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História da Psicologia

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DESCRIÇÃO
A construção histórica da Psicologia, desde seus antecedentes nos períodos da Antiguidade e
Idade Medieval até suas formulações modernas como uma ciência empírica e experimental.
PROPÓSITO
Conhecer o desenvolvimento histórico da Psicologia e seus assuntos e áreas afins é
importante para compreender como esta área do saber se consolidou na contemporaneidade,
bem como para discutir problemas atuais cuja origem se dá no início da Psicologia organizada
como ciência.
PREPARAÇÃO
Ter em mãos um bom dicionário de Psicologia ajudará a buscar conceitos mais específicos. O
APA Dictonary of Psychology (dicionário virtual, em inglês), da American Psychological
Association, é um dos mais reconhecidos e consultados, bem como o espanhol Diccionario de
Psicología , de Umberto Galimberti.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Definir antecedentes históricos longínquos da Psicologia como área de conhecimento ampla e
originalmente pensada como um ramo da Filosofia
MÓDULO 2
Localizar nas discussões filosóficas da Europa, no período da Idade Moderna, os temas do
racionalismo e empirismo na Filosofia, por meio do pensamento de Christian Wolff e Immanuel
Kant
MÓDULO 3
Esquematizar, na Psicofísica e Fisiologia Sensorial do século XIX, os recursos teóricos e
experimentais por meio dos trabalhos de Johannes Müller, Hermann von Helmholtz, Ernst
Weber e Gustav Fechner
MÓDULO 4
Descrever o trabalho e o projeto de Psicologia de Wilhelm Wundt
INTRODUÇÃO

A PSICOLOGIA POSSUI UM LONGO PASSADO, AINDA
QUE SUA REAL HISTÓRIA SEJA CURTA.
(EBBINGHAUS, 1910, p. 3)
Assim inicia-se a famosa obra Psicologia: um compêndio elementar , do alemão Hermann
Ebbinghaus. Esta frase, com mais de um século de existência, anima pesquisas e discussões
históricas no campo psicológico, e serve como um bom ponto de partida para pensarmos como
estudar a história da Psicologia, tanto como um saber científico, teórico e experimental, como
uma prática profissional.
Neste estudo, veremos como a Psicologia, apesar de ter sua fundação como ciência
experimental apenas no final do século XIX, possui antecedentes históricos que datam desde a
Idade Antiga. Isto significa dizer que, apesar de sua história ser traçada em 150 anos de
desenvolvimento de uma área de conhecimento mais ou menos definida, podemos buscar na
história uma série de temas, problemas e conceitos que, de uma forma ou outra, participaram
ativamente ou indiretamente na constituição do saber que chamamos de Psicologia hoje em
dia.
A Psicologia, como a conhecemos, é um saber eminentemente baseado em autores de
países europeus. Este estudo pretende apresentar as raízes da Psicologia na cultura
europeia, em especial na Antiguidade Grega Clássica, Período Romano e Idade Medieval da
Europa. Em seguida, do século XVI ao século XVIII, discutiremos os autores que animaram os
debates na Filosofia e que culminaram na formulação da Psicologia científico-experimental,
que se organiza no final do século XIX e dá vazão, no início do século XX, aos diversos
projetos e abordagens que conhecemos atualmente.
MÓDULO 1
 Definir antecedentes históricos longínquos da Psicologia como área de
conhecimento ampla e originalmente pensada como um ramo da Filosofia
GRÉCIA ANTIGA
Foto: Pixabay
 Quando falamos de Idade Antiga no Ocidente, estamos nos referindo a um período que vai
de aproximadamente 4.000 a.C. (surgimento da escrita fenícia) até 476 d.C. (queda do Império
Romano). Isso significa um período de quase cinco mil anos.
Neste tópico, vamos nos concentrar apenas na Grécia e Roma Antiga. É possível, entretanto,
buscar antecedentes em outras regiões e períodos. Existem autores, por exemplo, que
interpretam artefatos como os “livros dos sonhos”, produzidos pelo povo assírio entre o sexto e
quinto milênio antes de Cristo, como evidências de discursos ou narrativas sobre uma
interioridade (HOTHERSALL, 2006). Tais livros constituíam tábuas de argila com descrições de
sonhos e revelavam detalhes da vida íntima de quem os escreveu. Porém tais relatos são
escassos se comparados à vasta bibliografia que possuímos sobre nossos antecedentes
gregos, romanos e medievais.
Foto: Pixabay
A Grécia Antiga é considerada o berço da civilização ocidental, e, portanto, nela encontramos
uma série de antecedentes históricos da Psicologia. Não se trata de afirmar que tais
conhecimentos são similares à Psicologia tal qual a conhecemos hoje, mas trata-se de mostrar
como, neste berço da cultura ocidental, certos temas e questões de interesse surgiram, por
exemplo a noção de alma ou a noção de temperamentos. A partir daí, concepções de mundo,
da natureza e do ser humano foram se desenvolvendo, modificados em períodos posteriores,
através dos séculos, segundo contextos históricos específicos, e retomados por autores
contemporâneos.
Podemos falar de antecedentes gregos em três grandes frentes: nas artes, pela poesia e pela
tragédia; na Filosofia, pelas discussões sobre o mundo e o homem; e na Medicina, pelo que
sabemos sobre as concepções de cura dos antigos médicos gregos.
POESIA E TRAGÉDIA
Imagem: Shutterstock.com
A poesia era um componente muito importante para a construção da concepção de mundo
entre os gregos. Era uma forma de transmitir modelos de comportamento e ideias através das
declamações. Pela poesia, os jovens gregos eram alfabetizados e compreendiam uma visão de
mundo através das histórias vividas pelos personagens.
Poesia épica
Tratava de feitos dos grandes heróis em suas jornadas e dos mitos fundantes da Grécia, dos
deuses e seus caprichos, reflexos de caprichos dos mortais (MASSIMI, 2016, p. 27-28).

Poesia lírica
Era assim chamada porque as declamações eram acompanhadas ao som da lira (instrumento
musical). Falava dos sentimentos do homem e pregava uma vida a ser intensamente vivida
(MASSIMI, 2016, p. 27-28).
Nas tragédias, as famosas peças teatrais gregas retratavam o ser humano numa dupla
posição:
Por um lado, um ser de infinitas possibilidades, almejando a grandeza.
Por outro lado, um ser mortal, definido pela finitude e fragilidade.
Nessa condição, surge muitas vezes o tema do adoecimento, em que os personagens
enlouqueciam e, fora de si, eram tomados pela fúria que os levava a cometer atos
impensáveis.
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A tragédia Medeia, escrita por Eurípedes (480 a.C.-406 a.C.), é um bom exemplo. Medeia é a
personagem que dá o título à peça. Resumidamente, num dado ponto, ela é traída por seu
marido, o herói Jasão, e é tomada por uma fúria homicida, revelando que no ser humano há
paixões que fogem ao controle racional (MASSIMI, 2016).
Imagem: The Yorck Project / Wikimedia Commons / Domínio Público
 Medeia e Jasão, Girolamo Macchietti, entre 1570 e 1573.
Talvez a tragédia de maior importância para a Psicologia seja Édipo Rei, que é parte de uma
trilogia que inclui as tragédias Antígona e Édipo em Colono. Escritas por Sófocles (497/496
a.C.-406/405 a.C.), tratam da história de um homem, Édipo, órfão adotado por um rei, que
escuta do Oráculo de Delfos uma profecia: “mataria seu pai e se casaria com sua mãe”. No
intuito de escapar deste trágico destino, Édipo toma ações e cursos em sua vida, mas acaba
por cumpri-lo, matando seu pai (que encontrou como um andarilho numa estrada) e tomando o
trono de Tebas (casando-se com Jocasta, sua mãe). Édipo termina seus dias vendo sua mãe e
esposa tirar a própria vida e, então, fura os próprios olhos.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
 Édipo e a esfinge, 1808, pintura de Jean Auguste Dominique Ingres.
O tema aqui é justamente “o conhecimento de si”, que Édipo obteve ao consultar o Oráculo de
Delfos. Na tentativa de fugir desse conhecimento, acabou exatamente por causá-lo.
 ATENÇÃO
É importante destacar que a clássica interpretação de Sigmund Freud sobre esta tragédia jaz
não em seu sentido e discussão aqui apresentados, mas numa interpretação bastante peculiar
à teoria psicanalítica. Portanto, a trilogia de Sófoclestem dupla importância para os psicólogos:
pelo tema do autoconhecimento e destino e por ter inspirado um dos mais importantes
conceitos da Psicanálise, o Complexo de Édipo.
FILOSOFIA E CONCEITO DE “ALMA”
A palavra “Psicologia” é um neologismo que surge no século XVI em universidades
protestantes na Alemanha. Era utilizada pelos teólogos para discutir o que seria uma sciencia
de anima ou ciência da alma (VIDAL, 2010). Daí a construção das palavras:
PSYCHÉ (ALMA)
LOGIA (TRATADO, ESTUDO)
Se no século XVI teólogos discutiam a alma e suas faculdades, é importante traçar como, na
Grécia, este conceito já existia, a fim de compreendermos como ele se transformou através dos
séculos. Para os gregos, “alma” tinha diferentes significados. Assume-se que o termo psique
unificava ao menos duas concepções algo distintas entre si: de um lado, tratava-se de um
princípio vital do corpo; de outro, de um princípio separado e livre (MASSIMI, 2016).
Portanto, a alma para os gregos era um princípio vital que estava ligado ao corpo e à natureza.
Era ao mesmo tempo um princípio colocado no corpo pelos deuses, remetendo a uma alma
imortal que persistiria para além da morte.
Esta dualidade animaria debates entre diversos filósofos, alguns dos mais importantes:
Sócrates, Platão e Aristóteles. Cada um discutindo o tema da alma em suas vastas obras e
acrescentando alguma nova contribuição.
• SÓCRATES (469 A.C.-399 A.C.)
Foi um dos principais filósofos da Grécia antiga. Mestre de Platão, conhecemos suas ideias
através dos registros feitos por este discípulo. Nos diálogos de Platão, Sócrates aparece várias
vezes como personagem. A alma aparece em Sócrates como “centro intelectual e moral do
homem, com personalidade própria” (MASSIMI, 2016, p. 51).
Para Sócrates, a Filosofia era uma forma de fazer as pessoas buscarem o significado das
coisas belas, justas e verdadeiras, através de uma prática constante que poderia ser
condensada na noção de “conhecer a si mesmo”. Para “conhecer a si mesmo”, era necessário
aprender a ouvir uma “voz interior”, que seria de origem divina, implantada pelos deuses nos
homens. Sócrates, portanto, tematizou na Filosofia a necessidade de ouvirmos a voz da nossa
consciência, abrindo caminho para que essa interioridade fosse tematizada por seus principais
discípulos, Platão e Aristóteles.
Foto: Shutterstock.com
• PLATÃO (428/427 A.C.-348/347 A.C.)
Foi o autor de muitos textos que conhecemos sobre Sócrates, e ele mesmo escrevia em forma
de diálogos suas ideias. Suas concepções sobre a alma aparecem em diálogos como
Alcibíades Maior , Fédon , República e Timeu , em todos eles diferentes concepções da
alma foram progressivamente discutidas. Em nosso estudo, focaremos apenas em Timeu, por
apresentar a noção da tripartição da alma (MASSIMI, 2016).
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Foto: Shutterstock.com
Imagem: Shutterstock.com
TIMEU
Na famosa obra de Rafael, Escola de Atenas , onde aparece Platão e Aristóteles ao
centro, é exatamente o livro Timeu que Platão segura.
Para o filósofo, a alma humana tinha ligações com as partes do corpo e, portanto, três grandes
partes:
A CABEÇA
Parte divina e imortal, da lógica, que dominava as demais.
O PEITO
Parte irascível, dada a paixões que movem o corpo, sedia a parte mortal da alma.
A PARTE INFERIOR DO VENTRE
Parte da nutrição, onde reside uma alma que se preocupa com alimentar o resto do corpo.
Essa tripartição tem reflexo em nossas concepções modernas de que a cabeça é a “razão” e,
no corpo, está a “emoção” — localizada no peito, onde normalmente nos remetemos quando
tratamos de ações emocionadas.
• ARISTÓTELES (384 A.C.-322 A.C.)
Foi um dos filósofos mais importantes da Grécia Antiga e incorporado em tradições teológicas
até a Idade Média. Sobre a alma, continuou a discussão de seu mestre Platão, mas
introduzindo uma diferença: para ele, havia três aspectos da alma, mas organizados de forma
distinta. O filósofo estabelece que não apenas os humanos têm alma, mas todos os seres
vivos. Porém, com uma classificação (MASSIMI, 2016):
Plantas: alma vegetativa (responsável pela nutrição e reprodução).
Animais: alma vegetativa e sensitiva (responsável pela sensibilidade e a locomoção).
Humanos: se diferem por terem uma alma com um terceiro aspecto, o racional, o aspecto do
pensamento.
As noções de Aristóteles impactam não apenas concepções modernas de Psicologia (ao
assumir a racionalidade do homem como sendo peculiar a ele), mas também como esta noção
organiza os seres vivos: quando olhamos para um cão, por exemplo, e dizemos que ele não é
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um animal racional, estamos nos remetendo, de uma forma ou outra, a esta concepção de
alma que vem desde Aristóteles.
Foto: Shutterstock.com
MEDICINA NA GRÉCIA ANTIGA
A questão da Medicina é importante ser retomada porque nos traz uma concepção não apenas
de Saúde, tema adjacente à prática do psicólogo em quase todas as suas funções
profissionais, como também pela noção de uma “personalidade”, que pode ser remetida à
noção de temperamento.
Devemos a Hipócrates (460 a.C. – 377 a.C.) a noção de que o corpo humano possui quatro
humores básicos: a bílis negra, a bílis amarela, o sangue e a fleuma (fluidos relacionados ao
baço, fígado, coração e sistema respiratório, respectivamente). Tais humores são os
correspondentes dos elementos da natureza (terra, fogo, água e ar), e o desequilíbrio e
desarmonia entre eles é o que levaria às enfermidades.
Foto: Shutterstock.com
Tal arranjo dos humores seria também responsável pelos temperamentos (HOTHERSALL,
2006):
Imagem: Shutterstock.com
EXCESSO DE BÍLIS NEGRA (TERRA)
Mau humor, ser rabugento e melancólico.
Imagem: Shutterstock.com
EXCESSO DE BÍLIS AMARELA (FOGO)
Ser irritadiço, irascível e maníaco.
Imagem: Shutterstock.com
EXCESSO DE SANGUE (ÁGUA)
Ser alegre, otimista e feliz.
Imagem: Shutterstock.com
EXCESSO DE FLEUMA (AR)
Eram apáticos, tristes e preguiçosos.
Vemos como teorias da personalidade moderna herdam a forma de classificar os tipos da
teoria humoral de Hipócrates, e observamos como certos adjetivos que caíram de desuso,
como fleumático (frieza de ânimo, impassível) e bilioso (furioso, colérico) remontam a esta
teoria.
ROMA ANTIGA E CRISTIANISMO PRIMITIVO
Foto: Jongh Photography / Shutterstock.com
Embora representasse uma civilização diferente da grega, Roma (de 753 a.C. até sua queda
em 476 d. C.) acabou por incorporar muitas das questões filosóficas dos gregos, levando
adiante discussões e problemas que entrariam na Idade Medieval, tanto pela Filosofia como
pela Teologia, através dos santos católicos.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
 Psiquê e Eros, Jacques-Louis David, 1817.
Alguns exemplos dessa continuidade estão nos mitos gregos. O de Eros e Psiqué, contado
pelo romano Apuleio (125-170), relata a história da mortal Psiqué, que se apaixona por Eros, o
deus do Amor, e posteriormente se torna imortal como deusa que personifica a alma. Temos,
então, uma história referenciando a mitologia grega, porém escrita por um cidadão romano.
Outro exemplo se encontra em Claudio Galeno (129-217), médico que retoma algumas ideias
de Hipócrates. Especialmente, para Galeno, o clima e a alimentação eram cruciais no
desenvolvimento do temperamento humano; chegou a desenvolver uma tipologia própria dos
temperamentos, dividindo-os (MASSIMI, 2016) em: sanguíneos, coléricos, melancólicos e
fleumáticos. A influência de Hipócrates em Galeno é clara, reforçando a continuidade de
temas que sofreram contribuições específicas no contexto da época.
Um exemplo de antecedentes da Psicologia no período romano, no final da Idade Antiga, está
na Teologia, conforme era discutida por autores como Santo Agostinho (354-430). Conhecido
como Agostinho de Hipona, por residir na província de mesmo nome governada pelos romanos
e localizada na costa norte do Continente Africano (região que hoje corresponde a Argélia),
Santo Agostinho fez parteda Escola Patrística, perto do fim do período cristão primitivo.
SANGUÍNEOS, COLÉRICOS, MELANCÓLICOS
E FLEUMÁTICOS
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Conforme Galeno, cada pessoa já nasceria com certa combinação ou “tempero” dos
quatro humores básicos. Embora pudesse ocorrer de os quatro humores estarem
perfeitamente equilibrados em algumas pessoas, na maioria dos casos haveria a
predominância de um ou dois deles. Isso contribuiria tanto para a formação de tipos
físicos diferentes como de personalidades diferentes.
PATRÍSTICA
A Patrística consistia em diversos padres, teólogos e alguns santos que fundamentaram a
fé católica nos primeiros três séculos do cristianismo, e o fizeram muitas vezes debatendo
com filósofos gregos, como Platão e Aristóteles.
Imagem: Shutterstock.com
Santo Agostinho é notório por sua interlocução com Platão, porém desenvolve um pensamento
original que discute diversos temas (PENNA, 1991). Aqui vamos apontar brevemente apenas o
tema da memória, que possui interesse particular por ter partido de uma discussão Metafísica e
teológica e ter chegado a conclusões próximas de algumas teorias modernas.
Especialmente, Santo Agostinho discute como o homem é um “escravo da memória”, por esta
ser uma faculdade da alma que é ativa e que, em muitos momentos, domina o homem com
reminiscências que ele não controla. Em alguns sentidos, tal noção é interpretada como uma
espécie de antecipação de temas que seriam discutidos por Sigmund Freud, em sua teoria
psicanalítica (CONKE, 2014). Santo Agostinho faz uma série de descrições do funcionamento
da memória em diversos escritos, discutindo como essa faculdade da alma é essencial para
construir a noção do tempo no homem.
IDADE MEDIEVAL
Para finalizar nossa discussão sobre antecedentes históricos da Psicologia, trataremos
brevemente da Idade Medieval (de 476 a 1453), um período de mil anos que é até hoje
discutido em profundidade. Se outrora a Idade Medieval foi acusada de ser uma “Idade das
Trevas”, com pouco ou nenhum avanço no conhecimento ou na ciência, hoje sabemos que tal
concepção é um erro (LE GOFF, 2014): não apenas nesse período encontramos inúmeros
avanços tecnológicos e culturais (como o arado para agricultura, multiplicação dos moinhos
para produção de farinha e pão, o uso cada vez maior de ferro como material, o surgimento
das Universidades etc.), como observamos que tais avanços são, muitas vezes, as origens do
desenvolvimento social europeu que se atribuiu, em larga escala, ao Renascimento (meados
do século XIV ao fim do século XVI).
Vamos falar de um pensador que revela tanto o ambiente intelectual europeu medieval como a
continuidade da discussão da Filosofia grega clássica através da Teologia, inspirando filósofos
da Era Moderna: ele é São Tomás de Aquino (1225-1274). Responsável por operar uma
conciliação entre as Escrituras Sagradas cristãs e a Filosofia grega, especialmente em
Aristóteles, este santo funda não apenas uma tradição na Filosofia — conhecida como
tomismo, que colocava a Metafísica a serviço da Teologia —, como se apresenta como um
dos principais representantes da Escolástica, tradição que sucede a Patrística e que segue a
conciliação com os ensinamentos das Escrituras com a Filosofia Clássica dos gregos, focando
não apenas em Aristóteles. Tal conciliação visava construir a partir da cosmovisão dos filósofos
gregos um entendimento que se adequasse ao cânone da fé cristã católica.
Imagem: The Yorck Project / Wikimedia Commons / Domínio Público
 São Tomás de Aquino, Gentile da Fabriano, 1400.
São Tomás de Aquino é de grande importância para a Psicologia por retomar Aristóteles, que,
como vimos, propõe uma divisão da alma em vegetativa, sensitiva e racional. Entretanto, ao
retomar o filósofo grego à luz da teologia e do contexto cristão, opera uma releitura que
atualiza o conhecimento da Filosofia grega clássica e o transmite (especialmente a noção de
pessoa e de alma) para todo o Ocidente cristão (MASSIMI, 2016).
No próximo módulo, veremos como essa discussão anima o debate filosófico na Europa, que
culmina na organização da Psicologia como área de estudos da Filosofia.
Vamos, agora, aprofundar um pouco mais como a herança da História Antiga e Medieval pode
ainda estar presente na Psicologia.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. O ESTUDO DOS ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA PSICOLOGIA
ENVOLVE VISITAR CONTEXTOS HISTÓRICOS TÃO LONGÍNQUOS
QUANTO A IDADE ANTIGA, QUE VAI DE 4.000 A. C. ATÉ 476 D. C. NESSE
PERÍODO, ENCONTRAM-SE ANTECEDENTES DIVERSOS DE ESPECIAL
IMPORTÂNCIA PARA A PSICOLOGIA. PODEMOS DIZER QUE O ESTUDO
DESSES ANTECEDENTES NA ANTIGUIDADE É VÁLIDO PARA A HISTÓRIA
DA PSICOLOGIA PORQUE ELES:
A) Representam as únicas raízes possíveis da Psicologia Moderna.
B) Estabeleceram as bases da Psicologia Experimental do século XX.
C) Apresentam temas e questões que surgem e são ressignificados nos séculos seguintes.
D) Definiram os conceitos e técnicas psicológicas utilizados até os dias de hoje.
E) Esquematizaram os problemas de Filosofia específicos do século XIX.
2. ALGUNS AUTORES GREGOS PERMANECERAM COMO REFERÊNCIA
NO FIM DA IDADE ANTIGA E DURANTE A IDADE MEDIEVAL, QUE SE DEU
DO SÉCULO V ATÉ O SÉCULO XV. ARISTÓTELES E PLATÃO SÃO
EXEMPLOS DE FILÓSOFOS GREGOS QUE PERMANECERAM
ESTUDADOS ATÉ O FIM DA IDADE MÉDIA ENTRE PADRES E TEÓLOGOS
CRISTÃOS. PODEMOS AFIRMAR QUE ESSES PADRES E TEÓLOGOS
RETOMARAM OS FILÓSOFOS GREGOS PORQUE:
A) Sua visão de mundo era equivocada e precisava ser corrigida pela Igreja.
B) Suas poesias e tragédias gregas eram de interesse artístico e cultural.
C) Tais filósofos deixaram discípulos que levaram adiante seus escritos.
D) A Igreja Católica queria manter o controle sobre as ideias que circulavam na Europa.
E) Era de interesse da Teologia a conciliação entre os saberes clássicos gregos e a fé cristã.
GABARITO
1. O estudo dos antecedentes históricos da Psicologia envolve visitar contextos
históricos tão longínquos quanto a Idade Antiga, que vai de 4.000 a. C. até 476 d. C.
Nesse período, encontram-se antecedentes diversos de especial importância para a
Psicologia. Podemos dizer que o estudo desses antecedentes na Antiguidade é válido
para a história da Psicologia porque eles:
A alternativa "C " está correta.
O estudo dos antecedentes históricos da Psicologia serve para que identifiquemos temas e
questões que persistem através dos séculos e que, apesar de algumas mudanças em certos
contextos, permanecem relevantes para o estudo da história da Psicologia.
2. Alguns autores gregos permaneceram como referência no fim da Idade Antiga e
durante a Idade Medieval, que se deu do século V até o século XV. Aristóteles e Platão
são exemplos de filósofos gregos que permaneceram estudados até o fim da Idade
Média entre padres e teólogos cristãos. Podemos afirmar que esses padres e teólogos
retomaram os filósofos gregos porque:
A alternativa "E " está correta.
Os padres, teólogos e santos que retomaram os filósofos gregos o fizeram no intuito de
conciliar um modo clássico de compreender o mundo fornecido pelos gregos com a fé católica
baseada nas escrituras. Um exemplo dessa prática é a Escolástica.
MÓDULO 2
 Localizar nas discussões filosóficas da Europa, no período da Idade Moderna, os
temas do racionalismo e empirismo na Filosofia, por meio do pensamento de Christian
Wolff e Immanuel Kant
IDADE MODERNA
Com o término da Idade Medieval, após a queda de Constantinopla, conquistada pelo Império
Turco-Otomano no ano de 1453, inicia-se o período que os historiadores chamam de Idade
Moderna, que durará então do final do século XV até o século XVIII. Nesse período, ocorre na
Filosofia um longo debate que culminará na proposta de Psicologia criada pelo filósofo alemão
Christian Wolff que, por sua vez, sofrerá forte crítica de outro grande filósofo alemão, Immanuel
Kant.
Imagem: Jan Tavernier / expositions.bnf.fr / Wikimedia Commons / Domínio Público
 O cerco de Constantinopla (miniatura), JeanLe Tavernier, 1455.
Esse debate entre o Racionalismo e o Empirismo manifestam-se, no trabalho de Wolff, nas
propostas de uma Psicologia Racional e uma Psicologia Empírica, ambas com questões e
problemas distintos. As críticas que Kant fará a essas propostas serão conhecidas como vetos
kantianos e se tornarão cruciais para que, ao longo do século XIX, uma série de pressupostos
da Fisiologia Sensorial seja adaptada para resolver o problema da cientificidade da Psicologia,
proposto por Kant e resolvido pelos psicofisiologistas, assunto do terceiro módulo.
RACIONALISMO E EMPIRISMO
Pode se dizer que durante a Idade Moderna, instalou-se na Filosofia, especialmente no ramo
chamado de epistemologia, a discussão entre o Racionalismo e o Empirismo. Veja a diferença
entre ambos a seguir (PENNA, 1991):
Racionalismo
Se posiciona epistemologicamente como uma abordagem que prioriza o conhecimento
adquirido pelo sujeito através do intelecto, em detrimento das experiências ou das sensações.
Um argumento racionalista comum diz que os sentidos enganam nossa percepção da
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realidade, que apenas através da dedução lógica podemos assumir certas verdades sobre o
mundo.

Empirismo
Se posiciona epistemologicamente como uma abordagem que prioriza a obtenção do
conhecimento sensível pela experiência, ao contrário daquele obtido por deduções puramente
lógicas. Um argumento empirista comum é o de que na experiência se tira a prova de diversas
teorias sobre o funcionamento da natureza, em detrimento de puras especulações sem base
na realidade sensível.
EPISTEMOLOGIA
Ramo da Filosofia que se preocupa com o conhecimento, discutindo que tipos de
conhecimento podem ser considerados válidos e de que forma podem ser obtidos.
Podemos observar como a ciência moderna se fundamenta numa espécie de síntese entre as
duas posições:
Imagem: Shutterstock.com
Já o racionalismo muitas vezes inspira uma explicação para várias medidas e experiências
difusas das ciências aplicadas, que podem ser sintetizadas por uma matematização específica
dos resultados experimentais obtidos, resultando em leis.

Imagem: Shutterstock.com
De um lado, o empirismo inspira o viés experimental da ciência moderna, que tira a prova de
hipóteses através de cuidadosos experimentos, apontando como os fenômenos da natureza se
comportam em diferentes situações.
Veremos, em seguida, alguns filósofos modernos tomados como exemplos de cada uma das
duas abordagens. É importante destacar que evidentemente existem muitos outros autores,
porém, fica a critério da curiosidade do leitor buscar mais referências que ampliem sua visão
sobre esse vastíssimo tema na Filosofia e sua relação específica com a história da Psicologia.
RACIONALISMO
René Descartes (1596-1650) não é apenas um dos maiores nomes do racionalismo na
Filosofia, como também é considerado um dos principais expoentes da Filosofia moderna. Em
muitos trabalhos, como o Discurso do Método e Meditações Metafísicas , Descartes propõe
que a razão humana deve ser a principal fonte de obtenção de conhecimento, pois apenas dela
podem surgir conhecimentos tidos como válidos. Um exemplo dessa proposição aplicada na
prática é a origem da famosa frase Cogito, Ergo Sum , que se traduziria para “Penso, Logo
Existo”. A raiz dessa afirmação está na chamada dúvida metódica.
Imagem: André Hatala / Wikimedia Commons / Domínio Público
 Retrato de René Descartes , Frans Hals, entre 1649-1700.
Descartes isolou-se da sociedade e, num quarto fechado, ao longo de vários dias, começou a
propor dúvidas sobre todos os conhecimentos que havia previamente obtido, pretendendo reter
apenas os conhecimentos e as ideias dos quais não pudesse duvidar. Ao chegar num ponto
onde duvidava de tudo, percebeu que só tinha certeza de uma coisa: de que estava duvidando.
Daí, surge o cogito cartesiano: podia duvidar de tudo, menos de que duvidava e que,
portanto, pensava. Para Descartes, o pensamento humano é a base da Filosofia, pois nele se
pode confiar com certeza (MASSIMI, 2016).
Daí que a razão é o que orienta o racionalista: ao pensar logicamente, produz conhecimento
claro sobre o mundo. Ao não se deixar levar pelas sensações, que habitualmente são
enganosas, o racionalista pode acessar conhecimentos que são verdadeiros. Entretanto, não
se trata apenas de um pensamento sem regras, mas direcionado. Para Descartes, havia uma
série de regras para produzir conhecimento verdadeiro e confiável:
Tratar apenas do que é evidente;
Dividir problemas em partes para buscar sua solução;
Ordenar o pensamento do mais simples ao mais complexo;
Controlar o percurso desse pensamento.
Imagem: Anpaoliello / Wikimedia Commons / CC 3.0
Não é à toa que, para Descartes, um dos meios mais confiáveis de obtenção de conhecimento
era a Matemática, área à qual fez importantes contribuições (MASSIMI, 2016, p. 335). O plano
cartesiano, utilizado pela Geometria Analítica para dispor pontos em um eixo x e um eixo y, foi
inventado por Descartes. Também no cálculo infinitesimal fez contribuições, além de várias
notações matemáticas suas serem até hoje amplamente utilizadas.
Baruch Spinoza (1632-1677) foi, em grande parte, inspirado por Descartes. Uma das maiores
contribuições de Spinoza para a Filosofia é a distinção que opera, em parte de sua obra, entre
dois tipos de conhecimento (PENNA, 1991, p. 85):
O CONHECIMENTO SENSÍVEL
O CONHECIMENTO OBTIDO PELA RAZÃO
O CONHECIMENTO SENSÍVEL
É incompleto e é fonte de erros e concepções equivocadas sobre a realidade.
O CONHECIMENTO OBTIDO PELA RAZÃO
É confiável, pois a razão “revela-se em nós como um poder independente de todo o mundo
exterior, que nos permite apreender a essência íntima das coisas e as relações necessárias
que as ligam às outras”.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
 Retrato de Baruch Espinoza , anonymous, aproximadamente 1665.
Vemos em Spinoza o exemplo de um autor que apela para um argumento tipicamente
racionalista: os sentidos podem nos enganar, mas a razão é perfeitamente confiável. Sintetiza
o mundo sensível e permite que organizemos as coisas nas relações estabelecidas entre elas.
EMPIRISMO
Um dos grandes expoentes do empirismo na Filosofia foi John Locke (1632-1704). Para ele, a
mente humana se constituía de elementos básicos que seriam as ideias, e estas, por sua vez,
seriam formadas através da experiência humana. Locke utiliza-se da clássica noção de que o
ser humano é como uma folha em branco, ou uma tabula rasa, que se preenche ao longo da
vida. Tal preenchimento se dá tanto pelas sensações que adquirimos pela experiência quanto
pela reflexão, operação interna da mente.
Imagem: State Hermitage Museum / Wikimedia Commons / Domínio Público
 Retrato de John Locke , Sir Godfrey Knelle, 1697.
Imagem: Rômulo Rosa/Shutterstock.com
Um exemplo das ideias de Locke pode ser encontrado na troca de cartas que teve com um
amigo, fato apresentado em seu livro Ensaio sobre o entendimento humano .
 EXEMPLO
Trata-se do caso em que um homem, que havia nascido cego, subitamente recupera sua visão.
Porém, um fato curioso aconteceu: o homem, que ainda cego era capaz de diferir um cubo de
uma esfera pelo tato, após voltar a enxergar, era incapaz de distingui-los apenas pela
observação. Poderia raciocinar e deduzir matematicamente as propriedades de um cubo ou da
esfera, mas ainda não os reconheceria visualmente.
Imagem: Shutterstock.com
Como essa questão seria explicada? A explicação vem do Empirismo de Locke: apesar de
voltar a enxergar, o homem em questão nunca tinha experimentado um cubo ou uma esfera
visualmente, apenas de modo tátil. Para distingui-los com a visão, teria que experimentar esses
objetos visualmente, adquirindo essas sensações específicas (HOTHERSALL, 2006).
Outro filósofo muito importante para o empirismo foi David Hume (1711-1776). Ele foi um
empirista de uma vertente chamada associacionismo. Sua preocupação era, assim como
Locke, com a análise de experiências e como estasse tornam sensações que se tornam
ideias. Porém, Hume estava preocupado também em formalizar leis que explicassem como as
sensações se associavam.
Imagem: www.nationalgalleries.org / Wikimedia Commons / Domínio Público
 Retrato de David Hume , Allan Ramsay, 1766.
Para Hume, havia uma distinção entre ideias e impressões: as primeiras seriam cópias
“fracas” da segunda; e as impressões surgiriam das sensações. Ideias e impressões,
quando ocorrem juntas, tendem a se associar, daí sua filiação a um empirismo associacionista.
Dessa forma, Hume argumenta que nossa mente associa impressões a ideias e que tais ideias,
quando simples, associam-se umas com as outras para formar ideias mais complexas, o que
explicaria os conteúdos mais elaborados do pensamento a partir de impressões sensíveis —
ou seja, da experiência. Não seria, entretanto, uma associação fortuita. Hume descreve três
princípios ou leis de associação (HOTHERSALL, 2006, p. 59):
ASSOCIAÇÕES DE IDEIAS POR SEMELHANÇA
CONTIGUIDADE (ESPACIAL OU TEMPORAL)
RELAÇÕES DE CAUSA E EFEITO
Vemos assim como o Empirismo distancia-se do Racionalismo, quando presume como o ser
humano conhece e como pode conhecer de maneira confiável a realidade.
CHRISTIAN WOLFF E IMMANUEL KANT
Tendo em mente a distinção entre racionalismo e empirismo, podemos então discutir uma das
formulações mais complexas da Psicologia no século XVIII.
Trata-se do sistema filosófico de Christian Wolff (1679-1754) que, naquele século, foi o autor
que ajudou a delinear a Psicologia com status de uma disciplina da Filosofia. O complexo
sistema filosófico de Wolff visava garantir a essa área uma certeza da qual gozavam os
conhecimentos que dispunham da Matemática. Para Wolff, os ramos da Filosofia deveriam ser
a Lógica, a Metafísica, a Filosofia Prática, a Física, a Filosofia das Artes (nesse sentido,
tratava-se da Tecnologia, Artes Liberais e Medicina) e a Filosofia da Jurisprudência.
Imagem: en.wikipedia / Wikimedia Commons / Domínio Público
 Christian Wolff , Johann Bernigeroth, 1755.
A Metafísica, em ordem de dependência, estudava (VIDAL, 2010):
ONTOLOGIA
COSMOLOGIA GERAL
PSICOLOGIA EMPÍRICA
PSICOLOGIA RACIONAL
TEOLOGIA NATURAL
Aqui, do vastíssimo e elaborado sistema filosófico de Christian Wolff, interessa-nos destacar
como a Psicologia tornou-se um tema circunscrito na Filosofia como área de conhecimento, e
será a partir daqui que podemos começar a discutir um projeto de Psicologia que poderia
futuramente estar próximo de se separar da Filosofia.
NO SISTEMA DE WOLFF, A PSICOLOGIA EMPÍRICA
SERIA UM ESTUDO DA VIDA INTERIOR DA ALMA
EXCLUINDO AS RELAÇÕES FISIOLÓGICAS E
CORPORAIS.
O interesse seria o estudo das faculdades da alma (a percepção, os sentidos, a imaginação, a
memória, a atenção etc.). Trata-se de entender como a alma humana capta o mundo e
organiza as percepções e ideias, observando como nossas faculdades trabalham a posteriori ,
ou seja, após tais percepções do mundo se formarem em nossa alma.
JÁ A PSICOLOGIA RACIONAL DEFINE A ALMA
HUMANA COMO O PRÓPRIO PODER DE
REPRESENTAÇÃO DO UNIVERSO, E ESTUDA ESSA
ALMA COMO ENTE OU ESSÊNCIA A PRIORI .
Ou seja, que antes define por princípio as faculdades estudadas na Psicologia Empírica.
Colocando em outras palavras, se a Psicologia Empírica se preocupa com as faculdades da
alma, capazes de organizar o mundo ao nosso redor, a Psicologia Racional se preocupa em
justificar e explicar a própria existência dessa alma que, por sua vez, possibilita a existência de
tais faculdades em primeiro lugar. Para Wolff, a Psicologia Racional não produzia
conhecimentos empíricos, mas revelava aspectos da alma para além do que permitia a
observação, método próprio da Psicologia Empírica (VIDAL, 2010).
 ATENÇÃO
Observa-se como o debate entre Racionalismo e Empirismo se configura no sistema de Wolff:
uma Psicologia deduz racionalmente como a alma funciona e outra Psicologia estuda como
essa alma possui faculdades específicas que percebem e compreendem o mundo.
Esse sistema foi duramente criticado por Immanuel Kant (1724-1804), contemporâneo de
Wolff e que é considerado um dos mais importantes filósofos não apenas do período, mas
também para a epistemologia. Kant estabelece em seu livro Crítica da razão pura que certos
conhecimentos não podem ser ciências legítimas, uma vez que são incapazes de produzir uma
evidência demonstrativa. Tais conhecimentos recaem numa Metafísica, um tipo de
conhecimento que pode alegar várias coisas racionalmente, mas sem fornecer objeto ou
evidência empírica de sua validade. Seria preciso operar uma síntese entre uma certa
racionalidade especulativa e um certo empirismo demonstrável para atingir o status de
cientificidade.
Imagem: Becker / Wikimedia Commons / Domínio Público
Portanto, ao analisar a Psicologia Racional e a Psicologia Empírica de Wolff, o veredito é claro:
não se pode fazer ciência partindo da Psicologia Racional, dado que, sendo seu objeto a
alma, incorreria fatalmente num discurso puramente metafísico, sem viés empírico que
demonstre sua validade. Porém, a Psicologia Empírica tinha possibilidade de ser uma
ciência, mas apenas se formalizasse seu corpo de conhecimento. Em seu livro Princípios
metafísicos da ciência da natureza , Kant argumenta que, para se tornar ciência, a Psicologia
Empírica deveria (FERREIRA, 2010, p. 85):
Descobrir um objeto preciso, assim como a Química tinha como objeto de estudo o elemento,
sobre o qual realizava análises e sínteses.

Estudar tal objeto de modo objetivo, dado que no caso da alma, observador (humano) e
observado (alma) se confundem nesse processo, necessitando de uma separação entre objeto
e observador.

Produzir uma matematização sobre de tal objeto, matematização essa mais complexa que a
geometria de uma linha reta.
Aqui reside justamente o problema que levará a Psicologia a organizar-se como ciência
experimental. O século XIX será marcado pela busca na Fisiologia Sensorial de
ferramentas para a superação desses vetos estabelecidos por Kant. E uma vez que esses
vetos sejam formalmente superados, podemos falar finalmente de uma Psicologia que é
científica e, pela primeira vez, separada da Filosofia, existindo como campo próprio de atuação
e com problemas particulares, regidos pelos ditames da ciência experimental.
Pela importância para a Psicologia, vamos entender um pouco mais o embate de ideias entre
Wolff e Kant.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. A IDADE MODERNA APRESENTA UM GRANDE DEBATE NA FILOSOFIA,
ESPECIFICAMENTE ENTRE O RACIONALISMO E O EMPIRISMO. ESSE
DEBATE SE REVELA IMPORTANTE PARA A PSICOLOGIA PORQUE:
A) O racionalismo é a vertente que, por fim, a Psicologia aderiu inteiramente.
B) O empirismo deu origem ao método experimental, suplantando o racionalismo.
C) Ambos foram substituídos pelo associacionismo, que resolveu os problemas de cada
posição.
D) Culmina na inspiração de um projeto de Psicologia Filosófica.
E) Demonstrou como essa área de conhecimento poderia ser independente.
2. NO SÉCULO XVIII, CHRISTIAN WOLFF RECEBE CRÍTICAS DE
IMMANUEL KANT COM RELAÇÃO ÀS PSICOLOGIAS RACIONAL E
EMPÍRICA QUE FAZIAM PARTE DA METAFÍSICA DE SEU VASTO SISTEMA
FILOSÓFICO. ASSINALE A ALTERNATIVA QUE MELHOR JUSTIFIQUE AS
CRÍTICAS DE KANT:
A) Kant criticou a Psicologia Empírica por esta não apresentar lógica consistente.
B) Kant criticou a Psicologia Racional por esta não ser matematizável.
C) Kant criticou a Psicologia Empírica por não ter a alma como objeto.
D) Kant criticou as duas Psicologias por serem impossíveis de estudo científico.
E) Kant criticou a Psicologia Racional por esta ser demasiado matematizada.
GABARITO
1. A Idade Moderna apresenta um grande debate na Filosofia, especificamente entre o
racionalismo e o empirismo. Esse debate se revela importante para a Psicologia porque:
A alternativa "D " está correta.
O debate entre Racionalismo e Empirismo inspira Christian Wolff a propor duas Psicologias
(uma racional e uma empírica) em seu sistema geralde Filosofia.
2. No século XVIII, Christian Wolff recebe críticas de Immanuel Kant com relação às
Psicologias racional e empírica que faziam parte da Metafísica de seu vasto sistema
filosófico. Assinale a alternativa que melhor justifique as críticas de Kant:
A alternativa "B " está correta.
Kant vetou a alma como objeto da Psicologia Científica, mas deu à Psicologia Empírica uma
chance de se tornar ciência se esta conseguisse superar seus três vetos.
MÓDULO 3
 Esquematizar, na Psicofísica e Fisiologia Sensorial do século XIX, os recursos
teóricos e experimentais por meio dos trabalhos de Johannes Müller, Hermann von
Helmholtz, Ernst Weber e Gustav Fechner
PSICOFISIOLOGISTAS
Neste módulo, discutiremos a busca da Psicologia para superar os vetos que Immanuel Kant
estabeleceu. Observaremos como, no século XIX, diferentes teorias e modelos serão
incorporados no intuito de dar ao conhecimento psicológico uma organização científica, com
objeto e método definidos e uma formalização matemática típica das Ciências Naturais.
Apresentaremos, em seguida, quatro autores: Johannes Müller, Hermann von Helmholtz, Ernst
Weber e Gustav Fechner.
JOHANNES MÜLLER (1801-1858)
Johannes Müller foi um dos mais importantes fisiólogos alemães da primeira metade do século
XIX. Suas pesquisas envolviam as funções do sistema nervoso, sensorial, endócrino e
reprodutivo. Seu trabalho tornou-se relevante para a Psicologia, pois ele estabeleceu a Teoria
das Energias Nervosas Específicas. Tal teoria propunha que os órgãos sensoriais, não
obstante o tipo de estimulação externa que pudessem receber, sempre produziriam sensações
internas específicas, ligadas ao órgão em questão. O olho, por exemplo, ao ser estimulado,
teria seus nervos óticos sempre produzindo imagens luminosas.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
O importante desta teoria é a noção de que uma sensação interna seria correlata a um
estímulo externo. Dessa forma, tal sensação poderia ser causada via cuidadosa
experimentação e, dessa forma, estudada. A sensação também resolve o primeiro veto
kantiano discutido no módulo anterior, já que substituiria a alma como objeto da Psicologia
Científica, além de unir:
O mundo físico externo (através dos estímulos)
O mundo fisiológico (por serem os nervos a traduzir os estímulos em sensações)
O mundo psicológico (dado que as sensações se associavam na consciência)
A sensação ainda teria a vantagem de ser um elemento mais preciso e circunscrito do que as
ideias e impressões que filósofos empiristas acreditavam estar na base da associação de
ideias (FERREIRA, 2010). Vemos então que na Fisiologia Sensorial surge a primeira
possibilidade de superação dos vetos kantianos, tendo a possível futura Psicologia um objeto
definido: a sensação.
HERMANN VON HELMHOLTZ (1821-1894)
Hermann von Helmholtz foi um médico, físico e matemático alemão orientado por Johannes
Müller. Entre várias contribuições na Fisiologia, Física e até Filosofia, Helmholtz ficou
conhecido por desenvolver uma teoria sobre a formação das representações psicológicas, que
ele chamava de apercepções. Essa teoria foi crucial para o desenvolvimento de um novo
método de estudo e análise das sensações. Tratava-se da introspecção experimental, que
era baseada na noção de inferências inconscientes.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
Para explicar a teoria de Helmholtz, voltemos a Christian Wolff e sua Psicologia Empírica.
Quando Wolff falava que seu objetivo era observar as faculdades da alma e analisar a
formação de suas sensações e ideias a posteriori , o termo “observação” aqui não se tratava
de uma observação de algo no mundo “lá fora”, mas sim do “mundo interno” do filósofo. Em
outras palavras, tratava-se de um estudo baseado na introspecção, um olhar para dentro, em
busca de compreender esses processos internos das faculdades da alma. A essa forma
específica, chamaremos de introspecção filosófica.
É aqui que o trabalho de Helmholtz começa a fazer sentido. Uma vez que se pretende analisar
a formação das sensações, no sentido proposto por Müller e não da Filosofia, sabemos que
essas não são puramente assimiladas pela nossa consciência.
 EXEMPLO
Ao recebermos um estímulo externo vindo de uma fonte conhecida, a sensação que se forma
em nossa consciência é imediatamente associada à experiência passada vinculada àquele
estímulo, dado que numa longa vida recebemos inúmeras vezes tal estimulação.
ESSA VINCULAÇÃO DE UMA SENSAÇÃO A UMA
EXPERIÊNCIA PASSADA HELMHOLTZ NOMEIA DE
INFERÊNCIA INCONSCIENTE.
 EXEMPLO
Então, por exemplo, tomemos o estímulo luminoso de uma lâmpada: após nosso sistema
nervoso processar tal estímulo e a sensação de luminosidade aparecer em nossa consciência,
de imediato associaremos, via uma inferência inconsciente, aquela sensação à uma lâmpada.
Imagem: Shutterstock.com
Porém, se o estudo da sensação visava ser o estudo de um elemento em seu estado puro, tais
experiências passadas associadas por inferências inconscientes seriam um obstáculo. Logo,
Helmholtz propunha um método de observação e estudo dessas sensações que visava tirar a
influência de tais inferências.
Tal método só poderia ser ensinado a quem fosse versado e treinado na fisiologia sensorial
necessária para reconhecer o erro do estímulo, ou seja, confundir o estímulo externo e sua
correlata sensação com uma experiência passada inconscientemente a ela atrelada. O
treinamento envolvia uma introspecção, que é diferente da introspecção filosófica: Helmholtz o
nomeia de introspecção experimental, portanto, uma metodologia que facilitaria tanto depurar
as sensações em seu estado mais bruto como também eliminar a confusão sujeito-objeto
denunciada por Kant (FERREIRA, 2010). Observamos aqui a superação de mais um dos três
vetos kantianos.
ERNST WEBER (1795-1878)
Ernst Weber foi um fisiólogo e anatomista alemão que lecionou na Universidade de Leipzig.
Suas pesquisas em fisiologia focaram-se em sensibilidade tátil e audição. É, porém, no estudo
da sensibilidade tátil que encontraremos um caminho para a superação do terceiro e último
veto kantiano. Weber ficou conhecido por postular o que chamou de Lei das Diferenças
Apenas Percebidas, que chamaremos aqui de DAP. Esta lei é considerada não apenas uma
das bases da Psicologia Experimental, como também uma das primeiras formulações
matemáticas de interesse crucial para a Psicologia.
Imagem: vlp.mpiwg-berlin.mpg.de / Wikimedia Commons / Domínio Público
As DAP são uma relação de proporcionalidade entre as diferenças apenas percebidas, cuja
fórmula se expressa como:
DAP = ( EA – EB ) / EB
 Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal
Ea e Eb são os estímulos a serem comparados. Assumindo, por exemplo, que dois pesos, um
de 1kg e outro de 2kg, sejam comparados, é fácil notar a diferença entre eles. Há 1kg de
diferença e este se torna perceptível facilmente. Entretanto, se assumirmos a diferença entre
um peso de 21kg e um peso de 20 kg, empiricamente se torna uma diferença quase
imperceptível: não se nota a diferença entre esses dois pesos como se nota no primeiro
exemplo. Por mais que seja conhecida a diferença entre estímulos (novamente, 1kg), a
sensação dessa diferença não ocorre.
 ATENÇÃO
É importante observar que o valor absoluto da diferença é o mesmo nos dois casos (1kg), mas
dada a magnitude de estímulos do segundo caso, 1kg torna-se imperceptível, mostrando que a
diferença relativa, que de fato é percebida, depende da relação da diferença com os valores
absolutos (FERREIRA, 2010).
EM OUTRAS PALAVRAS, QUANTO MAIOR É A
MAGNITUDE DOS ESTÍMULOS, MAIS DIFÍCIL É NOTAR
PEQUENAS DIFERENÇAS ENTRE ELES.
Torna-se necessária uma diferença cada vez maior para que esta seja notada. Assumindo um
terceiro cenário, se fossem comparados pesos de 25kg e 20kg, por exemplo, tal diferença seria
sim percebida.
Porém, como esta fórmula ajuda a Psicologia a superar os vetos kantianos? Apesar de Weber
ter feitosignificativa contribuição para a psicofísica com essa fórmula, foi sua subsequente
apropriação por Gustav Fechner que possibilitou a superação do terceiro veto kantiano, como
veremos a seguir.
GUSTAV FECHNER (1801-1887)
Gustav Fechner foi um matemático, filósofo e físico alemão principal responsável pela
superação completa das críticas de Kant à possibilidade de a Psicologia tornar-se científica.
Dono de uma vasta obra filosófica e fisiológica, Fechner viu nas DAP de Weber a possibilidade
de adaptar tal formulação de modo que se calculasse não as diferenças apenas percebidas,
mas as próprias sensações internas. Vejamos seu raciocínio.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
A fórmula de Fechner complexifica a fórmula das DAP. Em primeiro lugar, substitui a noção de
DAP pela própria noção de Sensação, notada com um S na fórmula. Tal S seria igual a uma
constante k multiplicada pelo logaritmo do limiar de percepção do estímulo, notado como
LogR . A nova fórmula ficaria:
S = K . LOGR
 Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal
E seria conhecida a partir desse ponto como Lei de Weber-Fecher (FERREIRA, 2010, p. 88-
89).
Não nos importa aqui compreender exatamente a aplicação matemática de tal fórmula, mas
sim compreender o que ela possibilitou. Podemos observar que de um lado da equação estão
as sensações, que se encontram na consciência. Já do outro lado da fórmula, residem os
estímulos, que fazem parte do mundo físico externo à consciência. A principal contribuição
de Fechner, portanto, foi equacionar matematicamente o mundo externo a uma medida
objetiva do mundo interno. Em outras palavras, Fechner conseguiu realizar a matematização
que Kant havia imposto como condição para que a Psicologia tornasse um saber de fato
científico.
A importância dessa fórmula não pode ser subestimada. Alguns historiadores da Psicologia
marcam-na como o início do campo da Psicologia Experimental, e até mesmo com uma data
específica:

(...) FOI NO DIA 22 DE OUTUBRO DE 1850, ENQUANTO
ESTAVA DEITADO EM SUA CAMA PENSANDO NESTE
PROBLEMA [RELAÇÃO ENTRE MENTE E MATÉRIA],
QUE OS CONTORNOS DA SOLUÇÃO DO PROBLEMA
VIERAM A ELE.
(BORING, 1957, p. 280)
Trata-se de um evento não apenas importante para a Psicologia, mas crucial para a
compreensão de como a Psicologia atualmente se fundamenta: teve de angariar fontes e
evidências empíricas para, finalmente, entrar no salão das Ciências Experimentais.
Chegou o momento de entendermos um pouco melhor as fórmulas de Ernest Weber e Gustav
Fechner.
A IMPORTÂNCIA DOS
PSICOFISIOLOGISTAS
A maior contribuição dos psicofisiologistas para a Psicologia do século XIX foi a superação dos
vetos kantianos, conforme abordamos. Entretanto, há uma segunda contribuição importante a
ser discutida, que é a de possibilitarem que os problemas filosóficos do século anterior fossem
mesclados com os métodos da fisiologia sensorial. Mais do que apenas fornecerem respostas
àqueles vetos impostos por Kant, os trabalhos dos autores que discutimos aqui permitiram que
toda a problemática filosófica do século XVIII se mesclasse com as teorias e técnicas
experimentais da Fisiologia do século XIX, abrindo caminho para o que pode ser conhecido
como:
PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA DA EXPERIÊNCIA
A Psicologia como Ciência da Experiência é um projeto de Psicologia que se preocupa com a
dualidade entre uma experiência objetiva (que será chamada de “mediata”) e uma experiência
subjetiva (que será chamada “imediata”). Enquanto a Física cuida das experiências objetivas, a
Psicologia se ocuparia das experiências subjetivas, pois estas são, por definição, criadoras de
percepções falsas da realidade, ao contrário das experiências objetivas, passíveis de
representação no mundo (FERREIRA; PEREIRA 2007, p. 234 ).
Aqui podemos realmente contemplar a profundidade da contribuição dos psicofisiologistas
citados, pois seus trabalhos se uniram de forma a garantir cientificidade à Psicologia e criar um
projeto que foi seguido nos anos posteriores, voltado a compreender o falseamento da
percepção de experiências subjetivas:

A NECESSIDADE DE EXPLICAR AS CAUSAS DESTE
FALSEAMENTO COLOCA-SE NA SEQUÊNCIA. PARA
TAL, A EXPERIÊNCIA IMEDIATA OU PSICOLÓGICA
DEVERIA SER ESTUDADA POR UMA FORMA DE
EXPERIÊNCIA MEDIATA, A INTROSPECÇÃO
EXPERIMENTAL, NA QUAL OS SUJEITOS –
DEVIDAMENTE TREINADOS – DEVERIAM DECANTAR,
DA TOTALIDADE DA EXPERIÊNCIA, OS SEUS
ASPECTOS SENSORIAIS. IMPORTADO DA FISIOLOGIA,
javascript:void(0)
O CONCEITO DE SENSAÇÃO SE COLOCAVA COMO
UMA ESPÉCIE DE UNIDADE BÁSICA DA EXPERIÊNCIA,
CAPAZ DE DAR CONTA DE VARIAÇÕES DISCRETAS
DE ENERGIA NO INTERIOR DOS NERVOS E PASSÍVEL
DE FORMULAÇÃO MATEMÁTICA NOS MEANDROS DA
COMPARAÇÃO PSICOFÍSICA COM AS GRADAÇÕES
DOS ESTÍMULOS FÍSICOS. ESTA SE TORNOU A
GARANTIA DE CIENTIFICIDADE DA PSICOLOGIA E
LASTRO DE TODA A EXPERIÊNCIA.
(FERREIRA E PEREIRA, 2007, p. 234)
O que se segue é história. Wilhelm Wundt, no final do século XIX, irá compor o primeiro
laboratório de Psicologia Experimental e, a partir dessa conquista, será possível produzir uma
Psicologia que tenha um conteúdo empírico e observável e que, ao mesmo tempo, estabeleça
uma matematização “mais complexa que a geometria de uma linha reta”, como impusera Kant
como condição. A Psicologia proposta por Wundt será apenas um exemplo entre várias
possibilidades da Psicologia como Ciência da Experiência, mas certamente se colocará
como o exemplo de uma Psicologia Clássica, título que carrega em manuais de história da
Psicologia até os dias de hoje.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. A IMPORTÂNCIA DOS PSICOFISIOLOGISTAS PARA A PSICOLOGIA
EXPERIMENTAL FOI:
A) Fornecer meios de superação das críticas realizadas por Kant à Psicologia Filosófica.
B) Retomar o uso da alma como objeto da Psicologia, porém com abordagem matemática.
C) Questionar Kant e mostrar que seus vetos à Psicologia estavam equivocados.
D) Desenvolver a Psicologia como uma ciência sem o uso de métodos experimentais.
E) Mostrar a impossibilidade de uma verdadeira Psicologia Experimental.
2. GUSTAV FECHNER FOI RESPONSÁVEL POR ADAPTAR A FÓRMULA
MATEMÁTICA DE ERNST WEBER PARA MENSURAÇÃO DA SENSAÇÃO.
ENTENDE-SE QUE O IMPORTANTE RESULTADO DESSA FÓRMULA FOI:
A) Permitir a quantificação das sensações processadas pelas faculdades da alma.
B) Tornar desnecessária a introspecção experimental.
C) Estabelecer uma relação entre o mundo interior das sensações e o mundo exterior dos
estímulos.
D) Estabelecer uma relação entre diferenças percebidas entre estímulos e uma sensação
específica.
E) Estabelecer uma relação entre várias sensações diferentes e um único estímulo inicial.
GABARITO
1. A importância dos psicofisiologistas para a Psicologia Experimental foi:
A alternativa "A " está correta.
Os psicofisiologistas foram cruciais na formulação de teorias e métodos de pesquisa que
serviram como meio de superação dos vetos kantianos à Psicologia Científica.
2. Gustav Fechner foi responsável por adaptar a fórmula matemática de Ernst Weber
para mensuração da sensação. Entende-se que o importante resultado dessa fórmula
foi:
A alternativa "C " está correta.
Fechner, ao propor a Lei de Weber-Fechner, consegue equacionar as sensações internas aos
estímulos externos.
MÓDULO 4
 Descrever o trabalho e o projeto de Psicologia de Wilhelm Wundt
A PSICOLOGIA DE WILHELM WUNDT
Neste último módulo, apresentaremos brevemente o projeto de Psicologia de Wilhelm Wundt
(1832-1920), aquele que é considerado por muitos historiadores o fundador da Psicologia
Experimental. Wundt é creditado por ter criado e dirigido o primeiro Laboratório de Psicologia
Experimental, sediado na Universidade de Leipzig, na Alemanha, em 1879. Na visão de um dos
mais importantes historiadores da Psicologia:
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público

[WILHELM WUNDT] É O PRIMEIRO HOMEM A, SEM
RESERVAS, SER CHAMADO DE PSICÓLOGO. ANTES
DELE HAVIA MUITA PSICOLOGIA, MAS NÃO HAVIA
NENHUM PSICÓLOGO. (...) QUANDO NÓSO
CHAMAMOS DE ‘FUNDADOR’ DA PSICOLOGIA
EXPERIMENTAL, QUEREMOS TANTO DIZER QUE ELE
PROMOVEU A IDEIA DA PSICOLOGIA COMO UMA
CIÊNCIA INDEPENDENTE COMO TAMBÉM QUE ELE É
O MAIS VELHO DENTRE OS PSICÓLOGOS.
(BORING, 1957, p. 316)
Apesar dessa alegação tão intensa sobre Wundt ser o primeiro psicólogo de fato, há uma
característica de seu trabalho que chama a atenção: muito pouco se sabe sobre o que ele
escreveu. Nunca houve uma publicação completa de todos os escritos de Wundt (que
ultrapassariam 50 volumes), além de a disponibilidade de seus livros ser baixa e as traduções
escassas. Dessa forma, não há um claro entendimento de sua obra até os dias de hoje
(ARAÚJO, 2010).
A seguir, iremos apresentar um panorama da obra de Wundt seguindo os trabalhos de Saulo
de Freitas Araújo, professor brasileiro que empreendeu um dos maiores esforços, em nível
mundial, para compreender, pesquisar e divulgar a obra original do autor. Para tanto,
focaremos na fase madura do trabalho de Wundt, que se assume como a partir de 1880 até
seus últimos escritos.
DEFINIÇÃO DE PSICOLOGIA
EM SEU SISTEMA DE PSICOLOGIA, DENOMINADO DE
VOLUNTARISMO, WILHELM WUNDT DEFINE QUE A
PSICOLOGIA É UMA CIÊNCIA EMPÍRICA QUE SE
PREOCUPA COM A EXPERIÊNCIA INTERNA.
Toda experiência pode ser analisada por duas vias:
DIMENSÃO OBJETIVA
Ele a nomeia de experiência mediata (que trata dos objetos do mundo externo).
DIMENSÃO SUBJETIVA
Ele a nomeia de experiência imediata (que trata dos objetos do mundo interno da consciência).
Assim como as Ciências Naturais (Física e Química, por exemplo) tratam dos objetos do
mundo externo, a Psicologia se preocuparia com o aspecto subjetivo da experiência (ARAÚJO,
2010).
Não se trata de dizer que as dimensões internas e externas da experiência são distintas. Para
Wundt, trata-se de duas perspectivas de uma mesma experiência. Os aspectos do mundo
interno estão diretamente correlacionados com os aspectos do mundo externo, não havendo,
portanto, uma divisão ou hierarquia: ambas as perspectivas dizem coisas sobre a experiência
como um todo, apenas de posições diferentes — uma posição interna e outra externa.
Dessa forma, a principal diferença entre a Psicologia e as demais Ciências Naturais é a
natureza pela qual acessa a experiência.
CIÊNCIAS NATURAIS
Tratam de objetos externos e sua compreensão é mediada por aspectos do próprio sujeito (por
exemplo, ao observar um objeto cair, a apreensão do objeto é feita pelos sentidos do sujeito
observador).

PSICOLOGIA
Estuda experiências que não são mediadas (por exemplo, um exame das sensações após
observar uma fonte de luz é um acesso direto à sensação, sem mediação dos sentidos dado
que estes já transformaram um estímulo externo em sensação interna).
Em outras palavras, são posições complementares. A Física estuda os objetos externos
mediada pelos sentidos, e a Psicologia estuda as sensações internas geradas pelo contato
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com esses objetos e sem mediação (ARAÚJO, 2010).
MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO PSICOLÓGICA
Wundt divide a Psicologia em dois grandes meios ou métodos de investigação. Partindo da
distinção entre experimento e observação, comuns à metodologia científica, estabelece que à
Psicologia cabe metodologia similar, concernente à Psicologia individual e à Psicologia dos
povos (ARAÚJO, 2010):
PSICOLOGIA INDIVIDUAL
PSICOLOGIA DOS POVOS
PSICOLOGIA INDIVIDUAL
Deve ser estudada pela via dos experimentos, onde settings experimentais controlados
circunscrevem com precisão o fenômeno a ser estudado, manipulando variáveis em busca de
uma melhor compreensão deste. Portanto, é a Psicologia mais fisiológica, que se presta ao
estudo das sensações em laboratório.
PSICOLOGIA DOS POVOS
Deve se valer de uma observação cuidadosa de fenômenos impossíveis de serem controlados
ou manipulados experimentalmente. A Psicologia dos povos, por vezes chamada de
volkerpsychologie em alemão, estuda fenômenos que já ocorreram, como a linguagem, o mito,
a religião etc.
Dessa divisão, decorre uma Psicologia que estuda os fenômenos inferiores da consciência,
no sentido de serem os mais básicos e elementares que podem ser observados num indivíduo
apenas, e uma Psicologia que se preocupa com os fenômenos superiores da consciência,
muitas vezes complexos, elaborados e compartilhados entre muitos indivíduos. Tal divisão não
compromete a unidade da Psicologia como ciência empírica, visto que se trata de aspectos
complementares de investigação: dos fenômenos elementares e básicos, emergem os
fenômenos elaborados e complexos; já os fenômenos complexos retroagem organizando e
dando sentido aos fenômenos elementares.
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA PSICOLOGIA
WUNDTIANA
Há dois grandes princípios que Wundt propôs em seu sistema e que guiam seu entendimento
de um projeto de Psicologia: a noção de paralelismo psicofísico e a noção de causalidade
psíquica. Aqui, falaremos de dois princípios que remontam a problemas recorrentes da
Psicologia e que o autor tentou dar conta com base em princípios que norteassem seu trabalho
e dissolvessem tais questões.
PARALELISMO PSICOFÍSICO
É a afirmação de que o físico e o psíquico são processos paralelos que não interagem entre si
e são irredutíveis: isto é, o processo psíquico não deriva do processo físico e nem o
processo físico deriva do psíquico. Como a experiência pode ser conhecida a partir de duas
perspectivas distintas (objetiva e subjetiva), é possível que certas partes da experiência
mediata possam ter correspondência direta com a experiência imediata, sem, contudo, que
uma se reduza à outra. Não se trata aqui de uma afirmação puramente Metafísica ou
especulativa, mas a constatação de um fato empírico (ARAÚJO, 2010).
Tal princípio se remete diretamente à discussão do binômio mente-corpo, que sempre
assombrou a Psicologia e permanece até os dias de hoje relevante. A resposta de Wundt é
bem simples e elegante: mente e corpo são paralelos, porque um trata da experiência
interna e o outro da experiência externa.
CAUSALIDADE PSÍQUICA
Deriva em parte do princípio do paralelismo psicofísico. Partindo do pressuposto de que há
correspondência entre processos mentais e físicos, certos conteúdos específicos da
experiência só podem ser compreendidos com base em um único ponto de vista, físico ou
psicológico. No caso dos processos físicos, por exemplo, estados e processos cerebrais só
poderiam ser analisados sob esse ponto de vista, enquanto no caso dos processos
psicológicos, um exemplo de experiência apenas compreendida sob esse ponto de vista seriam
aspectos qualitativos da experiência religiosa.
Logo, há uma autonomia do conhecimento psicológico em alguns pontos, o que
pressupõe autonomia de certos processos mentais via uma causalidade própria. De fato,
há também uma autonomia de processos físicos, pois assumimos uma causalidade física na
natureza.
Wundt aqui assegura que ambas as causalidades, as específicas dos processos mentais e as
específicas dos processos físicos, não são excludentes, mas apenas complementares. O fato
de alguns processos mentais serem apenas observados por uma perspectiva específica não é
excludente ao mesmo fato para os processos físicos. Trata-se apenas de perspectivas
distintas que se somam na compreensão da mente e da consciência. O privilégio na
explicação de um fenômeno por uma das duas perspectivas não desmerece ou diminui a
importância da outra perspectiva em tantas outras explicações.
VOLUNTARISMO DE WUNDT X
ESTRUTURALISMO DE TITCHENER
Aqui apresentamos um panorama muito amplo de sistema de Wundt, o que não impede
demais investigações em outras fontes para complementar a discussão. Entretanto, cabe uma
última discussão teórica no intuito de deixar clara a posição de Wundt em relação à Psicologia
e como um dos principais autores desse campo de conhecimento.
O principal discípulo de Wundt foi Edward Titchener (1867-1927). Britânico, Titchener viajou
para a Alemanha e foi aluno de Wundt durante o doutorado. Ao término,tentou iniciar carreira
na Inglaterra, mas, sem sucesso, foi para os Estados Unidos. A partir desse ponto, Titchener se
tornou um dos mais importantes divulgadores da nova ciência psicológica experimental na
América. Porém, Titchener não reproduziu as ideias de Wundt, mas as alterou drasticamente.
Seu sistema, o estruturalismo, difere-se do Voluntarismo de Wundt em muitos aspectos, mas
persistiu por muitos anos a compreensão equivocada de que aquela Psicologia que ele
divulgava era a mesma de Wundt.
Imagem: Wikimedia Commons / Domínio Público
A principal diferença está na proposta geral: como vimos, Wundt admite uma Psicologia
individual e uma Psicologia dos povos.
Titchener considerava que só poderia ser objeto da Psicologia aquilo que estuda os elementos
da consciência pela via da introspecção. Tudo o que não estava relacionado a esses elementos
estruturais da consciência não deveria ser assunto da Psicologia.
Essa concepção de Titchener acabaria focando apenas numa Psicologia individual e fisiológica,
e eliminaria por completo a possibilidade de uma volkerpsychologie , Psicologia dos povos,
projeto ao qual Wundt devotou os últimos anos de sua vida aperfeiçoando. O estruturalismo é,
portanto, muito mais restrito como sistema de Psicologia do que o Voluntarismo de Wundt, que
propõe a investigação de uma gama de fenômenos que o sistema de Titchener simplesmente
não abarca (ARAÚJO, 2010).
LEGADO DE WUNDT
O leitor pode vir a se perguntar:
QUAL FOI O LEGADO DE WUNDT?
Como é um nome que não se estuda muito na graduação em Psicologia, é perfeitamente lícito
se questionar sobre sua importância. Ocorre que Wundt foi um ator cuja influência se sente
muito mais de forma indireta. É certo que seu sistema de Psicologia, parecendo confuso e
muito complexo, seria alvo de críticas da moderna neurociência e da Psicologia Cognitiva, mas
definitivamente Wundt foi responsável por abrir caminhos que garantiram à Psicologia um
campo de estudo muito particular ao longo do século XX.
Wundt teve muitos alunos que visitaram seu laboratório e nele obtiveram um título de Doutor, o
qual utilizaram em outras áreas e em outros lugares do mundo. Já citamos Titchener, seu mais
famoso aluno, mas existem muitos outros. Alguns dos mais famosos foram Charles Spearman
(1863-1945), britânico que faria contribuições de extrema importância na área da Estatística
para Psicologia, chegando ao famoso fator g, conceito fundamental nos estudos sobre a
inteligência humana. Outro aluno de extrema importância foi Emil Kraepelin (1856-1926),
psiquiatra considerado um dos principais fundadores da Psiquiatria moderna, além de ter
contribuições na Psicofarmacologia.
 VOCÊ SABIA
Um número surpreendente surge quando descobrimos que, entre 1875 e 1919, Wundt orientou
nada menos que 186 teses de doutorado nos mais variados temas (HOTHERSALL, 2006).
Se considerarmos que há mais de cem anos ele foi responsável por treinar uma nova geração
de psicólogos e demais doutores versados na nova possibilidade de uma Psicologia existir
como ciência experimental, podemos compreender a vastidão de sua obra reverberando
graças a seus alunos e orientandos. Este trabalho acadêmico significou uma vasta divulgação
da Psicologia e dos novos métodos experimentais, possibilitando distintas abordagens e
debates que persistiram através de outros sistemas e outras práticas psicológicas.
 COMENTÁRIO
Wundt talvez não tenha sido o psicólogo cujo sistema foi o mais significativo ou duradouro em
termos de relevância, mas seu legado pode ser sentido pelo que ele representou para a
Psicologia: a possibilidade de ser uma área de conhecimento autônoma e independente das
demais ciências.
No vídeo a seguir, vamos compreender, de forma ainda mais clara, porque Wilhelm Wundt é
considerado o pai da Psicologia.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. SOBRE O VOLUNTARISMO DE WILHELM WUNDT, A AFIRMAÇÃO
CORRETA É:
A) Tratou-se de um sistema que tinha mais preocupações filosóficas do que experimentais.
B) Era um sistema de Psicologia que focava mais na observação do que na experimentação.
C) Foi um sistema de Psicologia que focava no estudo da Psicologia dos povos em detrimento
das sensações e da fisiologia.
D) Constituiu-se de dois principais métodos de investigação: a Psicologia individual e o estudo
do inconsciente.
E) Dividia o funcionamento da consciência entre fenômenos inferiores e superiores.
2. O PARALELISMO PSICOFÍSICO É UM PRINCÍPIO BÁSICO DO SISTEMA
PSICOLÓGICO DE WUNDT. ESTE PRINCÍPIO PARTE DO PRESSUPOSTO
QUE:
A) Os processos físicos e os processos psíquicos são paralelos e não interagem entre si.
B) A investigação psicológica deve ser realizada com observações e experimentos realizados
em paralelo.
C) A mente possui processos inferiores e superiores paralelos e simultâneos entre si.
D) Os processos físicos e os processos psíquicos não são paralelos e interagem entre si.
E) Mente e corpo são instâncias paralelas que devem ser estudadas experimentalmente.
GABARITO
1. Sobre o voluntarismo de Wilhelm Wundt, a afirmação correta é:
A alternativa "E " está correta.
Wundt acreditava que os fenômenos inferiores eram os estudados pela experimentação e os
fenômenos superiores, pela observação.
2. O paralelismo psicofísico é um princípio básico do sistema psicológico de Wundt.
Este princípio parte do pressuposto que:
A alternativa "A " está correta.
Wundt acreditava que os processos físicos e os processos psíquicos ocorriam paralelamente,
porém não interagiam entre si, apesar de serem complementares. Opa! Algo não deu certo.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos, os antecedentes históricos da Psicologia são variados e, assim, é difícil
estabelecer quando exatamente surge a Psicologia. Ela possui raízes longínquas na cultura
grega e muitos aspectos dessas raízes foram levados adiante, do fim da Idade Antiga até a
Idade Medieval.
Em seguida, observamos como várias questões surgiram a partir das discussões filosóficas na
Idade Moderna e de que maneira vão culminar em outras questões a serem superadas, até
que a Psicologia se tornasse uma ciência experimental.
Por fim, aprendemos como essa superação se deu em conjunto com a fisiologia sensorial e
como o subsequente projeto de Psicologia de Wilheim Wundt foi de especial importância para
inaugurar de uma vez por todas a possibilidade da atuação da Psicologia como uma ciência
empírica e experimental.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Saulo de Freitas. O voluntarismo de Wilhelm Wundt. In: FERREIRA, Arthur Arruda
Leal (Org.). A pluralidade do campo psicológico. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. 2010. p. 25-38.
BORING, Edwin G. A History of Experimental Psychology. 2. ed. New York: Appleton-
Century-Crofts, 1957.
CONKE, Marcio Silveira. A questão da memória em santo Agostinho e Freud. In:
Perspectiva Filosófica, [s. l.], v. 41, ed. 1, p. 30-48, 2014. Consultado na internet em: 15 abril
2021.
EBBINGHAUS, H. Psychology: An Elementary Textbook. Boston: D.C. Health & Co., 1910.
FERREIRA, Arthur Arruda Leal; PEREIRA, André Luis. O projeto da Psicologia como ciência
da experiência: ascensão e declínio do império dos sentidos. In: Revista Mnemosine. Rio de
Janeiro, v. 3, nº 2, p. 222-247, 2007. Consultado na internet em: 15 abril 2021.
FERREIRA, Arthur Arruda Leal. A Psicologia no recurso aos vetos kantianos. In: JACÓ-
VILELA, Ana Maria; FERREIRA, Arthur Arruda Leal; PORTUGAL, Francisco Teixeira (Orgs.).
História da Psicologia: rumos e recursos. Rio de Janeiro: Nau, 2010. cap. 4, p. 85-92.
HOTHERSALL, David. História da Psicologia. 4. ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006.
LE GOFF, J. Em busca do tempo sagrado: Tiago de Varazze e a Lenda dourada. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.
MARTINS, L.; SILVA, P.; MUTARELLI, S. A teoria dos temperamentos: do corpus
hippocraticum ao séc. XIX. Memorandum 14. Belo Horizonte/Ribeirão Preto, abr. 2008.
Consultado na internet em: 15 abril 2021.
MASSIMI, Marina. História dos saberes psicológicos.São Paulo: Paulus, 2016.
PENNA, Antonio Gomes. História das ideias psicológicas. Rio de Janeiro: Imago, 1991.
VIDAL, Fernando. A mais útil de todas as ciências: configurações da Psicologia desde o
Renascimento tardio até o fim do Iluminismo. In: JACÓ-VILELA, Ana Maria; FERREIRA, Arthur
Arruda Leal; PORTUGAL, Francisco Teixeira (Orgs.). História da Psicologia: rumos e
percursos. Rio de Janeiro: Nau, 2010. cap. 2, p. 47-76.
EXPLORE+
Para saber mais sobre os assuntos tratados neste tema, leia:
História da Psicologia Moderna , de Duane P. Schultz e Sydney Ellen Schultz. O tema
central deste livro é, como diz o título, a história da Psicologia Moderna, mas
especificamente o período que se inicia no fim do século XX, quando a Psicologia se
torna uma disciplina independente. Apesar de recapitular, de forma resumida, os
pensamentos filosóficos anteriores, o livro concentra-se nas questões relacionadas ao
estabelecimento da Psicologia como um novo e distinto campo de estudo.
O artigo A questão da consciência na Psicologia de Wilhelm Wundt , de Cintia
Fernandes Marcellos, para aprofundar os conhecimentos sobre a teoria de Wilhelm
Wundt.
O artigo Passado e o futuro da Psicologia Experimental: contribuições de Fechner, Wundt
e James , de Saulo de Freitas Araújo, que promove uma reflexão de caráter histórico-
filosófico sobre a natureza da Psicologia Experimental, com base nas contribuições de
Fechner, Wundt e James. (Revista Psicologia em Pesquisa, Juiz de Fora, 14(3), p. 23-43.
set./dez. 2020).
Consulte o site da Rede Iberoamericana de Pesquisadores em História da Psicologia
(RIPeHP) e acesse o acervo sobre a história da Psicologia. Vale conferir.
CONTEUDISTA
Luiz Eduardo Prado da Fonseca
 CURRÍCULO LATTES
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DESCRIÇÃO
Contexto teórico e bases epistemológicas da Psicologia Científica: estruturalismo,
funcionalismo e pragmatismo. As bases conceituais da filosofia behaviorista. Behaviorismo
Clássico e Behaviorismo Radical: contribuições para a Ciência do Comportamento Humano.
PROPÓSITO
Contextualizar as proposições teóricas referentes à Psicologia como Ciência do
Comportamento, além de favorecer a relação entre a teoria estudada e as intervenções no
campo psicológico.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Identificar as principais características referentes à corrente estruturalista proposta por
Titchener, bem como as contribuições à Psicologia Científica do funcionalismo e pragmatismo
MÓDULO 2
Reconhecer as proposições teóricas que culminaram no Behaviorismo Clássico de Watson
MÓDULO 3
Distinguir os pressupostos teóricos referentes ao Behaviorismo Radical e suas contribuições à
Psicologia como Ciência do Comportamento
INTRODUÇÃO
A história da Psicologia como Ciência do Comportamento iniciou-se com a busca por métodos
que colaborassem para a compreensão das relações humanas. Nesse contexto, surgiram
teóricos importantes como Edward B. Titchener (1867-1927), William James (1842-1910),
Edward L. Thorndike (1874-1949), Ivan P. Pavlov (1849-1936), John B. Watson (1878-1958),
Edward C. Tolman (1886-1959) e Burrhus F. Skinner (1904-1990).
É sobre as propostas de cada um dos teóricos citados e os métodos utilizados para a definição
da Psicologia Científica que conversaremos nestes três módulos. Iniciaremos as discussões
com o Estruturalismo proposto por Titchener e a maneira como ele trouxe aspectos empiristas
para o estudo de elementos da consciência; depois, definiremos as influências das correntes
funcionalista e empirista para a construção da Ciência do Comportamento, destacando os
teóricos Thorndike, Pavlov e Watson como precursores da filosofia behaviorista (também
conhecida como comportamentalista), classificada mais tarde por Behaviorismo Clássico.
Para nos aproximarmos de questões contemporâneas na Ciência Comportamental,
discutiremos o desenvolvimento da filosofia behaviorista até a proposição da classificação
Radical (aqui, os teóricos Tolman e, especialmente, Skinner ganharão destaque!). É no
Behaviorismo Radical que identificaremos os principais conceitos referentes à Psicologia como
Ciência do Comportamento.
MÓDULO 1
 Identificar as principais características referentes à corrente estruturalista proposta
por Titchener, bem como as contribuições à Psicologia Científica do funcionalismo e
pragmatismo
O CONTEXTO DE SURGIMENTO DA
PSICOLOGIA
 A Meditação do Filósofo, por Rembrandt (1632).
Para iniciarmos nossa jornada pela Ciência do Comportamento, é importante afirmar que a
psicologia existia antes da Psicologia. A preocupação em se entender a psique humana e a sua
relação com as ações cotidianas sempre esteve presente na própria compreensão da
humanidade sobre si mesma. Em outras palavras: no princípio era a filosofia. No princípio era a
especulação. Como um psicólogo, o filósofo especulava “voltado para dentro” e em torno de si
mesmo. De suas experiências. De seu modo de se perceber e de perceber os outros. Contudo,
não se pode dizer que a introspecção então existisse como método da Psicologia, pelo menos
até René Descartes (1596-1650).
Com Descartes, a introspecção assumiu um papel definido como método da Psicologia. O
dualismo cartesiano admitia a existência do corpo e da alma na composição do homem. O
corpo seria semelhante a uma máquina, submetendo-se assim às leis da mecânica, devendo
ser estudado pelo método das Ciências Naturais. Enquanto a alma não poderia ser regida por
leis determinísticas e deveria ser estudada pela introspecção. A hipótese de a introspecção ser
o método psicológico por excelência foi reforçada pela “Nova Psicologia”, a partir de Wilhelm
Wundt (ROSAS, 2010, p. 42).
Foto: Alessio Facchin/Wikimedia commons/Domínio Público
 Grupo de pesquisa Wundt (1880).
Assim, o final do século XIX contemplou aspectos importantes para o desenvolvimento de uma
Psicologia Científica. Teóricos como Wilhelm Wundt iniciavam, em 1879, o primeiro
Laboratório de Psicologia Experimental na Universidade de Leipzig, na Alemanha. Nos Estados
Unidos, universidades também inauguravam departamentos voltados a pesquisas e estudos
em Psicologia (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002).
Aos poucos, a Psicologia vai se distanciando das discussões filosóficas e passa a ser foco de
pesquisadores que buscam definir o seu objeto de estudo e métodos de produção de
conhecimento. Entre estes pesquisadores, está Edward B. Titchener.
TITCHENER E O ESTRUTURALISMO
Nascido na Inglaterra, Edward Bradford Titchener é reconhecido pela capacidade intelectual
e dedicação aos estudos. Foi responsável pela direção de laboratórios de Psicologia nos
Estados Unidos, país em que propagou o Estruturalismo como a primeira escola americana de
pensamento neste campo. Titchener é considerado “seguidor” de Wilhelm Wundt e responsável
pela tradução de diferentes livros escritos pelo teórico (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002), embora
tenha desenvolvido sua própria concepção da Psicologia, que ainda buscava definir-se como
ciência naquele período.
Foto: Filip em/Wikimedia commons/Domínio Público
 Titchener por volta de 1890.
Wundt havia definido como meta da Psicologia a descoberta de leis universais da vida
psíquica, ainda que através das suas mais variadas manifestações. Para isso, buscava no
método analítico um meio para alcançar seu objetivo. Já em Titchener aparecem as primeiras
divergências, tanto no que se refere ao método que a Psicologia deveria adotar quanto ao
objeto de estudo.
Para o psicólogo estruturalista britânico, é a introspecção que possibilitará estudar os
elementos da consciência; o que se caracteriza no próprio objetivo da Psicologia. E tudo que
não puder ser relacionado, ou identificado, às estruturas da consciência estará fora como
campo desta ciência nascente: a Psicologia.
A EXPERIÊNCIA CONSCIENTE COMO OBJETO
DE ESTUDO DA PSICOLOGIA
 A vida: a Esperança, o Amor, a Saudade, por António Carneiro (1899).
Titchener defendia a experiência consciente como objeto de estudo da ciência psicológica.
Para

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