Buscar

162255811960b645a7efc03

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 100 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 100 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 100 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E 
DO ADOLESCENTE: A EXPLORAÇÃO DO 
TRABALHO INFANTIL 
SUMÁRIO 
1 VISÃO HISTÓRICA SOBRE O PAPEL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DENTRO 
DA SOCIEDADE ....................................................................................................................................... 3 
1.1 Aspectos históricos ..................................................................................................................... 3 
1.2 Síntese histórica do trabalho infantil ...................................................................................... 5 
1.3 A realidade brasileira .................................................................................................................. 10 
1.4 Evolução histórica dos direitos egarantias constitucionais...............................................12 
2
 
1.5 A criança e o adolescente ......................................................................................................... 16 
2 PROTEÇÃO SOCIAL E JURÍDICA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO BRASIL ........ 20 
2.1 A proteção nos primeiros séculos .......................................................................................... 21 
2.2 Asinstituições para a criança eoadolescente desassistidos apartir do século XX.. 24 
2.3 Princípio constitucional de proteção ..................................................................................... 31 
2.3.1 Direitos Fundamentais .................................................................................................................. 31 
2.3.2 Direitos e garantias fundamentais ............................................................................................... 31 
2.3.3 Direitos humanos ........................................................................................................................... 33 
2.4 Conceito de direitos humanos ..................................................................................................... 35 
3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE........................... 41 
3.1 Histórico dos direitos humanos no Brasil e no mundo .................................................... 43 
3.2 A história dos direitos humanos no Brasil ........................................................................... 46 
3.3 O menor na sociedade brasileira e suas garantias constitucionais .............................. 50 
3.4 O Estatuto da Criança e do Adolescente e a teoria da proteção integral ....................... 54 
4 TRABALHO INFANTIL ................................................................................................................ 57 
4.1 Considerações iniciais ............................................................................................................... 57 
4.2 Do direito à profissionalização e à proteção no trabalho ................................................. 60 
4.3 Normas vigentes sobre otrabalho infantil ........................................................................... 66 
4.4 A eficácia das normas jurídicas sobre o trabalho infantil ................................................ 67 
5 POSSIBILIDADES E DESAFIOS............................................................................................... 76 
5.1 Possibilidades ............................................................................................................................... 76 
5.2 Desafios ........................................................................................................................................... 79 
5.3 Diretrizes fundamentais ............................................................................................................. 88 
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 96 
1 VISÃO HISTÓRICA SOBRE O PAPEL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NA 
SOCIEDADE 
 
 
 
Aspectos Históricos 
 
 
Desde a Idade Média, o estudo da história da infância 
leva-nos à conclusão de que, até o século XVI, o sentimento de 
infância era praticamente inexistente, pois adultos e crianças 
compartilhavam os mesmos espaços e jogos, como se, entre eles, 
não houvesse distinção. Nessa época, a criança era vista como 
um adulto em miniatura e era reconhecida como adulta muito 
cedo. 
O ano de 1693, mais do que uma data, foi o marco 
inicial, historicamente registrado, da primeira tentativa de 
providência em favor do menor desvalido da Colônia Portuguesa. 
A Carta Régia, datada de 12 de dezembro de 1693, ordenou que as crianças fossem 
alimentadas pelos bens do Conselho do Reino. A ordem não foi cumprida, pois a Câmara alegou 
falta de recursos. 
Com o aumento da exposição de crianças pelas ruas e casas de família – e a 
dificuldade material da Câmara em ampará-las, o governador Antônio Paes Sande enviou 
petição ao rei, nos anos finais do século XVII, solicitando providências contra os atos desumanos 
deabandonarcriançaspelasruas, ondeeramcomidas porcães, mortasdefrio,fomeesede. 
Mais uma data a registrar: 1734. Ignácio Manuel da Costa Mascarenhas, vigário da 
freguesia da Candelária, no Rio de Janeiro, requereu licença para acolher trinta órfãos e pobres, 
paraviverem “emclausura até tomar seu Estado”, sobo beneplácito dobispo. Masaobranão 
foi adiante. O governador José da Silva Paes exigiu que acasasesujeitasse à fiscalização do 
governador, não do bispo, com o que o vigário não concordou. 
Outra data de relevo: 1738, quando o padre José de Anchieta fundou a Santa Casa do 
Rio de Janeiro, que até hoje existe e acolhe crianças, com o fim de servir de amparo aos 
inocentes abandonados ao nascer pela ingratidão de quem lhes deu a existência. 
No século XVII, o sentimento de família foi acentuado e, gradativamente, novas regras 
de cuidado com a criança foram impostas e, além do aprendizado, surgiam preocupações com a 
escolaridade. De acordo com Josiane R. Petry Veronese, os filhos dos senhores feudais 
passavam por uma rígida educação católica, sendo levados ao sacramento do matrimônio em 
idade muito tenra – especialmente as meninas, que eram vendidas por seus pais em troca de 
dotes ou lotes de terra. Em contraposição, os descendentes de servos acabavam dando 
continuidade aos serviços prestados por seus pais ao senhor feudal. 
 
“Desde muito cedo o jovem era separado de sua família e colocado sob um sistema 
rígido de educação, no qual desenvolvia, por meio de exercícios coletivos, suas 
aptidões físicas e intelectuais para compor o corpo e alcançar o status do cidadão 
grego. Esta condição representava, na época, a possibilidade de participar das 
atividades sociais da cidade, de construir uma família e de vir a ser um mestre na arte 
de guerrear”.1 
 
Com o surgimento da burguesia, a construção de uma nova estrutura familiar foi 
estimulada. O sentimento de infância extrapolava a nobreza e a burguesia, atingindo também a 
classe proletária. 
No século XIX, com a Revolução Industrial, houve a consolidação de um novo modelo 
defamília e, noquese refere àinfância, ocorreu umaregressão à Idade Média, quando a mão 
de obra infantil foi requisitada e surgiu certa “precocidade” na passagem para a idade adulta. 
Camponeses e artesãos de todas as idades foram colocados em ambientes com disciplina 
rígida, serviços repetitivos, trabalho ininterrupto, frio calor e muito ruído. 
Historicamente, desde os tempos bíblicos, crianças e adolescentes sempre 
trabalharam. Há relatos, inclusive, de Jesus ajudando o pai carpinteiro. Na história das 
civilizações, isso é mostrado não de forma imoral, mas como um processo normal do 
desenvolvimento do cidadão grego. Havia a prostituição masculina como meio de exploração, 
que se encontrava praticamente confinada ao grupo dos adolescentes, no período durante o qual 
pessoas dessa faixa etária eram consideradas desejáveis, objeto das experiênciaspromíscuas 
dos mais velhos, resultando em participação expressiva na sociedade. Para os gregos, esse tipo 
de prostituição masculina não era objeto de escândalo. 
 
“Apesar de denominada relação “homossexual educativa”, enaltecedora da 
superioridade masculina, da união dos fortes, dos hábeis com seus iguais, tal 
relação revelava um lado luxurioso, perverso e dominador dos mestres em relação 
aos seus alunos, que lhes serviam como objetos de prazer”.2 
 
 
 
 
 
1 VERONESE, Josiane Rose Petry. Papel da criança e do adolescente no contexto social: uma reflexão 
necessária. [S.l.: s.n.], 2000. 
 
2 Ibidem. 
 
 
 
 
 
 
Como vimos, quando falamos em trabalho infantil contra crianças e adolescentes, vem- 
nos à cabeça, por exemplo, o trabalho na agricultura ou nas carvoarias e acabamos nos 
esquecendo da prostituição infantil. No Brasil, atualmente, as crianças brasileiras são “objeto” de 
oferecimento no mercado nacional e internacional para a prática de atos sexuais. O Brasil – 
principalmente o Rio de Janeiro e o Nordeste – é mundialmente conhecido como polo de turismo 
sexual. 
 
“A infância tornou-se obscura e isenta de qualquer relevância no âmbito social. Era 
a ausência do chamado ‘sentimento da infância’, denominado por Ariès, que assim 5 
o descreve: ‘O sentimento da infância não significa o mesmo que afeição pelas 
crianças: corresponde à consciência da particularidade infantil, essa particularidade 
que distingue essencialmente a criança do adulto, mesmo jovem”.3 
 
 
 
 
 
 
1.1 Síntese histórica do trabalho infantil 
 
 
 
 
 
Em épocas remotas, as crianças e os adolescentes eram considerados os 
trabalhadores ideais, pois, por um salário insignificante, alojamento e remuneração menor que a 
dos adultos, produziam igual ou mais que os adultos. No trabalho, as crianças deveriam ser 
rápidas, o que a sociedade considerava admirável, maravilhando-se ao ver uma criança de 6 
anos ganhando a vida comoadulto. 
Registre-se que o trabalho do menor é muito antigo na História. O Código de 
Hamurabi, há dois mil anos, tinha algumas medidas de proteção aos menores aprendizes. No 
Egito, sob as dinastias XII a XX, todos os cidadãos, ricos ou pobres, nobres ou não, eram 
obrigados a trabalhar, e os menores estavam incluídos nesse regime geral, desde que tivessem 
relativo desenvolvimento físico. 
Na Grécia e em Roma, os filhos dos 
escravos também eram propriedade dos senhores, 
sendo obrigados a trabalhar para o dono ou para 
terceiros. Nessa hipótese, o soldo era revertido em 
 
 
3 ARIÉS, Phillippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 1981. 156 p. 
 
 
 
 
 
 
prol do senhor. Com o início das corporações romanas, os filhos dos trabalhadores livres 
laboravam como aprendizes para, no futuro, exercer o mesmo ofício paterno. 
Na Idade Média, com o surgimento das corporações de ofício, o menor laborava sem 
qualquer salário ou proteção, durante anos a fio. Já no Brasil, com o predomínio do trabalho 
escravo, não havia qualquer proteção legal. Os filhos dos escravos eram utilizados em atividades 
domésticas, agrícolas ou nas indústrias rudimentares. 
Na Inglaterra do século XVIII, germinaram-se as sementes da Revolução Industrial, o 6 
que alterou profundamente não só o processo produtivo, como a introdução das máquinas, e, 
principalmente, o mercado de mão de obra. Frise-se que, no início, esse tipo de mercado foi 
marcado por uma concorrência acirrada, violenta até, entre trabalhadores adultos do sexo 
masculino. 
A evolução tecnológica crescente possibilitou a introdução de novas máquinas no 
mercado produtivo e, consequentemente, a dispensa em massa de operários. Cresceu, então, o 
número de marginalizados e excluídos, com o aproveitamento e a exploração do trabalho de 
crianças e adolescentes. Poucos abusos dos direitos humanos eram tão universalmente 
praticados como o trabalho infantil. Destacam-se: 
França. Inicia a assistência à infância, com as Leis de 1.841 e 1.848, assegurando aos 
menores trabalhadores, com a lei datada de 19/03/1874, a idade de admissão ao emprego, o 
tempo máximo da duração do trabalho, a proibição do serviço noturno e nas minas subterrâneas. 
Bélgica. Lei datada de 28/05/1888 registra um conjunto de medidas protetoras. 
 
Inglaterra. Desde 1802, por iniciativa de Roberto Peel, existia uma lei de proteção aos 
menores trabalhadores nas indústrias têxteis. 
Alemanha. Em 1891, expedia um Código Industrial (Gewerbeordnung), incluindo 
proteção aos menores trabalhadores. A Suíça teve uma lei em 1877, a Áustria em 1855, a 
Holanda em 1889, Portugal em 1891 e a Rússia, em 01/07/1881, expedia sua primeira lei de 
proteção aos menores. 
Segundo Mario de la Cueva, a proteção aos menores é o ato inicial do direito do 
trabalho, pois foi o Moral and Health Act, expedido por Robert Peel, em 1802, a primeira 
disposição concreta que corresponde à ideia contemporânea do direito do trabalho. Ao manifesto 
de Peel, traduzido no protesto “Salvemos os menores”, lema de campanha pela proteção legal, 
culminou a redução da jornada diária de trabalho do menor para 12 horas. 
Também na Inglaterra, com a ajuda de Robert Owen, foi aprovada lei, em 1819, 
tornando ilegal o emprego de menores de 9 anos e restringindo o horário de trabalho dos 
adolescentes com menos de 16 anos para 12 horas diárias, nas atividades algodoeiras. Na 
Inglaterra, em 1833, provocada pela Comissão Sadler, uma lei proibiu o emprego de menores de 
9 anos e limitou a jornada dos menores de 13 anos em nove horas, além de vedar o trabalho 
noturno. 
Na França, em 1813, proibiu-se o trabalho de menores em minas; em 1841, vetou-se o 
emprego de menores de 8 anos e foi fixada em oito horas a jornada máxima dos menores de 12 
anos e, em 12 horas, a dos menores de 16 anos. Já na Alemanha, em 1839, foi votada lei que 
proibia o trabalho de menores de 9 anos e restringia a 10 horas a duração do trabalho dos 
menores de 16 anos. A lei industrial de 1869 fixou a idade mínima de admissão em 12 anos. 
Em 1886, na Itália, foi aprovada a lei que fixou em 9 anos a idade mínima para o 
emprego e proibiu certos tipos de trabalho para o menor. A partir disso, a legislação trabalhista 
protege o menor ao fixar normas tutelares proibitivas destinadas à idade mínima para seu 
trabalho, com relação aos ambientes que possam prejudicar sua saúde, integridade física e 
formação moral e a valorizar diretrizes voltadas para a sua educação e qualificação profissional. 
O governo federal brasileiro, por intermédio do Decreto nº 1.313, de 17 de janeiro de 
1890, fixou uma série de restrições ao trabalho do menor nas fábricas do Distrito Federal, as 
quais não foram aplicadas. Houve várias tentativas: o Decreto Municipal nº 1.801, de 11 de 
agosto de 1917; o Decreto nº 16.300, de 1923, o qual aprovou o Regulamento do Departamento 
Nacional de Saúde Pública, dispondo que os menores de 18 anos não poderiam trabalhar mais 
deseis horas em um período de 24 horas; essa proibição foi reproduzida na Lei nº 5.083, de 1º 
de dezembro de 1926. 
Em 12 de outubro de 1927, com o Decreto nº 17.943-A foi aprovado o Código de 
Menores, constando das seguintes proibições: a) trabalho para o menor de 12 anos; b) trabalho 
noturno aos menores de 18 anos; c) exercício de emprego, para os menores de 14 anos, na 
praça pública. 
O Decreto nº 22.042, de 3 denovembrode 1932, traçou as regras quanto aotrabalho 
domenor naindústria, sendoaidade mínima de 14 anos, além deserobrigatória aexibição de 
documentos para a admissão: certidão de idade; autorização dos pais ou responsáveis; atestado 
médico, de capacidade física e mental; prova de saber ler, escrever e contar. 
7 
 
 
 
 
 
 
Tornou-se obrigatória a apresentação de uma relação de empregados menores. Aos 
analfabetos, assegurou-se o tempo necessário para a escola. Proibiu-se o trabalho nas minas 
para os menores de 16 anos. O Decreto-Lei nº 1.238, de 2 de maio de 1939 (regulamentado peloDecreto nº 6.029, de 26 de julho de 1940), instituiu os cursos de aperfeiçoamento profissional, e 
proporcionou aos menores trabalhadores o direito à frequência. Com a educação profissional 
dos 18 aos 21 anos, o Decreto-Lei nº 2.548 permitiu a redução do salário. 
O Decreto-Lei nº 3.616, de 13 de setembro de 1941, para Segadas Vianna, foi a 
verdadeira lei de redenção do menor trabalhador. Mantidas as disposições das leis anteriores, 
foram elas aprimoradas. Assim, por exemplo, dispunha o art. 4º: “Quando o menor de 18 anos 
for empregado em mais de um estabelecimento, as horas de trabalho em cada um serão 
totalizadas”. Por esse decreto-lei, foi, ainda, instituída a carteira de trabalho do menor. 
No âmbito da Organização Internacional do Trabalho (OIT), houve uma série de 
convenções sobre o trabalho do menor. São elas: a) nº 5, de 1919, revista pela de nº 59, de 
1937, idade mínima de 14 anos para admissão em trabalhos industriais; b) nº 6, de 1919, o 
trabalho noturno na indústria; c) nº 7, de 1920, idade mínima de 14 anos para admissão no 
trabalho marítimo, sendo revista em 1936; d) nº 10, de 1921, idade mínima de admissão nos 
trabalhos agrícolas, vedando ocupá-los durante o horário de estudo nas escolas; e) nº 15, de 
1921, idade de 18 anos para admissão como paioleiros ou foguistas; f) nº 16, de 1921, os 
menores de 18 anos deveriam ser submetidos a exame médico antes de ingressar em empregos 
a bordo, com novo exame a cada ano; g) nº 33, de 1932, a idade mínima de 15 anos para 
admissão nos trabalhos nãoindustriais; h) nº 77, de 1946, a obrigação do exame médico para 
admissão de emprego na indústria; i) nº 79, de 1946, a limitação do trabalho noturno em 
atividades não industriais; j) nº 87, de 1949, orientação profissional; l) nº 96, admissão nos 
trabalhos subterrâneos das minas de carvão; m) nº 112, de 1959, idade mínima para o trabalho 
na pesca. 
As Convenções da OIT, relativas à idade mínima para o trabalho em várias atividades, 
foram englobadas pela Convenção nº 138, de 1973, a qual, em seu art. 1º enuncia: 
 
“Todo País-Membro, no qual vigore esta Convenção, compromete-se a seguir uma 
política nacional que assegure a efetiva abolição do trabalho infantil e eleve, 
progressivamente, a idade mínima de admissão a emprego ou a trabalho a um nível 
adequado ao pleno desenvolvimento físico e mental do jovem. A idade mínima é de 
15 anos (art. 2º, § 3º), admitindo, em caráter excepcional, a fixação da idade em 14 
anos (art. 2º, § 4º)”. 
 
 
 
 
 
 
 
A Convenção nº 182, de 1997, aborda pormenores sobre as piores formas do trabalho 
infantil, vedando-as e solicitando medidas para a sua eliminação: 
 
“Entre as piores formas de trabalho infantil, compreensivas de crianças com até 18 
anos, incluem-se a escravidão e práticas análogas, como a venda e tráfico de 
crianças, o trabalho forçado ou obrigatório, inclusive em conflitos armados, o 
recrutamento para a prostituição ou práticas pornográficas, para produção e tráfico 
de entorpecentes, o trabalho que possa causar danos à saúde, à segurança ou à 
moralidade das crianças. O Estado, as organizações de trabalhadores e 
empregadores, conjuntamente, devem definir os tipos que se designarão de piores 
formas de trabalho, revisando-os periodicamente, e localizar onde ocorre a prática a 
ser abolida. A educação é, declaradamente, o antídoto a ser ministrado pelo Estado, 
com políticas públicas efetivas e com um plano de ação para eliminar, como medida 
prioritária, essas modalidades detrabalho.4 
 
 
Apontamos a “Declaração dos Direitos da Criança”, assinada em Genebra em 1924, 
que, mais tarde, foi acatada pela “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, de 10/12/1948. 
As Convenções de número 5 e 6, de Washington (1935), fixaram em 14 anos a idade para o 
ingresso do menor no mercado de trabalho, bem como estabeleceram a proibição de trabalhos 
considerados prejudiciais à saúde física e mental, à moralidade e à perspectiva educacional da 
criança. 
No plano nacional, as normas jurídicas que tutelaram o trabalho da criança e do 
adolescente têm marco inicial relevante o Decreto nº 432, de 12/11/1935, que recepcionou os 
princípios das mencionadas convenções. Observando a recente história da civilização, 
percebemos que dirigentes e representantes de nações têm-se reunido em encontros 
internacionais, manifestando preocupações com o problema da criança, que, pela sua gravidade, 
envergonha o adulto e fere a consciência do homem de bem. 
Apesar de convenções, tratados, declarações, convênios e tantos outros documentos, 
nesse segmento, a humanidade ainda não saiu do campo das intenções relativamente à 
exploração do trabalho infanto-juvenil. Nesse quadro triste, emoldurado pela fome, as crianças 
são incorporadas no mercado produtivo a baixos custos. Envenenado pela cobiça, atacado pela 
febre do ouro, o empresário no início da Revolução Industrial, aviltando os salários, criou em 
torno de si um exército de miseráveis.5 
Àquela época da Revolução Industrial, a jornada de trabalho alcançava o limite de 18 
horas diárias nos subsolos das minas, onde as condições higiênicas eram deploráveis, 
 
 
4 TEIXEIRA FILHO, João de Lima et al,,op. cit., 1007 p. 
 
5 OLIVEIRA, Dris. O trabalho infanto-juvenil no direito brasileiro. OIT, 193. 16 p. 
 
 
 
 
 
 
 
proporcionando o surgimento de doenças com deformações físicas, em operários adultos e em 
crianças que só se diferenciavam pelo salário recebido. Apesar de absorver as ideias liberais 
que animaram as revoluções americana, de 1776, e francesa, de 1789, a vida prática mostrava 
exemplos de leis que não expressavam o sentimento de direito e de justiça, inscrito na 
consciência dos homens de bem, visto que a evolução moral do homem não acompanha na 
mesma velocidade, sua evoluçãointelectual. 
A Europa toda escureceu e não foi apenas pela fumaça liberada por suas chaminés, 
mas principalmente pelo pensamento obscurecido dos homens fascinados pelo ouro, que não 
hesitaram em submeter crianças de até 7 anos a uma vergonhosa escravidão, somente para 
garantir a edificação de fortunas que em tempo algum jamais foram garantidoras de paz e da 
felicidade pessoal.6 
A humanização do trabalho foi ganhando força, conquistando espaço nos parlamentos 
e nos gabinetes. A lucidez de sindicalistas, juristas e economistas comprometidos com a causa 
popular contagiaram governantes e patrões que passaram a contribuir para geração do direito da 
criança. 
O neoliberalismo, até nos países altamente industrializados, tem sido causador de um 
crescente desemprego, configurando-se numa política econômica que concentra renda, abaixa 
salários e desagrega a família. A ameaça do recurso ao trabalho da criança e do adolescente é 
então uma tentação por parte das empresas menos competitivas e estruturadas financeiramente. 
 
 
 
1.2 A realidade brasileira 
 
 
 
Qual é a realidade vivida? Costuma-se dizer que as crianças e os adolescentes que 
trabalham são prisioneiros de seu ambiente, com a pior qualidade de vida no trabalho possível, 
pois as necessidades e aspirações desses trabalhadores não são consideradas, como, por 
 
 
 
 
 
6 DERRIEN, Jean-Maurice. Trabalho infantil: a fiscalização do trabalho infantil. OIT, 1993. 11 p. 
10 
 
 
 
 
 
 
exemplo, o ambiente social, familiar, de trabalho, os valores culturais, condições de vida da 
família, etc. 
Partindo da cultura grega, passando por diferentes períodos, como a Idade Média, a 
Renascença, o pós-Renascimento e, finalmente, a Idade Moderna, observam-se algumas 
mudanças. De acordo com as palavras de Veronese: 
 
“O trabalho escravo a que osdonos das minas de carvão da Inglaterra, no século 
XVIII, submetiam crianças com até 5 anos de idade apresenta alguma diferença em 
relação ao trabalho escravo praticado no Brasil, neste final de século, em que 
crianças com idades entre 5 e 14 anos trabalham na lavoura, no corte da cana-de- 11 
açúcar, nas minas de extração de minérios,nos serviços em olarias.”5 
 
 
A diferença reside no fato de que a sociedade brasileira estava marcada tanto pela 
variação etária como pelo acentuado desnível social.6 O patrão de hoje, seja usineiro, o dono de 
olarias, o produtor de carvão vegetal, em relação à criança e ao adolescente, parece ter-se 
inspirado nos abastados patrões da Europa do Estado Liberal do século XVIII. Não nos 
esqueçamos que o século XIX também foi cenário de verdadeira era da escravidão de crianças e 
mulheres, coma submissão a trabalhos no interiorda minas de carvãoe na indústria têxtil. 
Na cidade e no meio rural, mostrar os problemas da infância e da juventude 
desassistidas, pequenos seres sem perspectivas, cujo número populacional aumenta ao longo 
do tempo, implica basicamente tratar do destino do país e de seus percalços na ordem 
econômica internacional. 
Mesmo sendo proibido em vários países, no Brasil o trabalho infantil conta com mais 
de três milhões de crianças e adolescentes menores de 14 anos, os quais, em vez de participar 
de atividades de socialização, de brincadeiras e de ter tempo para o estudo e outras atividades 
inerentes às crianças, passam o dia laborando para garantir seu sustento e/ou o de sua família, 
e esse fato traz consequências danosas paraseudesenvolvimento físico e psicológico. 
Uma sociedade que exclui suas crianças do convívio familiar e comunitário e impede o 
acesso a seus direitos fundamentais está plantando a violência que colherá mais tarde, criando, 
assim, um círculo vicioso com graves consequências sociais. A situação em questão decorre, em 
parte, da baixa renda de muitas famílias, para as quais o trabalho infantil é uma questão de 
sobrevivência. Os organismos sindicais se omitem por se tratar de setores não-organizados da 
economia. E, muitas vezes, os próprios pais ou responsáveis consideram o trabalho preferível à 
 
 
5 VERONESE, op. cit. 
 
6 Ibidem. 
 
 
 
 
 
 
escolarização, por ser mais “educativo e rentável”. Primeiro, a sociedade dita organizada e legal 
escreve uma Constituição e uma lei específica que não cumpre. 
Pelo que examinamos da Lei 8.069/90, está-se cumprindo tão-somente a parte em que 
os deveres das crianças são cobrados. Segundo Siro Darlan, ex-juiz da Vara da Infância e da 
Juventude, o diretor da Biblioteca Nacional assiste diuturnamente, do alto de seu gabinete, ao 
desfile de crianças, sem teto, sem escola, sem alimentação, cheirando cola para matar a fome. 
Podia fazer algo para mudar essa situação, mas nada faz. Poderia ter aberto um espaço na 
Biblioteca Nacional para realizar com elas um trabalho de escolarização. De acordo com a 
Organização Internacional do Trabalho, “a criança e o adolescente não podem esperar. Eles só 
têm uma única oportunidade de crescimento e desenvolvimento, ou seja: eles têm direito à 
infância”. 
 
 
 
1.3 Evolução histórica dos direitos e garantias constitucionais 
 
 
 
No Brasil, é possível dividir a evolução histórica dos direitos das crianças e dos 
adolescentesemquatrograndesperíodos, dosquaissedestacamalgunsfatosmarcantes: 
 
Período religioso (1500-1889) 
 
 
Durante esse período, qualquer tipo de assistência dada às crianças órfãs ou expostas 
ocorria como prática da piedade católico-cristã. Em 14 de janeiro de 1738, no Rio de Janeiro, foi 
fundada por Romão de Mattos Duarte a primeira Casa dos Expostos do Brasil, uma instituição 
em que eram acolhidas as crianças abandonadas por seus pais (os quais permaneciam no 
anonimato). 
Com a Constituinte de 1823, José Bonifácio defendeu um projeto em que a escrava, 
após o terceiro mês de gravidez, não poderia trabalhar e, após o parto, teria um mês de 
convalescença; passado este, durante um ano, não poderia trabalhar longe de seu filho. Apesar 
deter sido outorgada em 25 demarço de 1824, a primeira Constituição do Brasil, promulgada 
por Dom Pedro I, não trazia qualquer menção, em seu texto, à criança e ao adolescente. 
Em 1830, o Código Penal Imperial do Brasil estabeleceu que os menores infratores 
entre 14 e 18 anos deveriam ser considerados criminosos, tendo, no entanto, a pena atenuada. 
Em relação aos menores infratores abaixo de 14 anos, estes deveriam ser considerados 
 
 
 
 
 
 
 
inimputáveis; contudo, se fosse constatado terem agido com discernimento na prática do ato 
criminoso, seriam encaminhados pelo juiz a tratamento nas Casas de Correção, não 
ultrapassando a idade de 16 anos. Predominava, neste caso, a teoria da ação, na qual a 
imputabilidade se baseia na condição pessoal de maturidade do agente frente ao ato ilícito 
praticado. 
O Senado, em 12 de julho de 1862, aprovou a Lei de Silveira da Mota, que proibia a 
venda de escravos sob pregão e exposição pública, bem como a proibição de, em qualquer 
venda, separar o filho do pai e o marido, da mulher. 
Em 28 de setembro de 1871, a Princesa Isabel aprovou a Lei do Ventre Livre, que 
concedia liberdade às crianças nascidas de mães escravas. Contudo, havia restrições legais: o 
menor deveria permanecer sob a autoridade do proprietário de escravos e de sua mãe, que, 
juntos, deveriam educá-lo até os oito anos de idade. Completado este período, o proprietário da 
escrava-mãe teria duas opções: poderia receber uma indenização estatal de 600 mil réis pagos 
em títulos do governo, no prazo de trinta anos, ou se utilizar dos serviços do menor até que este 
completasse 21 anos. 
 
 
 
Período filantrópico (1889-1964) 
 
 
Durante esse período predominou a assistência à infância órfã, abandonada e 
delinquente, com base na racionalidade científica, em que o método, a sistematização e a 
disciplina têm prioridade sobre a piedade católica-cristã. 
Surge o primeiro Código Penal republicano do Brasil, no qual os menores de 9 anos 
eram absolutamente inimputáveis, bem como os menores entre 9 e 14 anos que agissem sem 
discernimento. Dentro dessa faixa etária, os menores que agissem com discernimento seriam 
internados em estabelecimentos correcionais disciplinares, até a idade de 17 anos. Aos maiores 
de 14 e aos menores de 16 anos, imputavam-se penas atenuadas. Ainda aqui, prevalece a teoria 
da ação com discernimento. 
Em 1896, foi fundada em São Paulo a versão paulista da Casa dos Expostos. Ocorreu, 
assim, em todo o Brasil, um aumento considerável de orfanatos, fato decorrente da urbanização 
aliada à imigração europeia, incentivada pelo governo para substituir a mão de obra escrava. 
Em 1° de janeiro de 1916 entrou em vigor o Código Civil Brasileiro, no qual, por 
influência do Direito romano, o homem é colocado como o centro da família, tendo sua mulher e 
seusfilhossubordinados àsuafigura. Em 1921, entrouemvigora Lein° 4.242, queafastavaa 
13 
 
 
 
 
 
 
 
teoria da ação com discernimento, declarando o menor infrator inimputável. A idade penal é 
fixada em 14 anos. 
Em 1924, começou a funcionar no Rio de Janeiro o primeiro Juizado de Menores do 
Brasil, graças ao esforço do jurista e legislador Mello de Mattos. Em 1927, o Decreto n° 17.943-A 
criou o primeiro Código de Menores do Brasil e da América Latina, de autoria do jurista Cândido 
Albuquerque de Mello Mattos. Este código conseguiu corporificar leis e decretos, desde 1902, 
que se propunham a provar um mecanismo legal que concedesse relevo à questão dos 
menores. 
A concepção do código pôs em evidência questões controversas em relação à 
legislação civil em vigor. Assim, o pátrio poder foi transformado em pátrio dever, pois ao Estado 
era permitido intervir na relação pai/filho, ou mesmo substituir a autoridade paterna, caso esta 
não tivesse condições ou se recusasse a dar ao filho uma educação regular, caso em que o 
menor seria recolhido a um internato. 
No ano de 1934, foi promulgada a segunda Constituição Federal da República. Trata- 
se da primeira Constituição brasileira que menciona questões vinculadas à infância e à 
juventude: “Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas:amparar a maternidade e a infância e proteger a juventude contra toda exploração, bem como 
abandono físico, moral e intelectual” (art. 138, letras c e d). 
Em 7 de setembro de 1940 entrou em vigor o Código Penal Brasileiro, com a fixação 
da idade penal em 18 anos, segundo o art. 23 do Decreto-Lei n° 2.848/40. Em 1° de maio de 
1943 passou a vigorar a Consolidação das Leis do Trabalho, que abrangia a regulação do 
trabalho dos menores que se situassem na faixa de 14 e 18 anos. 
 
Período militar (1964-1988) 
 
 
Nesse período, predomina uma visão de que a questão do menor abandonado ou 
infrator seria da esfera da segurança nacional, e que o Estado deveria buscar disciplinar, 
reprimir, reeducar, para que futuramente a criança não se tornasse um instrumento de oposição 
ao sistema democrático capitalista. 
Em 1964 foi criada a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem), seguindo 
a linha pedagógica de internação e implantando em seu Programa Nacional de Bem-Estar do 
Menor o apoio doutrinário e logístico da Escola Superior de Guerra. 
Foi instituído, em 1979, com o advento da Lei n° 6.697, o Código de Menores, que 
trouxe para o ordenamento uma nova categoria: “menor em situação irregular”, isto é, o menor 
14 
 
 
 
 
 
 
 
de 18 anos abandonado materialmente, vítima de maus-tratos, em perigo moral, desassistido 
juridicamente, com desvio de conduta ou autor de infração penal. Este código, apesar de ter sido 
considerado um avanço em relação ao anterior, apresentava alguns aspectos controversos, 
como as características inquisitoriais do processo envolvendo crianças e adolescentes, quando a 
própria Constituição garantia ampla defesa ao maior de 18 anos. 
O referido código não dispunha acerca do princípio do contraditório. Outro fato que 
pode exemplificar tal distorção é a existência de “prisão cautelar” para os menores de 18 anos, 
pois, caso lhes fosse atribuída a autoria de uma infração penal, poderiam ser presos para fins de 15 
verificação, o que constituía uma verdadeira afronta aos direitos da criança.7 
 
 
Período democrático (1988 até os dias atuais) 
 
 
Nesse período predomina uma grande mobilização da sociedade civil na tentativa de 
contribuir para inserir na Constituição Federal (1988) os direitos humanos da infância e da 
juventude, bem como materializar uma legislação especial que trate da criança e do adolescente 
abandonado e infrator como sujeito de direitos, sendo o Estatuto da Criança e do Adolescente de 
1990 (ECA/90) fruto dessa aspiração social.8 
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 significou um grande avanço 
nos direitos sociais, beneficiando, entre outros, a criança e o adolescente. Em 13 de julho de 
1990 entrou em vigor a Lei n° 8.069, que criou o Estatuto da Criança e do Adolescente 
(ECA/90). Baseado na Doutrina da Proteção Integral, esse diploma legal veio pôr fim a situações 
repressivas do Código de Menores de 1979 e a políticas da Funabem, além de tantas outras que 
ameaçavam os direitos das crianças e dos adolescentes. 
O Estatuto apresenta uma nova postura a ser tomada tanto pela família, pela escola e 
pelas entidades de atendimento como pela sociedade e pelo Estado, objetivando resguardar os 
direitos das crianças e dos adolescentes. Esse instituto será melhor examinado mais adiante. 
Dessa forma, com uma análise sucinta da evolução histórica dos direitos das crianças 
e dos adolescentes na estrutura brasileira, percebe-se que, ao longo dos anos, assiste-se a um 
quadro de profundas desigualdades, que, apesar de diversos instrumentos criados no intuito de 
minorá-las, somente tornou-se ainda mais complexo e diferenciado. As próprias decisões 
 
 
7 MENDES, Emílio Garcia e COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Das necessidades aos direitos. São Paulo: 
Malheiros, 1994, 127 p. 
 
8 Idem, 132 p. 
 
 
 
 
 
 
 
políticas (instrumentos criados), que deveriam atuar sobre a problemática, apenas resultaram em 
uma cristalização ainda maior dessas desigualdades sociais. 
 
 
 
 
 
1.4 A criança e o adolescente 
 
 
 
 
Entende-se por direito da criança e do adolescente o conjunto sistemático de normas 
coercitivas que regulam a conduta do homem, do Estado e da sociedade face à sua população 
menor de 18 anos, qualquer que seja a faixa social ou econômica. 
Muita gente não sabe diferenciar criança de adolescente. Assim, podemos dizer que a 
criança é aquela que tem até 12 (doze) anos incompletos e adolescentes é a pessoa que tem 
entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade. 
É proibido ao adolescente qualquer tipo de trabalho a menores de 14 (quatorze) anos, 
a não ser como aprendiz, que é aquele que aprende uma profissão, dentro das normas da 
legislação sobre educação. 
Essa preparação do adolescente para uma profissão, que é a formação técnico- 
profissional, não pode prejudicar a obrigação do adolescente de estudar em sua escola regular. 
Além disso, o adolescente deve ter uma atividade técnico-profissional que não prejudique seu 
desenvolvimento e um horário especial. 
Com a edição da Lei 8.069/90 (ECA), de 13/07/90, a qual entrou em vigor em 12/10/90, 
o Brasil mostra maturidade legislativa na questão da dignificação da pessoa humana desde a 
tenra idade, com a valorização do ser, em condição peculiar de desenvolvimento, marco para a 
construção de uma sociedade organizada, mais justa e capacitada a vencer os entraves 
discriminatórios e de violência que ainda estão expostas as crianças e adolescentes. A 
interpretação do Estatuto leva em conta os “fins sociais a que se dirige”: 
 
• Exigências do bem comum; 
 
 
• Direitos e deveres individuais e coletivos; 
16 
 
 
 
 
 
 
 
 
• Condição peculiar da criança e do jovem em desenvolvimento. 
 
 
O Estatuto da Criança edo Adolescente adotou omesmosistema do art. 5o da Lei de 
Introdução ao Código Civil. Mas acrescentou, no art. 6o (que também deve ser considerado pelo 
juiz), os direitos e deveres individuais e coletivos → na condição da criança e do adolescente 
como pessoas em desenvolvimento. 
Adapta também os princípios da Convenção Internacional dos Direitos da Infância à 
realidade brasileira e regulamenta o artigo 227 da Constituição, que dispõe acerca dos direitos 
da criança e do adolescente. Ao adotar a doutrina da proteção integral à criança e ao 
adolescente, mudou radicalmente a orientação ao atendimento à população infanto-juvenil, 
estendido, hoje, a todas as crianças e adolescentes do país, que é o respeito à dignidade da 
pessoa humana em processo de desenvolvimento e como sujeito de direitos civis, humanos e 
sociais garantidos na Constituição e nas Leis. 
Como vimos, o direito da criança e do adolescente guarda relação intrínseca com 
outros ramos do Direito, como, por exemplo, afinidade com o Direito Internacional Público e 
Privado, pois se baseou em Tratados e Convenções Internacionais. Também está presente 
afinidade com o Direito Constitucional, porquanto nossa Lei Maior, de maneira inédita, proclama 
uma série de direitos específicos da infanto-adolescência. Igualmente, há reflexos dos direitos 
civis (adoção, maioridade, poder familiar, etc), penais (imputabilidade, crimes em espécie, etc) e 
trabalhista (contrato de trabalho, direitos trabalhistas, etc). 
No que tange às leis extravagantes, destaca-se a lei da ação civil pública, 
imprescindível em se tratando da tutela dos interesses difusos. Verifica-se, ainda, o vínculo com 
outras ciências não jurídicas, como, por exemplo, Sociologia e Psicologia. 
A criança e o adolescente: um dos assuntos mais polêmicos na atualidade. Pelo 
menos desde meados do século XIX, esse sempre foi um verdadeiro problema, o modo como 
eram tratadas as crianças. 
Do final do século XIX até 1945, muitos países industrializados lutaram para limitar ou 
impedir o trabalho infantil, além de garantir as mínimas condições de escolaridade e atendimento 
médico. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, teve início uma conscientização,em nível 
mundial, de proteção às crianças. 
17 
 
 
 
 
 
 
 
Em 1946, a Assembleia Geral da ONU criou a Organização das Nações Unidas para a 
Infância (UNICEF), iniciando um amplo programa de auxílio aos novos países. A mesma 
Assembleia, já em 1948, inseriu na Declaração Universal de Direitos Humanos, a garantia à 
educação, à saúde e à limitação do trabalho. Esses princípios, embora com algum atraso, estão 
presentes no Estatuto da Criança e do Adolescente. 
Será que, algum dia, os adultos compreenderão a importância de dar amor, carinho, 
compreensão e apoio às crianças e aos adolescentes? Infelizmente não podemos responder a 
essas perguntas com certeza, mas esperamos sinceramente que sim, pois essa é uma tarefa 
muito importante e – por que não? – até vital. 
O direito da criança e do adolescente situa-se na esfera do direito público, uma vez 
que o Estado tem como missão precípua a proteção e a reeducação (em caso de desvio) dos 
futuros cidadãos. A função estatal, portanto, é protecionista e ordenadora. 
Consigna-se que, seguindo a distinção romana, as normas do ECA constituem ius 
cogens (direito ou norma cogente = de observância obrigatória. Por exemplo, a adoção somente 
pode ser obtida mediante sentença judicial), ao contrário das normas de direito privado em geral, 
as denominadas ius dispositivum (direito ou norma dispositiva = que fixa regra jurídica sem 
coagir. Por exemplo: via de regra, não há impedimento a que alguém faça uma doação). 
Portanto, a normatização do direito da criança e do adolescente tem por objeto 
considerá-los sujeitos de direito e afirmar sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, 
sendo esta a essência do ECA, haja vista que o legislador preocupou-se sobremaneira em não 
permitir ofensas a essa característica, de modo a evitar prejuízo ao futuro de cada um (art. 69.I e 
art. 71, ECA). 
Para isso é preciso seguir alguns princípios básicos, tais como: 
 
 
• Universalização 
São sujeitos de direito perante o ECA todo e qualquer menor, independentemente de 
faixa social ou econômica. Abandonou-se, assim, a distinção que fazia o Código de Menores, 
voltado basicamente para aqueles que se encontrassem em situação irregular. 
 
• Humanização 
18 
 
 
 
 
 
 
 
O art. 5° do ECA dispõe que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer 
forma de negligência/discriminação/exploração/violência/crueldade e opressão, sujeito a punição 
qualquer atentado de tais direitos, em outras palavras, humanizou o tratamento aos menores. 
 
• Desjudicialização 
Para a administração da justiça de menores dispõe que deve-se procurar o tratamento 
adequado ao infrator menor, sem recorrer ao processo judicial. 
 
• Despolicialização 
Emregra, problemas de menores não é casode polícia, mas sim questão social. Por 
isso, antes de qualquer envolvimento policial, deve-se procurar resolver por intermédio de 
Conselhosda Criança, Conselho Tutelar, Comissário dacriançaedoadolescenteeoutros. 
 
• Participação coletiva 
É dever da família/comunidade/sociedade em geral e do Estado assegurar; com 
absoluta prioridade, a efetivação dos direitos fundamentais da C. A. 
19 
 
 
 
 
 
 
 
2 PROTEÇÃO SOCIAL E JURÍDICA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO BRASIL 
 
 
 
 
 
Para uma análise mais profunda do problema da infância 
carente no Brasil, torna-se necessário recorrermos a subsídios 
anteriores à nossa colonização, pois a situação da família, e 
consequentemente dos filhos, é digna de atenção desde quinze ou 
vinte séculos antes de Cristo e já aparece nas civilizações romana e 
helênica. 
Anísio Garcia Martins, ao buscar informações na Cidade 
antiga, de Fustel de Coulanges, esclarece que: 
 
 
“Desde aquelas duas antigas civilizações que herdamos, no mundo 
ocidental, as mais importantes instituições políticas, jurídicas e 
sociais, a família e os filhos já tinham, como proteção especial, as 
normas instituidoras, como uma necessidade do culto familiar para 
preservação dos ritos de “Lares Manes”, ou deuses domésticos, na 
concepção de que este culto familiar lhes preservaria a imortalidade, 
pois os pais e os avós mortos tornavam-se deuses domésticos, e a 
continuidade da família pertencia aos filhos, especialmente do ramo 
masculino”.1 
 
Outras obras relativamente recentes têm fornecido subsídios acerca da relação familiar 
ao longo da história.2 Sem dúvida foi a partir do século XVIII que surgiram na Europa mudanças 
radicais que influíram na história da criança. Levantamentos demográficos realizados naquele 
período levaram a considerar as crianças abandonadas e as prostitutas como forças de 
produção potenciais, visando, sobretudo, à promoção de colônias. Chamousset esclarece que 
“as crianças abandonadas não conhecem outra mãe senão a pátria; daí a importância do Estado 
em conservá-las”.3 
 
 
1 MARTINS, Anísio Garcia. Direito do menor. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Universitária de Direito, 1988, 26 p. 
 
2 ARIÉS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. SHORTER, E. La 
naissance de la famile modeme. Paris: Seuil, 1977. 
 
 
 
3 CHAMOUSSET, H. apud BADINTER, Elizabeth. Um amorconquistado – o mito do amor materno. Rio de 
Janeiro: Nova Fronteira, 1988, pp. 12 e ss. 
20 
 
 
 
 
 
 
 
Elucida ainda que o Estado deve esforçar-se para manter vivas essas crianças 
abandonadas, cuidar de sua higiene e do aleitamento artificial para que sobrevivam. Seria 
inclusive isenta do serviço militar a aldeia que quisesse cuidar dessas crianças até que 
entrassem para o exército, quando seriam obrigadas a servir até 25 ou 30 anos, substituindo o 
marinheiro e o soldado, que custavam mais para o Estado do que o custo anual de uma criança. 
Como se vê, a criança era um valor mercantil em potencial.4 
O discurso da igualdade e da felicidade de Rousseau, nessa época, ressaltava a 
preocupação em relação à criança e ao poder dos pais, a partir da ideia da família como única 
sociedade natural. Já Voltaire demonstrava o interesse do homem pela felicidade; não se 
esgotava como uma questão individual, mas diante da possibilidade de vivê-la na coletividade. 
Nesse passo, todas essas ideias – consideradas num apanhado superficial – impuseram 
modificações políticas e sociais consideráveis na Europa daquele período. 
 
 
 
2.1 A Proteção nos Primeiros Séculos 
 
 
 
As ideias do século XVIII só chegaram efetivamente ao Brasil no final do século XIX e 
no início do século XX. Até então, o pobre era prioridade exclusiva da Igreja Católica e um de 
seus instrumentos de poder. Arthur Moncorvo Filho, em obra exemplar sobre a proteção da 
infância no Brasil, nos primeiros séculos que se seguiram à colonização, ressalta alguns 
aspectos importantes: 
 
“Na história do período colonial surgem, com algumas ideias adiantadas destoando 
da absoluta apatia pela sorte da criança, os vultos memoráveis de Nóbrega, 
Anchieta e tantos outros discípulos de Loyola, na esforçada empreitada de 
catequese dos selvagens, tão criticada por Oliveira Martins e vários outros 
escritores. Fundando, no entanto, em nosso território as primeiras escolas e 
empenhando-se na civilização das populações embrutecidas, a catequese foi obra 
de caridade dos jesuítas. Meio século ainda não se havia passado da chegada ao 
Brasil da missão apostólica de Anchieta e já quase todo o litoral, desde 
Pernambuco até São Vicente, estava povoado por índios domesticados e 
convertidos, já havendo sacerdotes convertidos, deles, mais de cem mil. Eram 
criadas aldeias e nelas se ensinava as crianças a ler e escrever, assim se 
multiplicando asescolas [. ]. Reza a história queaosjesuítas se deve a criação e, 
por espaço de dois séculos, quase exclusivamente, a manutenção do ensino público 
no Brasil [. ]. Seu primeiro ato, ao aportar às nossas plagas, foi, como se sabe, 
fundar em 1549, na Bahia, um colégio. Em 1551, esse colégio já funcionava com 20 
 
 
 
4 Ibidem. 
21meninos. Foi aí que, em 1622, recebeu instrução o notável Padre Antônio Vieira [...]. 
Segundo dizem os historiadores, as congregações religiosas se constituíram as 
grandes promotoras da instrução da mocidade e da educação da infância desvalida. 
 
 
Nesse intuito colaboraram os lazaristas, jesuítas, salesianos e redentoristas, e os 
Claustros de São Bento, dando ao Brasil uma plêiade de homens eminentes, de 
mestres em ciência e artes, graças à educação e instrução ali recebidas [...]. Sob o 
manto do catolicismo continuava a desenvolver-se a beneficência, fundando-se 
instituições que acolhiam os peregrinos e, como as antigas albergarias, protegiam 
os pobres, curavam os doentes, enterravam os mortos, adotavam e ensinavam os 
órfãos desvalidos, etc. À custa de piedosas esmolas, imploradas de porta em porta, 
instalavam os seminários dos órgãos da Bahia e de Itu, seguidos dos de 
Jacuecanga e do Caraça”.5 
 
O ano de 1693 foi marcado pela demonstração oficial de proteção direta à infância. 
Floro de Araújo Melo lembra este fato ao ressaltar que 
 
“O governador Antônio Paes de Sande informara ao rei sobre o estado em que 
ficavam os enjeitados na cidade do Rio de Janeiro, morrendo ao abandono. O rei 
determinou providência à Câmara, a qual, alegando falta de recursos, apelou à 
Santa Casa, que, já então, atendia aos que eram deixados à sua porta ou eram 
órfãos de falecidos nas enfermarias”.6 
 
O mesmo autor destaca, ainda: 
 
 
“Em 1734, Ignácio da Costa Mascarenhas, vigário colado na freguesia 
da Candelária do Rio, desejando ‘aliviar este drama’, solicitou licença 
para o acolhimento de trinta órfãos e pobres para viverem em 
clausura até tomar o estado sob o beneplácito do bispo. Como o 
governador José da Silva Paes exigiu que a Casa ficasse sujeita à 
fiscalização do governador, não do bispo – com o que não concordou 
o vigário – a ideia não foi adiante”.7 
 
 
 
 
 
 
As mudanças estruturais a partir do final do século XIX 
 
 
 
 
 
 
5 MONCORVO FILHO, Arthur. Histórico da proteção da infância no Brasil. 1550/1922. Rio de Janeiro: Empresa 
Gráfica Editora. 1923, p. 26-31. 
 
6 MELO, Floro de Araújo. A história da história do menor no Brasil. [editora particular], 1986, 27 p. 
7 Idem. 
22 
 
 
 
 
 
 
 
Irmã Rizzini, em recente e esplêndido trabalho de pesquisa, A assistência à infância na 
passagem para o século XX – da expressão à educação, focaliza, sobretudo, o conflito entre as 
forças da caridade e da filantropia como uma disputa econômica e política pela dominação sobre 
o pobre. Ela diz: 
 
“A filantropia surge como um modelo assistencial que se apresenta 
capacitado para substituir o modelo representado pela caridade. 
Fundamentada pela ciência, a filantropia atribuiu-se a tarefa de 
organizar aassistência nosentido dedirecioná-laàs novasexigências 23 
sociais, políticas, econômicas e morais que nascem juntamente com a 
República”.8 
 
Os grupos comprometidos com as ideias filantrópicas acusam a caridade pela falta de 
organização, de método de trabalho e de ordem nas iniciativas. A filantropia surge para dar 
continuidade à obra de caridade, mas sob uma nova concepção de assistência. Não mais a 
esmola que humilha, mas a reintegração social daqueles que seriam os eternos clientes da 
caridade: os desajustados. A caridade vai reagir à crescente tendência filantrópica da 
assistência, acusando as instituições de se distanciarem da palavra cristã.9 
Segundo a referida autora, no início do século XX o Estado passa a intervir no espaço 
social por meio do policiamento de tudo que seja causador da desordem física e moral e pela 
ordenação desta sob uma nova ordem. Assinala Irma Rizzini: “Para tanto, importam-se novas 
teorias e se produzem novas técnicas, as quais serviram de subsídio para a criação de projetos, 
leis e instituições que integrem um projeto de assistência social, ainda não organizado em 
termos de uma política social a ser seguida em nível nacional”.10 
A infância pobre tornou-se alvo não só de atenção e de cuidados, mas também de 
receios. Denunciou-se a situação da infância no país: nas famílias, nas ruas ou nos asilos, o 
consenso é geral: a infância está em perigo. Mas há outro lado da questão, constantemente 
lembrado pelos meios médico e jurídico: a infância “moralmente abandonada” é potencialmente 
perigosa, já que, devido às condições de extrema pobreza, baixa moralidade, doenças, etc. de 
seus progenitores, não recebe a educação considerada adequada pelos especialistas: educação 
física, moral, institucional e profissional. 
 
 
8 RIZZINI, Irma. A assistência à infância na passagem para o século XX – da repressão à reeducação. Revista 
Fórum Educacional, 02/90. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 80 p. 
 
9 Idem. 
 
10 Ibidem. 
 
 
 
 
 
 
 
Ciências como a medicina, a psiquiatria, o direito e a pedagogia contribuíram com 
teorias e técnicas para a formação de uma nova mentalidade de atendimento ao menor. A 
mentalidade repressora começou a ceder espaço para uma concepção de reeducação, de 
tratamento na assistência ao menor. Verificou-se o surgimento de um novo modelo de 
assistência à infância, fundado não mais somente nas palavras da fé, mas também nas da 
ciência, basicamente médica, jurídica e pedagógica. 
A assistência caritativa e religiosa deu espaço ao desenvolvimento de um modelo de 
assistênciacalçadona racionalidade científica, emqueométodo, asistematização eadisciplina 
têm prioridade sobre a piedade e o amor cristãos.11 Conclui Irmã Rizzini que “a luta de forças 
entre a caridade e a filantropia foi antes de tudo uma disputa política e econômica pela 
dominação sobre o pobre. Este, até o século XIX, pertencia ao domínio absoluto da Igreja. A 
preocupação com a pobreza por parte das ciências, como a medicina, a economia, a sociologia, 
a pedagogia e outras, permitiu tomarem para si diversos aspectos de pauperismos como objetos 
de estudo. Dessa forma, forneceram às elites sociais e políticas os instrumentos que 
possibilitavam a elas reclamarem entre si do domínio de uma situação que as ameaçaria 
diretamente e que a Igreja mostrava-se incapaz de controlar”.12 
 
 
 
 
2.2 As Instituições para a Criança e o Adolescente Desassistidos a Partir do Século XX 
 
 
 
 
 
Estudos revelam que, até 1930, as instituições educacionais tinham sua preocupação 
voltada ao caráter moral e religioso. Mais uma vez, Irmã Rizzini, reportando-se aos 
ensinamentos de Moncorvo Filho, lembra que os asilos “mantidos pela caridade religiosa e, em 
menor escala, pelo Estado” passaram a sofrer críticas negativas ligadas à mortalidade infantil em 
tais instituições, à educação “quase que exclusivamente religiosa, o tratamento repressivo e não 
especializado dos menores e o não-respeito aos preceitos da higiene”.13 
 
 
 
11 Ibidem. 
 
12 Ibidem. 
 
13RIZZINI,op. cit.,84p. 
24 
 
 
 
 
 
 
 
Em sua análise sobre instituições caritativas do século XIX, a referida autora constata 
“a existência de uma preocupação com a formação de mão de obra, como era o caso do preparo 
para o trabalho doméstico nos asilos para meninas e o preparo de artesãos nos asilos para 
meninos. No entanto, o objetivo era, antes, impedir a deterioração moral destes indivíduos, do 
que profissionalizá-los”.14 Pelo exposto, nota-se que o objetivo moral se sobrepõe ao 
econômico. E Rizzini continua: “No século seguinte, percebe-se o crescimento em importância 
das perspectivas econômica e política da assistência, muito embora a justificativa moral se 
mantivesse”.15 
A religiosa destaca o Instituto João Pinheiro, colônia agrícola em Minas Gerais, como 
um exemplo de crença dominante no início do século na superioridade da vida do campo sobre a 
vida da cidade. Conclui seu trabalho observando que, na passagem do século, 
 
“Os novos especialistas da infância, como os filantropos, as 
autoridades públicas e científicas, almejam transformar os antigos 
asilos considerados ineficazes, desorganizadose corruptores, em 
instituições disciplinadas e disciplinadoras. Nestas, os preceitos da 
higiene médica são obedecidos. A educação é dirigida para o trabalho 
e o poder disciplinar atinge o efeito moral desejado da introjeção da 
vigilância pelos internos. Tais técnicas de sujeição têm por objetivo 
devolver à sociedade indivíduos produtivos, cientes de seus direitos e 
deveres. A educação é concedida como o melhor instrumento para 
alcançar a tão desejada adaptação do indivíduo ao meio social. 
Preparação do corpo pela educação física; da mente pela educação 
moral; do intelecto pela educação instrucional e o trabalho pela 
educação profissional.16 
 
Merece destaque também, como modelo de inúmeras instituições em todo o Brasil, o 
Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro, criado por Moncorvo Filho, que 
consistiu emum projeto social voltadoà infânciapobre, a partir da perspectiva “a grandezada 
Pátria depende do preparo de uma gente sadia”. 
25 
 
 
 
 
 
 
 
Proteção jurídica da criança e do adolescente a partir das primeiras décadas do século XX 
 
 
Embora pretendamos, neste item, manter a mesma linha de divisão histórica, ou seja, 
uma análise do amparo e da assistência à criança sob o prisma da população desassistida pelas 
instituições e pelo Estado, cabe abrir parênteses para elucidar alguns aspectos da lei civil em 
relação à família e à criança no período em análise. 
O Código Civil, que entrou em vigor em 1917, era fruto de uma realidade social e 
jurídica do final do século XIX, influenciada pelas modificações estruturais introduzidas pelo 
Código de Napoleão na França e em toda a Europa no início do mesmo século. Assim, também 
a lei civil sofreu, naquela época, mudanças estruturais, modificando fundamentalmente a tutela 
do Estado em relação àfamília. 
Ao classificar e distinguir os filhos como naturais, adulterinos e incestuosos, adotados, 
legítimos e ilegítimos, e valorizar sobremaneira o pai ou o marido, ao outorgar a essa figura total 
poder de decisão na família e na vida de seus membros, o Código Civil já apontava para 
algumas situações que demonstravam o interesse da sociedade em resguardar as relações 
familiares contra a violência. 
Assim, a punição no caso de abuso do pátrio poder, as limitações legais, as atribuições 
do tutor, a fixação de obrigação dos pais para com a família e a possibilidade de propor 
investigação de paternidade são algumas conquistas que demonstraram um grande avanço para 
a época. 
Porém, em 1917, a nova lei civil destinava-se a uma classe de cidadãos de certa 
camada social. Na prática, a tutela jurídica não atingia as famílias dos “mendigos”, dos 
“vagabundos”, das “prostitutas”, dos negros recém-libertados. Os índios foram considerados por 
essa lei relativamente incapazes, equiparados aos maiores de 16 anos e menores de 21 anos, 
às mulheres casadas e aos pródigos. 
Clóvis Beviláqua, comentando o art. 69 do Código Civil, refere-se ao Marquês de 
Pombal, como quem primeiro reagiu diante das variedades de tratamentos destinados aos 
índios: 
 
“Ora os considerava à escravidão, ora lhes reconhecia o direito de 
liberdade [...]. Na discussão do Código civil em 1913, retomando a 
criação de José Bonifácio, a Câmara enfrentou o problema de 
incorporação definitiva dos aborígines na sociedade brasileira [...], 
eram parte integrante, mas de cujo convívio, não obstante, se 
26 
 
 
 
 
 
 
 
achavam afastados por circunstâncias, que era ocioso naquele 
momento recordar”.17 
 
Em 1916, foi criado o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), substituído, em 1967, pela 
Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Efetivamente, a sociedade de então valorizava a família 
legítima, distinguindo-a, sobretudo, nos direitos patrimoniais, e o restante considerado como 
enjeitados ou “párias” desta sociedade. “Perfilhar” um filho ilegítimo ou mesmo promover 
geralmente uma adoção era privilégio jurídico de poucos. 
Outros aspectos legais relativos à criança merecem igual análise, haja vista as 27 
conquistas constitucionais a partir da independência e, posteriormente, a partir de 1943, a 
tematização da proteção do trabalho infanto-juvenil. Optamos por limitar este trabalho a uma 
visão histórica de nossa legislação relativa à tutela da infância e da adolescência, em especial 
aos “desassistidos” e “abandonados” e aqueles considerados “infratores”. Marcelo Gantus 
Jasmim lembra que: 
 
“Tanto o Código Penal de 1830, promulgado pelo Império, quanto o 
Código Penal de 1890, o primeiro da República, continham medidas 
especiais prescritas para aqueles que, apesar de não terem atingido a 
maioridade, tivessem praticado atos que fossem considerados 
criminais. Os cânones informadores de ambos os códigos, naquilo 
que diz respeito especificamente ao tratamento do menor, parecem- 
se bastante, deixando-nos perceber apenas diferenças na concepção 
que define as diversas idades da infância. O que organizava estes 
códigos era uma “Teoria da Ação com Discernimento”, que imputava 
responsabilidade penal ao menor em função de uma pesquisa de sua 
consciência em relação à prática da ação criminosa”.18 
 
Código Mello Mattos de 1927 (Decreto 17.943-A de 12/10/1927) 
 
 
Como reconhecimento ao autor do projeto que estabeleceu suas bases, o Código 
Mello Mattos – como ficou conhecido – representou o primeiro Código Sistemático de Menores 
do País e da América Latina. José Cândido de Albuquerque Mello Mattos foi o primeiro juiz de 
menores do Rio de Janeiro, destacando-se, na época, ainda, como professor do Colégio Pedro II 
eda Faculdadede Direito, comodeputadofederalediretordo Instituto Benjamim Constant. 
 
 
 
17 BEVILAQUA, Clovis. Código civil comentado. Rio de Janeiro: Rio, 1975. 192 p. 
 
18 JASMIM, Marcelo Gantus. Para uma história de legislação sobre o menor. Revista de Psicologia, 4 (2), jul/dez 
1986, 81 p. 
 
 
 
 
 
 
 
Considerado como o “Apóstolo da Infância Abandonada”, deixou também um grande 
acervo bibliográfico, além de ter criado alguns estabelecimentos de assistência e proteção à 
infância abandonada e delinquente.19 Tal código representou uma iniciativa precursora dentro 
da legislação brasileira, destacando-se pela assistência aos menores de 18 anos. Ao definir, no 
Capítulo 1, o objeto e a finalidade da lei, o Código de Menores de 1927 teve uma visão 
correspondente aos conceitos então vigentes, abrangendo em um mesmo entendimento o 
“menor abandonado” e o “menor delinquente”, embora pretendendo oferecer a um e a outro 
“assistênciaeproteção”. No art. 26, agrupou em oito situações os menores abandonados com 28 
menos de 18 anos. 
Ao atentar para as situações da criança de menos de dois anos “entregue para criar 
fora da casa dos pais”, e dos menores “expostos até sete anos de idade em estado de 
abandono”, apresentou uma primeira perspectiva de integração e acalentou o propósito de evitar 
o abandono pela mãe, mediante conselho e, ao mesmo tempo, o sigilo que deveria revestir o 
processo de recolhimento. 
Além disso, ao voltar suas vistas para os menores abandonados (arts. 53 e seguintes), 
o Código Mello Mattos estabeleceu medidas relativas a seu recolhimento e seu encaminhamento 
a um lar, seja o dos pais, seja o de pessoa encarregada de sua guarda. No que se refere ao 
menor delinquente (arts. 68 e seguintes) na faixa etária de 14 anos, proibiu que fosse submetido 
a processo penal de qualquer espécie. Em um avanço para a sua época, mandou que se tivesse 
em vista o estado físico, moral e mental da criança, bem como a situação social, moral e 
econômica dos pais. 
Legislou a propósito da “liberdade vigiada” (art. 92), que tinha em vista os casos de 
menores delinquentes, que deveriam permanecer sempre em companhia dos pais, tutor ou 
curador, ou ainda aos cuidados de um patronato, mas sob a vigilância do juiz. 
Ao dispensar a “pesquisa de discernimento” da legislação penal anterior, em seu artigo 
69, §2°, estabeleceu que, se o menornão fosse abandonado, nem pervertido, nem estivesse em 
perigo de ser, a autoridade o recolheria a uma escola de reforma pelo prazo de um a cinco anos. 
Em caso afirmativo, ou seja, se fosse abandonado, pervertido ou estivesse em perigo 
de ser (art. 69, §3°), a internação seria por “todo o tempo necessário à sua educação entre três a 
sete anos”. Portanto, ser abandonado ainda representava um agravamento da pena, impondo, 
ao adolescente, até sete anos de reformatório. 
 
 
 
19 GUSMÃO, Saul de. Assistência a menores. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1942. p. 208-14. 
 
 
 
 
 
 
 
Sem descer às minúcias de cada caso, pode-se falar que o Código Mello Mattos 
representou a abertura de uma visão legislativa sobre o problema da criança e do adolescente 
em todos os seus aspectos. Antecedente das grandes medidas tomadas pelos Organismos 
Internacionais, não obstante os defeitos naturais em um diploma pioneiro, é lícito apontá-lo como 
código precursor, o qual colocou o Brasil na vanguarda dos países latino-americanos e preparou- 
o para enfrentar a questão da infância desassistida, agravada pela problemática social, neste 
último meio século. 
Após a promulgação do Código Mello Mattos, inúmeros decretos e decretos-lei se 
seguiram visando à proteção especialmente do “menor infrator”, e já aparecem leis especiais de 
proteção ao trabalho na infância e na adolescência. Nesse momento, vale abrir parênteses para 
complementar o que foi dito anteriormente: normalmente a legislação especial da época em 
relação ao “menor infrator” o confundia com os menores abandonados em geral, a exemplo do 
Decreto-lei 6.026, de 24 de novembro de 1943. Tal consideração decorria simplesmente da 
inadaptação ou do desajuste social. Francisco Pereira Bulhões de Carvalho, ao comentar o 
referido Decreto-lei, observa que: 
“São três os defeitos apresentados neste sistema legal: a) classifica os ‘menores’ 
conforme tenham ou não praticado infração penal, quando os deveria distinguir apenas quanto 
ao grau de desajuste; b) não coloca os infratores sem temibilidade entre os menores 
abandonados; c) não inclui entre os menores que carecem de medidas especiais de reeducação 
os gravemente desajustados, ainda que não infratores”.20 
Também a preocupação com o trabalho do menor já aparecera no Código Mello 
Mattos, limitando a idade mínima de trabalho aos doze anos, além de proibir o trabalho noturno 
aos menores de 18 anos. O Decreto-lei n° 5.452, de 19 de maio de 1943, que aprovou a CLT, 
nela incluiu as normas de proteção ao trabalho do menor. O Decreto-lei n° 31.546, de 06 de 
outubro de 1952, mudou especialmente o conceito do empregado aprendiz. 
Data de 5 de novembro de 1941 o Decreto n° 3.779, que criou o Serviço de 
Assistência a Menores (SAM), em substituição ao Instituto Sete de Setembro, com atribuição de 
prestar, em todo o território nacional, amparo social aos “menores desvalidos e infratores”. Por 
seus métodos inadequados de atendimento e estrutura sem autonomia, o SAM ficou marcado 
como um sistema caracterizado também pela repressão institucional. 
Diante do clamor público, em 1964 foi criada a Fundação Nacional de Bem-Estar do 
Menor (Funabem), pela Lei n° 4.513, de 19 de dezembro de 1964, com o objetivo de fixar as 
29 
 
 
 
 
 
 
 
diretrizes fundamentais da política nacional do bem-estar do menor. O novo sistema, 
subordinado moralmente à presidência da República, propunha substituir a repressão e a 
segregação por programas educacionais. Fundada como uma entidade normativa previa 
ramificações nos estados e municípios por meio das Febem’s. 
Em 1974, com o advento do Decreto n° 74.000, de 1° de maio de 1974, vinculou-se ao 
Ministério da Previdência e Assistência Social. Escapando, porém, das propostas originalmente 
previstas, outras agravantes, decorrentes da política administrativa e social, levaram a Funabem 
a atuar diretamente, como agente, desviando-se das políticas de atendimento inicialmente 
previstas. 
Comaentradaemvigordo Estatutoda Criançaedo Adolescente, em 12 deoutubrode 
1990 (Lei n° 8.069/90), a Funabem foi transformada em Fundação Centro Brasileiro para a 
Infância e Adolescência (FCBIA). 
 
Código de Menores de 1979 
 
 
O Código de Menores de 1979 (Lei 6.667, de 10 de outubro de 1979) adotou a doutrina 
jurídica de proteção do “menor em situação irregular”, que abrange os casos de abandono, 
prática de infração penal, desvio de conduta, falta de assistência ou representação legal, entre 
outros. Vale lembrar que a lei de menores era instrumento de controle social da infância e do 
adolescente, vítimas de omissões da família, da sociedade e do Estado em seus direitos 
básicos. 
O Código de Menores não se dirigia à prevenção; cuidava do conflito instalado. Por 
sua vez, o juiz de menores atuava diretamente na prevenção de segundo grau, por meio da 
política de costumes, proibição de frequência em determinados lugares, casas de jogos, etc. 
Paulo Lúcio Nogueira esclarece, comentando o art. 2° – que classifica em seis 
categorias a “situação irregular” –, que “se trata de situações de perigo que poderão levar o 
menor a uma marginalização mais ampla, pois o abandono material ou moral é um passo para a 
criminalidade”. Contudo, não se pode deixar de reconhecer que, em alguns casos, a situação do 
menor é decorrente da própria situação familiar, seja pelo estado de pauperismo (abandono 
material), seja em virtude de riqueza (desvio de conduta).21 Pormais de dez anos em vigor, o 
Código de Menores procurou atender à situação da época da forma mais condizente possível 
com a Lei Maior. 
30 
 
 
 
 
 
 
 
2.3 Princípio constitucional de proteção 
 
 
 
2.3.1 Direitos Fundamentais 
 
 
Entre os chamados direitos humanos fundamentais, 
encontram previsão legal nos arts. 1º e 55 da Carta das 
Nações Unidas os princípios da autodeterminação dos povos, 
da não-discriminação e da promoção da igualdade. De 
acordo com o primeiro deles, a autodeterminação dos povos, 
o direito dos povos à livre determinação, é um requisito prévio 
para o exercício de todos os direitos humanos fundamentais. 
Com o advento da Constituição Federal de 1988, a criança assume importância 
especial junto à nossa sociedade, a Constituição Federal no seu artigo 227, e dispõe o seguinte: 
 
“É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e 
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito àvida, à saúde, à 
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à 
dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e 
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, 
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. 
 
 
 
 
2.3.2 Direitos e garantias fundamentais 
 
 
 
Os direitos e garantias individuais foram ganhando cada vez mais espaço desde a 
Revolução Francesa. Como dito anteriormente, o art. XVI da Declaração dos Direitos do Homem 
e do Cidadão, trazendo um freio ao poder absolutista do Estado, trouxe a previsão de que 
“qualquer sociedade na qual a garantia dos direitos não está em segurança, nem a separação 
dos poderes determinada, não tem Constituição”. 
Os primeiros a surgir foram os relacionados às liberdades básicas, como o direito à 
vidaeodireitodeirevir, quesãoosdireitosdeprimeirageração, ou deprimeiradimensão. Os 
direitos de primeira geração exigem principalmente atitudes negativas do Estado, um não fazer, 
uma abstenção (status negativus). Não se pode, por exemplo, punir um criminoso com a pena de 
31 
 
32 
 
 
 
 
 
 
morte porque estaria ferindo o direito básico da vida. Esses direitos são os direitos civis e 
políticos. 
Logo após esse primeiro movimento, com a emergência de revoltas sociais dos 
trabalhadores, surgiram os direitos sociais, econômicos e culturais, que são os direitos de 
segunda geração, ou de segunda dimensão. Tais direitos, ao contrário dos primeiros, exigem 
uma prestação positiva doEstado, um fazer, uma ação. 
Por fim, com o fortalecimento das instituições democráticas e da sociedade sugiram os 
direitos relativos a um meio ambiente equilibrado, à qualidade de vida, à paz e outros interesses 
difusos que são os de terceira geração, ou seja, direitos pertencentes à sociedade como um todo 
(direitos coletivos em sentido lato). Para fins didáticos, as três gerações de direitos e garantias 
fundamentais podem ser relacionadas, respectivamente, com os três direitos reivindicados pela 
Revolução Francesa: Liberdade - 1ª geração, Igualdade - 2ª geração e Fraternidade - 3° 
geração. 
Para alguns, os direitos de quarta geração seriam aqueles relacionados à engenharia 
genética e aos seus avanços. Para outros, esses direitos seriam os nascidos com a 
globalização. Por fim, parte da doutrina identifica nos direitos de quarta geração, direitos 
republicanos, que traduzem a capacidade de o indivíduo atuar de forma ativa na construção das 
políticas públicas, por meio, por exemplo, dos conselhos. 
Em suma, o artigo 5° da Constituição Federal e outros, como, por exemplo, o artigo 
227, diz que a criança e o adolescente devem receber um tratamento especial e prioritário, até 
chegar aos 18 anos, com socorro em primeiro lugar, ser atendido primeiro pelos órgãos públicos 
de qualquer poder. Ela fala em absoluta prioridade. Claro, o direito penal não podia ficar de fora; 
trata-se de um direito que surge quando se faz necessária uma maior proteção a bens jurídicos 
que são importantes para viver em sociedade. 
Entre estes bens jurídicos temos a vida, o patrimônio e, atendendo ao preceito 
constitucional, a criança e o adolescente, que merece receber proteção: a tutela do direito penal. 
Ou seja, é um bem tão importante que não só a Constituição Federal dedica um artigo e impõe a 
absoluta prioridade, mas o direito penal é chamado para intervir no sentido de dar a essa criança 
ou adolescente uma proteção mais efetiva, mais eficaz. 
Como vocês sabem, o direito penal não atua onde não se faz necessário, e é claro que 
se viu a necessidade de reforço à criança e ao adolescente. No ponto de vista da sua integridade 
física, moral, da honra, da saúde, no ponto de vista dos seus bens mais importantes. 
O princípio da não discriminação, por sua vez, determina que o pleno exercício de 
todos os direitos e garantias fundamentais pertence a todas as pessoas, independentemente de 
 
 
 
 
 
 
 
raça, sexo, cor, condição social, genealogia, credo, convicção política, filosófica ou qualquer 
outro elemento arbitrariamente diferenciador. Para Flávia Piovesan: 
 
“Discriminação significa toda distinção, exclusão, restrição ou preferência que tenha 
por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício, 
em igualdade de condições, dos direitos humanos e liberdades fundamentais, nos 
campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. 
Logo, a discriminação significa sempre desigualdade”.22 
 
Conforme determina a Declaração Universal dos Direitos Humanos, qualquer espécie 
de discriminação deve ser destruída, extirpada, de modo a assegurar, a todos os seres 
humanos, o pleno exercício de seus direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais. Até 
mesmo nossa Magna Carta, em seu art. 5º, inciso XLI, determina que “a lei punirá qualquer 
discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. 
 
 
 
 
 
2.3.3 Direitos humanos 
 
 
 
 
 
A expressão direitos humanos é uma forma abreviada de mencionar os direitos 
fundamentais da pessoa humana. Esses direitos são considerados fundamentais porque, sem 
eles, a pessoa não consegue existir ou não é capaz de se desenvolver e de participar 
plenamente da vida. 
Todos os seres humanos devem ter assegurado, desde o nascimento, as mínimas 
condições necessárias para se tornarem úteis à humanidade, como também devem ter a 
oportunidade de receber os benefícios que a vida em sociedade pode proporcionar. Esse 
conjunto de condições e de possibilidades associa as características naturais dos seres 
humanos à capacidade natural de cada pessoa poder valer-se como resultado da organização 
social. É a esse conjunto de valores que se dá o nome de direitos humanos. 
Para entendermos, com facilidade, o que significam tais direitos, basta dizer que 
correspondem a necessidades essenciais da pessoa humana. Trata-se daquelas necessidades 
que são iguais para todos os seres humanos e que devem ser atendidas para que a pessoa 
 
 
22 PIOVESAN, Flávia. Temas de direitos humanos. [S.l.: s.n.], [20--]. 
33 
 
 
 
 
 
 
 
possa viver com dignidade. Assim, por exemplo, a vida é um direito humano fundamental, 
porque, sem ela, a pessoa não existe. Então, a preservação da vida é uma necessidade de 
todas as pessoas humanas. Mas, observando como são e como vivem os seres humanos, 
percebe-se a existência de outras necessidades que são também fundamentais, como a 
alimentação, a saúde, a moradia, a educação e tantas outras coisas. 
Todas as pessoas nascem essencialmente iguais e, portanto, com direitos iguais. 
Porém, ao mesmo tempo em que nascem iguais todas as pessoas nascem também livres. Essa 
liberdade está dentro delas, com sua inteligência e sua consciência. É evidente que todos os 34 
seres humanos acabarão sofrendo a influência da educação que receberem e do meio social em 
que viverem, mas isso não elimina sua liberdade essencial. É por isso que muitas vezes uma 
pessoa mantém um modo de vida até certa idade e depois o transforma completamente, 
mudando consciente e livremente o rumo de sua vida. 
Os direitos humanos fundamentais independem de sexo, local de nascimento, cor da 
pele, classe social e econômica, como também não consideram o nome de família, a profissão, a 
preferência política ou a crença religiosa: foram feitos para todos os seres humanos. E esses 
direitos continuam existindo mesmo para aqueles que cometeram ou praticam atos que 
prejudiquem as pessoas ou a sociedade. Nesses casos, aquele que perpetrou o ato contrário ao 
bem da humanidade deve sofrer a punição prevista em uma lei já existente, que respeita os 
direitos da pessoa humana. 
Não pode haver coisa mais valiosa do que o ser humano. Por suas características 
naturais, e por serem mais do que uma simples porção de matéria viva, as pessoas são dotadas 
de inteligência, consciência e vontade, e sua dignidade as coloca acima de todas as coisas da 
natureza. Mesmo as teorias chamadas materialistas, que não aceitam a espiritualidade da 
pessoa humana, sempre foram forçadas a reconhecer que existe em todos os seres humanos 
uma parte não-material, uma dignidade inerente à condição humana, e a preservação dessa 
dignidade faz parte dos direitos humanos. 
O crescimento econômico e o progresso material de um povo têm valor negativo se 
forem obtidos à custa de ofensas à dignidade de seres humanos. O sucesso político ou militar de 
uma pessoa ou de um povo, bem como o prestígio social ou a conquista de riquezas, nada disso 
é válido ou merecedor de respeito se for alcançado mediante afronta à dignidade e aos direitos 
fundamentais dos seres humanos. 
No ano de 1948, a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a Declaração 
Universal dos Direitos Humanos, que diz, em seu artigo 1°, que “todos os seres humanos 
nascem livres e iguais em dignidade e direito”. Além disso, segundo essa Declaração, todos 
 
 
 
 
 
 
 
devem agir, em relação uns aos outros, “com espírito de fraternidade”. A pessoa consciente do 
que é e do que os outros são, a pessoa que usa sua inteligência para perceber a realidade, sabe 
que não teria nascido e sobrevivido sem o amparo e a ajuda de muitos. 
E todos, mesmo os adultos saudáveis e muito ricos, podem facilmente perceber que 
não podem dispensar a ajuda constante de muitas pessoas para conseguirem satisfazer às suas 
necessidades básicas. Existe, portanto, uma solidariedade natural, que decorre da fragilidade

Outros materiais