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63 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br AS CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO (ABA) PARA A APRENDIZAGEM DE PESSOAS COM AUTISMO: UMA REVISÃO DA LITERATURA CONTRIBUTIONS OF BEHAVIOR ANALYSIS (ABA) TO LEARNING PEOPLE WITH AUTISM: A LITERATURE REVIEW _________________________________________________________________ Dailma da Silva Medeiros Pedagoga. Especialista em autismo. Formada no Programa de Enriquecimento Instrumental – PEI. dai2094@yahoo.com.br RESUMO Nos últimos anos é visível o quanto o número de pessoas diagnosticadas com autismo aumentou. Desta sorte, essas pessoas vão cada vez mais para a escola, o que lança desafios com relação à aprendizagem desse grupo. Para auxiliar nessa tarefa de ensinar pessoas com TEA, os profissionais da educação buscam metodologias e estratégias que pretendem intervir no desenvolvimento acadêmico desses alunos. Assim, levantam-se três pontos que são relevantes para esta pesquisa: quais os princípios da Análise do Comportamento Aplicada que podem contribuir para a aprendizagem escolar de pessoas com autismo? Quais as características que podem dificultar a aprendizagem de uma pessoa com TEA? Como os profissionais da educação podem por em prática as propostas da ABA voltadas para a aprendizagem de alunos com TEA no contexto escolar? Realizou- se uma pesquisa bibliográfica investigando estudos que relacionam o Transtorno do Espectro do Autismo com a aprendizagem, bem como as contribuições que a Análise do Comportamento Aplicada dá a esse processo. Palavras-chave: Autismo. Aprendizagem. Método ABA. ABSTRACT In recent years, it is visible how much the number of people diagnosed with autism has increased. This way, these people go to school more and more, which poses challenges regarding the learning of this group. To assist in this task of teaching people with ASD, education professionals seek methodologies and strategies that intend to intervene in the academic development of these students. Thus, three points are raised that are relevant to this research: What are the principles of Applied Behavior Analysis that can contribute to the school learning of people with autism? What characteristics can hinder the learning of a person with ASD? How can education professionals put into practice the ABA proposals aimed at learning students with ASD in the school context? A bibliographic research was carried out investigating studies that relate Autism Spectrum Disorder with learning, as well as the contributions that Applied Behavior Analysis makes to this process. Keywords: Autism. Learning. ABA method. 64 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br INTRODUÇÃO O Brasil contemplou a educação especial como modalidade da educação escolar na rede regular de ensino em sua Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDBEN), somente em 1996. A partir daí, muitos questionamentos surgiram a respeito da promoção da aprendizagem desse público. Neste sentido, a inclusão escolar pretende inserir todas as pessoas, independente do seu grau de comprometimento cognitivo e social na escola, objetivando amenizar a discriminação e aumentar a socialização dessas pessoas para que usufruíssem do mesmo ambiente. Assim, Farias (2006) defende que o educador tem a obrigação de buscar estratégias para ensinar esses alunos com necessidades educacionais diferentes, estabelecendo metodologias de ensino voltadas para essas precisões tão específicas. Portanto, frente a uma criança com autismo e com suas dificuldades e habilidades, questiona-se, se de fato, esses educadores estão preparados para suprir as necessidades do aluno com autismo. Diante de tudo isso, este trabalho busca apontar a análise do comportamento, como um método utilizado, que visa mediar o ensino e a aprendizagem de crianças com autismo. Que envolve não só a comunidade escolar, mas também a equipe multidisciplinar que atende esses alunos. Esta ciência vem apresentando muitos resultados nos aspectos sociais, cognitivos e pedagógicos. Sabe-se que o autismo é uma condição crônica que não tem cura, com prejuízo em diversas áreas do desenvolvimento e por isso necessita de tratamento multidisciplinar. Em muitos casos o atendimento precisa ser especializado e individualizado, a depender do nível de comprometimento a intervenção precoce e bem implementada consegue reduzir comportamentos inadequados e maximizar as habilidades desses alunos. A conquista da autonomia é o principal objetivo dos tratamentos de pessoas com autismo, o que favorece uma melhoria na qualidade de vida delas e de suas famílias. Falar de autismo é muito amplo, por isso iremos delimitar nosso trabalho tratando apenas das contribuições do método ABA para as pessoas com autismo. O método ABA há algum tempo é usada como uma terapia de excelência no 65 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br tratamento dos sintomas do autismo. Dessa forma, a estrutura desse trabalho, fundamenta-se na problemática: quais as contribuições da Análise Aplicada do Comportamento para a aprendizagem de pessoas com autismo? Assim, o objetivo desse trabalho é perceber como as pessoas com autismo que são expostas ao método ABA para aprenderem com mais facilidade. E nesse prisma, verificar que metodologias os educadores podem utilizar para ensinar com excelência pessoas com autismo. Para obter informações, utilizamos a pesquisa bibliográfica O levantamento de dados foi com ênfase nos tópicos: a) conhecimento acerca do autismo, histórico das abordagens sobre este transtorno e evolução da compreensão do autismo; b) análise do comportamento aplicado; e, d) as técnicas do método ABA para uma melhor compreensão sobre o autismo e o comportamento da pessoa autista. DEFINIÇÃO DE AUTISMO: HISTÓRICO E EVOLUÇÃO Leboyer (2005) explica que o autismo foi definido pela primeira vez por Kanner1 (1943), e nesses estudos os três núcleos de transtornos do autismo atualmente em vigor foram distinguidos na definição: (1) transtorno qualitativo do relacionamento, (2) distúrbios da comunicação e linguagem e (3) falta de flexibilidade mental e comportamental. De acordo Leboyer (2005), em sua palestra sobre Desenvolvimento Normal e Autismo, em 1997, Rivière2 menciona três períodos principais de estudo do autismo até aquele momento: os primeiros vinte anos após Kanner, nos quais o autismo é considerado um distúrbio produzido por fatores emocionais inapropriados no relacionamento da criança com as figuras infantis, predominando as concepções psicodinâmicas; um segundo período até 1983, no qual a imagem científica do autismo foi modificada e as hipóteses baseadas na existência de alterações afetivas começaram a ser afastadas: com base em pesquisas empíricas rigorosas e controladas, foi considerada a existência de 1 Leo Kanner foi um psiquiatra austríaco conhecido por sua descrição do que hoje é chamado de clínica psiquiátrica de Transtorno do Espectro do Autismo (DSM -V). 2 Ángel Rivière desenvolveu um longo e profundo trabalho profissional no campo do diagnóstico de transtornos generalizados do desenvolvimento. Seus relatórios de avaliação diagnóstica ou revisão periódica da evolução constituem documentos únicos e essenciais para ter uma perspectiva completa de seu trabalho. 66 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br alterações cognitivas mais do que afetivas, surgindo o tratamento educativo como principal recurso. E um terceiro e último estágio, no qual explicações e tratamentos são significativamente modificados e é feita uma mudança para uma perspectiva evolutiva e não apenas psicopatológica do distúrbio: a Teoria da Mente aparece,a partir da qual explica que no autismo há uma incapacidade específica de atribuir estados mentais a outras pessoas, e os procedimentos para o tratamento do autismo são caracterizados pelo uso de técnicas educacionais mais naturais, focadas na comunicação como núcleo essencial do desenvolvimento e mais respeitoso dos recursos e capacidades das pessoas autistas. Finalmente, há uma necessidade teórica e prática de considerar o transtorno da perspectiva de todo o ciclo de vida e não apenas como uma alteração típica da infância. Isso é evidenciado na inclusão do autismo nos distúrbios do desenvolvimento no DSM-III, criando assim uma categoria para diferenciá-lo da esquizofrenia ou da psicose infantil e de transtornos específicos do desenvolvimento (nos quais geralmente, uma única função é afetada e não várias como no TGD – Transtorno Global do Desenvolvimento). As três dimensões mencionadas acima como núcleos de autismo estão incluídas nas definições de diagnósticas mais usadas atualmente: o DSM-V (2014) da American Psychiatric Association (APA) e a CID-10 da Organização Mundial da Saúde. O transtorno autista é encontrado no DSM-V (2014) como um subtipo dos chamados Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), acompanhados por outros distúrbios conhecidos como Síndrome de Rett (distúrbio genético do substrato que afeta as meninas), Transtorno Desintegrativo da Infância (desordem que também se manifesta nos primeiros anos de vida e após um período de desenvolvimento normal), Síndrome de Asperger (desordem um pouco menos incapacitante, que não apresenta atraso geral de linguagem clinicamente significativo) e TGD atípico ou não especificado, o grupo mais numeroso na prática clínica. Para fazer um diagnóstico de transtorno autista de acordo com o DSM-V (2014), é necessário atender algumas características. Gauderer (1997) já havia destacado o seguinte: 67 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br A. Um total de seis (ou mais) elementos de (1), (2) e (3), com pelo menos dois de (1) e um de cada (2) e (3): (1) Alteração qualitativa da interação social, manifestada por pelo menos duas das seguintes características: Alteração significativa do uso de múltiplos comportamentos não verbais como contato visual, expressão facial, posturas corporais e gestos que regulam a interação social. Incapacidade de desenvolver os relacionamentos com colegas apropriados ao nível de desenvolvimento. Ausência de tendência espontânea para compartilhar com outras pessoas gostos, interesses e objetivos (por exemplo, não mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse). Falta de reciprocidade social ou emocional (GAUDERER, 1997, p. 112). (2) Alteração qualitativa da comunicação manifestada por pelo menos duas das seguintes características: Atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem oral (não acompanhada de tentativas de compensar modos de comunicação alternativos, como gestos ou mímica). Em indivíduos com fala adequada, alteração significativa da capacidade de iniciar ou manter conversa com outras pessoas. Uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou linguagem idiossincrática. Ausência de jogo realista espontâneo, variado ou de jogo social imitativo, característico do nível de desenvolvimento (GAUDERER, 1997, p. 112-113). (3) Padrões de comportamento, interesses e atividades restritos, repetitivos e estereotipados, manifestados por pelo menos uma das seguintes características: Preocupação absorvente com um ou mais padrões estereotipados e interesse restrito que se torna anormal, em intensidade ou em seu objetivo. Adesão aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos, não funcionais. Maneirismos motores estereotipados e repetitivos (por exemplo, agitar ou girar as mãos ou dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo). Preocupação persistente com partes de objetos (GAUDERER, 1997, p. 113). 68 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br B. Atraso ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, que aparece antes dos três anos de idade: (1) interação social, (2) linguagem usada na comunicação social ou (3) jogo simbólico ou imaginativo. C. O transtorno não é mais bem explicado pela presença de um transtorno de Rett ou do transtorno desintegrativo da infância. Ambrós e Oliveira (2017) destacam que na CID-10, esse transtorno é coletado com o nome de autismo infantil, com praticamente os mesmos critérios e códigos de diagnóstico (APA, 2000), e também é incluído entre os transtornos gerais de desenvolvimento, definidos como um grupo de transtornos caracterizados por alterações qualitativas características da interação social, das formas de comunicação e por um repertório repetitivo, estereotipado e restritivo de interesses e atividades. Nesta classificação, o autismo infantil é acompanhado por autismo atípico, síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância, transtorno hipercinético com retardo mental e movimentos estereotipados, síndrome de Asperger e distúrbio geral do desenvolvimento sem especificação. Cabe esclarecer que as classificações DSM-V (2014) e CID-10 não esgotam a descrição das áreas afetadas que podem ser observadas na clínica do autismo, uma vez que os diagnósticos psicopatológicos são muito inespecíficos devido à sua complexidade e falta de causas simples. Desse ponto de vista, é necessário levar em consideração outras contribuições nosológicas relacionadas ao autismo, como as propostas por Lorna Wing, que deram origem ao conceito de Espectro Autista, e por Angel Rivière, que expandiu esse conceito ao longo de seus estudos. Ambos os autores consideraram outras dimensões que não aparecem explicitamente como critérios nos manuais de diagnóstico. Gauderer (1997) explica que Wing3 diferenciou quatro dimensões principais de variação no espectro do autismo: (1) transtorno nas capacidades de reconhecimento social, (2) transtorno nas capacidades de comunicação social, (3) 3 Lorna Wing (1928 - 2014) foi uma médica psiquiatra inglesa, conhecida por seus estudos sobre autismo. 69 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br transtorno nas habilidades de imaginação e compreensão social (que compõe a chamada tríade de Wing4) e (4) padrões repetitivos de atividade. Duas ideias interessantes com consequências importantes podem ser extraídas do estudo de Wing e Gould: (1) o autismo, no sentido estrito, é apenas um conjunto de sintomas que podem ser associados a distúrbios neurobiológicos muito diferentes e a níveis intelectuais muito variados; e (2) existem muitos atrasos e alterações no desenvolvimento que são acompanhados por sintomas autistas sem realmente serem sintomas de autismo. De acordo com Leboyer (2005), Rivière elaborou o conceito de TEA com maior profundidade. Segundo este conceito, a consideração do autismo como um continuo de diferentes dimensões (e não como uma categoria única e bem definida) que ocorre em diferentes graus e em diferentes quadros de desenvolvimento, permite reconhecer ao mesmo tempo o que existe em comum e diferente entre pessoas autistas, ou seja, entender que todas apresentam alterações em maior ou menor grau em uma série de aspectos ou dimensões. Silva, Gaiato, e Reveles (2012) explicam que as relações estabelecidas entre o autismo, como transtorno nuclear e prototípico, os transtornos generalizados do desenvolvimento e transtornos do espectro do autismo podem ser observados na figura 1. Em primeiro lugar, qualquer diagnóstico de autismo também é um TGD e um TEA; Em segundo lugar, não se pode supor que um TGD seja estritamente um quadro de autismo, embora ainda seja um TEA; e, finalmente, umacriança com TEA, não pode ser entendida nem como um TGD nem como um quadro de autismo. 4 A Tríade do Autismo ou Transtorno do Espectro Autístico – TEA é responsável por um padrão de comportamento restrito e repetitivo, mas com condições de inteligência que podem variar do retardo mental a níveis acima da média. Instituto Inclusão Brasil. Disponível em: https://institutoinclusaobrasil.com.br/autismo-transtorno-espectro-autistico-tea/ 70 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br Figura 1: Relações entre autismo, distúrbios gerais do desenvolvimento e Espectro Autístico. Fonte: Adaptado de Silva, Gaiato, e Reveles (2012) O inventário do TEA, desenvolvido por Rivière, distingue um conjunto de doze dimensões que são alteradas naquelas pessoas que se consideram com autismo, e cada uma delas inclui quatro níveis de envolvimento, variando entre mais transtorno grave a menos grave. Leboyer (2005) explica que as doze dimensões que Rivière aponta são: (1) transtorno qualitativo das relações sociais, (2) transtorno das habilidades de referência conjunta (ação, atenção e preocupação), (3) transtorno das habilidades intersubjetivas e mentalistas, (4) transtorno das funções comunicativas, (5) transtorno qualitativo da linguagem expressiva, (6) transtorno qualitativo da linguagem receptiva, (7) transtorno de competência antecipatória, (8) transtorno de flexibilidade comportamental e mental, (9) transtorno de auto atividade, (10) imaginação e habilidades ficcionais, (11) transtorno de imitação e (12) transtorno de suspensão (capacidade de criar significantes). Espectro autista TGD Autismo 71 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br Silva, Gaiato, e Reveles (2012) apontam, por sua vez, seis fatores principais que dependem da natureza e expressão específica das alterações que as pessoas com TEA apresentam nas dimensões estão alteradas: a associação ou não do autismo ao retardo mental, a gravidade do distúrbio que apresentam, idade (momento evolutivo da pessoa), sexo (o transtorno autista afeta com menos frequência, mas com maior grau de alteração as mulheres do que os homens), a adequação e eficácia dos tratamentos utilizados e experiências de aprendizagem, e o compromisso e apoio da família. Leboyer (2005) argumenta que, para o TGD incluído nos manuais de diagnóstico, uma série de quadros clínicos que não aparecem neles poderia ser adicionada ao autismo: o fenótipo autístico ampliado (característica da personalidade com inabilidade social), o transtorno de aprendizagem de habilidades não verbais ou Síndrome hemisférica direita (transtorno que pode ser sofrido por crianças que falham no circuito escolar comum), Transtorno semântico-pragmático (interesse por parte dessas crianças em se comunicar com pessoas sem saber que para fazer isso é importante transmitir conteúdo na linguagem), ou um transtorno específico do desenvolvimento do módulo socioemocional (hipersociabilidade aparente sem levar em conta o que o outro pensa ou sente) e o DAMP (déficit de atenção, percepção e desenvolvimento da coordenação motora), entre outros. Nas palavras de Mello (2007), a noção de um TEA que pode ser associada a vários tipos de alterações pode ser muito útil do ponto de vista clínico e para uma perspectiva educacional. No primeiro aspecto, ela nos permite descobrir uma ordem abaixo da heterogeneidade desconcertante de traços autistas; no segundo, ajuda a entender como as pessoas com autismo ou condições relacionadas podem evoluir previsivelmente através do processo educacional. Também destaca a necessidade de fornecer recursos (por exemplo, especialização em determinados quadros) que podem não apenas ser aplicáveis a casos de autismo no sentido estrito, mas também a um grupo mais amplo de pessoas que, sem serem autistas, mostram traços de incapacidade social, comunicativa, inflexibilidade, deficiência simbólica e dificuldade em entender a própria ação. Os estudos atuais consideram a linguagem como um aspecto central a ser levado em consideração nas investigações realizadas para a compreensão e 72 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br tratamento do transtorno autista. Mello (2007) explica que com base no fato de que a aquisição da linguagem no autismo não ocorre por si só, é essencial um ensino explícito da linguagem e da comunicação com metodologia ativa, pois um avanço mínimo nesse sentido pode mudar a mente e o desenvolvimento de uma pessoa com autismo. A percepção de que ela pode conseguir coisas através das pessoas pode ser um avanço espetacular (por exemplo, levando a pessoa ao objeto que deseja). De acordo com Mello (2007), Rivière também enfatiza a importância do aspecto funcional da linguagem como um ponto fundamental sobre o código ou de sua estrutura: levando em consideração o contexto funcional para que o nível máximo de atividade comunicativa ocorra nas situações naturais da criança ou adulto. Embora o autismo continue sendo em grande parte um enigma e um desafio para a comunidade científica, é notável o crescimento exponencial da literatura e da pesquisa nas duas últimas décadas. Rivière (1995) atribui esses avanços a vários fatores, dentre os quais se destacam: avanços na pesquisa neurobiológica, o aperfeiçoamento progressivo das explicações psicológicas e os fatos experimentais que eles têm, a consideração do autismo como um distúrbio do desenvolvimento e a introdução do conceito de espectro autístico, a configuração de cada intervenção educacional cada vez mais eficaz e procedimentos de avaliação e diagnóstico, o consenso inter profissional cada vez mais rígido, as informações que as pessoas com autismo fornecem de dentro do transtorno, a incorporação de informações retrospectivas que as famílias fornecem para entender o transtorno e, finalmente, a pressão exercida pelas organizações nacionais e internacionais de pais e afetados para garantir uma qualidade adequada nos serviços necessários ao longo do ciclo de vida. ANÁLISE DO COMPORTAMENTO APLICADA: Surgimento, Definição e Princípios ABA é a abreviação para Applied Behavior Analysis.. Muitos definem a aplicação de ABA para crianças autistas como “aprendizagem sem erro”. A análise comportamental é uma abordagem científica para o estudo do 73 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br comportamento. De acordo com Santos (2015), como principais características, podemos citar que é interacional, uma vez que seu estudo se refere às relações comportamento-ambiente; analítico, porque busca identificar relacionamentos funcionais entre eventos comportamentais e ambientais; experimental, uma vez que tenta demonstrar que os eventos são responsáveis pela ocorrência ou não ocorrência do comportamento, manipulando variáveis; e pragmático, porque consiste em pesquisa básica e aplicada, e propõe-se que o entendimento permita a previsão e controle de eventos. Silva (2012) destaca que as pesquisas e experimentos relacionados à análise do comportamento começam no início dos anos 1920, com importantes precursores, como Thorndike, Pavlov, Watson e Skinner; e por volta de 1950 os postulados do behaviorismo e dos princípios de aprendizagem dos problemas de comportamento humano, destacando as produções de Skinner entre outros. Na década de 1970, com o surgimento de teorias cognitivas, muitos terapeutas comportamentais passaram a trabalhar a partir da estrutura cognitiva, descartando variáveis ambientais e enfatizando o processamento de informações. Por seu lado, o trabalho com a ABA mantém a tradição operante e se desenvolve usando osprincípios de aprendizagem aplicados ao desenvolvimento de comportamentos específicos e à avaliação de mudanças produzidas, ocupando- se com problemas relacionados especialmente à educação e intervenções terapêuticas em comportamentos problemáticos, como a automutilação presente em distúrbios graves, fobias, dependência de drogas, distúrbios alimentares e problemas sociais, como criminalidade. Silva (2012) explica, ainda, que os estudos nos anos 1960, que analisaram o autismo pela primeira vez em uma perspectiva comportamental, propondo que os problemas derivados do transtorno não tinham uma base emocional, mas eram o resultado de uma dificuldade de aprendizado, são precursores de um continuo de investigações cujo autor mais representativo é Lovaas5, que em 1987 realizou uma das primeiras avaliações da eficácia da ABA em transtornos do desenvolvimento. Lovaas comparou um grupo experimental de crianças que 5 Ole Ivar Lovaas (1932 - 2001) foi um psicólogo clínico considerado um dos pais da terapia para o autismo, chamado análise comportamental aplicada ou ACA, mais conhecida por sua sigla em inglês como ABA (análise comportamental aplicada). 74 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br receberam tratamento ABA por 40 horas por semana, durante 2 anos, com dois grupos de controle recebendo outros tratamentos, obtendo funcionamento normal de 47% dos casos em funcionamento normal, em comparação a 2% dos outros dois grupos. Petersen e Wainer (2011) afirmam que, embora os estudos de Lovaas sejam os mais citados, há outras evidências sobre a ABA que é relevante em termos de sua eficácia, como a revisão de Harris realizada em 1994 em vários estudos de pesquisa, que mostrou que mais de 50% das crianças autistas que participaram de programas pré-escolares usando ABA foram integradas com sucesso em salas de aula de crianças sem deficiência, com muito poucos requisitos para tratamento adicional. Petersen e Wainer (2011) consideram que existem vários aspectos que distinguem a ABA como disciplina: (1) é um modelo de pesquisa, uma vez que os terapeutas são eles próprios pesquisadores que fazem análises rigorosas do que uma pessoa faz e dos eventos que governam sua ação e seu trabalho estão constantemente sujeitos a controle e verificação; (2) o comportamento é o foco principal, uma vez que, nas análises comportamentais, os terapeutas não consideram variáveis como personalidade, sentimentos, cognições e atitudes, embora seja aceito que, após uma intervenção no comportamento, talvez o sujeito possa mudar seu comportamento, seus sentimentos e cognições; (3) a importância do condicionamento, uma vez que as contingências favoráveis a um determinado comportamento o tornarão um operador sempre pronto para procurar a consequência; (4) o tratamento direto de problemas comportamentais, uma vez que os terapeutas se concentram nos eventos ambientais que geram e mantêm comportamentos, registrando comportamentos focais e eventos que precedem e seguem as respostas por vários dias (linha de base) antes de iniciar qualquer tratamento. Em relação aos princípios do condicionamento, Silva (2012) explica sinteticamente que o condicionamento clássico (CC) e operante (CO) são formas básicas de aprendizado. O CC consiste em uma forma de aprendizado na qual dois eventos de estímulo são associados de tal maneira que a ocorrência de um deles prediz com segurança a ocorrência do outro. Condicionamento Operante (CO), por outro lado, é uma forma de aprendizado em que os organismos 75 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br aprendem a relação entre seu comportamento e suas consequências; assim, a probabilidade de uma dada resposta ocorrer muda dependendo do fato de que os comportamentos são reforçados (a taxa de comportamento é reforçada ou aumentada) ou são inibidas (a taxa de resposta é enfraquecida ou diminuída). Baseado nos conceitos estabelecidos por Wing, Leboyer (2005) lista alguns princípios básicos de aprendizagem em relação ao tratamento de comportamentos inapropriados no autismo, entre os quais ele menciona: (1) o comportamento que se recompensa é mais provável seja repetido do que aquele que não é reforçado; o importante nas pessoas autistas é saber o que conta como recompensa para elas; (2) o momento da recompensa é essencial para o paciente associá-lo ao comportamento, e deve estar completamente claro para o paciente qual comportamento produz a resposta; (3) novas habilidades são mais facilmente aprendidas em etapas divididas; (4) se um comportamento inadequado não puder ser evitado, ele também não deve ser recompensado e, se possível, uma atividade diferente e mais construtiva deve ser facilitada e recompensada para substituir o comportamento inadequado. REFORÇADORES Petersen e Wainer (2011) esclarecem que reforçadores são estímulos que reforçam comportamentos, que são definidos com base em seus efeitos sobre eles, não em suas características inerentes. Em situações envolvendo condicionamento operante, a probabilidade que ocorra uma resposta determinada muda dependendo das consequências. Reforços positivos aumentam a chance de um comportamento ocorrer novamente, enquanto reforçadores negativos tornam um comportamento menos provável fortalecer outros comportamentos ou respostas que os levam a evitá-los. No que diz respeito aos reforços negativos, deve ser esclarecido que o reforço negativo não é punição; o reforço negativo é prévio à resposta de fuga ou escape que deve ser reforçada (por exemplo, acordar cedo – antes de o alarme disparar – é reforçado negativamente pelo som do despertador que se evita ouvir); enquanto a punição é um estímulo aversivo que ocorre após a diminuição do comportamento (por exemplo, descontos no trabalho para chegadas tardias). É 76 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br importante observar que a punição não é usada pelas técnicas de modificação de comportamento, uma vez que há muito se provou que comportamentos geralmente punidos não são eliminados, mas suprimidos, enquanto a punição é uma ameaça presente e que também pode aumentar a agressividade, especialmente em crianças. Petersen e Wainer (2011) destacam a importância dos reforçadores na implementação das técnicas ABA e propõem regras básicas que devem ser levadas em consideração na escolha dos reforçadores para uso em programas de intervenção, para que eles sejam eficazes. Os reforçadores devem ser imediatos, ou seja, devem ser reforçados imediatamente após o comportamento desejado, especialmente se envolver novos comportamentos; eles devem ser contingentes, ou seja, não devem ocorrer por si mesmos, mas apenas se o comportamento desejado ocorrer; eles também devem ser variados, novos e adequados à idade, práticos e naturais para serem facilmente aplicados. Os tipos de intensificadores podem ser primários, incluindo alimentos e bebidas, como doces, batatas fritas ou refrigerantes; tangíveis, como brinquedos que a criança gosta ou troca mais tarde por algo desejado; ou podem ser sociais, como expressões de parabéns, sorrisos, aplausos ou cócegas. Em relação às objeções sobre o uso de reforçadores, Petersen e Wainer (2011) sustentam que estes se originam quando as pessoas testemunham um mau uso deles e sem planos para desencorajar seu uso. Eles alegam que todas as pessoas se sentem satisfeitas por meio de reforços que operam ao longo da vida: as pessoas são motivadas por férias, pagamento imediato, hobbies ou companhia de outras pessoas. Eles afirmam que às vezes há oposição ao seu uso por causa da crença equivocada de que os reforçadores constituem suborno. O suborno está induzindo a fazer algo inadequado, na ABAseria esperar até que a pessoa se recuse a fazer alguma coisa e depois negociar uma recompensa, modalidade que não faz parte do trabalho dos reforçadores, pois baseia sua aplicação nos princípios de aprendizado e condicionamento. Outras questões sobre o uso de reforçadores estão baseadas na crença de que o paciente se tornará dependente deles, e isso ocorre apenas quando as recompensas não são desencorajadas adequadamente e quando os motivadores 77 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br naturais não são incluídos no programa. As técnicas da ABA propõem programas que começam com os reforços apropriados com frequência e que rapidamente devem ser desencorajados. ESTRUTURAÇÃO DO AMBIENTE O tratamento proposto pela ABA requer um ambiente educacional altamente estruturado e com alta demanda interpessoal, o que implica estabelecer objetivos em termos comportamentais, analisando funcional e sistematicamente as variáveis relevantes e registrando comportamentos e condições estimulantes. O conceito de estruturação resume uma necessidade fundamental em pacientes com autismo, pois permite perceber claramente contingências e, portanto, aumentar suas possibilidades de aprendizado e diminuir seus comportamentos de isolamento e estímulo. De acordo com Petersen e Wainer (2011), no autismo, a alteração desses mecanismos de percepção de contingência seria a base para explicar deficiências na competência e no aprendizado interativo. A partir dessa alteração também se deduz a falta de valor dos reforçadores sociais, a dificuldades de antecipação e perturbação dos mecanismos do comportamento intencional e a própria lentidão dos processos operacionais. Por outro lado, Petersen e Wainer (2011) destacam que, embora os ambientes estruturados produzam efeitos positivos no comportamento das crianças autistas, pois facilitam a percepção de contingências, também podem, devido à sua artificialidade, dificultar a generalização dos aprendizados. Nesse sentido, ele propõe que o nível de estruturação do ambiente seja inversamente proporcional ao nível cognitivo e social da criança autista, a fim de garantir novas aquisições comportamentais além da situação escolar ou terapêutica. TÉCNICAS Para aumentar a frequência de comportamentos apropriados e subsequentemente transformá-los em hábitos, algumas das técnicas de ABA 78 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br utilizadas, de acordo com Petersen e Wainer (2011) são: reforço positivo, que consiste em dar uma consequência às respostas corretas, que podem ser um reforço social, primário ou tangível; modelagem, que é a indicação da resposta correta quando a resposta não ocorre ou está incorreta e seu reforço subsequente quando é feita; modelagem, que se baseia no movimento passo a passo, recompensando cada abordagem do comportamento desejado e não apenas após o comportamento final; e encadeamento, pelo qual uma sequência de pequenas partes de uma atividade é estabelecida, como uma cadeia de respostas na qual a recompensa é entregue após a última resposta da mesma. Técnicas para reduzir os comportamentos tais como agressão, auto- agressão, birras, ou seja, para tratar comportamentos inadequados, se aplicam as técnicas de extinção, reforço diferencial, saciedade, custo de resposta, tempo limite ou sobrecorreção; as quais são descritas a seguir. Extinção. Petersen e Wainer (2011) esclarecem que consiste em suspender massivamente o reforço que mantém determinado comportamento. Atenção, aprovação ou reforçadores materiais deixam de seguir contingentemente o comportamento a ser reduzido. Seu objetivo é a eliminação de comportamentos que são mantidos por consequências específicas. Como efeito inicial produz um aumento na frequência e intensidade do comportamento, ou um aumento nos comportamentos agressivos ou emocionais, chamados surto de extinção; portanto, é importante persistir na aplicação, pois garante sua eficácia. Reforço diferencial de outros comportamentos (DRO) ou comportamentos incompatíveis (DRI). Petersen e Wainer (2011) reforçam o uso reforço positivo para manter ou gerar comportamentos diferentes ou incompatíveis com o que se deseja eliminar, ignorando o último. Seu objetivo é a eliminação de comportamentos inapropriados quando observados no repertório do sujeito outros comportamentos adequados incompatíveis com o primeiro. Como efeito, leva à redução e eliminação de comportamentos inadequados e ao aumento de comportamentos alternativos apropriados. Saciedade. Para Petersen e Wainer (2011) consiste na apresentação de um reforçador de forma tão massiva que perde seu valor. Isso pode ser feito com o sujeito emitindo o comportamento que deve ser massivamente reduzido 79 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br (saciedade da resposta ou prática negativa), ou fornecer o reforço que mantém o comportamento em grande quantidade e perde seu valor recompensador (saciedade do estímulo). Para aplicar essa técnica, é necessário identificar e controlar o reforçador que mantém o comportamento e não pode ser aplicado se o comportamento é controlado por múltiplos reforçadores ou se são sociais. No caso de comportamentos autolesivos, ele deve ser combinado com a implantação ou o fortalecimento de comportamentos alternativos. Custo de resposta. Ainda de acordo com os autores Petersen e Wainer (2011), trata-se de remover algum reforço positivo já adquirido, dependente da aparência de comportamento inadequado. Se não foi identificado nenhum reforçador que possa ser removido, o sujeito poderá receber um reforçador adicional que então ele pode ser retirado quando emitir uma conduta inadequada. A eficácia desta intervenção depende da magnitude do reforçador removido e de que o mesmo não seja facilmente substituível. Antes de aplicar esta intervenção, recomendam-se considerar procedimentos menos aversivos, como extinção ou reforço diferencial. Intervalo ou tempo limite. Petersen e Wainer (2011) dizem que consiste em retirar as condições do ambiente que permitem obter reforços ou remover a pessoa delas durante certo período, de forma contingente a emissão do comportamento desadaptado. O objetivo é a eliminação de comportamentos mantidos pelo reforço de situações que não podem ser suspensas e devem ser aplicadas de maneira consistente, mesmo que a pessoa se queixe, resista ou prometa se comportar bem. A zona de isolamento deve estar próxima o suficiente para poder aplicar o tempo limite imediatamente à emissão do comportamento inadequado. Hipercorreção ou sobrecorreção. Segundo Petersen e Wainer (2011), a ideia central é compensar excessivamente as consequências de um comportamento inadequado ou corrigir para desencorajá-lo. Pode ser aplicada como uma sobrecorreção restauradora, que consiste em o sujeito restaurar o dano que ele produziu e corrigir ou melhorar o estado original antes do ato; ou como uma correção excessiva da prática positiva, que requer a emissão repetida de um comportamento no qual a restituição não é possível (por exemplo, 80 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br estereotipias), mas é possível a prática de um comportamento desejável e incompatível fisicamente a indesejável. ADULTOS AUTISTAS E AS TÉCNICAS ABA O autismo é um transtorno do desenvolvimento que acompanha a vida inteira de um indivíduo, e as pessoas com autismo têm a mesma expectativa de vida que qualquer pessoa fora do espectro. Apesar disso, são poucos os adolescentes e ainda menos adultos com diagnóstico de autismo; o diagnóstico errado ou a falta dele é comum em uma síndrome com uma declaração científica tão recente que até os anos 1980 foi diagnosticadacomo esquizofrenia. Por outro lado, é um diagnóstico feito principalmente em crianças, portanto, se os sintomas não tivessem sido observados antes dos 36 meses, não se considerava a possibilidade da presença de autismo. No entanto, a falta de diagnósticos não sugere que o autismo em adultos não tenha sido considerado. Mello (2007) afirma que entre adolescentes e adultos, as diferenças no padrão de habilidades e comportamento podem ser maiores do que entre as crianças com transtornos autistas. Em um extremo, algumas mudam tão pouco que continuam a ter os mesmos problemas que as crianças pequenas; no outro, alguns adolescentes podem progredir de tal maneira que podem se integrarem ao sistema educacional comum e se tornarem adultos relativamente independentes. No que diz respeito a comportamentos inadequados, Mello (2007) afirma que, mesmo nas pessoas mais deficientes e inconscientes de situações sociais, a adolescência traz consigo uma resistência em aceitar a autoridade dos adultos e uma decisão em não ceder. Naqueles com capacidade limitada, esses sentimentos podem ser mostrados em um retorno às birras, agressões e comportamentos inadequados dos primeiros anos, o que provocará mais reações negativas, tanto em público quanto na família, que o mesmo comportamento de criança pequena. Mello (2007) sugere que, como na infância, devem-se organizar programas para cada dia em particular, previsíveis, apresentados visualmente e ajustados aos interesses, dificuldades, motivações e atitudes da idade. 81 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br Estes últimos são precisamente algumas das características (mencionadas acima) dos programas propostos pela ABA. Embora a maioria das intervenções seja baseada em crianças, como essas crianças crescerão adultas com Transtorno do Espectro do Autismo, elas precisarão de apoio individualizado, adaptado ao seu nível e desenvolvimento, sendo os adultos com menos linguagem e autonomia que requerem opções mais completas e individualizadas. Embora as pessoas autistas raramente possam ser totalmente emancipadas quando adultas, elas têm muitas possibilidades de aumentar sua comunicação, obter realizações escolares, aumentar sua independência e melhorar seus comportamentos através da aplicação escrupulosa do método ABA por equipes profissionais adequadamente capacitadas. Os adultos autistas aprendem com o uso das técnicas ABA o desenvolvimento de numerosos trabalhos, geralmente rejeitados por outros por suas características de observação, repetição, perfeição e cuidado obsessivo. Trabalhos simples como limpar, organizar parques, embalar envelopes, distribuir folhetos, passar roupa e fazer artesanato são tarefas que podem ser realizadas com uma dedicação notável. Eles também podem ser classificadores excelentes e metódicos e podem suportar horas de trabalho que outros normalmente rejeitam. CONCLUSÃO De acordo com os objetivos estabelecidos para este estudo, as técnicas derivadas da abordagem ABA foram descritas e analisadas e relacionadas aos comportamentos inadequados de pessoas autistas. Quanto ao aspecto teórico, essa abordagem do autismo, levando em consideração as necessidades de um adulto, mostra que a maioria dos estudos e desenvolvimentos teóricos é baseada em crianças e que somente nos últimos anos há movimentos de organizações e grupos de pais orientados a obter cuidados adequados e serviços durante todo o ciclo de vida e não apenas durante a infância. Sobre isso, vale ressaltar a importância e a necessidade de atenção específica aos adultos autistas, pois é muito provável que adultos autistas sejam encaminhados para centros neuropsiquiátricos, perdendo não apenas a 82 Estudos IAT, Salvador, v.6, n.1, p. 63-83, jun., 2021. http://estudosiat.sec.ba.gov.br possibilidade de serem independentes ou de trabalhar – levando em consideração tudo que uma pessoa com autismo pode fazer se tiver apoio adequado –, mas também a possibilidade de manter as habilidades alcançadas, mesmo quando estão dentro de uma estrutura institucional. Em relação ao desenvolvimento do trabalho, se nota em primeiro lugar a importância da estruturação das atividades e do ambiente para a implementação eficaz das técnicas de ABA e, em segundo lugar, compreende-se que o é essencial o conhecimento e experiência por parte dos terapeutas, uma vez que quanto mais experientes, mais facilmente irão conseguir os resultados propostos nas intervenções, usando o tom de voz apropriado ou a clareza nas instruções. Como conclusão geral, o que é observado na pesquisa corrobora o que estudos atuais afirmam sobre a necessidade de integração e transdisciplinaridade nos tratamentos e na aprendizagem. A aplicação de técnicas, tratamento farmacológico, exame clínico de processos neuropsicológicos e avaliação clínica permanente compõe um tratamento complexo cuja principal característica deve ser a individualização. REFERÊNCIAS AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5.ed. 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Recebido em Abril/2021 Aprovado em Maio/2021