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Metabolismo dos lipídeos [Guyton] Diversos compostos químicos nos alimentos e no organismo são classificados como lipídios. Entre eles se encontram (1) gordura neutra, também conhecida como triglicerídeos; (2) fosfolipídios; (3) colesterol; além de (4) alguns outros de menor importância. Quimicamente, a parte lipídica básica dos triglicerídeos e dos fosfolipídios é formada por ácidos graxos, que são simplesmente cadeias longas de ácidos carboxílicos. Um ácido graxo típico, o ácido palmítico, é o seguinte: CH3(CH2)14COOH. Os triglicerídeos são usados no organismo, principalmente para fornecer energia para os diferentes processos metabólicos, função que compartilham quase igualmente com os carboidratos. No entanto, alguns lipídios, especialmente o colesterol, os fosfolipídios e pequenas quantidades de triglicerídeos, são usados para formar as membranas de todas as células do organismo e para realizar outras funções celulares. Observe que as três moléculas de cadeia longa dos ácidos graxos estão ligadas a uma molécula de glicerol. Os três ácidos graxos, mais comumente encontrados nos triglicerídeos do corpo humano são (1) ácido esteárico (mostrado na tristearina exemplificada anteriormente), que apresenta cadeia com 18 carbonos e é completamente saturada com átomos de hidrogênio; (2) ácido oleico, que também apresenta cadeia com 18 carbonos, mas mostra uma dupla ligação no meio da cadeia; e (3) ácido palmítico, que tem cadeia com 16 carbonos e é completamente saturada. Os principais tipos de fosfolipídios no corpo são as lecitinas, cefalinas e esfingomielina. Os fosfolipídios sempre contêm uma ou mais moléculas de ácidos graxos e radical de ácido fosfórico e, em geral, contêm uma base nitrogenada. Apesar de as estruturas químicas dos fosfolipídios serem relativamente variáveis, suas propriedades físicas são similares, porque todos são lipossolúveis, transportados por lipoproteínas, e empregados em todo o corpo para diversas finalidades estruturais, tais como nas membranas celulares e intracelulares. Apesar de o colesterol não apresentar ácidos graxos na sua fórmula, seu núcleo esterol é sintetizado a partir de partes de moléculas de ácidos graxos, o que lhe dá, assim, muitas das propriedades físicas e químicas de outros lipídios. É muito lipossolúvel, mas só ligeiramente hidrossolúvel. De forma específica, é capaz de formar ésteres com os ácidos graxos. Cerca de 70% do colesterol nas lipoproteínas plasmáticas se encontram sob a forma de ésteres de colesterol. Transporte Quase todas as gorduras na dieta, com a principal exceção de poucos ácidos graxos de cadeia curta, são absorvidas a partir do intestino para a linfa intestinal. Durante a digestão, a maior parte dos triglicerídeos se divide em monoglicerídeos e ácidos graxos. Então, na passagem através das células epiteliais intestinais, os monoglicerídeos e os ácidos graxos são ressintetizados em novas moléculas de triglicerídeos que chegam à linfa como minúsculas gotículas dispersas, chamadas endocrinologia: obesidade Igor Mecenas quilomícrons, cujo diâmetro fica entre 0,08 e 0,6 micrômetro. A maioria do colesterol e dos fosfolipídios, absorvidos do trato gastrointestinal, penetra nos quilomícrons. Assim, apesar dos quilomícrons serem compostos principalmente por triglicerídeos, eles contêm cerca de 9% de fosfolipídios, 3% de colesterol e 1% de apoproteína B. Os quilomícrons são então transportados para o ducto torácico e, em seguida, para o sangue venoso circulante na junção das veias subclávia e jugular. Remoção dos quilomícrons do sangue Cerca de 1 hora após a refeição rica em gorduras, a concentração de quilomícrons plasmática pode aumentar por 1% a 2% do plasma total e, devido ao grande tamanho dos quilomícrons, o plasma assume aspecto turvo, às vezes, amarelado. No entanto, os quilomícrons têm meia-vida de apenas 1 hora ou menos, de modo que, depois de poucas horas, o plasma volte a ficar claro. Grande parte dos quilomícrons é removida da circulação sanguínea, à medida que passa pelos capilares de vários tecidos, especialmente do tecido adiposo, do músculo esquelético e do coração. Esses tecidos sintetizam a enzima lipase lipoproteica, que é transportada para a superfície das células endoteliais capilares, onde hidrolisa os triglicerídeos dos quilomícrons à medida que entram em contato com a parede endotelial, liberando assim ácidos graxos e glicerol. Os ácidos graxos liberados dos quilomícrons difundem-se para o tecido adiposo e para as células musculares. Após os triglicerídeos serem removidos dos quilomícrons, os remanescentes dos quilomícrons enriquecidos com colesterol são rapidamente depurados do plasma. Os remanescentes se ligam a receptores nas células endoteliais dos sinusoides do fígado. A apolipoproteína-E na superfície dos remanescentes de quilomícrons e secretadas pelas células do fígado também desempenham papel importante na iniciação da depuração dessas lipoproteínas plasmáticas. Ácidos Graxos Livres Quando a gordura armazenada no tecido adiposo precisa ser usada em outras regiões do corpo para fornecer energia, ela deve em primeiro lugar ser transportada do tecido adiposo para o outro tecido. Seu transporte ocorre, principalmente, na forma de ácidos graxos livres. Esse transporte é conseguido pela hidrólise dos triglicerídeos de volta à forma de ácidos graxos e glicerol. Pelo menos duas classes de estímulos desempenham papel importante na promoção dessa hidrólise. Primeira, quando a quantidade de glicose disponível para a célula adiposa é inadequada, um dos produtos do metabolismo da glicose, o a-glicerofosfato, também só está disponível em quantidades insuficientes. Como essa substância é necessária para manter a porção glicerol dos triglicerídeos, o resultado é a hidrólise dos triglicerídeos. Segunda, a lipase celular hormônio- sensível pode ser ativada por diversos hormônios das glândulas endócrinas e isso também promove hidrólise rápida dos triglicerídeos. Ao sair dos adipócitos, os ácidos graxos passam por forte ionização no plasma, e a porção iônica se combina imediatamente com as moléculas de albumina das proteínas plasmáticas. Os ácidos graxos ligados desse modo são chamados ácidos graxos livres ou ácidos graxos não esterificados. A concentração de ácidos graxos livres no plasma sob condições de repouso é cerca de 15 mg/dL, totalizando apenas 0,45 grama de ácidos graxos em todo o sistema circulatório. Lipoproteínas No estado pós-absortivo, depois que todos os quilomícrons tiverem sido removidos do sangue, mais de 95% de todos os lipídios no plasma estarão sob a forma de lipoproteínas. São partículas pequenas — muito menores do que os quilomícrons, mas qualitativamente similares na sua composição — contendo triglicerídeos, colesterol, fosfolipídios e proteínas. A concentração total das lipoproteínas no plasma, em média de 700 mg por 100 mL de plasma — ou seja, 700 mg/dL —, pode se subdividir nos seguintes componentes lipoproteicos individuais: Além dos quilomícrons, existem quatro tipos importantes de lipoproteínas classificados segundo suas densidades, medidas pela ultracentrifugação: • As lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDLs), contendo altas concentrações de triglicerídeos e concentrações moderadas de colesterol e de fosfolipídios; • As lipoproteínas de densidade intermediária (IDLs), que são VLDL das quais uma parte de triglicerídeos foi removida, ficaram aumentadas quanto às concentrações de colesterol e de fosfolipídios; • As lipoproteínas de baixa densidade (LDLs), derivadas das IDL, com a remoção de quase todos os triglicerídeos, deixando concentração especialmente elevada de colesterol e aumento moderado de fosfolipídios; e • As lipoproteínas de alta densidade (HDLs), contendo concentração elevada de proteínas (cerca de 50%), mas concentrações muito menores de colesterol e fosfolipídios. Quase todas as lipoproteínassão formadas no fígado, que é também onde ocorre a síntese da maior parte do colesterol plasmático dos fosfolipídios e dos triglicerídeos. Além disso, pequenas quantidades de HDLs são sintetizadas no epitélio intestinal, durante a absorção dos ácidos graxos no intestino. A função primária das lipoproteínas é a de transportar seus componentes lipídicos no sangue. As VDLs transportam os triglicerídeos sintetizados no fígado, em sua maior parte para o tecido adiposo, enquanto as outras lipoproteínas são especialmente importantes nos diferentes estágios de transporte dos fosfolipídios e colesterol do fígado para os tecidos periféricos ou da periferia de volta para o fígado. Armazenamento Tecido Adiposo Grandes quantidades de gordura são armazenadas nos dois principais tecidos do corpo, o tecido adiposo e o fígado. Uma função crucial do tecido adiposo consiste em armazenar os triglicerídeos até que sejam necessários para o suprimento de energia em outras partes do corpo. Funções adicionais são a de proporcionar o isolamento térmico ao organismo e a secreção de hormônios, como a leptina e a adiponectina, que afetam múltiplas funções do organismo, entre elas o apetite e o gasto de energia. Os adipócitos são fibroblastos modificados que armazenam triglicerídeos, quase puros, em quantidades de até 80% a 95% de todo o volume das células. Os triglicerídeos nos adipócitos se encontram, em geral, sob a forma líquida. Quando os tecidos são expostos ao frio, por período prolongado, as cadeias de ácidos graxos dos triglicerídeos celulares, em período de semanas, ficam menores ou mais insaturadas, de modo a reduzir seu ponto de fusão, permitindo, então, que a gordura permaneça no estado líquido. Essa característica é particularmente importante, porque só a gordura líquida pode ser hidrolisada e transportada para fora dos adipócitos. As células adiposas podem sintetizar quantidades muito pequenas de ácidos graxos e triglicerídeos, a partir dos carboidratos; essa função suplementa a síntese de gordura no fígado. Grande quantidade de lipases está presente no tecido adiposo. Algumas dessas enzimas catalisam a deposição de triglicerídeos, dos quilomícrons e das lipoproteínas. Outras, quando ativadas por hormônios, causam a clivagem dos triglicerídeos, liberando ácidos graxos livres. Devido à rápida troca de ácidos graxos, os triglicerídeos nas células adiposas são renovados uma vez a cada 2 ou 3 semanas, o que significa que a gordura hoje armazenada nos tecidos não é a mesma que foi armazenada no mês passado, enfatizando, dessa forma, o estado dinâmico do armazenamento das gorduras. Lipídios Hepáticos As principais funções do fígado no metabolismo dos lipídios são • Degradar os ácidos graxos em pequenos compostos que podem ser usados como fonte de energia; • Sintetizar triglicerídeos, principalmente a partir de carboidratos, mas em menor extensão, também de proteínas; e • Sintetizar outros lipídios a partir dos ácidos graxos, em especial colesterol e fosfolipídios. Grande quantidade de triglicerídeos aparece no fígado (1) durante os estágios iniciais da inanição; (2) no diabetes melito; e (3) em qualquer outra condição em que as gorduras, em vez dos carboidratos, estão sendo utilizadas como fonte de energia. Nessas condições, grande quantidade de triglicerídeos é mobilizada do tecido adiposo, transportada como ácidos graxos livres no sangue e redepositada como triglicerídeos no fígado, onde começam os estágios iniciais de grande parte da degradação das gorduras. As células hepáticas, além de conterem triglicerídeos, contêm também grande quantidade de fosfolipídios e colesterol, que estão sendo continuamente sintetizados pelo fígado. De igual modo, as células hepáticas são muito mais capazes do que qualquer outro tecido de dessaturar os ácidos graxos, de modo que os triglicerídeos hepáticos são normalmente muito mais insaturados do que os do tecido adiposo. Essa capacidade do fígado de realizar a dessaturação dos ácidos graxos é funcionalmente importante para todos os tecidos do organismo, porque muitos elementos estruturais de todas as células contêm quantidades razoáveis de gorduras insaturadas, e sua principal fonte é o fígado. Essa dessaturação é realizada por meio de uma desidrogenase nas células hepáticas. Síntese Sempre que a quantidade de carboidratos ingerida é maior do que a que pode ser usada de imediato como fonte de energia ou do que pode ser armazenada sob forma de glicogênio, o excesso é rapidamente transformado em triglicerídeos e armazenado, desse modo, no tecido adiposo. A síntese da gordura de carboidratos é especialmente importante por dois motivos: 1. A capacidade das diferentes células do corpo para armazenar os carboidratos, sob a forma de glicogênio é, em geral, pequena. Ao contrário, é possível armazenar diversos quilos de gordura no tecido adiposo. Portanto, a síntese de gorduras fornece meio pelo qual o excesso de energia ingerida, sob a forma de carboidratos (e proteínas), pode ser armazenado para utilização posterior. 2. Cada grama de gordura contém quase duas vezes e meia mais calorias de energia do que cada grama de glicogênio. Consequentemente, para um dado ganho de peso, a pessoa é capaz de armazenar diversas vezes esse valor de energia sob a forma de gordura, o que é extremamente importante quando o animal precisa de grande mobilidade para sobreviver. Nos seres humanos, a maior parte da síntese de triglicerídeos ocorre no fígado, mas quantidades diminutas também são sintetizadas pelo próprio tecido adiposo. Os triglicerídeos, formados no fígado, são transportados em sua maior parte pelos VLDLs para o tecido adiposo, onde são armazenados. A primeira etapa na síntese dos triglicerídeos é a conversão dos carboidratos em acetil-CoA. Essa conversão ocorre durante a degradação normal da glicose pelo sistema glicolítico. A síntese dos ácidos graxos a partir da acetil-CoA ocorre por meio do processo em duas etapas, usando a malonil-CoA e a NADPH reduzida, como intermediários principais no processo de polimerização. Depois de sintetizadas, as cadeias de ácidos graxos cresceram para conter de 14 a 18 átomos de carbono; elas se ligam ao glicerol para formar triglicerídeos. As enzimas que provocam essa conversão são muito específicas para os ácidos graxos com comprimentos de cadeia de 14 carbonos ou mais, fator que controla a qualidade física dos triglicerídeos armazenados no organismo. Como vemos, a porção glicerol dos triglicerídeos é dada pelo a-glicerofosfato, que é outro produto derivado do esquema glicolítico da degradação de glicose. Uso como fonte de energia Hidrólise dos Triglicerídeos A primeira etapa na utilização de triglicerídeos como fonte de energia é a sua hidrólise em ácidos graxos e glicerol. Então, tanto os ácidos graxos como o glicerol são transportados no sangue para os tecidos ativos, onde vão ser oxidados para liberar energia. Quase todas as células — com algumas exceções, tais como o tecido cerebral e as hemácias — podem usar ácidos graxos como fonte de energia. O glicerol, quando penetra no tecido ativo, é imediatamente modificado pelas enzimas intracelulares em glicerol-3-fosfato que entra na via glicolítica para a metabolização da glicose e então é utilizado como fonte de energia. Antes que os ácidos graxos possam ser empregados como energia, eles devem ser ainda mais processados nas mitocôndrias. Betaoxidação A degradação e a oxidação dos ácidos graxos só ocorrem nas mitocôndrias. Logo, a primeira etapa para a utilização dos ácidos graxos é seu transporte para as mitocôndrias, um processo mediado por transportador que usa a carnitina como substância carreadora. A molécula dos ácidos graxos é degradada por meio da liberação progressiva de dois segmentos de carbono, sob a forma de acetilcoenzima A (acetil- CoA). Para compreender as etapas essenciais do processo de betaoxidação,observe que na equação 1 a primeira etapa é a combinação da molécula de ácido graxo com a coenzima A (CoA) para formar o acil-CoA graxo. Nas equações 2, 3 e 4, o carbono beta (o segundo carbono à direita) do acil-CoA graxo é oxidado. Então, na equação 5, os dois carbonos do lado direito da molécula se separam para liberar a acetil-CoA no líquido celular. Ao mesmo tempo, outra molécula de CoA se liga à extremidade da porção restante da molécula de ácido graxo, formando, assim, nova molécula de acil-CoA graxo; desta vez, no entanto, a molécula apresenta menos dois átomos de carbono, devido à perda da primeira acetil-CoA de sua extremidade terminal. A seguir, essa molécula mais curta de acil-CoA graxo entra na equação 2 e passa pelas equações 3, 4 e 5 para liberar ainda outra molécula de acetil-CoA, diminuindo assim a molécula de ácido graxo original por menos dois carbonos. Além das moléculas liberadas de acetil-CoA, quatro átomos de carbono são liberados da molécula de ácido graxo, ao mesmo tempo, inteiramente distintos da acetil-CoA. Oxidação da Acetil-CoA As moléculas de acetil-CoA, formadas pela betaoxidação penetram imediatamente no ciclo do ácido cítrico, associando-se, em primeiro lugar, ao ácido oxaloacético para formar ácido cítrico, que é então degradado em dióxido de carbono e átomos de hidrogênio. O hidrogênio é, subsequentemente, oxidado pelo sistema quimiosmótico oxidativo das mitocôndrias. A reação resultante no ciclo do ácido cítrico para cada molécula de acetil-CoA é a seguinte: Dessa maneira, depois da degradação inicial dos ácidos graxos em acetil-CoA, sua quebra final é exatamente a mesma que a da acetil-CoA formada a partir do ácido pirúvico, durante o metabolismo da glicose. Os átomos de hidrogênio excedentes são também oxidados pelo mesmo sistema quimiosmótico oxidativo das mitocôndrias, utilizado na oxidação de carboidratos, liberando grande quantidade de ATP. Formação de ATP Na betaoxidação, os quatro átomos de hidrogênio, clivados cada vez que uma molécula de acetil-CoA é formada da cadeia de ácido graxo, são liberados sob a forma de FADH2 reduzido, NADH reduzido e H+. Logo, para cada molécula de ácido graxo esteárico metabolizada para formar nove moléculas de acetil- CoA, 32 átomos adicionais de hidrogênio são removidos. Além disso, para cada uma das nove moléculas de acetil-CoA que são, subsequentemente, degradadas pelo ciclo do ácido cítrico, mais oito átomos de hidrogênio são removidos, formando outros 72 hidrogênios. Isto perfaz o total de 104 átomos de hidrogênio, eventualmente liberados pela degradação de cada molécula de ácido esteárico. Deste grupo, 34 são removidos pela degradação de ácidos graxos pelas flavoproteínas e 70 são removidos pela nicotinamida adenina dinucleotídio (NAD+) sob a forma de NADH e H+. Esses dois grupos de átomos de hidrogênio são oxidados nas mitocôndrias, mas eles entram no sistema oxidativo em pontos diferentes. Assim, uma molécula de ATP é sintetizada para cada um dos 34 hidrogênios das flavoproteínas, e 1,5 molécula de ATP é sintetizada para cada um dos 70 NADH e hidrogênios H+. Isto significa 34 mais 105, ou um total de 139 moléculas de ATP formadas pela oxidação do hidrogênio, derivado de cada molécula de ácido esteárico. Outras nove moléculas de ATP são formadas no ciclo do ácido cítrico propriamente dito (em separado do ATP liberado pela oxidação do hidrogênio), uma para cada uma das nove moléculas de acetil-CoA metabolizadas. Assim, um total de 148 moléculas de ATP são formadas durante a oxidação completa da molécula de ácido esteárico. No entanto, duas ligações de alta energia são consumidas na combinação inicial de CoA com a molécula de ácido esteárico, correspondendo a ganho final de 146 moléculas de ATP. Formação de Ácido Acetoacético Grande parte da degradação inicial dos ácidos graxos ocorre no fígado, em especial quando grande quantidade de lipídios está sendo usada como fonte de energia. No entanto, o fígado utiliza apenas pequena proporção de ácidos graxos para seu próprio processo metabólico intrínseco. Em vez disso, quando as cadeias de ácido graxo tiverem se dividido em acetil-CoA, duas moléculas de acetil-CoA se condensam para formar uma molécula de ácido acetoacético que é então transportada no sangue para as outras células por todo o corpo, onde são usadas como fonte de energia. Ocorrem os processos químicos seguintes: Parte do ácido acetoacético também é convertida em ácido b-hidroxibutírico, e quantidades mínimas são transformadas em acetona, segundo as seguintes reações: O ácido acetoacético, o ácido b-hidroxibutírico e a acetona se difundem livremente através das membranas das células hepáticas e são transportados pelo sangue para os tecidos periféricos. Aí, de novo, eles se difundem para as células, onde ocorrem reações reversas e formam-se moléculas de acetil-CoA. Essas moléculas, por sua vez, entram no ciclo do ácido cítrico e são oxidadas como fonte de energia. Normalmente, o ácido acetoacético e o ácido b- hidroxibutírico que entram na corrente sanguínea são transportados tão rapidamente para os tecidos que sua concentração conjunta no plasma raramente ultrapassa 3 mg/dL. Mesmo assim, apesar dessa pequena concentração sérica, grandes quantidades são de fato transportadas, do mesmo modo como acontece com o transporte de ácidos graxos livres. Obesidade [VILAR] A obesidade, definida como um índice de massa corporal (IMC) maior ou igual a 30 kg/m², é uma doença metabólica crônica, de difícil tratamento, cuja prevalência vem aumentando em proporções epidêmicas nas últimas quatro décadas na maioria dos países. A obesidade é um relevante problema de saúde mundial, agravado, sobretudo, pelo aumento do risco de diabetes melito tipo 2, doenças cardiovasculares e várias formas de câncer. Por exemplo, em homens, cada incremento de 5 kg/m² no IMC aumenta o risco de câncer esofágico em 52% e câncer de cólon em 24%; nas mulheres, esse aumento é de 59% para o câncer de endométrio, 59% para o câncer de vesícula biliar e 12% para o câncer de mama na pós-menopausa. O excesso de peso corporal também favorece o surgimento de muitas outras anormalidades, incluindo osteoartrite, doença hepática gordurosa não alcoólica, refluxo gastresofágico, hipertrofia benigna da próstata, infertilidade, hipogonadismo, asma, apneia do sono e deficiência de vitamina D, entre outros. Ademais, obesidade materna tem sido associada a um risco aumentado de anomalias congênitas e diabetes gestacional. Em geral, quanto maior o IMC, maior o risco dessas comorbidades. Excesso de peso está também associado a risco aumentado de morte. Em estudo americano, entre indivíduos que nunca fumaram, o risco de morte mostrou-se 20 a 30% maior naqueles com sobrepeso e 2 a 3 vezes maior nos obesos, em comparação a pacientes com peso normal. Epidemiologia [VILAR] Em 2005, a OMS estimou que havia 1,6 bilhão de pessoas adultas acima do peso em todo o mundo e, pelo menos, 400 milhões com obesidade. [UptoDate] Em 2015, aproximadamente 604 milhões de adultos tinham obesidade ao redor do mundo. Desde 1980 a prevalência de obesidade dobrou em mais de 70 países e também continua a aumentar na maioria dos outros países. Taxas de aumento foram similares entre homens e mulheres, em todas as faixas etárias, e foram mais altas em adultos jovens. Adicionalmente, em 2015, em todos os níveis socioeconômicos e para todas as faixas etárias, a prevalência de obesidade foi maior em mulheres que em homens. A maior taxa de aumento da prevalência entre 1980 e 2015 foi em homens entre 25 e 29 anos de países com renda baixa para média (de 11,1 para 38,3%). [ABESO.ORG] Em 2025, a estimativa é de que 2,3 bilhões de adultos ao redor do mundo estejam acima do peso, sendo 700 milhões de indivíduos com obesidade. No Brasil, essa doença crônica aumentou 72% nos últimos treze anos, saindo de 11,8% em 2006 para 20,3%em 2019. A frequência de obesidade é semelhante em homens e mulheres. Nestas, a obesidade diminui com o aumento da escolaridade. Já em relação à obesidade infantil, o Ministério da Saúde e a Organização Panamericana da Saúde apontam que 12,9% das crianças brasileiras entre 5 e 9 anos de idade têm obesidade, assim como 7% dos adolescentes na faixa etária de 12 a 17 anos. https://abeso.org.br/obesidade-e-sindrome- metabolica/mapa-da-obesidade/ Fisiologia da Fome e Saciedade [VILAR] O sistema nervoso central, mais precisamente o hipotálamo, é o grande responsável pelo controle da homeostase energética, sob a influência de sinais periféricos metabólicos e endócrinos. Isso resulta em respostas que modulam não somente comportamento alimentar, mas também o gasto energético. Os sinalizadores periféricos informam o hipotálamo não somente sobre a quantidade de energia já armazenada no organismo, como também sobre a necessidade de maior ou menor ingestão de alimentos. Esses sinalizadores se originam, sobretudo, do trato gastrintestinal, do pâncreas e dos adipócitos. • Produzida pelas células do epitélio gástrico, a grelina é chamada de “hormônio da fome”. Ela atua no hipotálamo estimulando a via orexígena. Seus níveis séricos se elevam com o jejum e caem após a ingestão alimentar, sobretudo de carboidratos e proteínas. • Os sinalizadores da saciedade são hormônios gastrenteropancreáticos secretados durante a alimentação e agem provocando um término mais precoce da refeição. O mais conhecido é a colecistocinina (CCK), um octopeptídeo secretado sobretudo no duodeno, em resposta à https://abeso.org.br/obesidade-e-sindrome-metabolica/mapa-da-obesidade/ https://abeso.org.br/obesidade-e-sindrome-metabolica/mapa-da-obesidade/ presença de nutrientes. Outros polipeptídeos envolvidos são o peptídeo YY (PPY; secretado no íleo e no cólon), o peptídeo semelhante ao glucagon-1 (GLP-1; células L no íleo), o peptídeo liberador da gastrina (GRP; estômago) e hormônios pancreáticos, como amilina, glucagon, peptídeo pancreático (PP) e insulina. • Existem também os sinalizadores de adiposidade, com ação anorexigênica, representados pela insulina e pela leptina (produzida pelos adipócitos). Esses peptídeos são secretados de acordo com a quantidade de gordura corporal e levam essa informação para os centros hipotalâmicos, gerando decréscimo na ingestão de alimentos. Em roedores e humanos, a deficiência congênita de leptina causa hiperfagia e obesidade. No entanto, na maioria dos obesos, os níveis séricos de leptina estão elevados, sugerindo tolerância ou resistência a este hormônio. Em condições fisiológicas, o núcleo arqueado do hipotálamo (ARC), localizado na eminência mediana, detecta sinais de nutrientes e hormônios a partir da periferia. Ele é o sítio primário de duas populações de neurônios que formam parte do sistema central da melanocortina, um regulador-chave do balanço energético. • Via orexígena: A primeira população, localizada lateralmente, expressa dois polipeptídeos com ação estimuladora do apetite: o neuropeptídeo Y (NPY) e a proteína relacionada ao Agouti (AgRP), um antagonista do receptor da melanocortina. Lesões do hipotálamo lateral (LHA) determinam hipofagia e perda de peso. • Via anorexígena: A segunda população, localizada medialmente, contém a pró- opiomelanocortina (POMC) e o transcrito regulado por cocaína e anfetamina (CART), componentes da via anorexigênica. Expresso em diversas áreas do SNC, o CART atua antagonizando os efeitos do NPY, sendo, assim, um potente anorexígeno. Lesões do hipotálamo ventromedial (VMH) geram grande aumento na ingestão alimentar e causam obesidade. O hormônio estimulador dos melanócitos-alfa (alfa- MSH) é um dos produtos de clivagem da POMC e age como agonista do MC3-R e do MC4-R, os dois principais receptores de melanocortina relacionados com o controle da ingestão alimentar. A ação do alfa- MSH, antagonizada pela AgRP, consiste na inibição da alimentação e no aumento do gasto energético. A privação de alimentos aumenta a expressão dos genes da AgRP e do NPY, além de reduzir a expressão dos genes da POMC e do CART. Portanto, o equilíbrio dos peptídeos hipotalâmicos orexigênicos e anorexigênicos é crucial para um adequado controle da ingestão de alimentos. Etiologia [HARRISON] Embora as vias moleculares que regulam o equilíbrio de energia estejam começando a ser conhecidas, as causas da obesidade continuam indefinidas. Em parte, isso reflete o fato de que a obesidade é um grupo heterogêneo de distúrbios. De um lado, a fisiopatologia da obesidade parece simples: um excesso crônico de aporte de nutrientes com relação ao nível de dispêndio energético. No entanto, devido à complexidade dos sistemas neuroendócrinos e metabólicos que regulam a ingestão, o armazenamento e o dispêndio de energia, é difícil quantificar todos os parâmetros relevantes (p. ex., consumo de alimentos e dispêndio de energia) ao longo do tempo em pacientes humanos. Papel dos genes versus ambiente A obesidade costuma ocorrer em famílias, e a hereditariedade do peso corporal é semelhante à da estatura. No entanto, a herança não costuma ser mendeliana, sendo difícil distinguir o papel dos genes e dos fatores ambientais. Pessoas adotadas assemelham-se mais a seus pais biológicos que aos adotivos quanto à obesidade, o que é um forte indicador da influência genética. De modo semelhante, gêmeos idênticos têm IMCs bastante semelhantes, independentemente de serem criados juntos ou separados, e seus IMCs correlacionam-se muito mais estreitamente que os de gêmeos dizigotos. Esses efeitos genéticos parecem estar associados à ingestão e ao dispêndio de energia. Atualmente, as variantes genéticas identificadas, tanto as comuns como as raras, são responsáveis por menos de 5% da variância do peso corporal. No entanto, seja qual for o papel dos genes, é evidente que o ambiente tem importância fundamental na obesidade. Fatores culturais também são importantes, estando ligados tanto à disponibilidade e à composição da dieta quanto a alterações do nível de atividade física. Em sociedades industrializadas, a obesidade é mais comum em mulheres pobres, enquanto nos países subdesenvolvidos as mulheres mais ricas são mais obesas. Em crianças, a obesidade tem alguma correlação com o tempo que passam em frente à televisão. Embora o papel da composição da dieta na obesidade continue gerando controvérsia, parece que as dietas ricas em gorduras podem promover a obesidade quando combinadas com dietas ricas em carboidratos simples, rapidamente absorvidos. Tanto correlações epidemiológicas como dados experimentais sugerem que a privação de sono acarreta o aumento da obesidade. As alterações no microbioma intestinal com capacidade de modificar o equilíbrio energético estão recebendo suporte experimental de estudos em animais, e um possível papel para as infecções virais obesogênicas continua a receber atenção esporádica. Síndromes genéticas específicas Sabe-se há muitos anos que, em roedores, a obesidade é causada por uma série de mutações distintas distribuídas por todo o genoma. A maioria de tais defeitos gênicos isolados causa hiperfagia e diminuição do dispêndio de energia, o que sugere uma ligação fisiológica entre esses dois parâmetros na homeostase energética. • Lep (ob): O camundongo ob/ob desenvolve obesidade grave, resistência à insulina e hiperfagia, além de um metabolismo deficiente. O produto do gene ob é o peptídeo leptina, que é secretada pelas células adiposas e atua sobretudo no hipotálamo. O nível de sua produção serve como índice das reservas adiposas de energia. Níveis altos de leptina diminuem o consumo de alimento e aumentam o gasto de energia. O gene ob está presente em seres humanos, onde também é expresso na gordura. • LepR (db): Outro camundongo mutante, o db/db, resistente à leptina, apresenta mutação no receptordesse hormônio e uma síndrome semelhante. As mutações dos genes da leptina ou de seu receptor não desempenham um papel importante nas formas comuns de obesidade. Mutações de vários outros genes podem causar obesidade grave em seres humanos; porém, tais síndromes são raras. • POMC: gene que codifica a pró- opiomelanocortina, mutações causam obesidade grave porque não ocorre a síntese de α-MSH, um neuropeptídeo fundamental que inibe o apetite no hipotálamo. A ausência de POMC também causa insuficiência suprarrenal secundária devido à falta do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), bem como palidez cutânea e cabelos avermelhados pela falta de α- MSH. • MC4R: O α-MSH liga-se ao receptor da melanocortina tipo 4 (MC4R), um receptor hipotalâmico importante que inibe a alimentação. As mutações heterozigotas de perda da função nesse receptor respondem por até 5% dos casos graves de obesidade. • PC-1: Acredita-se que as mutações da proenzima convertase 1 causem obesidade ao impedirem a síntese de α-MSH a partir do POMC. A perda de função de MRAP2, uma proteína necessária para a sinalização normal de MC4R, foi encontrada em casos raros de obesidade grave. Mais de 40 loci replicados ligados à obesidade foram identificados, mas juntos são responsáveis por menos de 3% da variação interindividual no IMC. • O mais replicado deles é um gene chamado FTO, que tem função desconhecida, mas assim como muitos dos outros candidatos recentemente descritos, é expresso no cérebro. Além desses genes humanos de obesidade, estudos em roedores revelaram vários outros candidatos moleculares a mediadores hipotalâmicos da obesidade ou da magreza em seres humanos. • O gene tub codifica um peptídeo hipotalâmico de função desconhecida; mutações nesse gene causam obesidade de início tardio. • O gene fat codifica a carboxipeptidase E, uma enzima processadora de peptídeos; acredita-se que mutações nesse gene também causem obesidade ao perturbarem a produção de um ou mais neuropeptídeos. • A AgRP é coexpressa com o NPY em neurônios do núcleo arqueado e antagoniza o α-MSH nos receptores de MC4. Sua expressão excessiva induz a obesidade. Várias síndromes humanas, complexas e de herança definida, estão associadas à obesidade. Na síndrome de Prader-Willi, um distúrbio multigênico do neurodesenvolvimento, a obesidade coexiste com baixa estatura, deficiência intelectual, hipogonadismo hipogonadotrófico, hipotonia, mãos e pés pequenos, boca em forma de peixe e hiperfagia. A maioria dos pacientes apresenta expressão reduzida de genes imprinted paternalmente herdados codificados na região cromossômica 15q11-13. A expressão reduzida de Snord116, um RNA nucleolar pequeno altamente expresso no hipotálamo, pode ser uma causa importante de função hipotalâmica defectiva nesse distúrbio. A síndrome de Bardet-Biedl (SBB) é um distúrbio geneticamente heterogêneo que se caracteriza por obesidade, deficiência intelectual, retinite pigmentar, diabetes, malformações renais e cardíacas, polidactilia e hipogonadismo hipogonadotrófico. Foram identificados pelo menos 12 loci genéticos, e a maioria das proteínas codificadas forma dois complexos multiproteína que estão envolvidos na função ciliar e no transporte intracelular com base em microtúbulos. Evidências recentes sugerem que as mutações podem perturbar o tráfego do receptor de leptina nos principais neurônios hipotalâmicos, causando resistência à leptina. Outras síndromes específicas associadas à obesidade SÍNDROME DE CUSHING Embora os obesos comumente tenham obesidade central, hipertensão e intolerância à glicose, eles não têm outros estigmas específicos da síndrome de Cushing. Apesar disso, é comum que se pense em doença de Cushing. A produção de cortisol e de metabólitos urinários (17OH-esteroides) pode estar aumentada na obesidade simples. Contudo, diferentemente da síndrome de Cushing, os níveis basais de cortisol no sangue e na urina, bem como após a injeção do hormônio liberador de corticotrofina (CRH) ou ACTH, são normais. A obesidade pode estar associada à reativação local excessiva do cortisol na gordura pela 11β-hidroxiesteroide-desidrogenase 1, enzima que converte a cortisona inativa em cortisol. HIPOTIREOIDISMO A possibilidade de hipotireoidismo deve ser considerada, mas ela é uma causa incomum de obesidade; a medição do hormônio estimulante da tireoide (TSH) possibilita descartar hipertireoidismo facilmente. Grande parte do ganho de peso que ocorre nessa deficiência hormonal se deve ao mixedema. INSULINOMA Os pacientes com insulinoma costumam ganhar peso porque comem excessivamente para evitar os sintomas da hipoglicemia. O substrato aumentado mais níveis altos de insulina promovem armazenamento de energia na gordura. Isso pode ser acentuado em alguns indivíduos, mas é modesto na maioria. CRANIOFARINGIOMA E OUTROS DISTÚRBIOS QUE ENVOLVEM O HIPOTÁLAMO Seja em decorrência de tumores, traumatismo ou inflamação, a disfunção hipotalâmica dos sistemas que controlam a saciedade, a fome e o dispêndio de energia pode resultar em graus variados de obesidade. É incomum encontrar uma base anatômica distinta para essas alterações. Provavelmente, disfunções sutis do hipotálamo são as causas mais comuns de obesidade que se pode demonstrar com as técnicas neurorradiológicas disponíveis hoje. O hormônio do crescimento (GH), que tem atividade lipolítica, mostra- se diminuído na obesidade e aumentado com a perda de peso. Apesar dos níveis baixos de GH, a produção do fator do crescimento semelhante à insulina tipo I (IGF-I) é normal, sugerindo que a supressão do GH seja resposta que compense o aumento da oferta nutricional. Quadro Clínico Resistência à insulina e DM2 A hiperinsulinemia e a resistência à insulina são comuns na obesidade, pioram com o ganho de peso e diminuem com sua perda. A resistência à insulina está mais relacionada com a gordura intraabdominal do que com a gordura em outras localizações. São alguns fatores importantes: (1) a própria insulina, ao induzir a subregulação do receptor; (2) os ácidos graxos livres, que ficam elevados e podem dificultar a ação da insulina; (3) o acúmulo intracelular de lipídeos e (4) os vários peptídeos circulantes produzidos pelos adipócitos, como as citocinas TNF-α e IL-6, RBP4, bem como as adipocinas adiponectina e resistina, que apresentam expressão alterada nos adipócitos dos obesos e podem modificar a ação da insulina. Outros mecanismos são inflamação ligada à obesidade, como infiltração de macrófagos nos tecidos como gordura, e indução de resposta ao estresse de retículo endoplasmático, que pode produzir resistência à ação da insulina nas células. Apesar da prevalência da resistência à insulina, a maioria dos obesos não manifesta diabetes, o que sugere que o diabetes exige interação entre a resistência à insulina induzida pela obesidade e outros fatores, como o comprometimento da secreção de insulina. No entanto, a obesidade é um importante fator de risco para o diabetes, e até 80% dos pacientes com diabetes melito tipo 2 são obesos. A perda de peso e o exercício, ainda que modestos, aumentam a sensibilidade à insulina e muitas vezes melhoram o controle da glicose no diabetes. Distúrbios reprodutivos As doenças do eixo reprodutor estão associadas à obesidade em ambos os sexos. O hipogonadismo masculino está associado a um aumento do tecido adiposo, que muitas vezes se distribui em uma conformação mais típica de mulheres. Homens cujo peso é mais de 160% do peso corporal ideal (PCI) muitas vezes têm redução da testosterona plasmática e da globulina de ligação ao hormônio sexual (SHBG) e aumento de níveis de estrogênio (derivados da conversão de androgênios suprarrenais no tecido adiposo). Pode-se observar ginecomastia. No entanto, na maioria desses indivíduos, a masculinização, a libido, a potência e a espermatogênese são normais. A testosterona livre pode diminuir em homenscom obesidade mórbida cujo peso excede 200% do PCI. Em mulheres, a obesidade está muito associada a anormalidades menstruais, principalmente em mulheres com obesidade na parte superior do corpo. Achados comuns são aumento na produção de androgênios, diminuição da SHBG e aumento da conversão periférica de androgênios em estrogênios. A maioria das mulheres obesas com oligomenorreia tem síndrome do ovário policístico (SOP), com sua anovulação associada e hiperandrogenismo ovariano; 40% das mulheres com SOP são obesas. A maioria das mulheres não obesas com SOP também é resistente à insulina, sugerindo que a resistência à insulina, a hiperinsulinemia ou a combinação das duas é causadora ou contribui para a fisiopatologia ovariana na SOP tanto em indivíduos obesos como magros. Cada vez mais evidências fornecem suporte ao papel das adipocinas na mediação de uma ligação entre a obesidade e a disfunção reprodutiva da SOP. Em mulheres obesas com SOP, a perda de peso ou o tratamento com fármacos sensibilizantes à insulina muitas vezes normalizam a menstruação. O aumento da conversão da androstenediona em estrogênio, mais comum em mulheres com obesidade na parte inferior do corpo, pode aumentar a incidência de câncer do útero em mulheres obesas na pós-menopausa. Doença cardiovascular O estudo Framingham revelou que a obesidade foi um fator de risco independente para a incidência durante 26 anos de doenças vasculares em homens e mulheres (como doença arterial coronariana, acidente vascular encefálico e insuficiência cardíaca congestiva). A razão cintura/quadril pode ser o melhor fator preditivo desses riscos. O impacto da obesidade fica ainda mais evidente quando se consideram os efeitos adicionais da hipertensão e da intolerância à glicose associados ao excesso de peso. O efeito da obesidade na mortalidade cardiovascular em mulheres pode ser verificado com IMC de apenas 25. A obesidade, sobretudo a abdominal, está associada a um perfil lipídico aterogênico com aumento no colesterol-LDL, na VLDL e nos triglicerídeos, além de diminuição no colesterol- HDL e nos níveis da adipocina vascular protetora adiponectina. A obesidade também está associada à hipertensão. A hipertensão induzida pela obesidade também pode causar elevação da resistência vascular periférica e do débito cardíaco, aumento no tônus do sistema nervoso simpático, exacerbação da sensibilidade ao sal e retenção de sal mediada pela insulina; com frequência, a hipertensão melhora após uma pequena perda ponderal. Doença pulmonar A obesidade pode ser associada a inúmeras anormalidades pulmonares, as quais incluem diminuição da complacência da parede torácica, aumento no trabalho respiratório, aumento do volume- minuto devido à maior atividade metabólica e diminuição da capacidade pulmonar total, da capacidade residual funcional e do volume expiratório de reserva. A obesidade grave pode estar associada à apneia obstrutiva do sono e à “síndrome de hipoventilação da obesidade”, com respostas ventilatórias hipóxicas e hipercapneicas atenuadas. A apneia do sono pode ser obstrutiva (mais comum), central ou mista, e está associada com hipertensão. A perda de peso (10-20 kg) pode trazer melhora substancial, assim como a perda substancial de peso que ocorre após bypass gástrico ou cirurgias restritivas. Doenças hepatobiliares A obesidade com frequência é associada a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA), e esta associação representa uma das causas mais comuns de doença hepática nos países industrializados. A infiltração gordurosa do fígado na DHGNA pode evoluir em um subgrupo para esteato-hepatite não alcoólica (EHNA) inflamatória e, mais raramente, para cirrose e carcinoma hepatocelular. A esteatose em geral melhora após perda de peso, secundária a dieta ou cirurgia bariátrica. A obesidade pode aumentar a secreção biliar de colesterol e a supersaturação da bile e elevar a incidência de cálculos, sobretudo de colesterol. Uma pessoa 50% acima do PCI tem uma incidência seis vezes maior de cálculos biliares sintomáticos. Câncer A obesidade está associada a um aumento do risco de vários tipos de câncer e, além disso, pode levar a desfechos de tratamento mais precários e aumento da mortalidade por câncer. A obesidade masculina está associada a maior mortalidade por câncer de esôfago, cólon, reto, pâncreas, fígado e próstata; a obesidade feminina está associada a maior mortalidade por câncer da vesícula biliar, dos ductos biliares, das mamas, do endométrio, do colo uterino e dos ovários. O aumento da taxa de conversão da androstenediona em estrona, que ocorre no tecido adiposo de obesos, pode causar alguns desses tumores. Outras possíveis ligações mecanicistas podem envolver hormônios, fatores de crescimento e citocinas cujos níveis estão ligados ao estado nutricional, como insulina, leptina, adiponectina e IGF-I, bem como ativação das vias de sinalização ligadas tanto à obesidade quanto ao câncer. Estimou-se recentemente que, nos EUA, a obesidade seja responsável por 14% dos cânceres em homens e 20% em mulheres. Doenças dos ossos, articulações e pele A obesidade pode aumentar o risco de osteoartrite. Não há dúvida de que isso se deve em parte ao traumatismo devido ao peso extra, mas também está potencialmente ligado à ativação de vias inflamatórias que poderiam promover patologia sinovial. A prevalência de gota também pode ser maior. Uma das afecções de pele associadas à obesidade é a acantose nigricans, que se manifesta por escurecimento e espessamento das dobras da pele no pescoço, nos cotovelos e nos espaços interfalangianos dorsais. A acantose reflete a gravidade da resistência à insulina subjacente e diminui com a perda de peso. A friabilidade da pele também pode aumentar, sobretudo nas dobras, o que aumenta o risco de infecções por leveduras e fungos. Finalmente, a estase venosa é mais comum no obeso. Diagnóstico Os médicos deverão proceder ao rastreamento para obesidade de todos os pacientes adultos, bem como oferecer aconselhamento intensivo e intervenções comportamentais para promover uma perda de peso sustentada. As cinco etapas principais na avaliação da obesidade são: (1) Uma anamnese voltada para a obesidade (2) Um exame físico para determinar o grau e o tipo de obesidade (3) Avaliação de condições de comorbidade (4) Determinação do nível de aptidão (5) Avaliação da disposição do paciente em alterar seu estilo de vida. Anamnese voltada para a obesidade As informações obtidas com a anamnese devem se basear nas sete perguntas seguintes: • Que fatores contribuem para a obesidade do paciente? • De que forma a obesidade está afetando a saúde do paciente? • Qual o nível de risco da obesidade para o paciente? • Qual a dificuldade encontrada pelo paciente em controlar o peso? • Quais as metas e as expectativas do paciente? • O paciente está motivado para começar um programa de controle de peso? • De que tipo de ajuda o paciente precisa? Embora a grande maioria dos casos de obesidade possa ser atribuída a fatores comportamentais que afetam a dieta e os padrões de atividade física, a anamnese pode sugerir causas secundárias que requeiram maior avaliação. Os distúrbios a considerar são síndrome do ovário policístico, hipotireoidismo, síndrome de Cushing e doença hipotalâmica. O ganho de peso induzido por fármacos também deve ser considerado. São causas comuns os medicamentos para diabetes (insulina, sulfonilureias, tiazolidinedionas), os hormônios esteroides, os agentes psicotrópicos, os estabilizadores do humor (lítio), os antidepressivos (tricíclicos, inibidores da monoaminoxidase, paroxetina, mirtazapina) e os antiepilépticos (valproato, gabapentina, carbamazepina). Outras medicações, como os anti- inflamatórios não esteroides e os bloqueadores dos canais de cálcio, podem causar edema periférico, mas não aumentam a gordura corporal. A alimentação e os padrões deatividade física atuais do paciente podem revelar fatores que contribuem para o desenvolvimento de obesidade e podem identificar comportamentos com vistas ao tratamento. Índice de massa corporal (IMC) e circunferência da cintura Há três medidas antropométricas importantes para se avaliar o grau de obesidade: o peso, a estatura e a circunferência da cintura. O IMC, calculado como peso (kg)/altura (m)² é usado para classificar a condição do peso e o risco de doença. O IMC fornece uma estimativa da gordura corporal e está relacionado com o risco de doença. O excesso de gordura abdominal, avaliado pela medida da circunferência da cintura ou pela proporção entre a cintura e os quadris, é associado de forma independente a um maior risco de diabetes melito e doença cardiovascular. A medição da circunferência da cintura é um indicador do tecido adiposo visceral e deverá ser feita no plano horizontal, acima da crista ilíaca. Vários estudos prospectivos demonstraram que a aptidão física, relatada em questionário ou medida em um teste de esforço máximo em esteira, é um previsor importante da taxa de mortalidade por qualquer causa, independentemente do IMC e da composição corporal. Tais observações esclarecem a importância de se obter uma história de exercício e atividade física durante o exame, bem como de enfatizar a atividade física como uma abordagem terapêutica. A avaliação das comorbidades deve basear-se na manifestação de sintomas, nos fatores de risco e no índice de suspeita. Para todos os pacientes, deverá ser realizado um painel de jejum de lipídeos (níveis totais, lipoproteínas de baixa densidade, lipoproteínas dealta densidade, colesterol e triglicerídeos) e a determinação do nível de glicose sanguínea no jejum e da pressão sanguínea. Os sintomas e as doenças direta e indiretamente relacionados com a obesidade constam no quadro: Tratamento O tratamento da obesidade requer uma abordagem multidisciplinar que obrigatoriamente requer mudanças do estilo de vida, as quais implicam reeducação alimentar e aumento da atividade física. Para muitos pacientes, a terapia medicamentosa também se faz necessária, já que facilita e/ou aumenta a adesão à dieta, propiciando uma perda ponderal maior e mais duradoura. A cirurgia bariátrica está potencialmente indicada para os casos não responsivos ao tratamento clínico com IMC ≥ 40 kg/m² ou IMC ≥ 35 kg/m² associado a comorbidades. Seja como for, está bem estabelecido que mesmo uma perda de 5 a 10% do peso corporal, independentemente de como for atingida, está associada a melhora do perfil de risco cardiovascular e a menor incidência de DM2. Tratamento Medicamentoso O tratamento farmacológico da obesidade, baseado em evidências clínicas consistentes, oriundas, principalmente, de grandes estudos multicêntricos, já está bem fundamentado. As recentes diretrizes da Endocrine Society recomendam a farmacoterapia para indivíduos com IMC > 30 kg/m² ou IMC ≥ 27 kg/m² na presença de, pelo menos, uma condição mórbida relacionada à obesidade, como DM2, dislipidemia, hipertensão arterial sistêmica (HAS) ou apneia do obstrutiva do sono. Considerando-se a fisiopatologia da obesidade, seu tratamento medicamentoso deve visar: estimular as vias anorexígenas de sinalização, antagonizar as vias de sinalização orexígenas, aumentar o gasto energético e/ou inibir a absorção de nutrientes. Durante muito tempo, o tratamento medicamentoso em nosso meio teve com o esteio maior o uso dos anorexígenos catecolaminérgicos (dietilpropiona, femproporex e mazindol), os quais, em 2011, foram retirados do mercado pela Anvisa, pela ausência de dados de segurança cardiovascular e, sobretudo, pelo potencial surgimento de dependência, por serem derivados anfetamínicos. Sibutramina Características farmacológicas. A sibutramina é um inibidor de recaptação de serotonina e norepinefrina. Diferentemente dos anorexígenos catecolaminérgicos, trata-se mais de um agente sacietógeno, visto que seu efeito principal sobre a regulação da ingestão de alimentos parece estar relacionado muito mais com o aumento da saciação e com o prolongamento da sensação de saciedade do que com um efeito direto de supressão da fome. Dose. A dose atualmente recomendada para a sibutramina (Sibus®; Biomag® etc.; comp. 10 e 15 mg) é de 10 a 20 mg/dia. Eficácia. Em estudos clínicos controlados com placebo, o uso da sibutramina propiciou, na dose de 10 a 20 mg/dia, uma perda de peso significativamente superior à do placebo, variando de –2,9% a –9,4%. Nos estudos com duração entre 16 e 52 semanas, a perda ponderal média variou entre 3,4 e 6,0 kg. Observou-se também melhora significativa dos perfis glicídico e lipídico. Em estudos clínicos controlados, o uso da sibutramina em obesos com compulsão alimentar propiciou resultados positivos para desfechos pré-especificados, como peso corporal, frequência de episódios de compulsão alimentar e melhora de sintomas psiquiátricos. Efeitos colaterais. A sibutramina é em geral bem tolerada. Em vários estudos, os efeitos adversos (EA) mais comuns foram cefaleia, secura de boca, constipação intestinal e insônia (em 10 a 30% dos pacientes). EA menos frequentes foram aumento do apetite, tonturas, taquicardia, sudorese, náuseas, dor abdominal e hipermenorreia. Em geral, mostraram-se moderados, associaram-se com doses mais altas e, raramente, obrigaram a retirada dos pacientes dos grupos de estudo. Devido a seu efeito adrenérgico, a sibutramina pode determinar elevação da pressão arterial e da frequência cardíaca, geralmente discreta. Contraindicações. O uso da sibutramina está contraindicado em gestantes e indivíduos com sabida hipersensibilidade ao medicamento. Segundo as recomendações da Anvisa, deve também ser evitado em pacientes com hipertensão inadequadamente controlada (PA > 140/95 mmHg), histórico de doença cardiovascular ou cerebrovascular, bem como em diabéticos tipo 2 com pelo menos um fator de risco adicional (i. e., hipertensão controlada por medicação, dislipidemia, prática atual de tabagismo ou nefropatia diabética), pessoas com idade > 65 anos, crianças e adolescentes. Orlistate O orlistate é um potente inibidor de lipases do trato gastrintestinal (TGI). Como consequência, cerca de 30% dos triglicerídeos provenientes da dieta permanecem não digeridos e não são absorvidos pelo intestino delgado, atravessando o TGI e sendo eliminados nas fezes. O orlistate não apresenta atividade sistêmica, e sua absorção intestinal é desprezível em doses de até 800 mg/dia. O orlistate não atua sobre os circuitos neuronais reguladores do apetite; contudo, ele promove uma liberação mais precoce do GLP-1, que tem efeito incretínico e sacietógeno. Posologia. A dose recomendada para o orlistate (Xenical®, cáp. 120 mg) é de 120 mg antes de cada refeição. No entanto, mesmo na posologia de 60 mg 3 vezes/dia, a medicação mostrou-se mais eficaz que o placebo. Eficácia sobre peso. A média de perda ponderal, subtraindo o placebo, é da ordem de 2,8 a 3,2 kg, associada a uma significativa melhora nos níveis de pressão arterial, perfil lipídico e controle metabólico do DM2. O orlistate está também aprovado pelo FDA para o tratamento da obesidade em adolescentes (a partir dos 12 anos de idade). Efeitos metabólicos. Foi demonstrado que o uso de orlistate propicia melhora de vários parâmetros metabólicos, e o efeito sobre o perfil lipídico é superior ao esperado para a perda ponderal. Em pacientes com DM2, o impacto sobre o controle glicêmico induzido pelo orlistate também supera o esperado para a perda ponderal alcançada. O mecanismo postulado para esse efeito envolve melhora na sensibilidade à insulina, absorção lenta e incompleta dos lipídios da dieta, redução nos níveis plasmáticos de ácidos graxos pós- prandiais, diminuição no tecido adiposo visceral e estímulo à secreção de GLP-1. O maior estudo clínico controlado com o orlistate foi o XENDOS.Após 4 anos de tratamento, a incidência cumulativa de DM2 foi de 9,0% com o placebo e 6,2% com o orlistate, o que corresponde a uma redução do risco de 37,3% (p = 0,0032). A perda de peso correspondente foi de 5,2% e 2,8% (p < 0,001), respectivamente. Evidenciou-se também melhora em diversos outros fatores de risco cardiovascular, como PA, perfil lipídico e circunferência de cintura. Tolerabilidade. Uma série de efeitos colaterais gastrintestinais pode limitar o uso do orlistate, como dor abdominal, fezes oleosas, incontinência fecal e flatos com descarga oleosa. Quanto maior a ingestão de gorduras na alimentação, mais frequentes são esses sintomas. Orlistate também está associado a diminuição na absorção intestinal de vitaminas lipossolúveis, fármacos antiepilépticos, varfarina, ciclosporina e L- tiroxina. Contraindicações. O uso do orlistate é contraindicado em gestantes e durante a amamentação, bem como em pacientes com colestase ou síndrome de má absorção crônica. Combinação de orlistate e sibutramina. A associação de orlistate com sibutramina foi avaliada em alguns estudos. Contudo, de um modo geral, sua eficácia não foi superior à monoterapia com a sibutramina. Psicotrópicos Fluoxetina e sertralina são inibidores de recaptação de serotonina e podem favorecer a redução do peso, mas não são considerados agentes antiobesidade. Indica-se seu uso apenas quando à obesidade estão associados transtorno depressivo ou transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP). Em estudos utilizando a fluoxetina (20 a 40 mg/dia) por um período de 6 meses, observou-se perda ponderal modesta com reganho a partir do sexto mês, o que torna essa medicação inadequada para o uso a longo prazo. Em um estudo multicêntrico com 52 semanas de duração, no grupo da fluoxetina (n = 230), a redução do peso foi similar à do grupo placebo. A bupropiona (Bup® etc., comp. 150 mg), aprovada para tratamento de transtornos do humor e tabagismo, é um inibidor duplo da recaptação de monoaminas (dopamina e norepinefrina) e tem sido avaliada em estudos para obesidade, tanto em monoterapia quanto em associação. Os resultados são variáveis, com perda ponderal entre 5 e 10% do peso inicial. Em estudo duplo-cego, os percentuais de pacientes que perderam pelo menos 5% do peso inicial foram 46%, 59% e 83% (p vs. placebo < 0,0001) para placebo, bupropiona SR 300 e 400 mg/dia, respectivamente; os percentuais correspondentes para perdas de peso ≥ 10% foram 20%, 33% e 46% (p vs. placebo = 0,0008), respectivamente. Resultados mais expressivos são obtidos pela combinação com naltrexona. O topiramato (Amato® etc., comp. 25, 50 e 100 mg) é aprovado para tratamento da epilepsia e profilaxia da enxaqueca. Seu mecanismo de ação relaciona-se com a modulação dos receptores do GABA, com reflexos no comportamento alimentar. Apesar de eficaz para perda ponderal, as doses habitualmente necessárias para o tratamento da obesidade estão associadas a efeitos colaterais diversos, o que levou à interrupção do seu programa de desenvolvimento como agente antiobesidade. No entanto, ele foi aprovado pelo FDA em associação à fentermina, usando-se doses menores. Lorcaserina Aprovada pelo FDA em junho de 2012, a lorcaserina é um agonista seletivo do receptor serotoninérgico 5- HT2c. O receptor 5-HT2c, presente no hipotálamo, modula a ingestão alimentar pela ativação do sistema neuronal relacionado com a POMC, levando à hipofagia. Essa maior especificidade pelo 5-HT2c seria importante para reduzir o risco de valvulopatia cardíaca, provavelmente associada ao estímulo do receptor 5- HT2b e detectada com outros agentes serotoninérgicos antiobesidade mais antigos e menos seletivos (fenfluramina e dexfenfluramina), o que motivou sua retirada do mercado em 1997. Posologia. A dose recomendada para a lorcaserina (Belviq® – comp. 10 mg) é de 10 mg 2 vezes/dia. Eficácia. Estudos de fase 3 com a lorcaserina demonstraram eficácia mantida após 2 anos de tratamento e boa tolerabilidade. A perda de peso subtraída do placebo variou de –3,1 a –3,6%. Tolerabilidade. Lorcaserina é muito bem tolerada. Nos estudos anteriormente mencionados, os eventos adversos mais relatados, em ordem decrescente de frequência, foram: cefaleia (cerca de 20%), infecções do trato respiratório superior (nasofaringite e sinusite) (cerca de 15%) e náuseas (cerca de 7%). As taxas de abandono do tratamento e de surgimento de nova valvulopatia cardíaca foram semelhantes às do grupo placebo. Liraglutida A liraglutida (Victoza®) é um análogo do GLP-1 que foi desenvolvido para o tratamento do DM2 na dose de até 1,8 mg/dia. Além de eficazmente melhorar o controle glicêmico, ela induz perda de peso. Melhores resultados na perda ponderal foram, contudo, obtidos com a dose de 3,0 mg/dia em estudos de fase 3,67,68 o que motivou sua aprovação pelo FDA, pela European Medicines Agency (EMA) e pela Anvisa para tratamento da obesidade, com o nome comercial de Saxenda®. Os mecanismos mediadores na redução de peso pela liraglutida são provavelmente relacionados com uma combinação de efeitos no trato gastrintestinal (TGI) e no cérebro (aumento da saciedade e diminuição do apetite). O papel das náuseas, principal reação adversa da liraglutida, na perda de peso é mais evidente com a dose de 3,0 mg/dia. Um recente estudo com camundongos sugere que a liraglutida tem como sítio de ação receptores do GLP-1 localizados no núcleo arqueado, onde promoveria: (1) estímulo direto dos neurônios do CART/POMC, aumentando a saciedade; e (2) efeito inibitório indireto, via sinalização dependente do GABA, sobre os neurônios de NPY/AgRP, resultando em redução no apetite. Dose. Liraglutida deve ser iniciada na dose de 0,6 mg/dia por injeção subcutânea, 1 vez/dia. A dose diária pode ser aumentada em 0,6 mg por semana até um máximo de 3,0 mg/dia, de acordo com a tolerabilidade do paciente. Eficácia. Em um estudo duplo-cego, conduzido durante 56 semanas e que envolveu indivíduos com IMC ≥ 27 kg/m2 sem DM2, 2.487 pacientes receberam liraglutida (3,0 mg/dia, por via subcutânea [SC]) e 1.244, placebo; ambos os grupos foram aconselhados sobre mudanças no estilo de vida. Ao final do estudo, os pacientes no grupo da liraglutida haviam, em média, perdido 8,4 ± 7,3 kg, contra 2,8 ± 6,5 kg no grupo placebo (uma diferença de –5,6 kg; p < 0,001). Também se observou com a liraglutida maior proporção de indivíduos que perderam pelo menos 5% (63,2% vs. 27,1%; p < 0,001) ou 10% do peso corporal (33,1% vs. 10,6%; p < 0,001). Resultados similares foram observados quando liraglutida 3,0 mg foi testada em pacientes com DM2 em estudo multicêntrico duplo-cego. O FDA recomenda que a liraglutida 3,0 mg seja descontinuada após 16 semanas, caso o paciente não tenha perdido pelo menos 4% do peso corporal inicial. Tolerabilidade. As reações adversas mais comuns relatadas por, pelo menos, 5% dos pacientes recebendo liraglutida 3,0 mg, respectivamente, foram náuseas, hipoglicemia em casos de DM2, diarreia, constipação intestinal, vômitos, cefaleia, dispepsia, fadiga, tonturas, dor abdominal e elevação da lipase. Na maioria das vezes, esses efeitos colaterais foram transitórios, e em 94% dos casos tiveram intensidade leve a moderada. Abandono do tratamento por efeitos gastrintestinais foi mais comum no grupo da liraglutida (6,4% vs. 0,7%), ocorrendo em relação a colelitíase, colecistite e taquicardia. No programa de desenvolvimento clínico para a liraglutida 3,0 mg, pancreatite aguda confirmada mostrou-se mais frequente nos indivíduos tratados com liraglutida 3,0 mg do que no grupo placebo (0,4% vs. < 0,1%; p < 0,01). No entanto, esses achados não foram ratificados pelos estudos SCALE. Contraindicações. O uso da liraglutida 3,0 mg está contraindicado diante de história pessoal ou familiar de carcinoma medular de tireoide, em pacientes com neoplasia endócrina múltipla tipo 2, bem como durante a gestação. Emborauma relação de causa/efeito não tenha sido confirmada, recomenda-se evitar análogos do GLP-1 em pacientes com história ou suspeita de pancreatite. Fentermina com topiramato A fentermina, molécula de ação central associada à liberação de norepinefrina com propriedades simpaticomiméticas, é aprovada nos EUA para tratamento da obesidade em monoterapia (37,5 mg/dia) durante curto período de tempo (< 12 semanas). A ação central do topiramato está associada ao bloqueio dos canais de sódio e cálcio, à potencialização da ação do GABA e à inibição da anidrase carbônica. Seu mecanismo associado à perda ponderal não é, contudo, totalmente conhecido, sendo descritos em modelos animais diminuição da fome, aumento na termogênese periférica e oxidação de reservas lipídicas. Dose. Quando se usa a combinação fentermina/topiramato ER, é necessário o escalonamento da dose. Os estudos clínicos apoiam iniciar com a dosagem de 3,75 mg/23 mg, 1 vez/dia, e mantê-la por, pelo menos, 2 semanas. Havendo boa tolerabilidade, um aumento para 7,5 mg/46 mg está indicado. Posterior acréscimo deve ser considerado somente se não tiver havido perda de, ao menos, 3% no peso corporal após 12 semanas. Neste caso, a dose pode ser aumentada para 11,25 mg/69 mg e, depois, se necessário, para 15 mg/92 mg. A redução da dose deve também ser gradual, em 3 a 5 dias, devido à observação de convulsão quando o topiramato foi suspenso abruptamente em pacientes com epilepsia. Eficácia. Seguindo dois estudos menores, o estudo CONQUER74 avaliou 2.487 pacientes com IMC entre 27 e 45 kg/m2 associado a duas ou mais comorbidades. Os pacientes foram randomizados para três grupos: combinação de fentermina com topiramato de liberação lenta 15 mg/92 mg, 7,5 mg/46 mg ou placebo, todos associados a medidas de mudança de estilo de vida. Os resultados de perda ponderal foram 10,4, 8,4 e 1,8% para cada grupo respectivamente, após um período de 56 semanas. O estudo SEQUEL, uma extensão em duplo-cego do estudo CONQUER, foi desenvolvido para avaliar a eficácia e a segurança a longo prazo da associação fixa de fentermina com topiramato por um período adicional de 52 semanas, totalizando uma duração de tratamento de 108 semanas. O uso de fentermina com topiramato foi associado a uma perda ponderal importante e persistente, significativamente superior ao placebo (p < 0,0001). A perda de peso percentual foi da ordem de 1,8, 9,3 e 10,5% para placebo, 7,5/46 mg e 15/92 mg, respectivamente. O grupo em tratamento ativo apresentou melhora em variáveis cardiovasculares e metabólicas e diminuição nos novos casos de diabetes em comparação com o placebo. Tolerabilidade. Nos estudos, os principais efeitos colaterais observados foram: xerostomia, alteração do paladar, infecção do trato respiratório superior, insônia, parestesias e constipação intestinal. Contraindicação. Como o topiramato é teratogênico, ele não pode ser usado durante a gestação. Outras contraindicações da combinação fentermina/topiramato são amamentação, glaucoma e hipertireoidismo. Naltrexona com bupropiona A combinação de naltrexona, um antagonista do receptor opioide, e a bupropiona, um inibidor da recaptação de norepinefrina, foi aprovada nos EUA (Contrave®) e na Europa (Mysimba®), em formulação de liberação sustentada (SR), para perda de peso em indivíduos com sobrepeso ou obesidade. Mecanismo de ação. Supõe-se que o efeito anorético dessa associação resulte da ativação dos neurônios da POMC no núcleo arqueado. A bupropiona estimularia a POMC hipotalâmica, enquanto a naltrexona bloquearia a autoinibição da POMC por meio de β-endorfinas endógenas. Dose. O esquema recomendado é a tomada, 2 vezes/dia, de 2 comprimidos de naltrexona/bupropiona 8 mg/90 mg. Eficácia. O COR-I randomizou 1.742 pacientes para naltrexona SR ou placebo, com 4 semanas de titulação da medicação e 56 semanas de duração na dose estabelecida. A perda de peso subtraída da do placebo (PPSP) foi de 3,7 e 4,8% para a combinação com 16 e 32 mg/dia de naltrexona, respectivamente. O COR-II testou a associação usando 32 mg/dia em 1.001 pacientes, contra 495 que receberam placebo. Os resultados foram semelhantes aos do COR-I, com PPSP de 5,2%. A proporção de pacientes com ≥ 5% de redução do peso inicial em relação ao placebo foi também semelhante no COR-I (48 vs. 16%) e no COR- II (56 vs. 17%). Tolerabilidade. Os efeitos colaterais mais comuns com naltrexona/bupropiona nos estudos clínicos foram náuseas, constipação intestinal, cefaleia, vômitos e tonturas. Náuseas, cefaleia e vômitos foram as principais causas de interrupção do tratamento. Cirurgia Bariátrica Os parâmetros utilizados classicamente para essa indicação foram definidos em 1991 pelo National Institute of Health (NIH). Apesar de antigas, estas diretrizes são seguidas principalmente por agências regulatórias e planos de saúde. Como o IMC não é capaz de avaliar a composição corporal de cada paciente, as exceções devem ser tratadas com cautela, considerando-se o histórico pessoal e familiar de comorbidades. Em 2011, a International Diabetes Federation (IDF) passou a propor a cirurgia bariátrica como forma de tratamento para pacientes com IMC entre 30 e 34,9 kg/m2 (obesidade grau I) desde que tenham diabetes melito tipo 2 (DM2) e haja insucesso na terapia medicamentosa. Em janeiro de 2016, o Conselho Federal de Medicina (CFM) lançou a resolução 2.131/2015, que inclui 21 comorbidades que, se associadas a pacientes com o IMC ≥ 35 kg/m2, tornam os mesmos elegíveis à cirurgia bariátrica. A Agência Nacional de Saúde (ANS), por meio da resolução 262, que passou a vigorar em 2012, incluiu a cirurgia bariátrica por via laparoscópica no rol de cobertura mínima obrigatória dos planos privados de assistência à saúde. Além da avaliação do IMC e das comorbidades, só devem ser considerados para essa cirurgia os pacientes maiores de 18 anos e com tratamento clínico insatisfatório por, pelo menos, 2 anos. No caso de adolescentes entre 16 e 18 anos, será necessária concordância dos responsáveis legais e avaliação por pediatra, com evidência de consolidação das cartilagens das epífises de crescimento dos punhos. Deverão ser avaliados com cautela pela equipe: pacientes usuários de drogas ilícitas; alcoolistas; com quadros psicóticos ou demenciais moderados a graves. Os idosos podem ser candidatos à cirurgia, desde que haja uma avaliação criteriosa, considerando risco/benefício, risco cirúrgico, comorbidades, expectativa de vida e benefícios do emagrecimento. Algumas medidas devem ser tomadas pelo endocrinologista no pré-operatório, como: • Otimização de controle glicêmico, com meta de HbA1c < 7% • Tratamento de dislipidemias, de acordo com a necessidade • Tratamento de hipotireoidismo com L-tiroxina • Rastreamento de causas raras de obesidade, quando necessário • Em pacientes com histórico de gota, o tratamento profilático para as crises pode ser iniciado • Orientação para perda de peso pré-operatória, de cerca de 10% do peso total, diminuindo a chance de complicações. Técnicas atuais A cirurgia bariátrica constitui uma mudança anatômica do trato gastrintestinal, diminuindo o aporte calórico ao organismo por meio de restrição mecânica e desvio de segmentos variáveis do intestino delgado. As técnicas podem ser classificadas em: restritivas (restrição mecânica), disabsortivas (desvio do intestino delgado, com diminuição da absorção dos alimentos) e mistas. A cirurgia pode ser executada por laparotomia ou videolaparoscopia, a qual corresponde a 95,7% dos procedimentos atuais. Banda gástrica ajustável A banda gástrica ajustável (BGA) consiste no implante de um dispositivo que envolve o estômago proximal e forma um reservatório gástrico de 20 a 30 mℓ, com uma via de saída ajustada por um portal de insuflação, que é situado no subcutâneo abdominal. Esta técnica causa sensação de plenitude gástrica, levando a uma perdade peso de 30% em média nos primeiros anos. Contudo, existe elevada recidiva da obesidade e complicações a longo prazo, o que tem causado seu desuso nos últimos anos, sendo reduzida a apenas 10% dos procedimentos em 2013. Gastrectomia vertical (sleeve gastrectomy) Atualmente, a gastrectomia vertical (GV) é a cirurgia bariátrica mais realizada nos EUA, e seu uso vem aumentando bastante nos outros países. Consiste na confecção de um tubo vertical por meio da retirada da grande curvatura e do fundo gástrico, de modo que o estômago remanescente passa a ter volume entre 150 e 200 mℓ. Originalmente constituía a primeira etapa da cirurgia de duodenal switch em pacientes de alto risco; porém, em função dos bons resultados e da relativa facilidade técnica, a GV vem se consolidando como o tratamento primário da obesidade, respondendo por 37% de todos os procedimentos em 2013. Além da restrição mecânica, há evidências de que a GV diminua os níveis de grelina. A perda do excesso de peso após GV é um pouco menor quando comparada à derivação gástrica em Y de Roux (DGYR); no entanto, essa diferença não tem significância estatística. Já com relação à resolução das comorbidades, a DGYR se mostrou significativamente superior. Cirurgia de Scopinaro Representa uma gastrectomia parcial em dois terços do órgão e uma derivação biliopancreática a 50 cm da válvula ileocecal, o que gera um grande componente disabsortivo, eficaz na perda de peso. Devido ao maior risco de desnutrição proteica, as derivações biliopancreáticas vêm caindo em desuso e, atualmente, correspondem a menos de 1% dos procedimentos bariátricos no mundo. Duodenal switch Método com predominância disabsortiva, a duodenal switch atualmente está indicado para pacientes superobesos, podendo ser realizada em dois passos. A técnica é constituída por uma gastrectomia vertical acompanhada de uma derivação biliopancreática, realizando-se uma anastomose proximal com o duodeno. Tem efeitos metabólicos por elevar a secreção de GLP-1 e PYY, levando à remissão do DM2 em mais de 90% dos casos. Derivação gástrica em Y de Roux (bypass gástrico) A DGYR ainda é a técnica mais realizada no mundo, representando 45% do total de procedimentos. O componente restritivo constitui-se na confecção de uma bolsa gástrica, a partir da secção do estômago paralela à pequena curvatura em direção ao ângulo de His, com volume próximo a 30 mℓ. O componente disabsortivo é caracterizado pelo desvio intestinal, em que o duodeno e a porção do jejuno não participam mais do trânsito alimentar, assim como pela exclusão de quase todo o estômago. A DGYR possui ação metabólica tanto por seu componente restritivo quanto pelo desvio intestinal, que causa alterações nas incretinas. Esse efeito metabólico leva a remissão do diabetes em cerca de 70% dos casos, comparada a 60% na gastrectomia vertical a longo prazo. A fístula gástrica e a trombose venosa são as complicações precoces mais temidas pelo cirurgião, para as quais deve haver um alto grau de suspeição. Pode ocorrer deficiência de ferro pela menor absorção, já que o duodeno não participa mais do trânsito, especialmente em mulheres com fluxo menstrual abundante. Em cerca de 25% dos pacientes, podem ocorrer problemas de má absorção de vitaminas e minerais. Há registros também de neuropatia por deficiência de vitaminas do complexo B, em especial a B12. Cuidado Pós-operatório A dieta no pós-operatório precoce passa por uma transição lenta de alimento líquido para pastoso, até finalmente chegar à dieta sólida cerca de 1 mês após o procedimento, período que pode variar de acordo com o protocolo da equipe cirúrgica. A dieta deve ser rica em proteínas e pobre em carboidratos, a fim de evitar recidiva da obesidade e hipoproteinemia, sempre acompanhada por equipe multiprofissional. No pós- operatório precoce, é recomendada a ingestão mínima de 60 g/dia de proteína, chegando até 1,5 g/kg de peso ideal. Alimentos hipercalóricos ricos em sacarose podem desencadear a síndrome de dumping, caracterizada pela presença da diarreia osmótica, a qual é decorrente das alterações disabsortivas secundárias à DGYR e pode estar associada a náuseas, tontura, mal-estar e sudorese, de ocorrência pós-prandial. Geralmente surge nos primeiros 60 minutos após a alimentação. Os medicamentos de uso contínuo devem ser utilizados macerados ou em versões líquidas de absorção rápida, devendo ser evitadas as apresentações de liberação estendida, para maximizar a absorção. A realização de atividade física é útil para controlar o peso a longo prazo, melhorar o resultado estético e reduzir as taxas de sarcopenia. Entretanto, isso deve ser realizado progressivamente e com o acompanhamento de um profissional de educação física. É recomendado um mínimo de 150 minutos/semana, com objetivo de atingir 300 minutos/semana, incluindo treinos de força. A reposição de micronutrientes deve seguir as necessidades de cada caso. A recomendação mínima diária para DGYR e gastrectomia vertical inclui duas cápsulas de complexos multivitamínicos/multiminerais, 1.200 a 1.500 mg de cálcio elementar, 3.000 UI de vitamina D (buscando alcançar níveis de 25-OH- vitamina D > 30 ng/mℓ), vitamina B12 de acordo com as necessidades, e 45 a 60 mg de ferro total. É recomendável que os níveis de glicemia sejam determinados nos diabéticos após a alta hospitalar, auxiliando no manejo das doses de medicações antidiabéticas e buscando flagrar possíveis hipoglicemias. Balão intragástrico O balão intragástrico (BIG) é uma opção minimamente invasiva no tratamento da obesidade, de caráter não permanente. Consiste na colocação de prótese esférica de silicone no estômago, preenchida por 600 a 700 mℓ de solução salina, por meio de endoscopia digestiva alta (EDA), sob sedação ou anestesia geral. O balão permanece implantado por 6 meses, levando a restrição de ingesta alimentar e sensação de saciedade. De maneira geral, o uso do balão associado a terapias conservadoras a curto prazo (6 a 12 meses) apresenta resultados clínicos. Síndrome Metabólica A síndrome metabólica (SM) é comumente definida por uma constelação de interligados fatores fisiológicos, bioquímicos, clínicos e metabólicos que aumentam diretamente o risco de doença cardiovascular e diabetes melito tipo 2 (DM2). Adiposidade visceral, resistência à insulina (RI), liberação excessiva de ácidos graxos livres e citocinas inflamatórias pelos adipócitos viscerais, estresse oxidativo, dislipidemia aterogênica, hiperglicemia, disfunção endotelial, hipertensão e estado de hipercoagulabilidade são os vários fatores que constituem a síndrome. A presença de SM confere um aumento de 5 vezes no risco para DM2 e de 2 vezes no risco de desenvolver doenças cardiovasculares ao longo dos próximos 5 a 10 anos. Além disso, em comparação aos indivíduos sem a síndrome, os pacientes com SM apresentam risco aumentado em 2 a 3 vezes para acidente vascular cerebral (AVC), 3 a 4 vezes para infarto agudo do miocárdio (IAM) e de 2 vezes o risco para morrerem em consequência de um desses distúrbios, independentemente de história prévia de eventos cardiovasculares. Critérios Diagnósticos Diversas definições já foram propostas para a SM, cada qual com suas particularidades. Existem, atualmente, duas classificações que têm sido mais amplamente utilizadas: do National Cholesterol Education Program’s Adult Treatment Panel III (NCEP-ATP III ou ATP III) e da International Diabetes Federation (IDF). Embora essas classificações adotem aspectos comuns da síndrome, elas têm especificidades a serem contempladas. A classificação proposta pelo ATP III em 2001 durante muito tempo foi a mais empregada na prática clínica diária. A classificação proposta pela IDF foi publicada em 2005 e tornou-se rapidamente uma das definições mais utilizadas no mundo. Ela se baseia no conceito de que a presença de gordura
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