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Abordagem farmacológica do processo inflamatório A inflamação é a resposta do organismo à injúria tecidual, com o objetivo de restaurar a estrutura e a função do tecido afetado, sendo uma resposta dinâmica de tecidos vascularizados à injúria. A curto prazo, a resposta inflamatória tem o objetivo de contenção da hemorragia, limpeza do tecido, inativar/neutralizar o agente inflamatório e melhorar a resposta do organismo. Se tratando a longo prazo, tem como objetivo a limpeza do tecido, cicatrização e reparo. A inflamação é a manifestação das respostas imunitárias inatas e adaptativas. Ao lado de atitudes (reflexas ou adquiridas) que permitem fugir ou evitar agressões, o organismo humano e os demais vertebrados tem dois mecanismos básicos de defesa: (1) barreiras mecânicas e químicas no revestimento do corpo e de suas cavidades (pele e mucosas); (2) resposta imunitária, que é o mecanismo de defesa mais importante do organismo. A resposta inata, é inespecífica, apresentando um amplo espectro de ação, desencadeando respostas semelhantes para enfrentar agressões muito diversas. Quando ligada à resposta adaptativa, interfere na qualidade e na intensidade desta. O sistema imunitário utiliza receptores que reconhecem agressões diversas, reconhecendo grupos de agressões, mas não uma agressão particular. Já a resposta imune adaptativa dispõe de um conjunto de receptores (gerados por recombinação genética) que permite reconhecer, de modo específico, todas a moléculas existentes em um patógeno ou aquelas modificadas por lesão tecidual (denominadas genericamente antígenos), constituindo um repertório de receptores que pode ser considerado completo para o reconhecimento de agressões. Por essa razão, fala-se que a resposta adaptativa é específica, ou seja, dirigida especificamente a uma agressão. Os componentes celulares são representados por: (1) células circulantes (neutrófilos, eosinófilos, basófilos, monócitos, linfócitos (que incluem as células NK [natural killer], NKT [células natural killer originadas no timo] e células linfóides da imunidade inata) e células dendríticas); (2) células imunitárias residentes em tecidos (macrófagos residentes, mastócitos); (3) demais células dos tecidos, como células epiteliais, células endoteliais, fibroblastos, células da glia, osteócitos, condrócitos, células musculares e terminações nervosas aferentes. Todas essas células têm receptores para reconhecer agressões e são capazes de gerar mediadores da resposta inata. Os leucócitos são os executores mais importantes da resposta imunitária inata e adaptativa. No entanto, como são capazes de eliminar microrganismos invasores, são também potencialmente lesivos para os tecidos. Os leucócitos e suas ações serão descritos adiante (células do exsudato inflamatório); As plaquetas são fonte importante de mediadores da resposta imunitária inata, além de atuarem na coagulação sanguínea. Embora não saiam ativamente da circulação, as plaquetas aderem ao endotélio e podem cooperar com estas células e com leucócitos aderidos na síntese transcelular de mediadores (ver adiante). Assim, além de sua ação no processo de hemostasia, as plaquetas são fonte de prostaglandinas e leucotrienos (mediadores pró-inflamatórios) e de lipoxinas (anti-inflamatórias). Mastócitos possuem receptores para IgE, além de receptores para C3a, C5a, receptores beta-adrenérgicos, receptores colinérgicos e receptores H1 e H2 para histamina. Receptores beta-adrenérgicos e H2 são antagonistas da desgranulação de mastócitos, enquanto receptores colinérgicos e alfa-adrenérgicos são agonistas de desgranulação. Seus grânulos contêm histamina, heparina, proteases e outros produtos. Os mastócitos sintetizam e excretam ainda citocinas, quimiocinas, leucotrienos e prostaglandinas. Células dendríticas existem em todos os tecidos e têm a propriedade de endocitar substâncias estranhas e componentes teciduais lesados. Digerem parcialmente antígenos proteicos e associam os peptídeos resultantes com MHC I ou II. Em seguida, deslocam-se para órgãos linfoides, onde apresentam os peptídeos (antígenos) aos linfócitos T CD4+ ou T CD8+ para a montagem da resposta imunitária adaptativa. A ativação da coagulação sanguínea é um processo rápido e explosivo que precisa ser limitado ao local em que a lesão ocorreu. Por essa razão, deve ser bem controlado, o que é feito por meio de: (1) diluição dos pró-coagulantes no fluxo sanguíneo; (2) remoção dos fatores pró-coagulantes pelo sistema fagocitário mononuclear; (3) mecanismos anticoagulantes naturais, constituídos por: (a) antitrombina, inibidora de proteases, inibe a trombina e os fatores Xa, IXa, XIIa e XIa, com eles formando complexos irreversíveis; (b) heparina e sulfato de heparano na superfície endotelial removem rapidamente a trombina (ver Figura 9.13B); (c) complexo da proteína S, que é um complexo formado por trombomodulina, trombina (protease) e proteína S (substrato). A proteína S, ativada pela trombina, ativa a proteína C, a qual tem ação proteolítica sobre os fatores Va e VIIIa (ver Figura 9.13C); (d) fator inibidor do fator tecidual (TFPI, tissue factor pathway inhibitor), que fica na superfície endotelial e inibe o fator Xa e o complexo FT/VIIa; (e) prostaciclina e NO são potentes antiagregadores plaquetários, inibindo a ação de plaquetas na progressão da coagulação. A coagulação sanguínea associa-se à inflamação por meio de: (1) agregação plaquetária libera serotonina e histamina, que são importantes mediadores inflamatórios; (2) o fator Hageman atua sobre a pré-calicreína e produz calicreína, a qual gera bradicinina, também um mediador inflamatório. A trombina é reconhecida em receptores PAR e ativa genes pró-inflamatórios Importância do Edema para o processo inflamatório ● Diluição das toxinas acumuladas na área da lesão ● Aporte local de mediadores químicos e de meios de defesa (imunoglobulinas, fatores da coagulação, componentes do sistema complemento) ● Limitação do ambiente inflamatório através de uma parede de fibrina (fibrinogênio plasmático), evitando a difusão de microrganismos infecciosos ● Redução do fluxo circulatório por hemo precipitação - Favorecimento da diapedese leucocitária Mediadores inflamatórios Citocinas Citocinas são proteínas que regulam a resposta imunitária, tanto inata como adaptativa. São características gerais das citocinas: (1) podem ser produzidas por qualquer célula em resposta a uma agressão, fazendo parte da resposta inata e imediata a agressões; (2) são secretadas por um período curto e em quantidade limitada; (3) há grande redundância em suas fontes e em seus efeitos: uma mesma citocina pode ser produzida por células distintas, tendo citocinas diferentes o mesmo efeito; (4) muitas têm efeito pleiotrópico, ou seja, efeitos diversos em células diferentes; (5) muitas vezes uma citocina influencia a síntese de outra, inibindo-a ou estimulando-a; (6) podem ter ação sinérgica ou antagônica; (7) todas as citocinas atuam em receptores celulares, podendo um mesmo receptor ligar-se a citocinas diferentes; (8) seus efeitos manifestam-se geralmente após indução gênica, com síntese de mRNA (efeitos não imediatos) após ligação com o receptor. Algumas, como a IL-18 e a IL-1β, existem pré-formadas e são liberadas após proteólise imediatamente após uma agressão. Algumas citocinas favorecem a inflamação, sendo denominadas citocinas pró-inflamatórias, como IL-1, TNF-α, IL-6 e IL18, mais universais na resposta inata, e IL-17 e IFN-γ, mais envolvidas na resposta adaptativa; outras reduzem a resposta e são chamadas citocinas anti-inflamatórias, como IL-10, TGF-β e IL-4. Quimiocinas Quimiocinas (chemokines, contração de chemotactic cytokines) são peptídeos de baixo peso molecular que orientam a movimentação de células que possuem receptores para elas. As quimiocinas possuem resíduos de cisteína na extremidade N, cujo espaçamento as divide em quatro grupos: (1) quimiocinas CXC (a), com duas cisteínas separadas por um aminoácido qualquer; (2) quimiocinas CC (b), com duas cisteínas contíguas;(3) quimiocinas C (g) com uma cisteína; (4) quimiocinas C3XC (d), com duas cisteínas separadas por três outros aminoácidos. Cada grupo tem vários membros, que são numerados como ligantes (L) de um receptor CXC, CC, C ou C3XC (CCL3, por exemplo, indica o ligante número 3 de um receptor CC) Mediadores lipídicos Fosfolipídeos e esfingomielina são as principais fontes de mediadores lipídicos. As enzimas-chave para a síntese desses mediadores são fosfolipases e esfingomielinases, situadas na membrana plasmática. Fosfolipases (A, C, D) hidrolisam fosfolipídeos da membrana e liberam ácido araquidônico, que origina: (1) prostaglandinas; (2) leucotrienos; (3) lipoxinas; (4) precursores do fator ativador de plaquetas. Esfingomielinases liberam ceramida e fosforilcolina. Aminas vasoativas Histamina e serotonina são as principais aminas com papel na reação inflamatória. Histamina é encontrada sobretudo em mastócitos e, em menor quantidade, em plaquetas e basófilos. A liberação de histamina se dá por agentes físicos (p. ex., frio, calor, traumatismos), pela ligação de anticorpos IgE na superfície celular (reações alérgicas; ver Capítulo 11), por componentes do complemento (C3a e C5a, anafilatoxinas), por neuropeptídeos (p. ex., substância P) ou por citocinas (p. ex., IL-1). Histamina causa dilatação arterial e aumenta a permeabilidade vascular, sendo o principal mediador da resposta inflamatória imediata. Serotonina, que também causa vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular, é encontrada em plaquetas e em algumas células neuroendócrinas do trato digestivo. Agregação plaquetária libera serotonina e histamina, o que explica em parte a associação entre coagulação sanguínea e inflamação. Cininas A calicreína atua no cininógeno de baixo peso molecular e origina bradicinina e calidina, ambas com ação vasodilatadora e de aumento da permeabilidade vascular, além de serem mediadores da dor (efeito algigênico). A bradicinina ativa a fosfolipase C, induzindo a síntese e a liberação de prostaglandinas. A enzima conversora da angiotensina (ECA, abundante nos pulmões) inativa a bradicinina e a calidina (a enzima que inativa a bradicinina é a mesma que converte a angiotensina I em angiotensina II, que é vasoconstritora). A α2-macroglobulina e a α1-antitripsina são inibidores naturais de cininas. Fenômenos ou momentos da inflamação A reação inflamatória desenvolve-se em diversas etapas ou momentos, aqui denominados fenômenos da inflamação: (1) fenômenos irritativos, que correspondem à irritação pelo agente agressor, seguida da liberação de alarminas, do reconhecimento destas e da liberação de mediadores; (2) fenômenos vasculares, caracterizados por modificações na microcirculação; (3) fenômenos exsudativos, com exsudação plasmática e celular; (4) fenômenos alterativos, que incluem lesões degenerativas e necróticas; (5) fenômenos resolutivos; (6) fenômenos reparativos, com regeneração ou cicatrização. Interferência farmacológica na inflamação Sendo divididos entre antiinflamatórios esteróides (glicocorticóides, corticosteróides, corticóides, antiinflamatórios hormonais); e antiinflamatórios não esteróides (AINES, não hormonais, antiinflamatórios do tipo da aspirina. Inibem a produção e/ou ação de todos os mediadores pró-inflamatórios Os principais fármacos usados para tratar a inflamação podem ser divididos em cinco em cinco grupos principais: ● Fármacos que inibem a enzima ciclo-oxigenase (COX) - os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e os coxibes. ● Fármacos antirreumáticos - os antirreumáticos modificadores da doença (ARMDs), incluindo alguns imunossupressores ● Os glicocorticoides ● Anticitocinas e outros agentes biológicos ● Outros fármacos que não pertencem a esses grupos, incluindo anti-histamínicos e fármacos usados para controlar gota. Antiinflamatórios esteróides Exemplos: dexametasona, Betametasona, Prednisona