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1. A Economia Brasileira na Primeira República (1889-1930): Auge e Crise da Economia Primário- Exportadora, Antecedentes do Desenvolvimentismo (1ª aula) Disciplina: Economia Brasileira Contemporânea I UFRJ – Graduação em Ciências Econômicas (Bacharelado) 1º Semestre Letivo de 2023 Prof. Wilson Vieira 1 1. Introdução Quatro interpretações principais a respeito do desenvolvimento industrial brasileiro a partir de uma base agrícola-exportadora: I) A teoria dos choques adversos. II) A ótica da industrialização liderada pela expansão das exportações. III) A interpretação baseada no desenvolvimento do capitalismo no Brasil (ou o “capitalismo tardio”). IV) A ótica da industrialização intencionalmente promovida por políticas do governo 2 1. Introdução A interpretação alternativa de Wilson Suzigan. Outras interpretações alternativas: Luis Carlos Soares, Geraldo de Beauclair Oliveira, Vera Cepêda, Pedro Cézar Dutra Fonseca e Ricardo Bielschowsky. 3 2. A Teoria dos Choques Adversos Aspectos fundamentais: A ocorrência de um choque adverso (crises no setor exportador, guerras, crises econômicas internacionais) afeta o setor externo da economia, aumentando os preços relativos das importações e impondo dificuldades às mesmas. “Versão extrema”: Proclama-se como uma teoria de aplicação geral. No Brasil, originou-se dos estudos dos primeiros escritores e observadores contemporâneos da economia brasileira, os quais afirmavam que a indústria interna de transformação reagiu positivamente às dificuldades impostas às importações pela I Guerra Mundial. 4 2. A Teoria dos Choques Adversos Posteriormente, outros autores seguiram esse caminho e estenderam a aplicação dessa versão a períodos similares de choques adversos (Grande Depressão da década de 1930 e II Guerra Mundial). A proeminência alcançada por essa versão decorreu da influente interpretação do desenvolvimento (ou subdesenvolvimento) da América Latina pela CEPAL. Versão de Furtado (1959) e Tavares (1972): Distinguem o tipo de desenvolvimento industrial ocorrido antes e depois da crise do café e da Grande Depressão da década de 1930. 5 2. A Teoria dos Choques Adversos Desenvolvimento industrial antes da década de 1930: crescimento industrial induzido pelo crescimento da renda interna resultante da expansão do setor exportador, principalmente do café e sem diversificação de sua estrutura, pois não houve a adoção de medidas adequadas de proteção e incentivo pelo governo. Desenvolvimento industrial após 1930: industrialização substitutiva de importações, estimulada pelo choque da crise do café e da Grande Depressão e pelas políticas econômicas adotadas para combater a crise. A crise de 1929-1932 no setor externo da economia brasileira é um ponto de inflexão no desenvolvimento industrial brasileiro. O setor exportador torna-se estratégico para criar a capacidade de importar os bens de capital essenciais para o investimento na indústria de transformação. 6 2. A Teoria dos Choques Adversos O enfoque de Tavares e Furtado é essencialmente igual ao enfoque cepalino do crescimento voltado para fora, porém, com a diferença básica que para os dois primeiros autores, a relação entre o setor exportador e as atividades internas é de interdependência e não de antagonismo, de modo que pôde ocorrer um crescimento industrial dentro da economia primário-exportadora. Entretanto, esse crescimento industrial, juntamente com o setor agrícola de subsistência, era insuficiente para dar autonomia às atividades internas. Na verdade, o crescimento econômico estava ligado ao crescimento da demanda externa por produtos primários, o que caracterizava a economia agrícola-exportadora como “reflexa e dependente” (SUZIGAN, 2000: 29). 7 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações A interpretação de Furtado e Tavares poderia, em princípio, ser considerada idêntica à interpretação desse desenvolvimento como uma industrialização liderada pela expansão das exportações. Contudo, há duas diferenças substanciais: i) esta interpretação estabelece uma relação direta entre o desempenho do setor exportador e o desenvolvimento industrial; ii) esse desenvolvimento industrial é caracterizado como um processo abrangente de industrialização, não limitado à produção de bens de consumo como extensão do setor exportador. Warren Dean em A Industrialização de São Paulo (1976) e Robert N. V. C. Nicol (1974) em A Agricultura e a Industrialização no Brasil (1850/1930), estabelecem uma relação direta entre a expansão das exportações de café e o desenvolvimento industrial no estado de São Paulo e afirmam que a I Guerra Mundial interrompeu um processo de desenvolvimento industrial que estava em andamento. 8 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações Quanto à década de 1930, Dean e Nicol têm visões diferentes. Nicol: a relação direta entre o desempenho do setor exportador (café) e o desenvolvimento industrial é válida para o período anterior à década de 1930. Depois, temos a industrialização substitutiva de importações (ISI). O papel do Estado e a participação do capital estrangeiro nesse processo foram importantes. Dean: tal relação direta é estendida à década de 1930. Para ele, a crise do café e a Grande Depressão não favoreceram o crescimento industrial durante a década de 1930. O papel do Estado nesse processo é mínimo. Os “burgueses imigrantes” foram importantes nessa construção industrial. 9 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações Peláez em História da Industrialização Brasileira (1972) critica o argumento dos choques adversos, concentrando-se somente na década de 1930 e especificamente na interpretação de Furtado sobre o impacto da crise do café e da Grande Depressão sobre a economia brasileira e nas políticas econômicas adotadas para combater a crise. Contudo, não oferece explicitamente uma interpretação alternativa do desenvolvimento industrial brasileiro, pois chega a concluir, com base em taxas relativas de retorno entre investimentos no setor exportador e nas atividades internas, que os programas de valorização do café favoreceram o primeiro e atrasaram o desenvolvimento industrial brasileiro. 10 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações A análise de Fishlow (1972) endossa a “Teoria dos Choques Adversos” com algumas qualificações, mas não refuta a tese da “industrialização induzida pela expansão das exportações” (cf. SAES, 1989: 25- 27). Leff em Underdevelopment and Development in Brazil (1982) defende que houve apoio mútuo entre a expansão das exportações e o desenvolvimento industrial no Brasil e que este não necessitou de choques externos (como o rompimento das relações de comércio durante a I Guerra Mundial). Porém, contraditoriamente, adota a análise de Furtado sobre a década de 1930, apesar de sequer mencionar a política de defesa do café. 11 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Contribuições mais importantes: Sérgio Silva em Expansão Cafeeira e Origem da Indústria no Brasil (1976), João Manuel Cardoso de Mello em O Capitalismo Tardio (1982), Maria da Conceição Tavares em Acumulação de Capital e Industrialização no Brasil (1974), Wilson Cano em Raízes da Concentração Industrial em São Paulo (1977) e Liana Aureliano em No Limiar da Industrialização (1981). 12 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Tal ótica se constitui numa revisão da doutrina cepalina tradicional, aceitando dela o postulado de que o desenvolvimento industrial latino-americano é específico (economia periférica), mas refutando o caráter reflexo atribuído às economias latino- americanas pela CEPAL. O conceito de dependência da vertente de FHC e Faletto, exposta em Dependência e Desenvolvimento na América Latina (1970) é incorporado por essa ótica ao sugerir que o desenvolvimento latino-americano (particularmente o brasileiro) é um desenvolvimento capitalista determinadoprimeiramente por fatores internos e secundariamente por fatores externos. 13 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” A transição do trabalho escravo para o trabalho assalariado na economia primário-exportadora marca a emergência do modo de produção capitalista. O crescimento industrial é primordialmente um resultado do processo de acumulação de capital no setor agrícola exportador que, por sua vez, depende da procura externa A periodização cepalina tradicional (antes de 1930: economia voltada para fora e depois, crescimento voltado para dentro devido à crise no setor exportador) é substituída por uma que enfatiza a transição da economia colonial para a mercantil nacional baseada no trabalho escravo e para a economia capitalista exportadora, fase (entre 1880 e 1920) em que se deu a origem e a consolidação do capital industrial. O Encilhamento é visto como algo positivo para a expansão industrial. 14 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” O capital industrial é visto como uma extensão do capital cafeeiro e como parte do complexo exportador de café. O “vazamento” de capital cafeeiro para a indústria ocorreu durante períodos de expansão das exportações. A relação entre a expansão do setor exportador (café) e o crescimento industrial não é linear: nos períodos de crise no setor exportador a indústria de transformação de início é negativamente afetada, mas à medida que a proteção ao mercado interno aumenta, como resultado da redução na capacidade de importar, a produção industrial se recupera, absorvendo gradualmente a capacidade de produção ociosa. 15 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” As contradições na relação entre o capital cafeeiro e o capital industrial derivam da subordinação do capital industrial ao capital cafeeiro, e da subordinação deste ao capital internacional É um crescimento industrial específico e retardatário porque é subordinado à acumulação internacional de capital e não é autônomo. O desenvolvimento industrial também é explicado pelos efeitos da política econômica (especialmente aduaneira e cambial) sobre a indústria. Esse padrão de acumulação de capital foi rompido pela crise do café e pela Grande Depressão da década de 1930, tornando a acumulação de capital industrial mais independente do capital cafeeiro, pelo menos no lado da procura, que agora seria principalmente pelo crescimento da renda no setor industrial-urbano. Mas seria, pelo menos até a década de 1950, uma industrialização restringida. 16 5. A Ótica da Industrialização Intencionalmente Promovida por Políticas do Governo Atribui grande importância a políticas do governo para a promoção da industrialização, notadamente através da proteção tarifária e da concessão de incentivos e subsídios. Não procura, porém, provar que a industrialização foi promovida por uma abrangente política deliberada de desenvolvimento. Minimiza a importância do Encilhamento. Busca contestar a visão comum na historiografia brasileira de que o papel do Estado na promoção do desenvolvimento industrial no período pré-1930 foi mínimo ou não significativo. O Estado, na verdade, desempenhou um papel positivo, primeiramente por meio de uma proteção alfandegária deliberada e em segundo lugar através da concessão de incentivos e subsídios a indústrias específicas. Principais defensores: F. R. Versiani e M. T. Versiani, em diversos trabalhos, individuais ou conjuntos, entre 1977 e 1982. 17 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan As origens do desenvolvimento industrial brasileiro poderiam também ser interpretadas nos termos da teoria do crescimento econômico induzido por produtos, de Watkins em A Staple Theory of Economic Growth (1963) ou da abordagem dos encadeamentos generalizados de Hirschmann em A Generalized Linkage Approach to Development, with special Reference to Staples (1981). O principal determinante de potencial de um produto básico para gerar efeitos de encadeamento ou de expansão é a sua capacidade de induzir investimentos no mercado interno pela demanda de fatores e insumos intermediários para sua produção, da possibilidade de processamento ulterior do produto básico e da distribuição da renda proveniente da expansão do produto básico de exportação. A essência do processo pelo qual a expansão das exportações induz o investimento em outras atividades é o efeito de encadeamento. 18 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Linkages: i) de produção (para frente e para trás); ii) consumo (ou demanda final); iii) fiscal. Classificação geral: i) interno; ii) externo. Todos podem ser internos ou externos, com exceção do linkage fiscal, externo por definição. Vantagens desse tipo de abordagem: é aplicável a qualquer produto básico e ajuda a entender as diferenças no desenvolvimento econômico (particularmente industrial) das diferentes regiões (ou países) durante o período de crescimento voltado para a exportação. As possibilidades de aplicar essa abordagem ao caso do Brasil são imensas ao observarmos os diversos produtos básicos que no século XIX, ao crescerem sua renda, induziram alguma diversificação das atividades econômicas em torno de sua base. Como exemplo maior, temos o café. 19 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Suzigan não aplica em sentido amplo a abordagem dos linkages em seu trabalho. Contudo, esses enfoques estão implícitos no estudo das origens de diversas indústrias específicas e das suas possíveis ligações com o produto (ou produtos) básico(s) da região. Hipótese de trabalho de Suzigan (que ele confirma no final de seu estudo): o desenvolvimento industrial no Brasil no século XIX pode ser explicado como um resultado do crescimento da produção industrial induzido pela expansão do setor exportador. Essa relação continuou no início do século XX, mas foi sendo gradualmente reduzida até a crise do setor exportador e a Grande Depressão da década de 1930, quando essa ligação é rompida, apesar do setor industrial continuar dependente do setor exportador para gerar capacidade de importar máquinas e equipamentos necessários aos investimentos industriais e insumos para a produção industrial, iniciando-se, portanto, a ISI. 20 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Reinterpretação das origens do desenvolvimento industrial brasileiro: antes de 1914, e em menor grau até 1929, o desenvolvimento da indústria brasileira de transformação pode ser caracterizado como tendo sido induzido pela expansão do setor agrícola exportador. Entretanto, há clara distinção entre o crescimento industrial que ocorreu antes da I Guerra Mundial e a partir dela. O desenvolvimento industrial que ocorreu a partir da década de 1930, por outro lado, pode ser caracterizado como ISI. A década de 1930 representa um ponto de inflexão na transição para uma economia industrial, mas também é evidente que essa transição começou durante o período de crescimento liderado pelo setor agrícola exportador, após o choque da I Guerra Mundial e especialmente na década de 1920. Transição que somente seria completada no fim da década de 1950, no início da industrialização pesada. 21 7. Outras Interpretações As interpretações de Luis Carlos Soares (1984) em A Manufatura na Formação Econômica e Social Escravista no Sudeste: Um Estudo das Atividades Manufatureiras na Região Fluminense (1840-1880) e de Geraldo de Beauclair Mendes de Oliveira (1987) em A Pré-Indústria Fluminense (1808-1860). A visão de Vera Cepêda sobre a transição café- indústria. A visão de Pedro Cézar Dutra Fonseca sobre o início do desenvolvimentismo em Vargas já antes da Revolução de 1930. A visão de Ricardo Bielschowsky. 22 8. Bibliografia BIELSCHOWSKY, Ricardo. Pensamento Econômico Brasileiro (1930-1964): O Ciclo Ideológico do Desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Contraponto, 2000. CEPÊDA, Vera. A Construção da Industrialização no Brasil: Políticas Econômicas, Mudança Social e Crise do Liberalismo na Primeira República. Desigualdade & Diversidade. Rio deJaneiro: PUC- Rio, nº 7, jul/dez, 2010, pp. 115-136. 23 8. Bibliografia FONSECA, Pedro Cézar Dutra. Gênese e Precursores do Desenvolvimentismo no Brasil. Pesquisa e Debate. São Paulo: PUC-SP, vol. 15, nº 2 (26), 2004, pp. 225-256. FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 34ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2007 (1ª edição: 1959). OLIVEIRA, Geraldo de Beauclair Mendes de. A Pré- Indústria Fluminense: 1808/1860. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, 1987. (Tese, Doutorado em História). 24 8. Bibliografia SAES, Flávio A. M. de. A controvérsia sobre a industrialização na Primeira República. Estudos Avançados. Vol. 3, n. 4, 1989, p. 20-39. São Paulo, IEA-USP. SOARES, Luis Carlos. A Manufatura na Formação Econômica e Social Escravista no Sudeste. Um Estudo das Atividades Manufatureiras na Região Fluminense – 1840-1880. Niterói, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia da UFF, 1984. (Dissertação, Mestrado em História). 25 8. Bibliografia SUZIGAN, Wilson. Indústria Brasileira: Origem e Desenvolvimento. São Paulo: Hucitec, Editora da Unicamp, 2000 (1ª edição: 1985). TAVARES, Maria da Conceição. Da Substituição de Importações ao Capitalismo Financeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1972. 26 Slide 1: 1. A Economia Brasileira na Primeira República (1889-1930): Auge e Crise da Economia Primário-Exportadora, Antecedentes do Desenvolvimentismo (1ª aula) Disciplina: Economia Brasileira Contemporânea I UFRJ – Graduação em C Slide 2: 1. Introdução Slide 3: 1. Introdução Slide 4: 2. A Teoria dos Choques Adversos Slide 5: 2. A Teoria dos Choques Adversos Slide 6: 2. A Teoria dos Choques Adversos Slide 7: 2. A Teoria dos Choques Adversos Slide 8: 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações Slide 9: 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações Slide 10: 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações Slide 11: 3. A Ótica da Industrialização Liderada pela Expansão das Exportações Slide 12: 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Slide 13: 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Slide 14: 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Slide 15: 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Slide 16: 4. A Ótica do “Capitalismo Tardio” Slide 17: 5. A Ótica da Industrialização Intencionalmente Promovida por Políticas do Governo Slide 18: 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Slide 19: 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Slide 20: 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Slide 21: 6. A Interpretação Alternativa de Wilson Suzigan Slide 22: 7. Outras Interpretações Slide 23: 8. Bibliografia Slide 24: 8. Bibliografia Slide 25: 8. Bibliografia Slide 26: 8. Bibliografia
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