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APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina CASO Em um dia de busca ativa pela equipe do Centro de Controle de Zoonoses, agentes se depararam com uma indígena de 30 anos, com sintomas de cansaço aos grandes esforços. A jovem morava em uma aldeia no interior do estado, numa casa de pau a pique, próximo a uma plantação de açaí. Encaminhada ao ambulatório de saúde indígena, juntamente com uma tradutora, a qual referiu que os pais da paciente morreram devido ao “bicho chupança”. Exames sorológicos foram solicitados. O interno pensa em solicitar também radiografias de tórax PA e perfil. OBJETIVOS - Conhecer os principais grupos de protozoários parasitas humanos. - Entender a epidemiologia, fisiopatologia, ciclo biológico e manifestações clínicas da doença de Chagas. - Conhecer os exames laboratoriais sorológicos para doença de Chagas. - Conhecer o esquema de tratamento para a doença de Chagas. - Discutir a situação atual de saúde indígena. PRINCIPAIS GRUPOS DE PROTOZOÁRIOS Protozoários são seres eucariontes, ou seja, possuem núcleo celular organizado dentro de uma carioteca, sendo a maioria heterótrofos, embora alguns sejam autótrofos, produzem clorofila e com ela fazem a fotossíntese, e assim conseguem produzir seus próprios alimentos. São classificados, de acordo com a locomoção no meio aquático, em: • Ciliados, que se locomovem mediante o batimento de cílios; • Flagelados, que se movimentam por meio de flagelos, estruturas mais adaptadas para a natação; • Rizópodos, que se rastejam com movimento ameboide, um tipo de locomoção no qual os microrganismos vão mudando a forma do seu corpo pela emissão de pseudópodes (“falso pés”); • Esporozoários, que não possuem organelas locomotoras nem vacúolos contráteis; esses microrganismos parasitas se disseminam pelo ambiente através da produção de muitos esporos, que são levados pela água e pelo ar, ou são levados através de animais vetores (moscas, mosquitos, carrapatos etc.), que se contaminam com esses protozoários patogênicos, ficam doentes e APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina transmitem essas doenças para outros animais. A maioria dos protozoários apresenta vida livre e aquática, podendo ser encontrada na água doce, salobra ou água salgada, leva vida livre também em lugares úmidos, rastejando pelo solo ou sobre matéria orgânica em decomposição. No entanto, algumas espécies levam vida parasitária nos organismos de diversos hospedeiros e, assim, passam a maior parte da vida parasitando diversas espécies de seres vivos, causando muitas doenças. A reprodução dos protozoários geralmente é assexuada, acontecendo por divisão múltipla, onde o microrganismo apenas se divide em cópias dele mesmo. Alguns produzem esporos para se disseminar pelo ambiente; outros, às vezes, também apresentam reprodução sexual, havendo nítida troca de material genético entre um microrganismo e outro. Principais doenças causadas por protozoários: Agente Etiológico Doença Giardia lamblia Giardíase Entamoeba histolytica Amebíase Trichomonas vaginalis Tricomoníase Toxoplasma gondii Toxoplasmose Leishmania Leishmaniose Trypanossoma cruzi Doença de Chagas Plasmodium vivax P. falciparum (95% das mortes) P. malariae P. ovale. Malária Trypanossoma cruzi As primeiras descrições morfológicas do Trypanosoma cruzi, por Carlos Chagas, foram feitas por observações do parasito fixado e corado pelo corante de Giemsa, método até hoje empregado. Observações por microscopia ótica nos permitem identificar no parasito: • a forma geral da célula; • o núcleo; • o cinetoplasto (DNA mitocondrial condensado, que se localiza sempre próximo ao flagelo nos tripanosomatídeos). Este nome foi dado porque se acreditava que esta estrutura (cineto=movimento; plasto=organela) fosse responsável diretamente pelo movimento do flagelo); • o flagelo. APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina De acordo com: (i) a forma geral da forma evolutiva; (ii) a posição relativa entre o flagelo e o núcleo; (iii) localização da bolsa flagelar (local de saída do flagelo); e (iv) localização do flagelo livre, podemos diferenciar as diferentes formas evolutivas dos tripanosomatídeos. No caso do Trypanosoma cruzi, a observação por microscopia óptica permite a identificação de 3 formas evolutivas bem definidas: Tripomastigota: forma alongada (podendo se apresentar como formas finas e largas), com cinetoplasto com formato arredondado localizado na região posterior ao núcleo, flagelo emergindo da bolsa flagelar (não visível ao microscópio óptico) que se localiza lateralmente, na região posterior do parasito. O flagelo emerge e se adere ao longo do corpo do parasito, tornando-se livre na região anterior. Esta forma é altamente infectante, e pode ser encontrada: no inseto vetor (porção posterior do intestino, no reto); sangue e espaço intercelular dos hospedeiros vertebrados; culturas de células infectadas; cultivo axênico (metaciclogênese in vitro). Amastigota: forma arredondada, com cinetoplasto em forma de barra ou bastão na região anterior ao núcleo, flagelo curto (não visível ao microscópio óptico) que emerge da bolsa flagelar. Esta forma pode ser encontrada: no interior de células em hospedeiros infectados bem como em cultivo axênico. APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina Epimastigota: forma alongada, com cinetoplasto em forma de barra ou bastão localizado anteriormente ao núcleo. O flagelo emerge da bolsa flagelar com abertura lateral, e percorre aderido a parte do corpo do parasita, tornando-se livre na região anterior. Pode ser encontrado: no tubo digestivo do inseto vetor; cultivo axênico. EPIDEMIOLOGIA DA DOENÇA DE CHAGAS Estima-se que 5,7 milhões de pessoas estejam infectadas por T. cruzi, incluindo 1 milhão de pessoas com miocardiopatia crônica. Porém, a verdadeira carga global da doença de Chagas não é conhecida. O maior número de pessoas infectadas mora na Argentina, Brasil e México; a prevalência é maior na Bolívia (6,1%), Argentina (3,6%) e Paraguai (2,1%). Em regiões altamente endêmicas desses países, a prevalência pode ser de mais de 40%. Anteriormente restrita a populações rurais pobres, a distribuição dos casos – e, de certa forma, a transmissão do T. cruzi – se estendeu progressivamente para cidades no contexto da rápida urbanização e migração rural. Uma história recente de migração de uma área rural é o principal fator de risco em ambientes urbanos. Um número crescente de surtos localizados está sendo relatado em regiões anteriormente estáveis, com a Bacia Amazônica particularmente sob risco. A alteração do quadro epidemiológico da doença de Chagas (DC) no Brasil, em decorrência das ações de controle vetorial e transfusional a partir da década de 1970, promoveu mudanças nas ações e nas estratégias de vigilância. Entretanto, o risco de transmissão vetorial da DC persiste em função da existência de espécies de triatomíneos autóctones com elevado potencial de colonização, da presença de reservatórios de Trypanosoma cruzi, e da aproximação cada vez mais frequente das populações humanas a esses ambientes, além da persistência de focos residuais de Triatoma infestans (DIAS et al., 2016). Soma-se a esse quadro a ocorrência de casos e surtos por transmissão oral pela ingestão de alimentos contaminados (caldo de cana, açaí, bacaba, entre outros), vetorial domiciliar sem colonização e vetorial extradomiciliar, principalmente na Amazônia Legal (PINTO; VALENTE; APG 04:O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina VALENTE, V. C.,2004; PINTO et al., 2008). Mesmo com a eliminação da transmissão da doença pelo principal vetor, Triatoma infestans, que persistia no século passado, a magnitude da DC no Brasil permanece relevante. Apesar da ausência da sistematização de dados relativos à fase crônica, em estudos recentes de pesquisa, as estimativas de prevalência da infecção variaram de 1,0% a 2,4% na população, o equivalente a 1,9 a 4,6 milhões de pessoas infectadas por T. cruzi (MARTINS-MELO et al., 2014). Reflexo disso é a elevada carga de mortalidade por DC no País, que representa uma das quatro maiores causas de mortes por doenças infecciosas e parasitárias nos últimos anos (MARTINS-MELO et al., 2016). FISIOPATOLOGIA Apenas o tripanossoma africano Trypanosoma brucei e o tripanossoma americano T. cruzi causam doença em seres humanos. A patogênese da doença de Chagas resulta de interações complexas entre o patógeno e a resposta imunológica do hospedeiro. Após a penetração local de tripomastigotos, os parasitas entram rapidamente na corrente sanguínea e se espalham pelo corpo, infectando uma ampla gama de células nucleadas nas quais podem se diferenciar em amastigotas. Figura 1: Um agregado de amastigotas de Trypanosoma cruzi com um infiltrado inflamatório na placenta de um lactente com infecção congênita. A resposta imune inata desencadeada por mucinas e DNA do parasita leva a uma resposta predominantemente de linfócitos T auxiliares 1. A produção de várias citocinas pró-inflamatórias e a ativação de linfócitos T CD8+ reduzem a parasitemia a um nível sub-patente dentro de 4 a 8 semanas, um ponto que marca o final da fase aguda. Mecanismos de evasão imune permitem a proliferação persistente de baixa intensidade de amastigotas e sua liberação na corrente sanguínea, com a subsequente infecção de potencialmente todos os tipos de células nucleadas – notavelmente as células cardíacas, esqueléticas e musculares lisas. Os mecanismos postulados para determinar a evolução patogênica para a miocardiopatia incluem a persistência dos parasitas e a incapacidade do hospedeiro para APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina sub-regular a resposta imune inicial, resultando em dano mediado por células e em desequilíbrio das respostas de células T auxiliares 1 e 2 com produção excessiva de citocinas pró-inflamatórias. Mecanismos secundários, como anormalidades da microcirculação e disautonomia (uma disfunção do SNA que pode acarretar tonturas, desmaios, fadiga, oscilações constantes da frequência cardíaca e desregulação da pressão arterial e da temperatura, dentre outros descompassos no organismo), também podem influenciar a progressão da lesão tecidual. No miocárdio, a inflamação crônica resulta em destruição celular e desenvolvimento de fibrose, levando a uma perda segmentar de contratilidade e dilatação das câmaras, com o risco associado de aneurisma apical do ventrículo esquerdo. A hipoperfusão (oferta de oxigênio insuficiente) focal e o dano tecidual são fontes de arritmias ventriculares, enquanto as lesões fibróticas afetam principalmente o sistema de condução. A destruição de células autonômicas leva à desnervação vagal e simpática, cuja significância exata ainda não está clara. O T. cruzi parece ter um efeito tóxico direto sobre as células ganglionares autonômicas intramurais do trato digestivo. Com o tempo, a perda de células neurais afeta o tônus muscular, levando a distúrbios da motilidade e, por fim, à dilatação do órgão (síndrome de mega vísceras). O esôfago e o cólon são primariamente afetados, mas as lesões podem ocorrer ao longo de todo o trato digestivo. O relaxamento inadequado do esfíncter esofágico inferior causa sintomas de acalasia, enquanto o dano ao cólon acaba simulando a doença de Hirschsprung, com constipação grave e risco de vólvulo e dilatação tóxica. Os fatores que reduzem a resposta imune celular, como a infecção pelo HIV, as terapias imunossupressivas pós-transplantes ou as doenças malignas hematológicas, podem aumentar a replicação intracelular de amastigotas, com aumento da parasitemia (reativação). As lesões ocorrem predominantemente no sistema nervoso central (SNC), no coração e na pele. Entre os pacientes com HIV, o risco de reativação é de cerca de 20% na ausência de terapias antirretrovirais, ocorrendo quando a contagem de células T CD4+ cai abaixo de 100/μL. CICLO BIOLÓGICO Muitas espécies de insetos triatomíneos, também denominados barbeiros, atuam como vetores para o T. cruzi, e muitas espécies de mamíferos domésticos e selvagens, bem como os seres humanos, estão envolvidos no complexo ciclo biológico. APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina 1. Os vetores são infectados pela ingestão de sangue de mamíferos que apresentam parasitas em sua corrente sanguínea. 2. Em seguida, os parasitas multiplicam-se no intestino dos insetos e, por fim, são eliminados nas fezes do vetor. 3. A transmissão para um novo hospedeiro mamífero ocorre quando as fezes do vetor carregadas de parasitas entram em contato com superfícies vulneráveis, como as mucosas da boca e do nariz, a conjuntiva ou soluções de continuidade da pele. 4. Quando entram em contato com tecidos do novo hospedeiro, os parasitas penetram nas células locais e multiplicam-se intracelularmente; à medida que as células parasitadas sofrem ruptura, os parasitas são liberados no sistema linfático e na corrente sanguínea. 5. Os microrganismos que estão na circulação entram em novas células situadas em locais distantes e, dessa maneira, mantêm um processo incessante de multiplicação assíncrona. 6. O ciclo biológico completa-se quando os parasitas são carregados no sangue sugado pelos vetores. As formas habituais de transmissão de T. cruzi para o ser humano são: • Vetorial: acontece pelo contato do homem suscetível com as excretas contaminadas dos triatomíneos que, ao picarem os vertebrados, costumam defecar após o repasto, eliminando formas infectantes do parasito, que penetram pelo orifício da picada, pelas mucosas ou por solução de continuidade deixada pelo ato de coçar. • Vertical: ocorre, principalmente, pela via transplacentária em qualquer fase da doença (aguda ou crônica). A transmissão pode ocorrer durante a gestação ou no momento do parto. Há possibilidade de transmissão pelo leite, durante a fase aguda da doença. Já em nutrizes na fase crônica, a transmissão durante a amamentação pode APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina ocorrer em casos de sangramento por fissura mamária, e não propriamente pelo leite. • Por via oral: acontece quando há ingestão de alimentos contaminados acidentalmente, seja com triatomíneo ou por fezes infectadas, bem como pela secreção das glândulas anais de marsupiais infectados. Também pode ocorrer por meio da ingestão de carne crua ou malcozida proveniente de animais de caça infectados. • Transfusional: ocorre pelo sangue contendo as formas tripomastigotas de T. cruzi quando transfundido em indivíduo hígido. • Por transplante de órgãos: ocorre por meio da doação de órgão ou tecidos de doador infectado (em qualquer fase da doença) a receptor sadio. • Por acidentes laboratoriais: podem ocorrer pelo contato direto de mucosa ou pele lesada com culturas de T. cruzi e exposição às fezes de triatomíneos contaminadas ou sangue (de casos humanos ou de animais) contendo formas infectantes do parasito. • Por outras formas acidentais: foram registradoscasos, principalmente em crianças, pela ingestão acidental do triatomíneo e/ou por contato direto com as excretas do inseto contaminado com T. cruzi. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Fase aguda (Inicial) Manifestação mais característica: febre constante, inicialmente elevada (38,5°C a 39°C), podendo apresentar picos vespertinos ocasionais. A síndrome febril pode persistir por até 12 semanas. Mesmo não tratada ou diagnosticada, essa fase pode evoluir com o desaparecimento espontâneo da febre e da maior parte das outras manifestações clínicas, progredindo para a fase crônica. Pode ocorrer o óbito em manifestações clínicas graves. Sintomatologia inespecífica Na maioria dos casos, ocorrem: • prostração, diarreia, vômitos, inapetência, cefaleia, mialgias, aumento de linfonodos; • exantema cutâneo de localização variável, com ou sem prurido e de aparecimento fugaz; • irritação em crianças menores, que apresentam frequentemente choro fácil e copioso. Sintomatologia específica APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina É caracterizada pela ocorrência, com incidência variável, de uma ou mais das seguintes manifestações: • sinais e sintomas de miocardite difusa com vários graus de gravidade; • sinais de pericardite, derrame pericárdico, tamponamento cardíaco; • manifestações sindrômicas de insuficiência cardíaca, derrame pleural; • edema de face, de membros inferiores ou generalizado; • tosse, dispneia, dor torácica, palpitações, arritmias; • hepatomegalia e/ou esplenomegalia, de intensidade leve a moderada. Sinais de porta de entrada, característicos da transmissão vetorial, como o sinal de Romaña (edema bipalpebral unilateral por reação inflamatória à penetração do parasito, na conjuntiva e adjacências) ou o chagoma de inoculação (lesões furunculoides, não supurativas, em membros, tronco e face, por reação inflamatória à penetração do parasito, que se mostram descamativas após duas ou três semanas), são menos frequentes. Deve-se ressaltar que a picada de um triatomíneo pode causar reações alérgicas locais ou sistêmicas, sem que isso signifique necessariamente infecção por T. cruzi. Quadros clínicos graves podem cursar com meningoencefalite, especialmente em lactente ou em casos de reativação (pessoas com comprometimento imunológico). No caso da DCA por transmissão oral, os surtos estudados parecem indicar diferenças na evolução clínica por essa forma de transmissão. Têm sido relatados: exantema cutâneo, hemorragia digestiva (hematêmese, hematoquezia ou melena), icterícia, aumento das aminotransferases, além de quadros mais frequentes e mais graves de insuficiência cardíaca. Fenômenos de enterite, abdome agudo, sangramento fecal, choque, hepatite focal podem ocorrer e têm significação prognóstica variada, devendo ser rotineiramente pesquisados e monitorados. Ressalta- se que a morbimortalidade é mais elevada na transmissão oral que a observada nos casos agudos por transmissão vetorial (DIAS et al., 2016). Fase Crônica A parasitemia é baixa e intermitente. Inicialmente, é assintomática e sem sinais de comprometimento cardíaco e/ou digestivo, e pode apresentar-se com as formas elencadas a seguir (DIAS et al., 2016): • Forma indeterminada: paciente assintomático e sem sinais de comprometimento do aparelho circulatório (clínica, eletrocardiograma e radiografia de tórax normais) e do aparelho digestivo (avaliação clínica e radiológica normais de debor Realce debor Realce debor Realce debor Realce APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina esôfago e cólon). Esse quadro poderá perdurar por toda a vida do indivíduo infectado ou pode evoluir tardiamente para a forma cardíaca, digestiva ou associada (cardiodigestiva). • Forma cardíaca: evidências de acometimento cardíaco que, frequentemente, evolui para quadros de miocardiopatia dilatada e insuficiência cardíaca congestiva (ICC). Essa forma ocorre em cerca de 30% dos casos crônicos e é considerada responsável pela maior frequência de óbitos na doença de Chagas crônica (DCC). • Forma digestiva: evidências de acometimento do aparelho digestivo que pode evoluir para megacólon e/ou megaesôfago. Ocorre em cerca de 10% dos casos. • Forma associada ou mista (cardiodigestiva): ocorrência concomitante de lesões compatíveis com as formas cardíacas e digestivas. EXAMES LABORATORIAIS SOROLÓGICOS São preconizados métodos parasitológicos diretos e/ou métodos sorológicos (BRASIL, 2018a), a depender da fase clínica da doença. Fase Aguda Métodos parasitológicos diretos O exame parasitológico é o mais indicado nesta fase. É definido pela presença de parasitos circulantes, demonstráveis no exame direto do sangue periférico. Incluem: • Pesquisa a fresco de tripanossomatídeos: execução rápida e simples, sendo mais sensível que o esfregaço corado. A situação ideal é a realização da coleta com paciente febril e dentro de 30 dias do início de sintomas. • Métodos de concentração: de rápida execução e baixo custo, debor Realce debor Realce debor Realce debor Realce APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina são eles: Strout, micro- hematócrito e creme leucocitário. Recomendados como primeira escolha de diagnóstico para casos sintomáticos com mais de 30 dias de evolução, devido ao declínio da parasitemia com o decorrer do tempo. As amostras de sangue devem ser examinadas dentro de 24 horas, devido à possível lise dos parasitos. • Lâmina corada de gota espessa ou de esfregaço: tem menor sensibilidade que os métodos anteriores, sendo realizado prioritariamente na região da Amazônia Legal, em virtude da facilidade de sua utilização em concomitância com o diagnóstico da malária. Em casos de elevada parasitemia, como na fase aguda da doença, na transmissão transfusional e em pessoas com comprometimento imunológico, pode ser um achado casual no exame de esfregaço para contagem diferencial de leucócitos. Métodos sorológicos Constituem-se em métodos indiretos, não sendo os mais indicados para o diagnóstico de faze aguda. Podem ser realizados quando os exames parasitológicos forem negativos e a suspeita clínica persistir. As técnicas sorológicas que podem ser utilizadas para confirmação de DCA são as que se seguem: • Detecção de anticorpos anti- T. cruzi da classe IgG: para confirmação, são necessárias duas coletas com intervalo mínimo de 15 dias entre uma e outra, sendo preferencialmente de execução pareada (inclusão da primeira e da segunda amostras no mesmo ensaio para efeitos comparativos), que possibilitem comparar a soroconversão, ou seja, sorologia negativa na primeira amostra e positiva na segunda por qualquer um dos métodos (ensaio imunoenzimático – ELISA; imunofluorescência indireta – IFI; ou hemaglutinação indireta – HAI), ou a variação de pelo menos duas diluições, pelo método de IFI (exemplos de variação com duas ou mais diluições: primeira amostra com valor de títulos 1:80, e segunda amostra com valor de títulos 1:320; primeira amostra com valor de títulos 1:160, e segunda amostra com valor de títulos 1:640). • Detecção de anticorpos anti- T. cruzi da classe IgM: é técnica complexa, e pode apresentar resultados falso- positivos em várias doenças febris. Para realizá-la, o paciente deve apresentar APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina alterações clínicas compatíveis com DCA e história epidemiológica sugestiva. É mais adequada na fase aguda tardia, quando as repetições dos exames de pesquisa direta apresentarem resultados negativos. Paradetecção de IgM, recomenda-se o método de IFI, realizado pelo Laboratório de Referência Nacional (LRN), ou por Lacen habilitado pelo LRN. Ressalta- se a importância de considerar também a oportunidade da coleta de amostra do paciente, ou seja, período para detecção dessa imunoglobulina considerando-se o intervalo igual ou superior a 15 dias entre as datas de início de sintomas e da coleta da amostra. Fase Crônica Nessa fase, o diagnóstico é essencialmente sorológico e deve ser realizado utilizando-se um teste com elevada sensibilidade em conjunto com outro de alta especificidade: HAI, IFI, ELISA e quimioluminescência. A confirmação laboratorial de um caso de doença de Chagas na fase crônica ocorre quando há positividade em dois testes sorológicos de princípios distintos ou com diferentes preparações antigênicas. Devido à parasitemia pouco evidente nessa fase, os métodos parasitológicos convencionais têm baixa sensibilidade. Os métodos parasitológicos indiretos (hemocultura e xenodiagnóstico) podem ser usados em situações específicas, tais como em caso de resultados sorológicos inconclusivos ou para verificação de efeito terapêutico de fármacos tripanocidas (BRASIL, 2018a). Métodos parasitológicos indiretos Xenodiagnóstico: consiste na alimentação de ninfas do triatomíneo livre de infecção, com sangue do paciente suspeito. Existem duas formas: natural ou direto (o vetor pica diretamente o paciente), e artificial ou indireto (o vetor é alimentado com sangue da pessoa sob investigação por meio de membranas apropriadas). Recomenda-se apenas a técnica artificial, visto que esta tem sensibilidade semelhante à natural, é mais confortável às pessoas, evita reações alérgicas decorrentes da picada do triatomíneo, além de permitir a repetição do teste com maior facilidade. Cultura para T. cruzi: método que se baseia no cultivo de amostras clínicas (sangue, líquor, entre outras) em meio de cultura para identificação do T. cruzi. Diagnóstico molecular Reação em cadeia da polimerase (PCR): técnica de uso restrito e realizada por centros de pesquisa e LRN, devido à ausência de protocolos definidos e procedimentos operacionais padronizados. Dessa forma, a PCR não pode ser considerada APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina um método de diagnóstico isolado para confirmação ou descarte de caso de doença de Chagas aguda ou crônica. Ressalta-se que a PCR tem potencial especialmente para: 1) avaliação da efetividade do tratamento antiparasitário; 2) identificação de casos em fase crônica e imunossupressão em risco para reativação; 3) diagnóstico de casos de transmissão materno-fetal (BRASIL, 2018a). Deve-se atentar ao fato de que os métodos indiretos e moleculares podem ser positivos em ambas as fases da doença, avaliando-se criteriosamente os aspectos clínicos e epidemiológicos. Diagnóstico no recém-nascido O exame parasitológico do recém- nascido de mãe sororreagente deve ser realizado prioritariamente nos 10 primeiros dias de vida. Em casos nos quais a mãe tiver diagnóstico de DCA ou com coinfecção T. cruzi + HIV, recomenda-se a pesquisa exaustiva do parasito no recém-nascido até 2 meses de vida (exames parasitológicos diretos, xenodiagnóstico indireto/artificial e hemocultura). Os casos de recém-nascidos com exame parasitológico negativo e sem sintomatologia compatível com DCA devem ser acompanhados, com retorno aos 9 meses a fim de realizar dois testes sorológicos para pesquisa de anticorpos anti-T. cruzi da classe IgG. Antes desse período, o resultado poderá sofrer interferência da imunidade passiva (anticorpos maternos). Se ambas as sorologias forem negativas, descarta-se a possibilidade de transmissão vertical; caso haja discordância entre os resultados dos testes, um terceiro teste de princípio diferente deve ser realizado, tal como é preconizado para o diagnóstico da fase crônica (DIAS et al., 2016). EXAMES COMPLEMENTARES GERAIS Para a verificação do estado geral das pessoas com DCA, é proposta uma relação de exames laboratoriais complementares (BRASIL, 2008): • Hemograma completo com plaquetas. • Urinálise (EAS). • Provas de função hepática. • Radiografia de tórax. • Eletrocardiografia convencional. • Provas de coagulação (TTPA). • Endoscopia digestiva alta. • Ecodopplercardiografia. • Exame do líquor. Por sua vez, quanto às pessoas na fase crônica, recomendam-se para avaliação inicial (DIAS et al., 2016): • Eletrocardiograma (ECG) e radiografia de tórax. Pessoas na forma crônica indeterminada deverão realizar APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina ECG convencional uma vez por ano. • Em caso de ECG com alterações cardíacas: ecocardiograma e, se possível, Holter. • Em casos suspeitos de megacólon e/ou megaesôfago: enema opaco e radiografia contrastada do esôfago, respectivamente. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Para a fase aguda, devem ser consideradas doenças como leishmaniose visceral, malária, dengue, febre tifoide, toxoplasmose, mononucleose infecciosa, esquistossomose aguda, infecção por coxsakievírus, sepse e doenças autoimunes. Também doenças que podem cursar com eventos íctero- hemorrágicos, como leptospirose, dengue, febre amarela e outras arboviroses, meningococcemia, sepse, hepatites virais, febre purpúrica brasileira, hantaviroses e rickettsioses (BRASIL, 2008). Ressalta-se a necessidade de maior atenção ao diagnóstico diferencial da doença de Chagas crônica na forma gastrointestinal. Outras condições, como acalasia primária idiopática, amiloidose, sarcoidose, neurofibrimatose, gastrenterite eosinofílica, coinfecção por Helicobacter pylori, refluxo e tumores, devem ser consideradas conforme a síndrome clínica manifesta. Em caso de constipação, esta pode estar relacionada à malignidade, aos distúrbios metabólicos, à amiloidose e à esclerose sistêmica (BRASIL, 2018a). ESQUEMA DE TRATAMENTO Tratamento etiológico Nifurtimox e benznidazol: são usados para tratar a tripanossomíase americana causada por T. cruzi. O nifurtimox, um análogo do nitrofurano e o benznidazol, um análogo do nitroimidazol. Efeitos antiprotozoários e mecanismos de ação Nifurtimox e benznidazol são tripanocidas tanto contra ambas as formas tripomastigotas e amastigotas de T. cruzi (Barrett et al., 2007; Kennedy, 2013). Os efeitos tripanocidas do nifurtimox e do benznidazol derivam da sua ativação por uma nitrorredutase mitocondrial dependente de NADH para radicais nitroaniônicos, que se acredita serem responsáveis pelos efeitos tripanocidas (Wilkinson et al., 2011). Os radicais nitroaniônicos formam ligações covalentes com as macromoléculas, levando a lesões celulares que incluem peroxidação dos lipídeos, lesão da membrana, inativação enzimática e lesão do DNA. A expressão reduzida da nitrorredutase por meio de experimentos de nocaute de um único APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina gene alelo ou pela seleção de fármacos leva à resistência ao fármaco (Wilkinson et al., 2011). Usos terapêuticos O nifurtimox e o benznidazol são utilizados no tratamento da tripanossomíase americana (doença de Chagas), causada pelo T. cruzi (Bern et al., 2011; Chatelain, 2015; Malik et al., 2015; Ribeiro et al., 2012). Devido às preocupações com toxicidade, o benznidazol é o tratamento preferido da doença de Chagas. Ambos os medicamentos reduzem acentuadamente a parasitemia, a morbidade e a mortalidade pela doença aguda de Chagas, com curas parasitológicas obtidas em mais de 80% desses casos, embora a resposta clínica da doença aguda à terapia medicamentosa variecom a região geográfica (Messenger et al., 2015). Na forma crônica da doença, ainda são possíveis curas parasitológicas, embora o fármaco seja menos eficaz do que na fase aguda. Em um estudo recente de pacientes com doença de Chagas crônica, 94% dos pacientes que completaram o tratamento com 150 mg de benznidazol, 2 vezes/dia, durante 60 dias, permaneceram PCR-negativo até a conclusão do estudo no seguimento de 10 meses (Molina et al., 2014). As recomendações atuais são que os pacientes com menos de 50 anos de idade com doença de fase crônica, aguda ou recente, sem miocardiopatia avançada, devem ser tratados. Em pacientes com mais de 50 anos de idade, os benefícios do tratamento são complicados pela tolerância reduzida ao fármaco. A terapia é fortemente recomendada para pacientes que irão receber tratamento imunossupressor ou que são HIV-positivo. O tratamento com nifurtimox ou benznidazol deverá ter início prontamente após a exposição ao risco de infecção por T. cruzi em acidentes de laboratório ou por transfusões sanguíneas. Ambos os fármacos são administrados por via oral com as doses recomendadas conforme descrição (Drugs for Parasitic Infections, 2013): Tratamento com o nifurtimox • Os adultos (> 17 anos de idade) com infecção aguda devem receber 8 a 10 mg/kg/dia, divididos em 3 a 4 doses, por 90 dias; • crianças de 1 a 10 anos de idade deverão receber 15 a 20 mg/kg/dia, divididos em 3 a 4 doses, por 90 dias; • para indivíduos entre 11 a 16 anos de idade, a dose diária é de 12,5 a 15 mg/kg/dia, administrados de acordo com o mesmo protocolo (90 dias). Tratamento com o benznidazol: APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina • adultos (> 13 anos) é de 5 a 7 mg/kg/dia, divididos em 2 doses, por 60 dias; • crianças de até 12 anos recebendo 10 a 15 mg/kg/dia, divididos em 2 doses, por 60 dias; *Alguns estudos sugeriram que doses totais superiores a 300 mg/ dia são bem menos toleradas (Salvador et al., 2014). **Em casos de desconforto gástrico e perda de peso durante o tratamento, a dosagem deverá ser reduzida. A ingestão de álcool deverá ser evitada. ***O nifurtimox é usado em combinação com a eflornitina no tratamento da fase tardia da doença do sono causada pelo T. brucei gambiense. Toxicidade e efeitos colaterais Efeitos colaterais são comuns e variam desde reações de hipersensibilidade (p. ex., dermatite, febre, icterícia, infiltrados pulmonares e anafilaxia) a complicações dependentes da dose e da idade relacionadas ao trato gastrointestinal (GI) e ao sistema nervoso periférico e SNC (Ribeiro et al., 2012). Náuseas e vômitos são comuns, bem como mialgias e fraqueza. Para o benznidazol, o evento adverso mais comum (ocorrido em 30% dos pacientes na primeira semana de tratamento) é a dermatite urticária, que pode ser tratada com anti- histamínicos ou corticosteroides. Entretanto, geralmente o tratamento precisa ser descontinuado em pacientes que apresentam essa reação. A supressão da medula óssea poderá ocorrer no início da terapia, de modo que a contagem de células sanguíneas deverá ser medida a cada 2 a 3 semanas e o tratamento, interrompido caso a supressão seja observada. A neuropatia periférica e os sintomas GI são especialmente comuns após tratamentos prolongados; essa última complicação poderá levar à perda de peso e impedir a continuidade do tratamento. O benznidazol deverá ser administrado junto com alimentos para minimizar os efeitos GI. Por causa da gravidade da doença de Chagas e da falta de medicamentos melhores, há poucas contraindicações absolutas ao uso desses fármacos. Tratamento não etiológico O manejo da miocardiopatia chagásica geralmente acompanha as diretrizes de manejo para insuficiência cardíaca, distúrbios da condução ou arritmias ventriculares de outras etiologias. Considerando-se o alto risco de morte súbita, o início precoce do tratamento com amiodarona ou o implante de desfibrilador- cardioversor deve ser considerado na presença de anormalidades eletrofisiológicas patológicas. APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina A anticoagulação é recomendada para prevenção primária e secundária de eventos cardioembólicos na presença de trombo intramural ou aneurisma apical. Há necessidade de controle estrito de outros fatores de risco cardiovascular. A miocardiopatia chagásica é uma indicação importante para transplante cardíaco na América Latina; algumas evidências indicam que os resultados são melhores que na miocardiopatia de outras etiologias. A imunossupressão pós-transplante exige monitoramento cuidadoso, dado o alto risco de reativação. O tratamento da dismotilidade digestiva inclui aconselhamento dietético e refeições ricas em fibras e hidratação, com porções menores ingeridas com maior frequência. Fármacos que relaxam o esfincter esofágico inferior (p. ex., nifedipino ou dinitrato de isossorbida antes das refeições), dilatação com balão pneumático ou miotomia laparoscópica melhoram os sintomas digestivos superiores no estágio inicial. O uso de toxina botulínica é efetivo, mas exige injeções repetidas. Laxativos e enemas aliviam a constipação crônica na maioria dos pacientes. A cirurgia está indicada em pacientes com sintomas perturbadores refratários ao tratamento clínico. FEVE: Fração de ejeção ventricular SITUAÇÃO ATUAL DE SAÚDE INDÍGENA Há tempos, nossas populações indígenas enfrentam inúmeras tensões no âmbito da saúde, desde os primeiros contatos com os não indígenas, ainda no século 16, passando pelas epidemias de gripe e sarampo, no século 20, mais recentemente com a gripe H1N1, em 2009, até a pandemia de Covid-19, em APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina 2020. Cada uma dessas epidemias e/ou crises sanitárias impactaram de diferentes formas os grupos indígenas atingidos, seja social, econômica ou demograficamente, sendo, portanto, importante um olhar para as especificidades de cada região e de cada povo na compreensão e no enfrentamento de questões de saúde pública entre os povos indígenas. O acompanhamento da evolução do novo coronavírus entre as populações indígenas representa um grande desafio. Embora os números oficiais informem sobre a dinâmica de notificação, eles não refletem necessariamente a extensão da pandemia. Ademais, a falta de desagregação dos dados dificulta o reconhecimento das regiões e dos povos mais afetados. Outro problema grave é a ausência de dados sobre indígenas que vivem fora de Terras Indígenas homologadas, o que inclui tanto citadinos como populações que aguardam a finalização do longo processo de demarcação de suas terras. Indígenas e não indígenas estão imunologicamente suscetíveis a vírus que nunca circularam antes, como é o caso do novo coronavírus causador da Covid-19. Diferentes estudos atestam, no entanto, que povos indígenas são mais vulneráveis a epidemias em função de condições sociais, econômicas e de saúde piores do que as dos não indígenas, o que amplifica o potencial de disseminação de doenças. Condições particulares afetam essas populações, como a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, seja pela distância geográfica, como pela indisponibilidade ou insuficiência de equipes de saúde. O subsistema do Sistema Único de Saúde criado para atender a saúde indígena sofre com a falta de estrutura e de recursos para tratamento de complicações mais severas como a Covid-19. Além disso, os modos de vida de muitos povos criam uma exposição às doenças infecciosas a qual as pessoas nas cidades não estão submetidas. Grande parte dos povosindígenas vive em casas coletivas, e é comum entre muitos deles o compartilhamento de utensílios, como cuias, tigelas e outros objetos, o que favorece as situações de contágio. Desde a criação da Fundação Nacional do Índio (Funai), em 1967, diferentes instituições e órgãos governamentais se responsabilizaram pelo atendimento das populações indígenas. Em 1999, essa política mudou, resultando na criação do subsistema de saúde indígena do Sistema Único de Saúde, organizado em 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dsei). Em 2010, graças à pressão do movimento indígena, foi criada a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), vinculada ao Ministério da Saúde. A SESAI atende mais de 755 mil indígenas aldeados em todo o Brasil. A Secretaria de Saúde Indígena conta com mais de 22 mil APG 04: O INIMIGO MORA AO LADO Débora Janaína UNIGRANRIO - Afya Medicina profissionais de saúde, sendo que destes, 52% são indígenas, e promove a atenção primária à saúde e ações de saneamento, de maneira participativa e diferenciada, respeitando as especificidades epidemiológicas e socioculturais destes povos. BIBLIOGRAFIA Brunton, L.L. Goodman & Gilman: As Bases Farmacológicas da Terapêutica. 12ª ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 2012. Site:https://chagas.fiocruz.br/parasi ta/organizacao-estrutural/; acesso em 15/08/2023. Medicina interna de Harrison [recurso eletrônico] / J. Larry Jameson... [et al.]; tradução: André Garcia Islabão...[et al.] ; [revisão técnica: Ana Maria Pandolfo Feoli... [et al]. – 20. ed. – Porto Alegre: AMGH, 2020. e-PUB. Guia de Vigilância em Saúde [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Articulação Estratégica de Vigilância em Saúde. – 5. ed. rev. e atual. – Brasília: Ministério da Saúde, 2022. Saúde Indígena: uma introdução ao tema, número 5, Luiza Garnelo Ana Lúcia Pontes.
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