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Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 1 1. Cultura em batelada Todo cultivo de microrganismo em um frasco sem variação de volume é conhecido como cultura em batelada. Quando um meio liquido é inoculado com microrganismos este geralmente cresce obedecendo um padrão geral descrito na Figura 2.1, conhecido como curva de crescimento. Essa curva é dividida em fases que possuem características próprias: i. Fase lag: as células estão se adaptando as condições do meio de cultura seja através da ativação de vias metabólicas, indução genica e outras atividades que auxiliam a transformação do substrato orgânico em energia e biomassa microbiana. ii. Fase exponencial: nessa fase as células estão adaptadas ao meio de cultura e estão se dividindo no máximo de sua capacidade e todas dividem-se em sincronicidade, isto é que define essa fase. iii. Fase estacionaria: nessa fase a divisão celular não mais acontece com sincronicidade mas existe reposições de células, ou seja, o número de células que aparecem iguala-se ao número de células que morrem. A fase exponencial é descrita pela equação derivada: dx/dt = .x (ou seja, a relação entre a variação de x sobre t é de “.x “) x – biomassa microbiana t – tempo de cultura – é a constante que define a “velocidade” do acumulo de biomassa. Em outras palavras: v – que pode ser associada a “velocidade” de crescimento, nesse caso é a taxa de produção de biomassa (TxP). OBS: A derivada é o coeficiente angular da reta tangente a curva. A derivada pode ser usada, também, para determinar a taxa de variação. Em outras palavras, a derivada de uma função representa o quão rápido, ou o quão devagar esta função cresce, decresce A integral dessa equação derivada é: Xt = X0 e t Xt – é biomassa esperada depois de um intervalo fixo X0 – é a biomassa no tempo 0 e – é a base natural logarítmica (LN) OBS: A integral de uma função determina a área sob uma curva no plano cartesiano, e é usada, por exemplo na determinação da posição em todos os instantes de um objeto. Portanto, a função integral descreve toda a fase exponencial da curva da Figura 2.1. Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 2 Como relacionar uma função derivada com uma integral: Caso você se encontre dentro de um carro em movimento, a função derivada dessa velocidade corresponde a aceleração (o quanto a velocidade aumenta ou diminui durante o tempo de viagem). A função integral da velocidade, por sua vez, mostra a distância que o carro percorreu durante um certo tempo (o valor dessa distância é calculado como a área abaixo da curva, ou do gráfico da velocidade no tempo). Taxa de Produtividade: Baseado na explicação acima se conclui que dx/dt = .x corresponde ao coeficiente angular (ou inclinação da reta) que passa pelos pontos x2-x1 dividido por t2-t1 (Figura ao lado). Portanto, o valor encontrado para “.x” de uma curva de crescimento microbiano onde “x=biomassa” e “t=hora”, esse valor corresponde a taxa de produção de biomassa por hora. Isto é, se o “x” for mg/L, o “.x” será um valor cuja unidade é mg/L/h (dx/dt). x2 x1 t2t1 Coeficiente angular Coeficiente de crescimento “”: Para calcular o valor de ““ é necessário tirar o efeito da biomassa “x” (mg/L) dessa relação “.x”. Para resolver a equação (dx/dt)/x)) basta usar um recurso matemático que é transformar os valores de biomassa em LN (logaritmo Neperiano), veja figura ao lado. Observe que quando os valores de “x” (biomassa, mg/L) são transformados por LN (valor sem unidade), gera um numero cuja unidade é apenas o tempo (h-1). Esse valor corresponde ao coeficiente de crescimento especifico do microrganismo. Observe que a curva exponencial assume a forma de uma reta quando os valores de biomassa são transformados por LN. LN x2 LN x1 t2t1 Coeficiente angular d(LNx)/dt = O valor do logaritmo normal (LN) da variação da biomassa microbiana for plotado em um gráfico contra o tempo, a fase exponencial vai aparecer como uma reta. O ângulo ou inclinação dessa reta é chamado de coeficiente de crescimento (), e este é especifico para cada situação de cultivo. Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 3 2. Facilitando os cálculos (REGRESSAO LINEAR) LN x2 LN x1 t2t1 Coeficiente angular d(LNx)/dt = Taxa de crescimento “”: O coeficiente de crescimento corresponde ao coeficiente angular ou inclinação da reta formada na fase exponencial de LN do crescimento microbiano contra o tempo. Portanto, se for feita uma regressão linear na porção correspondente a fase exponencial do LN de biomassa contra o tempo a equação da reta “y = ax ± b” vai mostrar que a constante “a” corresponde ao ângulo de inclinação dessa reta. Portanto, o valor de “a” irá corresponder a Taxa de Crescimento (“”). Taxa de Produção: Por outro lado, se uma reta for ajustada nos valores de biomassa (mg/L) contra o tempo, a constante “a” da reta irá corresponder a Taxa de Produção de biomassa, cuja unidade, nesse caso, é mg/L/h. O fato do coeficiente de crescimento microbiano ser especifico para cada situação de cultivo é muito importante. Isso explica o motivo pelo qual uma bactéria cresce melhor em um meio do que em outro, veja a Tabela 1 e Tabela 2.1. Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 4 O coeficiente de crescimento mede a “velocidade” de crescimento, por isso é importante calcula-lo. Mesmo os microrganismos miceliais (fungos filamentosos) crescem exponencialmente e geram um coeficiente ou “unidade de crescimento” especifico para a espécie e condição de cultivo. O crescimento de biofilme também pode seguir um padrão exponencial até que o tamanho do biofilme comece a limitar a difusão de fonte de carbono. Nesse caso o coeficiente de crescimento é então afetado. Indiferente ao fato se o organismo ser unicelular ou micelial a equação que modela o crescimento microbiano é usada para prever o crescimento. O crescimento, no entanto, não ocorre indefinidamente e diminui com o desaparecimento do substrato do meio de cultura em batelada. Portanto, depois de um tempo de cultura o coeficiente de crescimento diminui ate ser nulo. Visto dessa forma a parada do crescimento está associada a ausência de um nutriente ou fonte de carbono. 3. O coeficiente de crescimento varia com as condições de cultivo A natureza da limitação do crescimento pode ser entendida analisando o coeficiente de crescimento do microrganismo em um intervalo crescente de substrato. Ao plotar a biomassa total obtida em cada concentração inicial de substrato mostrado na Figura 2.2 observa-se que a partir de uma determinada concentração de substrato não ocorre mais aumento de biomassa final. Essa situação é modelada matematicamente da seguinte forma: X= Y(SR – S) X – concentração de biomassa final Y – fator de produção (g de biomassa produzida por g de substrato consumido) SR – concentração inicial do substrato S – concentração residual de substrato no meio Essa equação pode ser usada para prever a quantidade de biomassa de microrganismo pode ser produzida com uma certa quantidade de substrato. Portanto, essa equação é importante para modelar a produção em escala industrial. O fator de produção “Y” é uma medida da eficiência da conversão do substrato em biomassa. Esse cálculo é importantepara identificar os microrganismos e processos mais produtivos. No entanto, deve-se salientar que o fator Y não é constante, mas, dependente de vários fatores como a variação do coeficiente de crescimento () e Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 5 outros como o pH, temperatura, etc. Por isso, o coeficiente Y deve ser calculado para cada situação especifica de produção. O coeficiente de crescimento ou taxa de crescimento microbiano pode variar de acordo com a concentração de substrato. Em concentrações muito pequenas o coeficiente de crescimento é pequeno, em concentrações altas essa taxa de crescimento é máxima. A Figura 2.3 ilustra esse fenômeno. É importante notar que entre a concentração baixa e a alta existe uma variação desse coeficiente de crescimento, representada na Figura pela fase C. A Figura 2.3 mostra, portanto, que existe uma concentração de substrato em um meio de cultura onde o coeficiente de crescimento é máximo e, a partir dessa concentração, não existe aumento na taxa de crescimento. Adicionar substrato ao meio não vai aumentar a velocidade de reprodução do microrganismo. Esse fenômeno é descrito matematicamente pelo modelo de Monod: = max S/(Ks + S) s – concentração de substrato residual no meio Ks – o valor da concentração de substrato onde o coeficiente de crescimento é a metade do coeficiente máximo de crescimento. m – coeficiente de crescimento especifico para cada concentração de substrato mmax – coeficiente de crescimento máximo A constante de Monod (Ks) é a concentração do nutriente limitante para a qual a taxa de crescimento é metade da taxa de crescimento máxima (Figura 2.3). Representa a afinidade do organismo para o substrato. Os valores Ks dependem do organismo do substrato. Valores típicos de Ks são mostrados na Tabela 2.2, que ilustram valores comumente baixos. Caso um organismo tenha uma alta afinidade pelo substrato, ou seja, o seu Ks ocorre em concentrações de substrato bem baixas, o coeficiente de crescimento não se altera muito com o desaparecimento do substrato do meio. No entanto, se o microrganismo possui um Ks em concentrações mais altas de substrato, o coeficiente de crescimento diminui significativamente com o desaparecimento do substrato. Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 6 A cultura em batelada é utilizada para produzir biomassa microbiana e metabolitos primários e secundários. Os produtos primários são biomoléculas produzidas durante o crescimento dos microrganismos e os secundários são biomoléculas que ocorrem de forma induzida, seja por um estado fisiológico ou fase de crescimento. Alguns pesquisadores preferem o termo produção de biomoléculas ligadas ao crescimento microbiano e produção de biomoléculas não ligadas ao crescimento microbiano para definir metabolitos primários e secundários, respectivamente. 4. Testando os fundamentos de cinética de crescimento em batelada Foi discutido até aqui que o coeficiente de crescimento ou taxa de crescimento de um microrganismo pode estar diretamente ligado a disponibilidade de substrato. Vamos fazer um experimento onde a mesma quantidade de inoculo seja introduzida no mesmo volume de meio, mas, cada frasco ao abaixo vai ter uma concentração diferente de substrato. Curva de crescimento com diferentes concentrações iniciais de substrato (S). Cada uma dessa batelada S1, S2,... gera um especifico. A Figura A abaixo mostra o monitoramento do número de células microbianas ao longo do tempo de cultivo nas diferentes concentrações de substrato S1 a S5. Note que na Figura A é possível identificar as fases lag, exponencial e estacionaria do crescimento microbiano. A Figura B abaixo mostra o mesmo valor de dados agora transformado em logaritmo Neperiano (LN). Observe que o formato da curva muda e passa a lembrar uma reta. A inclinação ou ângulo de cada uma dessas retas de LN de biomassa contra o tempo corresponde ao coeficiente de crescimento ou taxa de crescimento microbiano especifico para cada concentração usada de S1 a S5. Portanto, cada concentração de substrato pode ser associada a um coeficiente de crescimento especifico. Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 7 A B A Figura C abaixo ilustra como fica um gráfico que relacione os diferentes valores de coeficiente de crescimento especifico calculado a partir dos dados da Figura B contra as concentrações de substrato que as originaram (S1 a S5). Observe que a taxa de crescimento aumenta gradativamente até alcançar um máximo. A Figura D didaticamente mostra em que concentração de substrato acontece o coeficiente de crescimento máximo (max) e em que concentração de substrato a taxa de crescimento é igual a máxima dividida por 2 (Ks). C es p ec if ic o Concentracao de substrato D Dessa analise conclui-se que: - existe uma concentração de substrato a partir da qual nenhum aumento resulta em aumento do coeficiente de crescimento. - existe uma concentração de substrato abaixo da qual a taxa de crescimento é menor que a metade do valor máximo, portanto, nessas concentrações de substrato o crescimento do microrganismo fica muito debilitado. - para achar a concentração ideal de substrato é preciso investigar o intervalo de concentração que produz o Ks e o max. Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 8 5. Como calcular em que concentração de substrato acontece o Ks e o max? A equação de Monod é um modelo matemático prático e útil para calcular em que concentração de substrato acontece o Ks e o max. Basta colocar essa equação em um programa de computador para obter essa resposta. No entanto, Lineweaver e Burk descobriram que não precisa de computador para fazer esse cálculo. Em uma transformação “matemagica” esses cientistas inverteram o modelo de Monod (isso é, dividiram o numero 1 pela equação) e descobriram que essa equação inversa se assemelha muito a formula de uma reta (y=ax±b), veja ao lado, onde: Y = 1/especificos X = 1/s b = 1/max Portanto, quando se coloca em um gráfico os valores do inverso do coeficiente de crescimento especifico (1/especificos) contra o valor correspondente do inverso da concentração de substrato (1/S), a reta que se forma vai ajudar a calcular o max e o Ks. Isto é, onde essa reta toca no eixo Y (ou seja, y=±b porque x é zero) o valor corresponderá ao inverso do coeficiente de crescimento Maximo (1/max). Onde essa reta tocar no eixo x (ou seja, ax±b=0, porque y é zero) o valor corresponderá ao inverso da concentração de substrato onde o crescimento começa a “acelerar”, a concentração de substrato a partir da qual o microrganismo vai crescer cada vez mais rápido (1/Ks). Cinética do crescimento microbiano ICS-C33 Prof: Fabio A. Chinalia Tecnologia de Processos Fermentativos ICS-C33 © UFBA Page 9 6. Crescimento Diauxico A curva de crescimento gerada quando um microrganismo cresce sob a influência de duas fontes de carbono é chamado de comportamento “diauxico”. A E coli e a Aerobacter aerogenes mostra tais padrões quando são inoculadas em meio de cultura contendo glicose e lactose ou glicose e citrato, respectivamente. Esse fenômeno acontece por causa da preferência metabólica para a utilização de glicose primeiro antes da lactose ou citrato. Portanto, a curva de crescimentoprimeiro reflete o coeficiente de crescimento da bactéria com a glicose e, depois de um breve interalo (patamar), a bactéria retoma o crescimento com um coeficiente diferente e correspondente ao uso da lactose ou do citrato, respectivamente. Existem vários fenômenos fisiológicos que geram o comportamento diauxico. Primeiro a via glicólica pode agir como agente inibidor de outras vias metabólicas. Segundo, para iniciar uma nova via metabólica a célula precisa de um curto espaço de tempo para expressar as enzimas dessa segunda via. Portanto, a Figura 2.9 exemplifica esse efeito. 7. Consumo de substrato O mesmo princípio usado para calcular a Taxa de Produção e a Taxa de crescimento, ou seja, a regressão linear, pode também ser utilizada para calcular a taxa de consumo de substrato. Veja que na figura ao lado uma regressão linear foi utilizada para calcular a Taxa de Produção que possui inclinação ascendente (reta que modela os valores de O.D). Caso uma regressão linear seja ajustada na fase de decaimento logarítmico da concentração de substrato (no caso a glicose), a constante “a” da formula da reta irá corresponder diretamente a Taxa de consumo de substrato.
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