa certa. Esta alteração de categoria se dá no momento da escolha, e a coisa, que indeteriorável e imperecível, por aquele fato se torna suscetível de dano ou perda. Antes da concentração a coisa devida não se perde pois genus nunquam perit (o gênero nunca perece). Se João deve cem laranjas a José não pode deixar de cumprir a obrigação alegando que as laranjas se estragaram, pois cem laranjas são cem laranjas, e se a plantação de João se perdeu ele pode comprar as frutas em outra fazenda (246). Todavia, após a concentração, caso as laranjas se percam (ex: incêndio no armazém) a obrigação se extingue, voltando as partes ao estado anterior, devolvendo-se eventual preço pago, sem se exigir perdas e danos (234, 389, 402). O risco é suportado pela parte que sofre o prejuízo proveniente da prestação, caso esta venha se tornar impossível por caso fortuito ou força maior (TELLES, 1997, p. 306). O credor suportará o risco se a obrigação se extinguir, com a consequente liberação do devedor. (após concentração) Suportará o risco o devedor, caso continue vinculado ao cumprimento do acordo, devendo, portanto, indenizar os danos suportados pelo credor. (antes concentração) 14/03/2021 33 - Gênero limitado de coisas certas Alertarmos, todavia, uma flexibilização à regra de que o gênero (entende-se espécie) não perece, que é o caso das coisas de existência limitada, como um vinho raro ou livros com edições limitadas e que não mais existem no mercado. Nestas hipóteses, poderá o devedor alegar perda ou deterioração quando desaparecida a coisa. Maria Helena Diniz (2004, p. 89) explicando o assunto adverte que “se o genus (gênero) é assim delimitado, o perecimento ou inviabilidade de todas as espécies que o componham, desde que não sejam imputáveis ao devedor, acarretará a extinção da obrigação”. O perecimento de todas as espécies que componham o genus acarretará a extinção da obrigação. 3 - Obrigação de Fazer - conduta humana que tem por objeto um serviço. Conceito: espécie de obrigação positiva pela qual o devedor se compromete a praticar algum serviço lícito em benefício do credor. (Maria Helena Diniz) Enquanto na obrigação de dar o objeto da prestação é uma coisa, na obrigação de fazer o objeto da prestação é um serviço (ex: professor ministrar uma aula, advogado redigir uma petição, cantor fazer um show, pedreiro construir um muro, médico realizar uma consulta, etc.). E se eu quero comprar um quadro e encomendo a um artista, a obrigação será de fazer ou de dar? Se o quadro já estiver pronto a obrigação será de dar, se ainda for confeccionar o quadro a obrigação será de fazer. A obrigação de fazer tem duas espécies: 14/03/2021 34 2.1 – fungível: quando o serviço puder ser prestado por uma terceira pessoa, diferente do devedor, ou seja, quando o devedor for facilmente substituível, sem prejuízo para o credor, a obrigação é fungível (ex: pedreiro, eletricista, mecânico, caso não possam fazer o serviço e mandem um substituto, a princípio para o credor não há problema). As obrigações de dar são sempre fungíveis pois visam a uma coisa, não importa quem seja o devedor (304). 2.2 – infungível: ao credor só interessa que o devedor, pelas suas qualidades pessoais, faça o serviço (ex: médico e advogado são profissionais de estrita confiança dos pacientes e clientes). Chama- se esta espécie de obrigação de personalíssima ou intuitu personae ( = em razão da pessoa). São as circunstâncias do caso e a vontade do credor que tornarão a obrigação de fazer fungível ou não. Em caso de inexecução da obrigação de fazer o credor só pode exigir perdas e danos (247). Viola a dignidade humana constranger o devedor a fazer o serviço por ordem judicial, de modo que na obrigação de fazer não se pode exigir a execução forçada como na obrigação de dar coisa certa (art. 475 – sublinhem exigir-lhe o cumprimento). Ex: Imaginem um cantor se recusar a subir no palco, não é razoável o Juiz mandar a polícia para forçá-lo a trabalhar “manu militari”, o coerente é o credor do show exigir perdas e danos (389). Ninguém pode ser diretamente coagido a praticar o ato a que se obrigara. Assim, a execução “in natura” do art. 475 do CC deve ser substituída por perdas e danos quando for impossível (ex: a coisa devida não está mais com o devedor) ou quando causar constrangimento físico ao devedor (ex: obrigação de fazer). Se ocorrer recusa do devedor de executar obrigação fungível, o credor pode pedir a um terceiro para fazer o serviço, às custas do devedor (249). Havendo urgência, o credor pode agir sem ordem judicial, num autêntico caso de realização de Justiça pelas próprias mãos (pú do 249, ex: consertar o telhado de casa ameaçando cair). Mas se tal recusa decorre de um caso fortuito (ex: o cantor gripou e perdeu a voz), extingue-se a obrigação (248). 14/03/2021 35 4 – Obrigação de não-fazer: trata-se de uma obrigação negativa cujo objeto da prestação é uma omissão ou abstenção. Os romanos chamavam de obrigação ad non faciendum. Conceito: vínculo jurídico pelo qual o devedor se compromete a se abster de fazer certo ato, que poderia livremente praticar, se não tivesse se obrigado em benefício do credor. O devedor vai ter que sofrer, tolerar ou se abster de algum ato em benefício do credor. Exemplos: o engenheiro químico que se obriga a não revelar a fórmula do perfume da fábrica onde trabalha; o condômino que se obriga a não criar cachorro no apartamento onde reside; o professor que se obriga a não dar aula em outra faculdade; o comerciante que se obriga a não fazer concorrência a outro, etc. Pode haver limite temporal para a obrigação (1.147). Como na autonomia privada a liberdade é grande, as obrigações negativas podem ser bem variadas, mas obrigações imorais e antissociais, ou que sacrifiquem a liberdade das pessoas, são proibidas, ex: obrigação de não se casar, de não trabalhar, de não ter religião, etc. A violação da obrigação negativa se resolve em perdas e danos, então se o engenheiro divulgar a fórmula do perfume terá que indenizar a fábrica. Mas se for viável, o credor poderá exigir o desfazimento pelo devedor (ex: José se obriga a não subir o muro para não tirar a ventilação do seu vizinho João, caso José aumente o muro, João poderá exigir a demolição, 251). Neste exemplo do muro, se José se mudar, o novo morador terá que respeitar a obrigação? Não, pois quem celebrou o contrato não foi ele. Mas se João, ao invés de um simples contrato de obrigação negativa, fizer com José uma servidão predial, todos os futuros proprietários da casa não poderão aumentar o muro (1.378). 14/03/2021 36 Servidão predial é assunto de Civil 5, e por se tratar de um direito real, já se percebe sua maior força em relação a um direito obrigacional. Enquanto uma obrigação vincula pessoas (João a José), uma servidão predial vincula uma pessoa a uma coisa, então a segurança para o credor é bem maior. Ainda tratando do exemplo do muro, e se a Prefeitura obrigar José a aumentar o muro por uma questão de estética ou urbanismo? José terá que obedecere João nada poderá fazer, pois o Direito Público predomina sobre o Direito Privado (250 – é o chamado “Fato do Príncipe”, em alusão aos monarcas que governavam os países na Europa medieval).
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