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Fundamentos da Educação de Jovens e Adultos Educação de Jovens e Adultos Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Gerente Editorial ALESSANDRA VANESSA FERREIRA DOS SANTOS Projeto Gráfico TIAGO DA ROCHA Autoria MÁRCIA JUSTINO DA SILVA AUTORIA Márcia Justino da Silva Sou Licenciada em Pedagogia, Pós-Graduada em Psicopedagogia Diferencial: Diferenças na Aprendizagem, Especialista em Psicanálise Aplicada à Educação e em Metodologia do Ensino na Educação a Distância e Mestre em Psicanálise Aplicada à Educação e Saúde (Curso Livre). Fui coordenadora do curso de Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional – FAJOLCA. Atualmente, atuo como professora de Graduação e Pós-Graduação em diversos cursos na área de educação e coordenadora pedagógica da Consultoria Didática Escolar – Reforço Escolar, professora conteudista e executora da EaD da UNINASSAU (curso de Licenciatura em Pedagogia), do Instituto Federal de Educação (curso de Licenciatura em Matemática) e da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco (curso Técnico em Secretaria Escolar). Tenho muito orgulho de minha profissão, pois acredito que só a educação é o caminho para o desenvolvimento pessoal, social e nacional. Estou muito honrada e feliz por ter a oportunidade de ajudá-lo na construção do conhecimento, tornando-o uma aprendizagem significativa. Estamos juntos nessa jornada! ICONOGRÁFICOS Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: OBJETIVO: para o início do desenvolvimento de uma nova competência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de apresentar um novo conceito; NOTA: quando necessárias observações ou complementações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser priorizadas para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofundamento do seu conhecimento; REFLITA: se houver a necessidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou discutido; ACESSE: se for preciso acessar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso fazer um resumo acumulativo das últimas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma atividade de autoaprendizagem for aplicada; TESTANDO: quando uma competência for concluída e questões forem explicadas; SUMÁRIO Pensamento Político-Pedagógico ao Longo da História ............ 12 Dos Jesuítas à Revolução Industrial ................................................................................. 12 Período Jesuítico (1549-1759) .............................................................................. 12 Período Pombalino (1760 - 1808) .................................................................... 14 Período Joanino (1808 – 1821) ............................................................................ 15 Período Imperial ............................................................................................................ 17 Período Republicano: Redemocratização e os dias Atuais ........... 19 EJA como Modalidade da Educação Básica ....................................29 Contexto da Escola ........................................................................................................................29 Importância do EJA ........................................................................................................................ 31 Inclusão Social e Diversidade Cultural .............................................. 37 Inclusão Social e a Diversidade Cultural ........................................................................37 Orientações Curriculares para a EJA e para a Alfabetização ...46 O EJA ....................................................................................................................................................... 46 O Processo de Alfabetização e Letramento: Ressignificando os Saberes Escolares .............................................................................................................................................. 48 Conceitos de Alfabetização e Letramento de Jovens e Adultos ................ 50 9 UNIDADE 01 Educação de Jovens e Adultos 10 INTRODUÇÃO Caro estudante, seja muito bem-vindo a esta disciplina! Chegou a hora de complementar seus estudos sobre a Educação Básica, adentrando em uma modalidade muito interessante, a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Você sabia que esta modalidade é relativamente nova? Pois é, em princípio, seu objetivo era apenas ensinar os adultos, que por algum motivo não foram alfabetizados na escola regular, a ler e a escrever. Contudo, no decorrer dos tempos, houveram mudanças significativas em suas propostas e objetivos, respaldadas pela legislação e pelas políticas públicas educacionais. Exatamente isso que veremos nesta unidade. Faremos uma viagem no tempo para que possamos compreender como ocorreu a construção do pensamento pedagógico da Educação de Jovens e Adultos- EJA- ao longo da história de nosso país, até os dias atuais. Vamos lá? Educação de Jovens e Adultos 11 OBJETIVOS Segundo Perrenoud (1999, p. 30) “Competência é a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, capacidades, informações etc.) para solucionar com pertinência e eficácia uma série de situações.” Seguindo este princípio estabelecemos algumas competências para esta Unidade. Nosso objetivo é auxiliá-lo no desenvolvimento desta etapa de estudos: 1. Compreender a trajetória histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil. 2. Discernir sobre a importância da Educação de Jovens e Adultos como uma das modalidades da Educação Básica a partir da sua evolução histórica. 3. Entender o papel da EJA no processo da inclusão social. 4. Compreender o processo de alfabetização dos jovens e adultos, enfatizando a importância de uma didática e uso de metodologias adequadas. Preparado para nossa viagem no tempo? Tenho certeza que será muito gratificante! Educação de Jovens e Adultos 12 Pensamento Político-Pedagógico ao Longo da História OBJETIVO: Ao término deste capítulo, você será capaz de entender como se iniciou a Educação de Jovens e Adultos no Brasil – EJA - em seus aspectos gerais e específicos, ao longo de nossa história, contextualizando as suas diferentes fases até hoje. Então vamos lá!. Dos Jesuítas à Revolução Industrial Você certamente se recorda do que estudou em História da Educação, certo? Mas, vamos refrescar um pouco a sua memória. Agora numa perspectiva da EJA. Período Jesuítico (1549-1759) Lembra-se que os jesuítas foram os primeiros educadores em terras brasileiras e que o seu principal objetivo era a catequese dos índios que aqui viviam? Pois bem, para que alcançassem seu objetivo era primordial que houvesse a alfabetização desse povo na língua portuguesa. Contudo, o Projeto Educacional Jesuítico não era apenas um projeto de catequização, mas sim algo bem mais amplo, pois havia o intuito de transformação social, implementando mudanças radicais na cultura indígena brasileira nesse período colonial. Apesar de existirem indícios de que os jesuítas e membros de outras ordens religiosas, também, catequizaram e instruíram escravos, não se encontram registros históricos sobre essas experiências. Nem outras que possam ter sido realizadas com mulheres adultas. Cabe ressaltar o que nos dizem Maciel e Neto (2008) quanto ao ensino jesuítico: Educação de Jovens e Adultos 13 O ensino jesuítico implementado no período colonial brasileiro era adequado para o momento histórico vivenciado, levando-se em consideração quatro aspectos: os objetivos do Projeto Português para o Brasil; o projeto educacional Jesuítico; a própria estrutura socialbrasileira da época; e o modelo de homem necessário para a época Colonial. (NETO; MACIEL, 2008, P.1) Figura 1 - Cenas de catequese Fonte: Wikimedia Commons Ao longo de 210 anos (1549-1759), os jesuítas implantaram um Plano Educacional elaborado pelo Padre Manoel da Nóbrega – Ratio Studiorum - que servia às várias classes da população. Contudo, de acordo com a classe social a que a pessoa pertencia, era designado um tipo de Educação. Educação de Jovens e Adultos 14 Figura 2 - Ratio studiorum Fonte: Wikimedia Commons SAIBA MAIS: Caso queira se aprofundar no assunto, (ou relembrar um pouco), assista ao vídeo sobre este período de nossa história, clicando aqui. Período Pombalino (1760 - 1808) Em 1759, os jesuítas foram expulsos do Brasil pelo Marquês de Pombal, que modificou todo o sistema educacional instaurado. Os jesuítas tinham 25 residências, 36 missões e 17 colégios e seminários, além de seminários menores e escolas de primeiras letras, que instaladas em todas as cidades onde havia casas da Companhia de Jesus, foram desativadas. A educação brasileira vivenciou, nesta fase, uma grande ruptura de um método educacional implantado e até então consolidado. Foi estabelecido um novo modelo e estrutura educacional que se diferenciava Educação de Jovens e Adultos https://youtu.be/AfArxoWl9rQ 15 do Ratio Studiorum, conhecido como Aulas Régias. O resultado da decisão de Pombal foi que, no princípio do século XIX, a educação brasileira estava reduzida a praticamente nada. O sistema jesuítico foi desmantelado e nada que pudesse chegar próximo dele foi organizado para dar continuidade a um trabalho de educação. Figura 3 - Aulas Régias Fonte: Wikimedia Commons De acordo com Stephanou (2005c, apud SACRAMENTO, 2008), a expulsão dos jesuítas aparentemente não teve experiências sistemáticas e significativas em relação à alfabetização de adultos. A ênfase pombalina estava no ensino secundário, organizado por meio do sistema de Aulas Régias. Período Joanino (1808 – 1821) A vinda da Família Real, em 1808, foi marcada por mais uma ruptura no sistema educacional. Embora D. João VI tenha criado diversas instituições de ensino, tais como Academias Militares, Escolas de Direito e Medicina e escolas noturnas, havia uma dificuldade de manter estas instituições em funcionamento. Educação de Jovens e Adultos 16 O surgimento da imprensa Régia na colônia contribuiu para divulgação de fatos e pensamentos para a população letrada. Entretanto a educação, mais uma vez, era relegada a segundo plano. Figura 4 - Chegada da família real no Brasil Fonte: Wikimedia Commons SAIBA MAIS: Caso queira se aprofundar no assunto sobre o Período Joanino e suas mudanças sociais, acesse aqui. D. João VI volta a Portugal em 1821. Em 1822, seu filho D. Pedro I proclama a Independência do Brasil e, em 1824, outorga a primeira Constituição Brasileira. O Art. 179 desta Lei Magna dizia que a “instrução primária é gratuita para todos os cidadãos.” Isto veremos a seguir, continuando nossa retrospectiva histórica. Vamos lá! Educação de Jovens e Adultos https://youtu.be/4Dtte78JGKs 17 Período Imperial A Constituição de 1824 estabeleceu o ensino primário e gratuito a todos, mas nem todos tinham acesso à educação. Em 1826, um Decreto institui quatro graus de instrução: Pedagogias (escolas primárias), Liceus, Ginásios e Academias. Só em 1827 é que foi promulgada a lei geral sobre a instituição do ensino primário. Tal lei determina que as escolas ensinem a ler, escrever e a utilizar as quatro operações, além de noções gerais de geometria, gramática, moral cristã e doutrina católica. Pela primeira vez, as meninas foram incluídas no sistema educacional, mas com um currículo diferenciado. Em 1831, cedendo às pressões da corte portuguesa e por atravessar uma grave instabilidade política, D. Pedro I abdica ao trono brasileiro e, como seu pai, deixa no Brasil seu filho - D. Pedro II - com apenas cinco anos de idade. Por não ter idade para assumir o trono, o governo de D. Pedro II é dividido em dois momentos: Período Regencial (1831 - 1840) e Segundo Reinado (1840 - 1889). Dom Pedro II apoiou as ciências, as letras e as artes e fez muito para o Brasil desenvolver-se no campo econômico, industrial e científico, mesmo enfrentando conflitos e guerras. Em 1834, o Ato Adicional à Constituição dispõe que as províncias passariam a ser responsáveis pela administração do Ensino Primário e Secundário. A intenção era de que pobres (brancos ou negros) tivessem acesso à escolaridade, adquirindo a cultura e a civilização europeia. A ideia era que somente a educação conseguiria desenvolver o país. Surgem, então, em 1835, as primeiras Escolas Normais para formação de professores. Embora possa ter havido a intenção de obter bons resultados, não foi o que aconteceu, tendo em vista uma barreira: as dimensões do país. Assim, a educação brasileira perdeu-se mais uma vez, obtendo resultados muito pouco expressivos. Em 1837, é criado no Rio de Janeiro, o Colégio Pedro II, com o objetivo de se tornar um modelo pedagógico para o curso secundário. Educação de Jovens e Adultos 18 Porém, o Colégio não conseguiu se organizar até o fim do Império para atingir tal objetivo. Figura 5 - Colégio Pedro II no Rio de Janeiro Fonte: Wikimedia Commons Quanto à educação para jovens e adultos, foi somente, em 1879, que Carlos Leôncio de Carvalho elaborou uma reforma educacional. Por meio do decreto 7.247, foram criados cursos noturnos para adultos, do sexo masculino, nas escolas públicas de instrução primária. Infelizmente, caro estudante, até a Proclamação da República, em 1889, praticamente pouco foi feito de concreto pela educação brasileira, apesar da consideração de D. Pedro II pela tarefa educativa, numa consolidação de um sistema educacional no país. REVISANDO: Caro estudante, acredito que seja interessante fazer uma revisão sobre o Império e as primeiras tentativas de organização da educação nacional. Então, acesse o material, clicando aqui. Educação de Jovens e Adultos http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/periodo_imperial_intro.html 19 Período Republicano: Redemocratização e os dias Atuais O primeiro período republicano foi marcado por uma grande mudança social, política, econômica e, consequentemente, educacional. A primeira Constituição da República, datada de 1891, reafirma a proibição ao voto do analfabeto nas eleições. O censo de 1890 já havia constatado a existência de 85% de analfabetos na população total. Nesta época, ainda não havia ações políticas voltadas para esta necessidade. As mobilizações da sociedade a favor da alfabetização dos adultos só aconteceram nas primeiras décadas do século XX. Surgiram, então, várias campanhas de alfabetização, como a Liga Brasileira contra o Analfabetismo (1915), no Rio de Janeiro. A Revolução Industrial, a partir de 1930, trouxe a necessidade de uma mão de obra qualificada e especializada. Nesse momento, houve um considerável aumento da migração para as capitais, de pessoas que viviam na zona rural, em busca de novas oportunidades de trabalho. Havia uma grande preocupação e mobilização para erradicar o analfabetismo no país, em um curto espaço de tempo. Algumas experiências foram realizadas, como o surgimento do ensino supletivo destinado aos adultos. Todavia, durante o Estado Novo, quase não há registros de iniciativas voltadas à alfabetização de adultos, pois o novo regime não estava interessado na instrução popular. Contrariando a ação oficial de oferecer soluções para a alfabetização de adultos, os analfabetos, moradores de área urbana, eram participantes de práticas de uso da leitura e da escrita. Educação de Jovens e Adultos 20 VOCÊ SABIA? Nos anos 1930 foram iniciadas, em Pernambuco, práticas de leitura oralizadas de folhetos de cordel em feiras. Em reuniões, poemas e contos eram lidos.Isso facilitava o contato do adulto com o mundo da escrita. Constata-se, ainda, que a participação dos homens era distinta à das mulheres. Elas, mesmo pertencentes às elites econômicas (principalmente, rurais) não podiam frequentar a escola, pois os homens consideravam perigoso o seu ingresso no mundo letrado. A partir do fim da Segunda Guerra Mundial e do Estado Novo, e com a volta da democracia no país, ocorreram novas medidas voltadas para a alfabetização de adultos. O ensino supletivo foi organizado a partir da Lei Orgânica do Ensino Primário, de 1946, mas é apenas, em 1947, que o governo brasileiro lança, pela primeira vez, uma campanha de âmbito nacional, visando alfabetizar a população, conhecida como Campanha de Educação de Adultos (CEA) ou Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), extinta apenas em 1963. Criou-se uma infraestrutura para atender à educação de jovens e adultos, com classes de alfabetização distribuídas em todos os municípios. A Campanha recrutava voluntários para erradicar o analfabetismo no país. Era evidenciada a redenção do analfabetismo, continuando a ênfase no assistencialismo nesta iniciativa governamental. Não havia uma preocupação com um material didático específico para os adultos. O material utilizado era o mesmo da educação das crianças. Verificamos, assim, que o adulto analfabeto continuava sendo considerado incapaz, comparado a uma criança. Caro estudante, chegamos aos anos 1950. Verifica-se, no início desta década, muitas críticas à CEAA, com origem no seu próprio núcleo. Assim, um importante movimento surgirá, em 1958, por meio de um grupo experimental em Pernambuco, liderado por Paulo Freire. Educação de Jovens e Adultos 21 No II Congresso Nacional de Educação de Adultos, Freire coloca que a organização dos cursos deveria ter como base a própria realidade dos alunos e o trabalho educativo deveria ser feito “com” o homem e não “para” o homem. Nessa nova perspectiva, o material didático não poderia ser uma mera adaptação das propostas infantis. Houve uma mudança na percepção do adulto não alfabetizado, não mais tomado como alguém ignorante e imaturo, mas visto como produtor de cultura e de saber. ACESSE: Conheça mais sobre o método Paulo Freire de Alfabetização, acessando aqui. Como podemos perceber no vídeo, a proposta de alfabetização era que a leitura do mundo viria antes da leitura da palavra. Considerava, ainda, que o analfabetismo não era o único e grave problema do país e sim as condições de miséria em que vivia o não alfabetizado. Outras campanhas foram criadas como a Campanha Nacional de Educação Rural (1950) e a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo (1958). Contudo, infelizmente, não obtendo o êxito esperado no que se refere ao projeto de tornar os jovens e adultos leitores e produtores de textos proficientes. No final da década de 1950 e início de 1960, verificamos movimentos de educação e de cultura popular, quase todos inspirados nos ideais de Paulo Freire. São eles: o Movimento da Educação de Base (MEB), que consistia em um convênio entre o Governo Federal e o Conselho Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); o Movimento de Cultura Popular da Prefeitura do Recife (MCP); os Centros Populares de Cultura (CPCs), organizados pela União Nacional dos Estudantes no Rio de Janeiro (UNE - 1961-1964); o CEPLAR, ou seja, a Campanha de Educação Popular; a Campanha de Pé no Chão também se Aprende a Ler, desenvolvida pela prefeitura de Natal (RN). Educação de Jovens e Adultos https://youtu.be/2DAOO8jPyCU 22 IMPORTANTE: Cabe ressaltar que, apesar desses movimentos emergirem de vários pontos do país, sua expressividade se deu no Nordeste, em decorrência da alta taxa de analfabetismo, como já citamos, e de sua organização. Esse pensamento tornou-se muito forte e a bandeira pelo desenvolvimentismo nacional e as reformas de base tomaram conta da sociedade civil organizada, com a finalidade de alterar esse quadro socioeconômico e político. Agora há um novo olhar especial para analfabetismo, que passa a ser visto não como causa da situação de pobreza, mas como consequência de uma sociedade injusta e desigual. Assim, o não alfabetizado conquista um novo patamar, pois agora é considerado produtor de conhecimento. Nesse sentido, a educação deveria ser dialógica e com a participação de todos. A influência de Paulo Freire abrangeu de forma significativa todos os espaços, possibilitando uma educação popular, entre 1960 e 1964. Junto com o MEC (Ministério da Educação e Cultura), o educador organizou o Plano Nacional de Alfabetização de Adultos que foi interrompido pelo golpe militar de 31 de março de 1964. Durante a ditadura militar, as experiências de educação de adultos com objetivo de conscientização sofreram interdição e, devido a repressão militar, foram extintas e Paulo Freire foi, posteriormente, exilado. O Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) foi criado em 1967, começando suas atividades em Recife, Paraíba e Sergipe, apenas em 1969. Tinha duas características básicas: contribuir com a aprendizagem do desenho do nome pelo educando e interditar todas as experiências voltadas para a transformação da realidade. Educação de Jovens e Adultos 23 Figura 6 - MOBRAL Fonte: Wikimedia Commons Era recrutado para o Mobral quem poderia ensinar, sem se preocupar com sua formação docente. Bastava a pessoa ter disponibilidade para ser treinada e interessada em ganhar uma baixa remuneração. Embora o material didático fosse semelhante ao usado na educação popular, o potencial crítico do conteúdo era bastante esvaziado, além de ser padronizado para todo o país. O Mobral foi marcado por denúncias de corrupção que culminaram na instalação de uma CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito – para apurar desvios de dinheiro e divulgação de falsos dados sobre o analfabetismo, extinto em 1985, juntamente com o Regime Militar. Os anos 1980 foram marcados pela abertura política, quando surgiram diversos projetos e experiências de alfabetização de iniciativa de associações de moradores, sindicatos e comunidades religiosas. Em 1985, o regime militar dá lugar para a Nova República. Em substituição ao Mobral nasce, durante o governo Sarney (1985- 1990), a Fundação Educar, com o propósito de organizar programas Educação de Jovens e Adultos 24 destinados àqueles que não tiveram acesso à escola ou que foram, anteriormente, excluídos. Diferente do Mobral, essa fundação funcionava em sintonia com o MEC e recebia o apoio financeiro das prefeituras ou de associações da sociedade civil. Sua atuação era, basicamente, nos municípios, onde exercia a supervisão e o acompanhamento junto às instituições e secretarias, que recebiam recursos para execução de seus programas locais. Em 1988, foi promulgada a nova Constituição Federal, dessa vez estabelecendo uma nova ordem jurídica. Considerada a Constituição Cidadã, estabelece um tratamento específico à educação nacional, em seu Capítulo III, dos art. 205 ao 214, abrindo caminho para novas regras educacionais. Vemos em 1989, novamente no cenário da Educação, o educador Paulo Freire que assume a Secretaria Municipal de Educação do estado de São Paulo, lançando o MOVA (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos da Cidade de São Paulo), envolvendo a participação de movimentos populares da cidade Acreditava-se que o MOVA- SP possibilitaria o prosseguimento dos estudos pós-alfabetização, garantindo, assim, a escolarização básica formal. Não havia preferência por um determinado método de alfabetização. Pelo contrário, havia uma valorização do pluralismo, recusavam-se apenas métodos pedagógicos autoritários ou racistas, já que bebiam da fonte freiriana de educação libertadora. Em 1993, o projeto foi extinto pela nova gestão municipal. SAIBA MAIS: Caso queira de aprofundar no assunto sobre o MOVA de PauloFreire, acesse o link aqui. Chegamos aos anos 1990. E neste ano, comemorou-se o Ano Internacional da Alfabetização. O governo de Fernando Collor de Mello tem início em março deste mesmo ano, mas não vai adiante, devido ao seu impeachment, encerrado em dezembro de 1992. Neste cenário, Educação de Jovens e Adultos https://www.pucsp.br/maturidades/aspectos_bio_sociais/mova_32.html 25 extinguiu-se a Fundação Educar e criou-se o Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), em decorrência das discussões que circularam na época. Contudo, verifica-se que não há nenhuma intenção de estabelecer uma política de alfabetização para jovens e adultos. Nos anos de 1995 e 1996, continuamos com diversas mudanças legislativas. Alguns projetos que foram levados adiante nesse período são influenciados pelas pesquisas, realizadas nas áreas da Psicologia Cognitiva, Linguística e Educação, levando uma proposta pedagógica para a EJA, associada às práticas sociais de leitura e escrita. Figura 7 - Ex-presidente Fernando Henrique Fonte: Wikimedia Commons No governo FHC (1995-2003) é aprovada, em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Um marco importante para a área. A Educação de Jovens e Adultos - EJA- passa a ser parte integrante da Educação Básica, como uma de suas modalidades de ensino, tendo garantidas a obrigatoriedade e a gratuidade de sua oferta, de acordo com a Constituição Federal de 1988. Educação de Jovens e Adultos 26 Bem, caríssimo estudante, vamos avançar um pouco no tempo, indo para os anos 2000? Siga-me! No começo do século XXI, em 2000, surgem as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Jovens e Adultos. Elas reafirmam a exigência do direito à educação escolar para jovens e adultos, reconhecendo a importância da formação inicial e continuada de professores e a elaboração e execução de propostas pedagógicas em consonância com a identidade dessa modalidade. Nessa época, o Ministério da Educação elabora e disponibiliza um vasto material didático e pedagógico aos sistemas de ensino, promovendo formação continuada de professores, além de dar apoio financeiro federal às ações de políticas locais. O governo do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003 -2010) lança o Programa Brasil Alfabetizado, em 2003, em parceria com os estados e municípios, juntamente com empresas privadas, universidades, organizações não governamentais e instituições civis. Esse programa tem como objetivo alfabetizar jovens, a partir dos quinze anos, de maneira descentralizada, com o apoio de voluntários. Foi desenvolvido em todo o território nacional, com o atendimento prioritário a municípios que apresentavam alta taxa de analfabetismo, sendo 90% destes localizados na região Nordeste. Não podemos deixar de reconhecer que o Programa Brasil Alfabetizado representa uma porta de entrada na cidadania, pois promove o acesso à educação como direito de todos em qualquer momento da vida. A população contemplada inclui indígenas, ribeirinhos, caiçaras e urbanos. O Programa tem como prioridade diminuir as estatísticas, partindo da concepção de que em seis meses é possível alfabetizar um adulto, disseminando o discurso de que o “analfabetismo é um mal em si mesmo, uma mazela social semelhante à escravidão.” Nessa perspectiva, o Programa Brasil Alfabetizado percebe o adulto um produtor de saber e de cultura, e, que embora não saiba ler, nem Educação de Jovens e Adultos 27 escrever, convive nos espaços sociais na qual a escrita circula, participando assim de algumas práticas de letramento nos centros urbanos. Enfim, é um sujeito que tem uma história de construção de sua identidade. SAIBA MAIS: Caso queira se aprofundar no assunto do Programa Brasil Alfabetizado, Acesse o Portal do MEC, clicando aqui. Em 2019, o Programa Brasil Alfabetizado pretendia alfabetizar 1,5 milhão de jovens e adultos, nas cinco regiões do país, com exceção de São Paulo que não aderiu ao programa. O índice maior de analfabetismo continua concentrado nas regiões Norte e Nordeste. De acordo com o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010, da população com 15 anos ou mais, 13,9 milhões são considerados analfabetos. A estatística do IBGE ainda mostra que os homens aparecem com 9,9% do índice e as mulheres com 9,3%. Quanto à divisão territorial, o IBGE aponta que a área rural é responsável por 23,18% da população analfabeta do país e a área urbana, por 7,28%. Veja na tabela a divisão por faixa etária. Os jovens também estão presentes nos índices: de 25 a 29 anos, eles são 4% e de 15 a 17 anos, 2,2%. Tabela 1 Idade Porcentagem 60 anos ou mais 26,5% 50 a 59 anos 13,8% 40 a 49 anos 9,9% 30 a 39 anos 6,6% 25 a 29 anos 4,0% 18 a 24 anos 2,6% 15 a 17 anos 2,2% Fonte: MEC (2019). Educação de Jovens e Adultos http://portal.mec.gov.br/programa-brasil-alfabetizado 28 RESUMINDO: E então, compreendeu tudo que tratamos neste capítulo? Esperamos que sim, mas de toda forma vamos revisar juntos um pouco. Você estudou o pensamento político pedagógico, ao longo da história, na educação de jovens e adultos, iniciando pelo período Jesuítico e o ratio studiorum que era um plano educacional para as diferentes classes da população. Em seguida, estudamos sobre o período pombalino, no qual foi implementado o Aulas Régias. Em seguida, tivermos o período Joanino que teve como marco a ruptura no sistema educacional e o período imperial que distinguiu quatro graus de instrução: pedagogias, liceus, ginásios e academia. Seguindo a linha cronológica, vimos o período republicano em que houve o surgimento do Ensino Supletivo, destinado aos adultos. Todavia, durante o Estado Novo, quase não há registros de iniciativas voltadas à alfabetização de adultos, pois o novo regime não estava interessado na instrução popular. Vimos que o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) foi criado em 1967, começando suas atividades em Recife. Paraíba e Sergipe, apenas em 1969. Em seguida, a Constituição de 1988 trouxe a educação para todos os cidadãos e em 1989, o educador Paulo Freire que, assume a Secretaria Municipal de Educação do Estado de São Paulo, lança o MOVA (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos da Cidade de São Paulo). Já no ano de 1996, FHC aprovou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Um marco importante para a educação. A Educação de Jovens e Adultos - EJA- passa a ser parte integrante da Educação Básica, como uma de suas modalidades de ensino. Educação de Jovens e Adultos 29 EJA como Modalidade da Educação Básica OBJETIVO: A educação de jovens e adultos atua como um processo de inclusão. Deste modo, sendo uma modalidade da educação, estudaremos neste capítulo a sua importância frente ao cenário social. Prontos para entender esse mundo? Vamos lá!. Contexto da Escola Caro estudante, nas últimas décadas, verificamos a intensificação dos debates sobre uma escola mais democrática, na qual haja o respeito à diversidade, à heterogeneidade no âmbito escolar. Constatamos, também, na legislação e nas políticas públicas educacionais desenvolvidas, a preocupação com uma educação para todos, priorizando a qualidade, respeitando as diversas formas e ritmos de aprendizagem. Há um consenso de que para alcançarmos esta qualidade na educação, faz-se necessária a renovação de sua estrutura, abandonando o ensino tradicional. Nesse cenário, está a escola atual, que enfrenta vários desafios para que seja efetivamente, inclusiva, interativa e democrática. Uma escola democrática é aquela que permite a participação de alunos, professores e funcionários nos processos decisórios da comunidade escolar. Essa escola também deve considerar de suma importância a Educação de Jovens e Adultos, como modalidade da Educação Básica. Ela é a oportunidade de estudo, alfabetização, letramento e crescimento deste públicoque não conseguiu finalizar seus estudos em tempo hábil, na idade oportuna. Figura – Escola Educação de Jovens e Adultos 30 Fonte: freepik Nesse sentido, a escola tem papel essencial para a inserção e consideração desse aluno em sua rotina. De acordo com Candau (2011): A escola tem um papel importante na perspectiva de reconhecer, valorizar e empoderar sujeitos socioculturais subalternizados e negados. E esta tarefa passa por processos de diálogo entre diferentes conhecimentos e saberes, a utilização pluralidade de linguagens, estratégias pedagógicas e recursos didáticos[...] e o combate a toda forma de preconceito e discriminação no contexto escolar. (CANDAU, 2011, p.253) Portanto, esse espaço torna os alunos atores centrais do processo educacional, fazendo dos professores facilitadores, orientadores das atividades, de acordo com a bagagem cultural dos seus alunos e de seus interesses. Numa perspectiva inclusiva, é fundamental que a escola proporcione espaços para discussão sobre a diversidade e a pluralidade, proporcionado à sua comunidade um olhar diferenciado de sua realidade social, estimulando o respeito e aceitação das diferenças e individualidades. Educação de Jovens e Adultos 31 Assim, constata-se, mais uma vez, a necessidade de uma formação para os professores que irão atuar na EJA, com o objetivo de prepará-los para lidar com esta diversidade encontrada na escola. Deve-se priorizar uma formação que alinhe a teoria com a prática e que permita que o professor se torne um docente reflexivo, crítico e pesquisador, mudando sua prática educacional, atualizando-se sempre em prol de seu aluno e de uma aprendizagem que o leve a uma cidadania ativa e participativa. Importância do EJA Todo esse contexto estudado até o momento, nos leva à importância da Educação de Jovens e Adultos, modalidade assegurada pela Constituição Brasileira no art. 208, I, que delimita: “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de - I - Educação Básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria” (BRASIL, 1988). Figura – EJA Fonte: freepik Conforme podemos observar, a Constituição Federal garante o direito à Educação Básica às pessoas que não tiveram acesso na idade própria, de forma gratuita. Educação de Jovens e Adultos 32 A Constituição preocupou-se em delimitar essa temática em virtude do elevado índice de analfabetismo da população brasileira, além da baixa escolaridade que contribuem para uma maior desigualdade social, desencadeando um crescimento na pobreza, no desemprego, nos crimes e em diversos outros males que atingem a sociedade. Assim, a oferta do EJA surgiu como uma modalidade de Educação Básica, com três funções principais: • Função reparadora – faz renascer o direito de todos os cidadãos ao acesso à Educação Básica e gratuita. A Função Reparadora da EJA não se refere apenas à entrada dos jovens e adultos no âmbito dos direitos civis. Passa também pela restauração de um direito a eles negado, ou seja, o direito a uma escola de qualidade e ao reconhecimento da igualdade de todo e qualquer ser humano ter acesso a um bem real, social e simbolicamente importante. No entanto, não se pode confundir a noção de reparação com a de suprimento, pois é indispensável que seja um modelo educacional que crie situações pedagógicas satisfatórias para atender às necessidades de aprendizagens específicas de alunos jovens e adultos. (FERREIRA, 2008, p. 7) • Função equalizadora – são oferecidas oportunidades iguais às crianças, jovens e adultos na Educação Básica, com horários flexíveis, no entanto, há adaptações, quando necessário para os jovens e adultos, devido a carga de experiência que eles carregam. Ferreira (2008, p.7) então retrata sobre essa função: Função equalizadora relaciona-se à igualdade de oportunidades que possibilita oferecer aos indivíduos novas inserções no mundo do trabalho, na vida social, nos espaços da estética e nos canais de participação. A equidade é a forma pelos quais os bens sociais são distribuídos, tendo em vista maior igualdade, em situações específicas. Nessa linha, a EJA representa uma possibilidade de efetivar um caminho de desenvolvimento a todas as pessoas, de todas as idades, permitindo que jovens e adultos atualizem seus conhecimentos, mostrem habilidades, troquem experiências e tenham acesso a novas formas de trabalho e cultura. Educação de Jovens e Adultos 33 • Função qualificadora – devido à função de atualização dos conhecimentos, além da estimulação no desenvolvimento de consciência questionadora, crítica, reflexiva, construindo um cidadão pronto para o exercício da cidadania. Já a função qualificadora refere-se à educação permanente, com base no caráter incompleto do ser humano, cujo potencial de desenvolvimento e de adequação pode-se atualizar em quadros escolares. Mais do que uma função, é o próprio sentido da educação de jovens e adultos. (FERREIRA, 2008, p. 8) O EJA, deste modo, tem um papel fundamental na construção curricular dos jovens e adultos, tornando-os pessoas críticas, ativas, com a finalidade de formar a sociedade e inseri-los no mercado de trabalho. Figura – O EJA e o seu papel de formação Fonte: Freepik. Aranha (1997, p. 50) aponta que a importância do EJA reside em [...] como uma atividade sistemática de interação entre seres sociais, ocorrendo essa interação no nível intrapessoal como no nível da influência do meio, interação essa que se configura numa ação exercida sobre sujeitos ou grupos de sujeitos, visando provocar neles mudanças tão eficazes Educação de Jovens e Adultos 34 que os tornem elementos ativos desta função, a educação deve voltar-se a uma formação na qual os educandos possam: aprender permanentemente; refletir sobre a própria ação exercida. Como já mencionado, é o ambiente escolar o espaço utilizado para a educação, no qual os professores ensinam, interpretam, usam a criatividade, ou seja, nesse ambiente é construído o futuro da sociedade. Deste modo, o EJA ocupa o lugar de dar oportunidades de conhecimento a todas as pessoas que fazem parte dessa sociedade. O EJA é articulado em três eixos curriculares: • Cultura. • Trabalho. • Tempo. Esses eixos devem ser levados em consideração no elaborar das aulas e na didática de estudo dos alunos, além de serem uma sustentação para a aprendizagem que desemboca na politização na inclusão social. IMPORTANTE: É importante considerar que os alunos do EJA são pessoas mais velhas, assim, a sua estrutura deve ser mais flexível em consideração às escolas regulares, tendo em vista que o tempo de aprendizagem de cada aluno é diferente. Assim, os professores devem se atentar às necessidades individuais para garantir que todos tenham acesso e permaneçam estudando. O foco do EJA é no aluno, desta forma, o ensino deve estar voltado para ele, devendo o professor considerar toda a bagagem que esses estudantes carregam para um melhor ensinamento. Os jovens e adultos pouco escolarizados trazem consigo um sentimento de inferioridade, marcas de fracasso escolar, como resultado de reprovações, do não aprender. A não aprendizagem, em muitos casos, decorreu de um ato de violência, porque o aluno não atendeu às expectativas da escola. Muitos foram excluídos da escola pela evasão (outro reflexo do poder da escola, do poder social); outros Educação de Jovens e Adultos 35 a deixaram em razão do trabalho infantil precoce, na luta pela sobrevivência (também vítimas do poder econômico). (SANTOS, 2008, p. 74) Mesmo com todos esses fatores citados, cabe destacar que essas pessoas vão além dos estudantes “normais”, porque em virtude do que já viveram, elas já têm conhecimento de diferentes aspectos da vida, mais fácil fazerrelações para a compreensão de diferentes conteúdos. NOTA: Deve-se ter em mente que o professor precisa conhecer o aluno do EJA para que ocorram discussões que englobem o seu contexto social e cultural. É necessário que a escola garanta que o processo de aprendizagem seja bem-sucedido, visando à transformação da vida dos alunos e buscando a formação de um novo cidadão, considerando que eles possam contar suas histórias e perspectivas em relação à escola, a fim de desenvolverem uma aprendizagem na linha de pensamento e de suas limitações. Figura – Histórias no EJA Fonte: Freepik (2022). Educação de Jovens e Adultos 36 Considere-se que, para que ganhe sentido, é necessário que a aprendizagem escolar acarrete à pessoa que aprende e aquele que ensina formas novas de ressignificação e de compreender a realidade, visando a inserção em quatro mundos diferentes: • Social. • Econômico. • Político. • Trabalho. Esses quatro elementos englobam a vida do cidadão, porque toda pessoa deseja fazer parte do meio e obter relações sociais. Assim, a escola pode possibilitar isso por meio do processo de aprendizagem. O econômico, por sua vez, entra em conjunto com o trabalho, pois por meio da escola, é possível se qualificar, conseguindo empregos melhores e em contrapartida um salário melhor. Por fim, o político, refere-se à aprendizagem do cenário mundial, levando a discussões políticas. RESUMINDO: E então, aprendeu tudo que falamos nesse capítulo? Esperamos que sim, no entanto, é importante que façamos um resumo para ter a certeza disso, vamos lá? Primeiramente você estudou o contexto escolar, compreendendo que na atualidade procura-se transformar a escola em ambientes democráticos com respeito a diversidade, com a participação de todos os alunos, entendendo a importância da escola democrática, nos debruçamos sobre a importância da escola para jovens e adolescente. Assim, vimos que a própria Constituição Federal, diploma maior do Brasil, consagra a obrigatoriedade do ensino para todas as pessoas, vimos também as funções principais do EJA que são: função reparadora, função equalizadora e função qualificadora. O EJA se torna importante porque faz com que pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar ganhe essa chance e ingresse no meio social, política, econômico e cultural. Educação de Jovens e Adultos 37 Inclusão Social e Diversidade Cultural OBJETIVO: Caro estudante, abordaremos agora um assunto muito importante no contexto da EJA: como se concebe a inclusão e a diversidade cultural nos espaços escolares que oferecem esta modalidade de ensino? Espero que seja uma oportunidade, não só de análise, mas de reflexão dessa realidade.. Inclusão Social e a Diversidade Cultural Iniciamos nosso capítulo indagando, o que vem a ser inclusão? O que quer dizer inclusão? A palavra inclusão deriva do verbo latim includere, e tem como significado colocar algo ou alguém em um determinado espaço. A inclusão consistiu no ato da participação ampla das pessoas em um determinado local, assim no contexto da inclusão social, consideramos a essa inclusão como o processo de participação de todas as pessoas nos estabelecimentos de ensino. A educação inclusiva pode ser definida como a prática da inclusão de todos – independentemente de seu talento, deficiência, origem socioeconômica ou cultural – em escolas e salas de aula provedoras, onde as necessidades desses alunos sejam satisfeitas. (STAINBACK; STAINBACK, 1999, p. 21) A educação inclusiva visa à heterogeneidade da escola, tornando a escola um local aberto para todas as pessoas, sejam crianças ou adultos, com deficiência ou não. O movimento mundial pela educação inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia Educação de Jovens e Adultos 38 de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola. (BRASIL, 2001, p.1) Nesse contexto, podemos enxergar o tema da inclusão como um assunto amplo, que perpassa a ideia de ser aplicada apenas às pessoas que têm algum tipo de deficiência. Educação inclusiva é uma metodologia pedagógica que almeja recolocar na rede de ensino, em todos os seus níveis, as pessoas excluídas como: portadoras de alguma deficiência, de distúrbios de aprendizagem, excluídas por gênero, cor ou outros motivos. Figura – Escola como local aberto Fonte: Freepik (2022). A importância dessa inclusão se faz devido ao fato da escola ter uma função única para os alunos, pois ela é uma forma de proporcionar o desenvolvimento social, cultural, intelectual e físico de cada um, auxiliando no desenvolvimento das pessoas. O conceito de inclusão no âmbito específico da Educação implica, antes de mais, rejeitar por princípio a exclusão (presencial ou acadêmica) de qualquer aluno da comunidade escolar. Para isso, a escola que pretende seguir uma política de Educação Inclusiva (EI), deve desenvolver políticas, culturas e práticas que valorizam Educação de Jovens e Adultos 39 o contributo ativo de cada aluno para a construção de um conhecimento construído e partilhado e, dessa forma, atingir a qualidade acadêmica e sociocultural sem discriminação. (RODRIGUES, 2006, p. 2) Nesse contexto de inclusão, engloba-se a Educação de Jovens e Adultos - EJA – que é a modalidade de ensino na qual mais encontramos turmas absolutamente heterogêneas, desenhando uma diversidade não só social, mas racial, cultural, econômica, religiosa, etária, entre outras. Deve-se pensar na escola inclusiva em virtude da escola ser o local de se aprender a interpretar o mundo, visando transformá-lo, por meio do domínio das categorias de método e de conteúdo que causa inspiração e transformação das práticas de emancipação humana em uma sociedade que encontra-se, cada vez mediada, pelo conhecimento. O desafio para uma escola inclusiva é o de desenvolver uma pedagogia centrada no aluno [...] Escolas inclusivas precisam reconhecer e responder às necessidades diversificadas de seus alunos, acomodando os diferentes estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando educação de qualidade para todos mediante currículos apropriados, mudanças organizacionais, estratégias de ensino, uso de recursos e parcerias com suas comunidades. (BRASIL, 1996, p. 6 e 12) A LDB/96 foi encarregada de ditar os deveres do Estado com relação à Educação nas diferentes modalidades de ensino, como também de caracterizar essas modalidades. Como vimos, essa lei foi considerada um marco em virtude de assegurar a EJA, dando oportunidade àqueles que não puderem iniciar ou continuar seus estudos IMPORTANTE: A partir da LDB, o Estado passou a ter obrigação de fornecer o EJA, sendo esse ensino uma maneira de efetivação da cidadania e da participação social e política das pessoas. A LDB, então, em seu capítulo II, seção V - Educação de Jovens e Adultos, artigo 37, define que: “A educação de jovens e adultos será Educação de Jovens e Adultos 40 destinada àqueles que não tiveram acesso ou oportunidade de estudos no Ensino Fundamental e Médio na idade própria” (BRASIL, 1996). Na atual realidade brasileira, a profunda estratificação social e a injusta distribuição de renda têm funcionado como um entrave para que uma parte considerável da população possa fazer valer os seus direitos e interesses fundamentais. Cabe ao governo o papel de assegurar que o processo democrático se desenvolva de modo a que esses entraves diminuam cada vez mais. É papel do Estado democrático investir na escola, para que ela prepare e instrumentalize criançase jovens para o processo democrático, forçando o acesso à educação de qualidade para todos e às possibilidades de participação social. (BRASIL, 2001, p.33) Figura – Educação para jovens e adultos Fonte: Freepik A Educação de Jovens e Adultos - EJA - é a modalidade de ensino na qual mais encontramos turmas absolutamente heterogêneas, desenhando uma diversidade não só social, mas racial, cultural, econômica, religiosa, etária, entre outras. A LDB/96 em seu capítulo II, seção V - A Educação de Jovens e Adultos, artigo 37, define que: “A educação de jovens e adultos será Educação de Jovens e Adultos 41 destinada àqueles que não tiveram acesso ou oportunidade de estudos no Ensino Fundamental e Médio na idade própria” (BRASIL, 1996). Portanto, devemos tomar cuidado para que não sejam reproduzidas em nossas escolas atitudes e práticas educacionais excludentes, distanciando-se de seu verdadeiro papel, que é zelar pela formação de indivíduos críticos e reflexivos, que atuem de forma autônoma e democrática, solucionando e superando os obstáculos no seu cotidiano e ao longo de sua vida. Devemos considerar que grande parte desses alunos chegam à escola com seus próprios saberes, adquiridos ao longo de sua vida, por meio de suas relações familiares e sociais. Essas experiências não devem ser desprezadas, pelo contrário, devem ser o elo de novos conhecimentos propostos pela escola, evitando, assim, o desinteresse, o fracasso e a evasão. Outrossim, devemos considerar que a EJA, na atualidade, deve assumir como princípio norteador o mundo do trabalho. Nesse cenário, é imprescindível que os educadores da EJA estejam preparados para trabalhar com tantas variantes, respeitando as individualidades, mediando conflitos, agregando os diversos grupos, em prol de uma aprendizagem significativa e da inclusão social. No entanto, sabemos que um número considerável de professores (iniciantes ou veteranos) que atuam na EJA não está preparado para tal função. Os novatos por não terem nos cursos de formação (graduação) disciplinas que os capacitem para assumir uma turma tão diversificada e os veteranos por estarem, em sua maioria, acostumados com as turmas regulares, sem tanta heterogeneidade (etária e social), acabam por replicar a mesma prática pedagógica, que, obviamente, não funciona. Assim, temos um grande problema a ser resolvido: como assegurar a inclusão e o respeito às diferenças? Primeiramente, é necessário que haja um projeto eficaz de formação continuada para os professores que irão trabalhar (e já trabalham) na EJA. É de fundamental importância a troca de experiências e dos saberes que são compartilhados, além de ficarem a par de novas metodologias e tecnologias educacionais. Educação de Jovens e Adultos 42 Figura – professor do EJA Fonte: Freepik Os professores da EJA precisam mudar seus paradigmas, rever sua prática pedagógica, não se contentando apenas em ensinar a ler, escrever e contar. Infelizmente, o que vemos na realidade das salas de EJA são professores que atuaram (ou atuam) no Ensino Fundamental ou Médio, sem preparo para lidar com a diversidade lá encontrada e pouco preocupados com a formação integral dos alunos, possibilitando que exerçam sua cidadania de forma plena Podemos constatar nas Diretrizes Curriculares Estaduais de EJA (DCEs), a ênfase à função social dessa modalidade de ensino, delineando o perfil de seus alunos, as formas de avaliação, metodologia e especialmente, os três eixos articuladores do currículo de EJA, a saber: cultura, trabalho e tempo. A partir das reflexões durante o processo de elaboração das DCE para a Educação de Jovens e Adultos, identificaram- se os eixos cultura, trabalho e tempo como os que deverão articular toda a ação pedagógico-curricular nas escolas. Tais eixos foram definidos tendo em vista a concepção de currículo como um processo de seleção de cultura, bem como pela necessidade de atender o perfil do educando da EJA. (DCE/EJA, 2005, p.37). Educação de Jovens e Adultos 43 VOCÊ SABIA? Há uma diferenciação entre Pedagogia e Andragogia. Para conhecer mais sobre o tema, acesse o link, clicando aqui. Você se lembra que no começo da EJA eram utilizados materiais didáticos iguais ou adaptados daqueles que eram utilizados para a educação das crianças? Percebemos que havia, na verdade, uma ênfase no ensino infanto-juvenil do que para os jovens e adultos que por algum motivo não conseguiram cumprir o tempo normal na escola. Pois bem, a partir de 1970, houve um olhar diferenciado para a educação de jovens e adultos, por meio da definição de Malcolm Knowles de andragogia, que definiu a educação voltada para o adulto, em contraposição à pedagogia, que se referia à educação de crianças (do grego paidós, criança). Segundo Gadotti (2001), linhas de ação podem ser adotadas para que a EJA atenda às perspectivas de seu alunado: • Adotar modelos de atendimento em EJA, respeitando suas características de aluno- trabalhador. • Considerar as características psicossociais próprias do jovem e do adulto que nunca foi à escola ou que volta aos bancos escolares. • Promover maior flexibilidade na metodologia, na organização curricular e na duração dos programas de atendimento educacional. • Avaliar contínua e sistematicamente a educação de jovens e adultos em virtude de sua flexibilidade e diversidade. • Apoiar propostas feitas pelos movimentos sociais com vistas a resolver problemas específicos (GADOTTI, 2001, p. 124) Você percebe que o conceito da EJA, na perspectiva colocada, se expande? Isso acontece na medida que há a compreensão de que os processos educativos são desenvolvidos em várias dimensões: • A do conhecimento. • Das práticas sociais. Educação de Jovens e Adultos https://andragogiabrasil.com.br/pedagogia-e-andragogia-sao-iguais/ 44 • Do trabalho. • Do confronto de problemas coletivos. • Da construção da cidadania. Embora a perspectiva seja libertadora, precisa-se somar a outros esforços para apresentar alternativas emancipatórias, pois a escola sozinha não dá conta. Na EJA menos ainda, pois lá estão também os moradores de rua (andarilhos), adolescentes explorados no turismo sexual, mulheres que sofrem violência, jovens marginalizados, drogadito, negro, portadores de necessidades educacionais especiais e o sistema prisional. (LOPES, 2016, p.12) Como educadores, não podemos esquecer que essas pessoas que chegam à EJA, vêm em busca, primeiramente, de acolhimento desejando (re)encontrar um (seu) caminho. Para tanto, precisam de profissionais que os conduza nessa trajetória. É imprescindível que não esqueçamos que o atendimento de alunos na EJA constitui-se no avanço efetivo da educação para todos, conforme está previsto na Constituição de 1988 e na LDB/96. Nessa perspectiva, podemos considerar que todos devem ter oportunidade de participação, adquirindo autonomia por meio do conhecimento, do desenvolvimento de suas competências e habilidades e possam ser capazes de serem inseridos no mercado de trabalho. RESUMINDO: Aprendeu tudo que estudamos até aqui? Esperamos que sim. A inclusão torna-se conteúdo essencial para o dia a dia das pessoas. Pensando na importância, vamos então revisar um pouco do que vimos? Este capítulo foi dedicado ao estudo da inclusão social e a diversidade cultural, vendo a escola como espaço de interações e relações no EJA. Iniciamos, como estudo do que vem a ser a inclusão, consistindo no ato da participação ampla das pessoas em um determinado local, assim no contexto da inclusão social. Educação de Jovens e Adultos 45 No contexto educacional, a inclusão diz que a escola deve ser um espaço heterogêneo e que todos devem ser acolhidos em igual condição. Vimos que a importância dessa inclusão aparece devido ao fato da escola ter uma função única para os alunos, pois ela é uma forma de proporcionar o desenvolvimentosocial, cultural, intelectual e físico de cada um, auxiliando no desenvolvimento das pessoas. Diante de todo esse contexto de inclusão e considerando a diversidade de pessoas que vão à escola, principalmente na modalidade EJA, estudamos a importância dos professores como pessoas que irão promover a inclusão e a aprendizagem desses alunos, delimitando as linhas de ação que podem ser adotadas para que a EJA atenda às perspectivas de seu alunado. Educação de Jovens e Adultos 46 Orientações Curriculares para a EJA e para a Alfabetização OBJETIVO: A partir da importância do ensino para jovens e adultos e a compreensão de como ele atua na inclusão social, nesse capítulo estudaremos as orientações curriculares para a EJA. Vamos lá!. O EJA Caro estudante! Vimos em nossos estudos recentes que A EJA tem como finalidade incluir aqueles que por algum motivo não tiveram acesso à escola em sua infância ou adolescência, caracterizando-se em uma modalidade que busca atender às particularidades desses sujeitos que a integram. Ao contrário das demais modalidades de ensino, os alunos matriculados na EJA são pessoas diversas, com seus traços de vida, origens, idades, vivências profissionais, históricos escolares, ritmos e estruturas de aprendizagem bastante diferenciados. Figura – Alunos no EJA Fonte: freepik Educação de Jovens e Adultos 47 Na história da educação mais recente, percebemos um avanço nas discussões, propiciando maior relevância em relação às orientações curriculares específicas para EJA. A Conferência Nacional de Educação Básica de 2008 corrobora com a Constituição Federal de 1988, voltando à pauta a questão da isonomia e da acessibilidade à educação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), como mencionado, já havia estabelecido no capítulo II, seção, artigo 37, que a EJA se destina aos indivíduos que, por algum motivo, não tiveram acesso ou oportunidade de estudos no Ensino Fundamental e Médio na idade correta. Estabelece, também, que os sistemas de ensino devem assegurar gratuidade a estes jovens e adultos, considerando suas características e necessidades. Ainda na referida Lei, no art.38, encontramos a proposição de que os sistemas de ensino mantenham “cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular”. Quanto à avaliação, acontece por meio de provas que comprovam a fluência e a capacitação para a conclusão do Ensino Básico, realizadas em duas etapas: primeiramente o Ensino Fundamental (para maiores de 15 anos) e, em segunda etapa, para o Ensino Médio (para maiores de 18 anos). Você percebeu que a Base Nacional Comum Curricular já havia sido mencionada na LDB? Pois bem, com as discussões advindas de sua criação, a EJA voltou a ser debatida. Portanto, podemos verificar, analisando os documentos, no primeiro momento, nas versões 1 (2015) e 2 (2016) surgidas do debate nacional, que houve algum foco específico em EJA. Contudo, não verificamos nas versões finais, esta especificidade em relação à EJA. Isso ocorre, segundo Maria Helena Guimarães, do MEC, para que o segmento não seja “estigmatizado” e percebido como outsider (exterior) em relação ao ensino regular. Segundo a educadora Guiomar Namo de Mello, uma das profissionais responsáveis pela elaboração da 3ª versão da BNCC, a EJA está incluída na educação regular e, como tal, foi considerada no conjunto dos direitos de Educação de Jovens e Adultos 48 aprendizagem de todos, já que a base não é currículo e as especificidades de EJA devem ser discutidas relativamente aos pormenores de currículo. (MACHADO, 2018) Entretanto, alguns estudiosos não concordam com o MEC, no que se refere à elaboração da 3ª versão da BNCC (2018), pois acreditam que as especificidades da EJA debatidas, conforme já foi dito, desde a Constituição de 1988, corroboradas pela LDB/96 e revistas em 2008 na Conferência Nacional da Educação Básica, devem ser consideradas pela BNCC. ACESSE: Veja como se deu o histórico da BNCC, acessando o link, clicando aqui. O Processo de Alfabetização e Letramento: Ressignificando os Saberes Escolares O homem é essencialmente um ser social, pois desde o seu nascimento interage com os outros (pais e familiares) e é inserido na sociedade e em sua cultura. Tal interação ocorre de forma contínua e é marcada por símbolos, que são internalizados por meio da leitura e da escrita. Com o advento da globalização, da informação, da inovação da sociedade contemporânea, percebemos que nosso dia a dia se tornou cada vez mais letrado. Isto implica na necessidade de que todos sejam alfabetizados. Contudo, o Brasil está muito distante dessa meta. Em pleno século XXI, segundo estatísticas, 11% da população, acima de 25 anos, é analfabeta. Soares (2011) considera que a alfabetização é tornar o sujeito capaz de ler e de escrever. Nessa perspectiva, seu objeto é a aquisição da escrita por parte de uma pessoa ou de um grupo de pessoas. Educação de Jovens e Adultos http://basenacionalcomum.mec.gov.br/historico 49 É um processo, segundo a autora, pelo qual adquire-se o domínio de códigos e habilidades necessárias para ler e escrever, adquirindo assim o domínio da técnica. Contudo, sabemos que a alfabetização vai muito além do domínio da técnica (codificar e decodificar) e das habilidades de ler, na medida que envolve outros processos como a interpretação, a compreensão, a crítica e a produção de conhecimento. A alfabetização, envolve, ainda, o desenvolvimento de novas formas de compreensão e o uso da linguagem de uma maneira geral (SOARES, 2011). Já o letramento, de acordo com a referida autora, ocorre quando o indivíduo ou grupo adquire um estado ou condição como consequência de ter-se apropriado da escrita, como usar a leitura e a escrita para seguir instruções (receitas, bula de remédio, manuais de jogo), apoiar a memória (lista), comunicar-se (recado, bilhete, mensagem), divertir e emocionar-se (conto, fábula, lenda), informar (notícia), orientar-se no mundo (o Atlas) e nas ruas (os sinais de trânsito) (SOARES, 2011). Figura – letramento através dos recados Fonte: freepik Educação de Jovens e Adultos 50 O que diferencia a alfabetização de crianças e a alfabetização de jovens e adultos, além do público da aprendizagem, são os processos cognitivos que têm suas semelhanças, mas guardam diferenças bastante relevantes. Nesse sentido, não cabe a utilização da mesma didática e metodologia para realidades distintas. Veremos, a seguir, os processos de alfabetização e letramento e instrumentos de alfabetização para jovens e adultos. Conceitos de Alfabetização e Letramento de Jovens e Adultos Estudos indicam que o conceito de alfabetização, em seu primórdio, era identificado como apenas o ensino e a aprendizagem do sistema alfabético de escrita. Durante momentos distintos na sociedade, a alfabetização assumiu diversos conceitos. Podemos citar que no início do século XX, era considerada alfabetizada a pessoa que soubesse codificar e decodificar. Na década de 1950, esse conceito assumiu outro significado, estando relacionado à interpretação do que é escrito e lido. Atualmente, constata-se uma ampliação do significado da alfabetização que contempla a apropriação do sistema de escrita que tem dois aspectos indissociáveis: codificação e produção (escrita) e decodificação e compreensão (leitura) de gêneros textuais diversos (SOARES, 2003). Deste modo, para a autora, a alfabetização pode ser considerada como um processo complexo e multifacetado que envolve duas dimensões: uma individual – caracterizada pela capacidade do indivíduo ler e escrever – e outra social, que se refere à utilização social da leitura e da escrita. Assim a leitura se limitaria à capacidade de decodificar os sinais gráficos transformando-os em sons, e a escrita,a capacidade de codificar os sons da fala e transformá-los em sinais gráficos. Educação de Jovens e Adultos 51 Figura – A leitura Fonte: freepik Com os estudos realizados por Emília Ferreiro e Teberosky, observando 108 crianças e seu sistema de escrita, o conceito de alfabetização foi sendo ampliado. De acordo com as referidas autoras, a escrita não se reduz ao domínio e a correspondência entre grafemas (letras/decodificação) e fonemas (sons/codificação), mas se caracteriza como um processo ativo, por meio do qual a criança constrói e desconstrói suas hipóteses acerca do funcionamento da língua escrita para compreendê-la como um sistema de representação da fala. Emília Ferreiro (2011) defendeu a importância da compreensão do mecanismo de interação da criança com a língua, deixando claro que esta aquisição não pode estar vinculada a uma simples reprodução do falado para o escrito, mas que é preciso um nível de significância para que a criança assimile o aprendizado. Educação de Jovens e Adultos 52 SAIBA MAIS: Caso queira se aprofundar no assunto da teoria da Psicogênese da Escrita de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, acesse o link, clicando aqui. Não podemos deixar de mencionar as grandes contribuições à educação de jovens e adultos, sobretudo no que se refere à alfabetização, de Paulo Freire. O educador e estudioso realizou uma crítica à concepção mecanicista da alfabetização, na qual enfatiza um trabalho com os aspectos ligados à codificação e decodificação da língua, em detrimento dos processos de produção e compreensão. Para ele, a alfabetização deve ser um instrumento que faça com que os indivíduos analfabetos tenham consciência dos seus direitos políticos, sociais e econômicos (FREIRE apud CARVALHO, 2009). Emília Ferreiro (2011, p.56) corrobora com este pensamento quando afirma que “[...]analfabetismo e pobreza caminham juntos, não são fenômenos independentes; analfabetismo e marginalização social caminham juntos, não são fenômenos independentes,” esse um problema, sobretudo político. RESUMINDO: Caro estudante, chegamos ao final da Unidade 1. Fizemos uma viagem no tempo como o objetivo de compreender a trajetória histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Nesse sentido, verificamos a influência dos valores e cultura indígena em nossas vidas. Vimos que 49 anos depois da “descoberta” do Brasil, aportou em nossa terra a Companhia de Jesus, cujos padres eram denominados jesuítas. Esses tinham, como objetivo principal, catequizar os nativos, por meio da alfabetização em português e, concomitantemente, introduzir a cultura portuguesa na colônia. Os jesuítas abriram muitos colégios no Brasil, tendo como método o Ratio Studiorum. Duzentos e dez anos depois, os jesuítas foram expulsos do Brasil pelo Marquês de Pombal, que fechou os colégios jesuítas e instaurou um novo método conhecido como Aulas Régias, que não obteve muito sucesso. Educação de Jovens e Adultos https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/15/11/emilia-ferreiro-ana-teberosky-e-a-gnese-da-lngua-escrita 53 Com a chegada da Família Real ao Brasil, em 1808, houve mais uma ruptura no sistema educacional. Contudo, foram criadas algumas instituições como: Academias Militares, Escolas de Direito e Medicina e escolas noturnas, mas havia uma dificuldade de manter estas instituições em funcionamento. Foi criada, também, a imprensa Régia na colônia, que contribuiu para divulgação de fatos e pensamentos para a população letrada. Entretanto a educação, mais uma vez, era relegada a segundo plano. Por pressão dos portugueses, em 1821 D. João VI e sua comitiva voltam à Portugal, deixando seu filho D. Pedro I no Brasil. Em 7 de setembro de 1822, D. Pedro I proclama a Independência do Brasil de Portugal. Porém, este período não é muito profícuo para educação. Podemos destacar um marco na educação brasileira, que foi a Constituição de 1824, que determinou a obrigatoriedade do ensino público primário. Em 1831, D. Pedro I abdica do trono brasileiro, retorna a Portugal e deixa seu filho D. Pedro II, apenas uma criança à época. Embora tenha sido um entusiasta da ciência e da educação, o reinado de D. Pedro II pouco solidificou o sistema educacional. Em relação à educação para jovens e adultos, somente em 1879, Carlos Leôncio de Carvalho, elaborou uma reforma educacional. Por meio do decreto 7.247, foram criados cursos noturnos para adultos, do sexo masculino, nas escolas públicas de instrução primária. Foi um período marcado por conflitos e guerras, o que culminou, em 1889, com a Proclamação da República e o exílio de D. Pedro II, retornando a Portugal. O primeiro período republicano foi marcado por grandes mudanças sociais, políticas, econômicas e, consequentemente, educacionais. Havia uma grande mobilização para erradicação do analfabetismo do país. Além disso, a Revolução Industrial, a partir de 1930, trouxe a necessidade de uma mão de obra qualificada. Passamos por momentos bastante conturbados econômica, política e socialmente, mas a partir de 1932, como o Manifesto dos Pioneiros, a educação brasileira vai solidificar seu sistema educacional e voltar seus olhos para a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em 1947, o governo lança a Campanha de Educação de Adultos (CEA) ou Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA). Em 1950, em Pernambuco, o educador Paulo Freire e seus colaboradores insurgem à campanha e surge o Método Paulo Freire, que alfabetizou milhares de brasileiros. Com o Golpe Militar de 1964, os movimentos que seguiam Educação de Jovens e Adultos 54 as ideias de Paulo Freire foram extintos. Em 1967, é criado o MOBRAL - Movimento Brasileiro de Alfabetização. Após sua criação, vários outros programas governamentais irão se preocupar com a EJA, principalmente, no que se refere à inclusão social, o respeito à diversidade, a singularidade das pessoas que por algum motivo deixam seus estudos e os retoma fora do momento regular de educação. Destacamos, então, a Constituição de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, as Diretrizes Curriculares para Educação de Jovens e Adultos e, mais recentemente a Base Nacional Comum Curricular. Toda esta trajetória objetivou, ainda, a identificação da importância da EJA no processo de inclusão social. Finalmente, analisamos o processo de alfabetização e letramento, as opções metodológicas no trabalho docente. Educação de Jovens e Adultos 55 REFERÊNCIAS ARANHA, A. V. S. O conhecimento tácito e a qualificação do trabalhador. Revista Trabalho e Educação, Belo Horizonte, n. 2, p. 12-30, 1997. Disponível em: www.repositório-ufpb.br>juspui>bitstream>POM28062018. Acesso em: 07 mar. 2022 BRASIL. 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