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Resenha: O ascetismo e o espírito do capitalismo (Max Weber em A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo) Capítulo V – Ascese e Capitalismo A ociosidade que o gozo da riqueza pode proporcionar é em si só um motivo que torna reprovável a retenção de posses, visto que permite um relaxamento quanto a busca de uma conduta moral cotidiana que seja condizente com a salvação desejada no âmbito do sagrado. Na busca de um estado de graça, o ser humano deve agir de acordo com a vontade de Deus, na tentativa de aumentar sua glória através do trabalho sem descanso, a fim de reforçar sua própria vocação. O trabalho duro, como barreira às tentações sexuais, dúvidas religiosas e escrúpulos torturantes. A vontade de trabalhar remete à presença do estado de graça e a verificação da ausência de um é tida automaticamente como sintoma da ausência do outro. “Também ao homem de posses não é permitido comer sem trabalhar, pois se ele de fato não precisa do trabalho para cobrir suas necessidades, nem por isso deixa de existir o mandamentos de Deus, ao qual ele deve obediência tanto quanto o pobre.” (pág. 145) Nesse sentido, o protestantismo acredita na divisão do trabalho como especialização do indivíduo na vocação que lhe foi dada por Deus. Para Lutero, a divisão em profissões e estamentos entre os seres humanos apresenta-se como a exalação da vontade divina, de modo que manter-se na posição social reservada por Deus a um indivíduo torna-se uma obrigação de cunho religioso. A divisão do trabalho tende a proporcionar uma profição fixa que, se comparada ao trabalho instável imposto fora dessa divisão, apresenta um caráter metodo-sistemático, exigido pela ascese intramundana. “Não o trabalho em si, mas o trabalho profissional racional, é isso exatamente que Deus exige.” (pág. 147) A ética protestante é racional por sua natureza. A especialização da profissão trazida pela divisão do trabalho não é condenável se seu fim for a dedicação a um exercício mais útil do trabalho, que aproxime ainda mais o indivíduo de sua graça. Uma profissão condizente com a vontade de Deus, além de útil, orienta-se por critérios morais, pela importância que tem para o coletivo e pela capacidade de gerar lucro econômico privado. Se há oportunidade de maior obtenção de lucro, o crente deve aproveitá-la visando atender a vontade de Deus para com ele. Ao recusar-se a seguir tal conduta de obediência, o indivíduo recusa-se simultaneamente a ser administrador de Deus, visto que, se feito unicamente para Deus, o trabalho enriquecedor é permitido. Weber relaciona as normas presentes no Antigo Testamento com uma justeza formal e as éticas judaica e puritana. Havia uma distância entre ética econômica judaica medieval e moderna, que encontrava-se ao lado do capitalismo “aventureiro”, de orientação especulativa, e a ética econômica puritana, que encontra-se na empresa racional burguesa e na organização racional do trabalho. A crença discernida entre os puritanos, de que pertenciam ao povo eleito de Deus, assumia um tom de gratidão que percorria a disposição da vida cotidiana burguesa, que favorecia o caráter firme e formalisticamente correto do capitalismo da época. Weber tenta então esclarecer os pontos nos quais a concepção de vocação profissional e uma conduta de vida ascética influenciaram diretamente o estilo de vida capitalista. A ascese contra o ócio e o gozo descontraído da existência. O autor cita o decreto que permitia certas diversões populares (como esportes, por exemplo) aos domingos. Combatido pelos puritanos principalmente por desviar de propósito aqueles que mantinham sua conduta de vida ordeira. Os puritanos defendiam o princípio da conduta de vida ascética, de forma que tais manifestações de esporte serviria apenas para o fim racional de restauração da potência física do ser. Qualquer gozo deste o tornava condenável. “O gozo instintivo da vida que em igual medida afasta do trabalho profissional e da devoção era, exatamente enquanto tal, o inimigo da ascese racional, quer se apresentasse na forma de esporte “grã-fino” ou, da parte do homem comum, como freqüência a salões de bailes e tabernas.” (pág. 152). Dessa forma, era de merecida atenção a postura assumida referente até aos bens culturais cujo valor difere do religioso. Aspectos culturais que implicavam em um comportamento irracional, sem finalidade, não ascético, que não servia à glória de Deus, como o teatro ou a ostentação de trajes, eram condenáveis e por vezes tido como contraditório à ética do puritano. “Quanto mais posses, tanto mais cresce – se a disposição ascética resistir a essa prova – o peso do sentimento de responsabilidade não só de conservá-la na íntegra, mas ainda de multiplicá-la para a glória de Deus através do trabalho sem descanso.” Eis aqui a uma passagem exemplar que traz ao conhecimento do leitor o caráter acumulativo da ética protestante e que, tal multiplicação, como é citada, explica o fato de os reinvestimentos nos negócios serem encarados como a manutenção e continuidade do trabalho duro que agrada a Deus. A repulsa do desejo intenso por bens materiais não era uma luta contra o ganho racional, mas sim contra o uso irracional das posses. “A valorização religiosa do trabalho profissional mundano, sem descanso, continuado, sistemático, como meio ascético simplesmente supremo e a um só tempo comprovação o mais segura e visível da regeneração de um ser humano e da autenticidade de sua fé, tinha que ser, no fim das contas, a alavanca mais poderosa que se pode imaginar da expansão dessa concepção de vida que aqui temos chamado de “espírito” do capitalismo.” Weber desconstrói todo o discurso puritano para então reconstruí-lo explicitando todas as tendências que esse produzia para fortalecer em seu centro uma conduta tão igualmente formal, voltada para o aspecto econômico , no que se refere a uma ascese, um exercício efetivo da realização da virtude plena na vida moral, e o espírito do capitalismo se encontra nas racionalização que a conduz.
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