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8 - Terapias Comportamentais e Cognitivas: convergências e divergências. 8.1. As terapias comportamentais – o paradigma comportamental A análise Comportamental Clínica, também freqüentemente nomeada como Terapia Analítico-Comportamental, é um termo usado para se referir às propostas de intervenção clínica que são baseadas nos princípios provenientes da Análise Experimental do Comportamento e do Behaviorismo Radical de B. F. Skinner. Suas estratégias de intervenção estão voltadas para o setting terapêutico, em que há ênfase na análise operante do comportamento verbal, na relação terapeuta-cliente e na análise dos eventos privados sem, no entanto, perder o cunho externalista de causalidade. Tais abordagens ou teorias têm como princípio que a aprendizagem é o elemento fundamental a ser analisado no surgimento e manutenção das psicopatologias. (Abreu & Guilhardi, 2004; Kerbauy, 2001; Rangé, 2001). A terapia comportamental, sem referências as aspectos cognitivos como determinantes do comportamento, tem proposto, historicamente, uma forma de intervenção clínica que requer: a) a avaliação precisa do comportamento-alvo e de sua interdependência com outros comportamentos; b) a especificação da topografia do comportamento; c) as dimensões e funções do comportamento; d) a história de reforçamento; e) a freqüência e ocorrência dos comportamentos desadaptativos. O foco da análise é, portanto, as relações funcionais entre os estímulos do ambiente e as respostas da pessoa. Tal análise permite o planejamento das mudanças comportamentais desejadas e, por conseguinte, o processo de resolução dos problemas apresentados por pelo indivíduo. Portanto a abordagem comportamental é empregada no sentido de se entender por que aquele indivíduo, vivendo dentro de certas situações e num dado momento, apresenta aqueles comportamentos e os mantém. Desse modo, o terapeuta comportamental busca descobrir as causas que originaram aqueles comportamentos desadaptativos, assim como os fatores envolvidos na sua manutenção. A investigação dessas causas e dos fatores de manutenção dos comportamentos é feita via método experimental. Conforme Delitti (2001) em função da queixa inicial trazida pelo cliente, o terapeuta investiga as causas externas (variáveis independentes) das quais o comportamento (variável dependente) é produto, procurando identificar os fatores mantenedores, e levanta hipóteses a fim de comprovar, durante a intervenção, a ocorrência e a freqüência das relações contingenciais. Levantadas as hipóteses, o terapeuta ajuda o cliente a discriminar as contingências em operação, testando o seu funcionamento e sua influência no comportamento. Isso permitirá que o terapeuta e o cliente façam a previsão e o controle do comportamento de ambos, não só nas relações estabelecidas pelo cliente, mas na própria relação terapêutica. O processo de identificação e análise de todas as variáveis que contribuíram para o aparecimento e para a manutenção da resposta desadaptativa, bem como suas conseqüências para o indivíduo e para o meio, ao longo do tempo, chama-se análise funcional (forma de avaliação das variáveis independentes que interferem nas respostas). Constitui-se no aspecto mais difícil da análise comportamental e talvez seja a maior contribuição da abordagem comportamental para o diagnóstico e a terapia (Kerbauy, 2001; Meyer, 2001; Skinner, 1953/1989; Torós, 2001;). Hayes, citado por Meyer (1995) considera que não existe uma definição única de análise do comportamento, abordagem comportamental ou behaviorista, mas sim, quatro níveis de análise, que em conjunto formam um paradigma -o paradigma chamado behaviorismo radical de Skinner. Os quatro níveis de análise envolvidos são o tecnológico, o metodológico, o conceitual e o filosófico. No nível tecnológico, temos um conjunto de técnicas, que em geral envolvem manipulações diretas de eventos antecedentes e consequentes, por exemplo o uso de um sistema de pontos, procedimento de reforçamento ou extinção sensorial ou social, programas de treino de habilidades específicas. Técnicas terapêuticas incluem dessensibilização sistemática, treino assertivo, entre outras. Meyer (1995) chama a atenção para o fato de que a gama de técnicas é grande, e que o elemento comum a todas é que devem estar baseadas numa análise funcional. Uma intervenção bem sucedida implica não apenas em usar uma técnica, mas, também, em corretas decisões sobre ocasiões apropriadas para seu uso e acurada interpretação de seus efeitos. No nível metodológico, ilustrando o caráter experimental do paradigma, o trabalho original da análise comportamental aplicada é quase totalmente orientado para pesquisa (delineamentos experimentais com sujeito único, medidas repetidas, observação direta), o que é importante (pesquisas sobre a própria atuação) para a formação de conhecimento científico - um dos compromissos da abordagem. Entretanto, concorda com Freitas (citado por Meyer,1995) quando diz que a tarefa central da análise do comportamento ou da ciência do comportamento é a de especificar as variáveis independentes (eventos ambientais) das quais o comportamento “tenha probabilidade” de ser função (análise de contingências), ou seja, muito do progresso obtido pela análise do comportamento deve-se a análises funcionais não-experimentais, isto é, à identificação (ou tentativa) de variáveis dependentes e independentes, ou das contingências que produzem e mantém comportamentos. (Meyer, 1995). O aspecto metodológico básico da análise comportamental,então, é a análise funcional, e este aspecto é condição necessária para que um trabalho seja considerado comportamental. No nível conceitual, o analista do comportamento deve conhecer e aplicar os princípios básicos do comportamento, uma vez que conceitos científicos podem fornecer a estrutura necessária para se ordenar e desenvolver a prática clínica. Além disto, deve tentar relacionar os seus procedimentos com estes princípios. Reforçamento, punição, extinção, controle de estímulo, generalização, esquemas de reforçamento, contraste comportamental, equivalência de estímulos, controle por regras verbais, são alguns dos conceitos da abordagem. Por exemplo porque consideramos útil perguntar a um cliente o que ele sentiu em uma dada situação ou o que ele pensou? Como é que isto pode ser entendido comportamentalmente? Ou quando analisamos sonhos, intuições? Enfim, porque qualquer técnica bem sucedida funcionou? Que processo ou processos comportamentais podem ter ocorrido? Conforme Hayes (1978), a metodologia e as técnicas formam as paredes e teto do nosso campo, mas eles não podem permanecer firmes por longo tempo sem a firme fundação do interesse filosófico e conceitual. No nível filosófico, um resumo das principais propostas do behaviorismo radical foi apresentado por Freitas (1985): 1- O comportamento dos organismos é ordenado, passível de ser estudado cientificamente na mesma forma das ciências naturais. 2- A relação entre o comportamento dos organismos e seu meio ambiente deve ser estudada diretamente, sem a postulação de eventos mentais, conceituais ou fisiológicos de efeito mediador entre as variáveis independentes e a variável dependente. 3- Os acontecimentos do mundo privado dentro da pele são levados em consideração, como mais comportamento a ser estudado. Não se nega a possibilidade de auto-observação ou do auto-conhecimento, ou ainda sua possível utilidade. Questiona- se sua natureza (não é diferente do comportamento aberto) e sua acessibilidade (relato verbal). 4- O que é sentido ou introspectivamente observado não é nenhum mundo imaterial da consciência ou vida mental, mas o próprio corpo do observador. São produtos colaterais da história genética e ambiental da pessoa. 5- O que é sentido ou introspectivamente observado não é a causa do comportamento. Essas residemfora do organismo e afetam a sua probabilidade de ocorrência. O ambiente determina o comportamento pelo menos em três formas: a) através de sua ação seletiva durante a evolução da espécie; b) seu efeito na modelagem e manutenção do repertório comportamental que converte cada membro da espécie em uma pessoa; e c) seu papel como estabelecedor da ocasião na qual o comportamento ocorre (Skinner, 1994). Concluindo, são essenciais numa terapia comportamental, no nível metodológico, a análise de contingências; no nível conceitual, o conhecimento e a aplicação, mesmo que assistemática, de princípios de comportamento; e no nível filosófico, pelo menos a rejeição ao mentalismo. Caso contrário teremos uma abordagem sem consistência e que provavelmente não sobreviverá. Dos estudos referidos pode-se perceber que de uma perspectiva comportamental, de modo genérico, o comportamento é função de condições ambientais específicas com as quais está associado por processos de aprendizagem. A terapia comportamental, como um todo, procura estudar de forma objetiva e experimental as relações de cada aspecto do comportamento com o meio onde este ocorre, dentro de um contexto situacional específico, com determinados antecedentes, respostas e conseqüências, que expressam, de forma geral, os princípios de aprendizagem e as leis gerais do comportamento. Quando se faz um levantamento das modalidades ou dos gêneros em psicoterapia comportamental a abordagem mais referida é a psicoterapia analítico- comportamental, uma prática clínica embasada nos pressupostos filosóficos do Behaviorismo Radical e nos conceitos e métodos da Análise do Comportamento, que vem desenvolvendo procedimentos de intervenção terapêutica desde 1953, ano em que B. F. Skinner cunhou o termo "Terapia Comportamental" (ZAMIGNANI, 2007). Skinner (1994) designa o modelo de causalidade do seu sistema psicológico de modo causal de seleção por conseqüências, no qual propõe que as causas do comportamento estão nas conseqüências que ele produz. Segundo este modelo, a determinação do comportamento é produto de processos básicos de variação e seleção, de maneira semelhante à teoria da seleção natural proposta por Charles Darwin, ou seja, os comportamentos são selecionados a partir do efeito que produzem no mundo. O comportamento humano, na perspectiva behaviorista radical, é determinado por três níveis de variação e seleção - a genética, a história individual e o ambiente social. Nas palavras de Skinner, "o comportamento humano é o produto conjunto (1) das contingências de sobrevivência responsáveis pela seleção natural das espécies e (2) das contingências de reforçamento responsáveis pelos repertórios adquiridos por seus membros, incluindo (3) as contingências especiais mantidas por um ambiente social que evoluiu" (SKINNER, 1981/1987, p. 55). Por conseguinte, os psicólogos de orientação analítico-comportamental investigam como os comportamentos de cada indivíduo foram selecionados pelos efeitos que produziram e produzem no mundo, isto é, buscam pelas contingências instaladoras e mantenedoras de cada repertório comportamental. Embora o modelo de causalidade behaviorista radical seja claramente voltado para as relações do indivíduo com o ambiente que se situa "fora de sua pele", os eventos privados, compreendidos como respostas e estímulos que ocorrem "sob a pele" do indivíduo, são objeto de investigação. Skinner explicita a utilidade prática dos eventos privados: "eles são pistas (1) para o comportamento passado e as condições que o afetaram, (2) para o comportamento atual e as condições que o afetam, e (3) para as condições relacionadas com o comportamento futuro" (SKINNER, 1974/1995, p. 31). Neste sentido, os chamados "fenômenos mentais" ou "processos psicológicos superiores" não são vistos como entidades mentais de uma natureza especial, mas como respostas que são diferentes apenas por ocorrerem "sob a pele" do indivíduo e, por isso, terem acessibilidade limitada. Além disso, Skinner, em diversas obras (por exemplo, 1953/2003 e 1974/1995), lida com os eventos privados como constituintes do ambiente do indivíduo que se comporta, o que implica em admiti-los como parte do controle do comportamento (TOURINHO, 1997). Nas palavras de Skinner (1953/2003), "(...) o termo ‘ambiente' significa presumivelmente qualquer evento no universo capaz de afetar o organismo. Mas parte do universo está circunscrita no interior da própria pele do organismo" (p. 281). Ainda, Skinner aponta que os sentimentos não são determinados pelos pensamentos, mas são estados corporais produzidos pela interação do indivíduo com o mundo. Dito de outra forma, os sentimentos são subprodutos das contingências em vigor, sendo que mudanças nestas contingências alteram aquilo que o indivíduo sente. Skinner explica que "nós não choramos porque estamos tristes ou sentimos tristeza porque choramos, nós choramos e sentimos tristeza porque aconteceu alguma coisa" (SKINNER, 1989/2005, p. 103). Enfim, como aponta Zamignani (2003), na terapia analítico-comportamental "os estímulos e respostas que ocorrem sob a pele do terapeuta ou do cliente podem estar envolvidos em diferentes processos comportamentais e podem exercer um papel importante na construção de um repertório de autoconhecimento" (p. 7), objetivo de qualquer psicoterapia. Em resumo, a terapia analítico-comportamental, embora atribua extrema importância para os eventos privados no setting clínico, assevera que é nas relações com o ambiente externo que devem ser buscadas as explicações pertinentes para todo e qualquer comportamento, ou seja, o recorte da análise e da intervenção é externalista. Aqui é importante destacar uma tendência encontrada na literatura e na prática da clínica comportamental, que é a de apresentar propostas ou estratégias clínicas como a da psicoterapia analítico-funcional (Kohlenber & Tsai, 1991) e a terapia de aceitação e compromisso (Hayes, Strosahl & Wilson, 1999), como exemplos dentro da terapia analítico-comportamental. Essa tendência é encontrada em Abreu (2006), que menciona que as terapias analítico-comportamentais, como as referidas, apresentam hoje propostas de intervenção com larga aplicação e validação empírica. Terapia analítico funcional (FAP): enfatiza a análise da relação terapêutica como estratégia para promover a mudança comportamental do cliente.O pressuposto central da FAP é o de que o cliente se comporta em relação ao terapeuta de forma semelhante ao modo como se comporta com outras pessoas significativas em sua vida (Kohlenberg e Tsai, 2004). Em outras palavras, os comportamentos clinicamente relevantes (CRBs) ocorrem na sessão e podem ser tratados via modelagem direta, o que evitaria o controle por regras na psicoterapia. Logo, mudanças de comportamento em sessão teriam grande probabilidade de ser generalizadas para outras situações sociais. Como a terapia de aceitação e compromisso (ACT), a FAP considera que os problemas dos clientes são conseqüências de uma história de fuga ou esquiva de situações interpessoais aversivas que podem ser desencadeadas a partir da relação terapêutica. Assim, o terapeuta tem o papel de promover o bloqueio da esquiva de situações interpessoais aversivas e a aceitação das reações emocionais associadas a elas (CONTE; BRANDÃO, 1999). A FAP classifica os comportamentos, relacionados com problemas do cotidiano, que aconteçam na relação com o terapeuta, como CCRs (Comportamentos Clinicamente Relevantes). CCR1 é um comportamento que pertence à mesma classe funcional como comportamentos que, quando emitidos no cotidiano fora da relação terapêutica, fazem parte do problema para o qual o cliente procura terapia. CCR2 é uma melhora do cliente, que ocorre na sessão. Se ele emite comportamentos funcionalmente similares nas situações problemáticas do cotidiano, os problemas delemelhorariam. CCR3 é a interpretação que o cliente dá às suas ações e reações. A visão analítica-funcional propõe que as pessoas se comportam devido às contingências de reforçamento presentes nas suas vidas, e a terapia prossegue de acordo com o mesmo princípio. A interação terapêutica é curativa quando enfraquece os CCRs 1, fortalece os CCRs 2 e modifica os CCRs 3 para se tornar mais construtivas. Enquanto a ACT enfatiza a descontrução do controle verbal, para que o cliente possa dar uma chance às contingências, a FAP coloca o cliente em contato direto com as contingências que controlam seu comportamento. O comportamento clinicamente relevante é modelado durante a sessão terapêutica por meio de reforçadores naturais. Estes últimos são reações genuínas do terapeuta, ou outros efeitos causados pelos comportamentos do cliente que não são específicos para o ambiente terapêutico, mas também são disponíveis como conseqüências de comportamentos similares no ambiente natural. Trata-se de eventos que são contingentes a uma classe maior de respostas por serem elementos que fazem parte da vida do cotidiano. Terapia de Aceitação e compromisso (ACT): tem como meta principal tratar a esquiva emocional, o número excessivo de respostas literais ao conteúdo cognitivo e a inabilidade de assumir e manter compromissos com a mudança comportamental (Hayes et al., apud Abreu, 2006). Segundo seus criadores, os clientes normalmente chegam à clínica com queixas que apresentam claramente a tentativa de controlar os supostos determinantes de seu sofrimento, ou seja, a eliminação de emoções negativas, lembranças, impulsos,etc. A ACT estaria centrada na quebra do controle de estímulo problemático, abrindo possibilidade de contato com fontes alternativas de reforçamento. Em vez de tentar mudar os conteúdos que o cliente traz, ou levar o cliente a pensar mais racionalmente, a ACT considera que tal trabalho se reduz à reorganização do cenário, e pretende olhar atrás deste, ou seja, atacar os contextos sócio-verbais que tornaram estes conteúdos ou estes pensamentos problemáticos. Ela se interessa para os contextos que permeiam uma sociedade patogênica ou uma cultura alienadora (HAYES; STROSSAHL e WILSON, 1999). A ACT objetiva enfraquecer a esquiva de emoções negativas e aumentar a capacidade para mudança comportamental. O controle aversivo exercido por eventos privados pode impedir o contato com as fontes de reforçamento. Desta forma, o terapeuta nem sempre agirá como o cliente espera. Ele procura fazer que o cliente destrua regras em vigor e entre em contato com as contingências naturais, sem, no entanto, perceber o cliente como alguém necessitado de que lhe ensinem como se comporte. A ACT foi desenvolvida a partir da releitura contextualizadas do processo psicoterapêutico (Hayes, 1987). Um dos alvos principais da ACT é a redução da esquiva experiencial, que é vista pela teoria como uma das maiores fontes do sofrimento humano. A ACT promove uma atitude de aceitar pensamentos e emoções como realmente são, e não como parecem ser. Uma vez livre da luta contra as próprias avaliações, pensamentos e sentimentos, as pessoas podem agir de modo produtivo sobre seu ambiente. O modelo postula que os transtornos de ansiedade são decorrentes da socialização da pessoa de acordo com quatro contextos sócio-verbais patogênicos, que resumem uma variedade de armadilhas embutidas na forma em que se faz uso da linguagem no ato de pensar (Hayes, Pankey & Gregg, 2002). O contexto de literalidade refere-se à tendência de idéias e pensamentos a se tornarem fonte de regulação de emoções e comportamentos mais importantes. Assim, não há espaço suficiente para o efeito regulador saudável da experiência direta. Os conceitos podem determinar nossas reações como se fossem literalmente fatos, e esquecemos que não são nada mais do que produtos verbais. Se o controle verbal se torna excessivo, as pessoas começam a viver em função dos conceitos, crenças e vieses. O contexto de avaliação refere-se à tendência automática de categorizar eventos em termos de bons ou ruins. Se estas avaliações não são baseadas nas vivências diretas e contextualizadas em ampla visão das mesmas, podem influenciar nossas reações de maneiras injustas e rígidas. Isto acontece principalmente quando são baseadas em regras sociais ou construções verbais. O contexto de controle refere-se à tendência de tentar-se eliminar os sentimentos, pensamentos e sensações avaliados como negativos. Trata-se de tentar rejeitar aspectos de sua própria vivência, ao invés de enfrentar as condições no contexto da vida que os geram. O contexto de dar razões refere-se a tentativas de criar explicações literais para os problemas, tornando estes últimos socialmente aceitáveis ou ao menos compreensíveis. Enquanto a cultura em geral oferece amplo apoio a esta estratégia, mostrando mais compaixão, tolerância e outras vantagens às pessoas que conseguem explicar bem suas ansiedades e seus comportamentos auto-destrutivos, esta produção de razões lógicas e aceitáveis pode afastar as pessoas cada vez mais do contato com as condições que realmente poderiam mudar para resolver seus problemas. Hayes e Gregg (2000) distinguem três níveis da vivência de si. O Eu Conceitual é o que pensamos sobre nós mesmos. São conceitos que explicam o que a pessoa percebe a respeito de si mesma. Identificar-se demasiadamente com seu Eu Conceitual gera atitudes defensivas, rígidas e desonestas. A pessoa que cai nesta armadilha terá dificuldade de aceitar ou até mesmo entender aspectos da sua vivência que não cabem na camisa de força do seu auto-conceito e se dedicará a disfarçar ou negar estes aspectos. Muito importante no processo de distanciar-se deste Eu é que a pessoa retira o caráter literal de seus pensamentos e regras, aprende que estes não são o que parecem significar. Neste processo, o cliente aprende que ele não é o que pensa sobre si mesmo. Pode descobrir que seus pensamentos são nada mais do que seus próprios comportamentos verbais e, portanto, não podem impor nenhuma realidade ao que ele deveria se adequar. O Eu Vivencial é a vivência dos sentimentos, sensações e pensamentos. Neste nível, a pessoa se reconhece no fluxo perpétuo de mudanças. Ter contato com o Eu Vivencial leva a características saudáveis como atitudes flexíveis, genuínas, abertura para a experiência e capacidade de crescimento. Porém, realmente identificar-se com estes conteúdos mutáveis e imprevisíveis caracteriza-se por um modo de ser altamente instável e impulsivo. O Eu Observador corresponde à perspectiva transcendente, em que a pessoa tem consciência que não é nem os conceitos que ela tem sobre si, nem os conteúdos que vivencia, que todos estes são eventos com os quais lida, mas que são distintos dela mesma. O contato com este nível de ser permite que a pessoa se reconheça como expectadora dos seus problemas e conflitos e, assim, consegue entendê-los melhor porque não se confunde com eles. Esta tomada de distância em relação aos pensamentos e sentimentos aumenta a tolerância aos mesmos, bem como permite ver suas implicações mais amplas com mais clareza. A ACT procura aumentar a consciência que a pessoa pode ter de sua vivência interior (emoções, pensamentos, sensações) por habilidades que envolvem observação e aceitação. A aceitação de sentimentos e sensações (que não são sempre o que desejamos) facilita a disposição para agirmos num mundo que não está sob nosso controle, mas em que podemos ter efeitos importantes, com a condição de nos envolvermos ativamente nele, ao invés de vivê-lo em nossa cabeça. Desta perspectiva, a pessoa não é seu fluxo de consciência, já que todos os conteúdos passam, enquanto ela permanece. Aprende a tomar a posição de observador que permite um contato íntimo com os conteúdos e o fluxo dos momentos da vida, sem se confundir comestes, podendo enxergar o sentido mais amplo dos mesmos. Assim, a pessoa torna-se capaz de agir de acordo com seus valores e não sob o controle dos contextos sócio-verbais descritos acima. Terapia por Contingências de Reforçamento (GUILHARDI, 2004). É uma proposta de intervenção terapêutica que se baseia no modelo de seleção do comportamento pelas suas conseqüências. Com a TCR o autor está apenas contribuindo e participando de um processo ou movimento de desenvolvimento da Análise Aplicada do Comportamento. Tal modelo tem como fundamento para a atuação clínica: o Behaviorismo Radical de B. F. Skinner, para a conceituação filosófico-conceitual e a Ciência do Comportamento e inúmeros artigos publicados em revistas especializadas, os quais dão um panorama abrangente e compreensivo do que se tem produzido na área chamada de Análise do Comportamento, com publicações de artigos de estudos experimentais básicos ou aplicados, textos teóricos e estudos de caso em diferentes contextos. 8.2. As terapias cognitivas – o paradigma cognitivo Quando se fala das terapias cognitivas normalmente se está falando de uma ou mais das diversas modalidades terapêuticas e concepções aliadas à introdução de termos e concepções cognitivos, as quais podem ser rotuladas de abordagens comportamental- cognitiva ou cognitivo-comportamental. (Abreu & Guilhardi, 2004; Kerbauy, 2001; Rangé, 2001. Destacam-se a Terapia Racional-Emotiva-Comportamental (Albert Ellis, 1955); a Terapia Cognitiva (Aron Beck, dec. de 60); Terapia Muldimodal (Lazarus, 1989), entre outras. Para a abordagem desse tópico faço a opção de tratar de forma ampla os princípios e pressupostos básicos de diversas modalidades no âmbito das psicoterapias cognitivas (i.é., baseadas no modelo cognitivo), isto porque eles também se aplicam, de forma geral, à TCC. Para começar, o aspecto central que marca as terapias cognitivas, quase sem exceção, é o entendimento de que a psicopatologia, ou os problemas trazidos pelos pacientes são resultado de crenças disfuncionais e/ou de pensamentos distorcidos, os quais influenciariam o humor e o comportamento do indivíduo, enviesando sua percepção da realidade (Beck e Freeman, 1993). Os primórdios das terapias cognitivas encontram-se no behaviorismo mediacional de Hull e Tolman, em especial do último. Estes Behavioristas começaram a rejeitar o modelo de Watson e assumiram uma outra postura, na qual o ambiente perdia o seu lugar primordial na causação do comportamento para cedê-lo de volta ao organismo. Em outras palavras, estímulos ambientais gerariam nas pessoas processos mentais que, por sua vez, seriam a causa do comportamento. Este tipo de Behaviorismo ficou conhecido como Behaviorismo Mediacional, pois tais processos cognitivos mentais mediariam a ação dos estímulos ambientais no organismo, maneira de pensar ainda dualista e mecanicista. Atualmente, chama-se este tipo de Behaviorismo de Cognitivismo (Matos, 1993). Em Bahls e Navolar (2004) encontramos que o modelo cognitivo utiliza o conceito da estrutura “biopsicossocial ” na determinação e compreensão dos fenômenos relativos a psicologia humana, no entanto focaliza o trabalho sobre os fatores cognitivos da psicopatologia .As terapias baseadas no modelo cognitivo, em especial a TCC, vem demonstrando eficácia em pesquisas científicas rigorosas além de ser as primeiras a reconhecer a influência do pensamento sobre o afeto, o comportamento,a biologia e o ambiente (Shinohara,1997). De acordo com o modelo cognitivo os indivíduos atribuem significado a acontecimentos, pessoas, sentimentos e demais aspectos de sua vida, e com base nisso comportam-se de determinada maneira e constroem diferentes hipóteses sobre o futuro e sobre sua própria identidade. As pessoas reagem de formas variadas a uma situação específica podendo chegar a conclusões também variadas. Em alguns momentos a resposta habitual pode ser uma característica geral dos indivíduos dentro de determinada cultura, em outros momentos estas respostas podem ser idiossincráticas derivadas de experiências particulares e peculiares a um indivíduo. Em qualquer situação estas respostas seriam manifestações de organizações cognitivas ou estruturas. De acordo com Bech, citado por Bahls e Navolar (2004), uma estrutura cognitiva é um componente da organização cognitiva em contraste com os processos cognitivos que são passageiros. Conforme Range (1997) nossas emoções e comportamentos são influenciados pela maneira de como percebemos e interpretamos os eventos (cognições), ou seja, como estruturamos o mundo; propõe ainda, que o pensamento disfuncional ou distorcido seja comumente apresentado nos distúrbios psicológicos. A psicopatologia é resultante de significados maladaptativos que o sujeito constrói em relação a si, ao contexto ambiental (experiência) e ao futuro (objetivos), que juntos formam a tríade cognitiva. Na ansiedade, a visão de si é vista como inadequada (devido a recursos deficientes), o contexto é considerado perigoso e o futuro parece incerto. Já na depressão, todos os três componentes são interpretados negativamente. Afeto Mundo externo → Interpretações → Comportamento (modelo esquemático – Range, 1997). A história da terapia cognitiva - principal representante atual entre as terapias cognitivas - inicia-se em 1956, quando Aaron Beck realizou um trabalho de pesquisa com o intuito de verificar os pressupostos psicanalíticos acerca da depressão. Para a Psicanálise, pessoas deprimidas apresentavam uma “hostilidade retrofletida ” ou seja, uma espécie de masoquismo ou necessidade de sofrer. Beck percebeu então que a depressão era melhor entendida como um transtorno cuja principal característica seria uma tendência negativa onde a pessoa deprimida apresenta, muito freqüentemente, expectativas negativas com relação ao resultado de seus comportamentos e uma visão também negativa de si mesma,do contexto em que está inserida e de seus objetivos. (Beck &Alford,2000). A partir disso os demais estudos desenvolveram-se de forma a testar estratégias de modificação de tais tendências negativas existentes na depressão bem como a extensão da testagem deste novo modelo a outros transtornos. De acordo com Falcone (1995) o final da década de 60 foi marcada pelo surgimento de insatisfações com a terapia comportamental tradicional, por esta não considerar os fatores cognitivos como imprescindíveis para compreensão e tratamento mais abrangentes de problemas clínicos mais complexos, tais como desordens de ansiedade e depressão. Além dos estudos de Bandura sobre aprendizagem vicária e auto-eficácia, que contribuíram para o desenvolvimento de pesquisas na área de cognição, modelos de tratamento tais como a Terapia Racional Emotiva de Ellis, o Treino Auto-Instrucional de Meichenbaum e a Terapia Cognitiva da Depressão de Beck foram se desenvolvendo e gerando interesses entre os profissionais de orientação comportamental. O avanço das pesquisas que incorporam processos cognitivos aos modelos comportamentais conquistaram um número cada vez maior de adeptos gerando o que mais tarde foi chamado por Mahoney (1988) de “revolução cognitiva”. Abordando especificamente os princípios básicos do modelo cognitivo aplicáveis à TCC, Rangé (1997) destaca que as interpretações que um indivíduo faz do mundo estruturam-se progressivamente durante seu desenvolvimento, formando regras ou esquemas. Estes orientam, organizam, selecionam suas novas interpretações e ajudam a estabelecer critérios de avaliação de eficácia ou adequação de sua ação no mundo (como regras gramaticais regulam o comportamento verbal). Range (1997) refere que esquemas são como “fórmulas” que a pessoa tem a seudispor para lidar com situações regulares de forma a facilitar o processamento de novas situações. Orientam na seleção de detalhes relevantes do ambiente e a evocar dados da memória importantes dados para sua interpretação. Os esquemas podem se organizar em compostos mais complexos, chamados constelações cognitivas, que se manifestam através de prontidões cognitivas (sets), entendidas como estados de ativação cognitiva, que preparam o indivíduo para um certo tipo de atividade cognitiva específica (detecção de perigo, por exemplo). Estes esquemas determinam a espécie e a amplitude das reações emocionais e comportamentais. Em condições normais um estado de prontidão cognitiva varia de acordo com mudanças na estimulação, mas pode haver uma tendenciosidade (ou rigidez) na ativação desses sets (esquemas organizados), e há a ativação de um modo particular de interpretar as situações, ou de funcionamento, por exemplo, que pode ser negativista, narcisista,vulnerável, eróticos, etc. (Range, 1997). A ativação de um modo estimula a ativação de esquemas correspondentes e de certos sets cognitivos, que irão disparar pensamentos automáticos – verbalizações ou imagens encobertas, específicas, autônomas e idiossincráticas, sentidas como plausíveis. Os pensamentos automáticos vão gerar emoções correspondentes; é a partir deles que se chega aos esquemas, e se descobre os tipos de distorções cognitivas que sustentam as patologias. O domínio pessoal, de acordo com Range (1997), é um dos esquemas mais fundamentais, sendo constituído pelo conjunto de objetos, tangíveis ou não, que são relevantes para uma pessoa. No centro do domínio está o seu conceito de si mesma, seus atributos físicos e características pessoais, suas metas e valores. Em torno do centro há objetos animados ou inanimados nos quais há investimento e incluem a família,amigos, bens, etc. Outros componentes variam em grau de abstração e incluem: escola, trabalho, grupo social, valores, etc. A natureza da resposta emocional depende da pessoa ver os eventos como adicionando (alegria/euforia), subtraindo (tristeza/depressão), ameaçando (medo/pânico) ou invadindo/coagindo (raiva/hostilidade), seu domínio. O funcionamento psicológico bem como a adaptação psicológica a determinado contexto estão na dependência de “estruturas de cognição com significado ” ou simplesmente “esquemas ”.O termo “significado ” é, por sua vez, designado como o resultado da ação de interpretar uma realidade determinada e a forma de relação desta realidade com o self . (Bahls e novolar, 2004). Uma “categoria de significado” apresenta implicações que são padrões específicos de emoção, atenção, memória e comportamento. Este fato denomina-se “especificidade do conteúdo cognitivo”. Os significados são construídos pelo indivíduo, ou seja,não são componentes preexistentes da realidade. No entanto tais significados podem constituir-se como corretos ou incorretos em relação a um contexto ou objetivo específicos. Os significados ditos incorretos são denominados como “disfuncionais ” ou “maladaptativos ” no que se refere a ativação dos sistemas. Os esquemas só são classificados como adaptativos ou maladaptativos com relação a um contexto específico. Assim os esquemas evoluem para facilitar a adaptação da pessoa ao ambiente no qual está inserida. Os erros (“distorções cognitivas ” e “preconcepções ”) podem acontecer tanto em relação ao conteúdo cognitivo propriamente dito (significado) como em relação ao processo de elaboração de significado (processamento cognitivo). O modelo cognitivo propõe que existe nos indivíduos uma predisposição a fazerem construções cognitivas falhas e isto denomina-se “vulnerabilidade cognitiva ”. Em decorrência da especificidade cognitiva uma vulnerabilidade cognitiva específica predispõe a pessoa a uma síndrome específica. Nos transtornos de ansiedade, por exemplo, existe o impedimento de uma tendência inata a ampliar o foco de atenção (ampliar o universo de fenômenos aos quais um organismo fica atento) de forma que este organismo atua como se estivesse em uma situação de ameaça real sem poder dar outros significados à situação. Em situações de ameaça à sobrevivência esta tendência é bloqueada de forma que o indivíduo foca sua atenção sobre aquilo que está o ameaçando,o que é extremamente adaptativo do ponto de vista evolutivo (Lotufo Neto,1993b; Rangé,1998b). Assim, nos transtornos de ansiedade, o indivíduo sente-se intensamente vulnerável ao que considera serem ameaças, esta sensação o leva a esquivar-se de situações potencialmente ansiogênicas para ele. Os significados maladaptativos, dos quais resultam a psicopatologia, são construídos em relação ao que é denominado de “Tríade Cognitiva ” ou seja em relação ao self, ao ambiente (experiência atual) e ao futuro (objetivo). O objetivo da terapia, dentro do modelo cognitivo, seria o de fornecer estratégias capazes de corrigir conceitos idiossincrásicos maladaptativos. No processo de psicoterapia os sistemas de crenças pessoais são testados com relação à suas conseqüências e funcionalidade para a vida do paciente dentro de contextos específicos (Lima &Wielenska,1993). Através de registros de pensamentos, usados na terapia cognitivo-comportamental, as crenças disfuncionais e os pensamentos distorcidos podem ser modificados pelo acesso a pensamentos alternativos e compensatórios, desenvolvendo-se novas crenças, facilitando a mudança dos estados de humor e do comportamento. O modelo cognitivo, fundamentado nas teorias construtivistas, vê o homem como um ser que constrói seus significados sobre os fatos e portanto constrói sua própria realidade, já que a forma como este interpreta seu mundo determinará a maneira com que ele irá comportar-se. Terapias cognitivo-comportamentais contemporâneas De acordo com Dobson e Block (1988) as terapias cognitivo-comportamentais representam a mistura de estratégias comportamentais e processos cognitivos com o objetivo de alcançar mudanças cognitivas e comportamentais. Os diversos procedimentos terapêuticos cognitivo-comportamentais apresentam muitos aspectos comuns e estão incluídos dentro de três principais divisões: terapias de reestruturação cognitiva, de treinamento de habilidades e de solução de problemas. Do primeiro grupo fazem parte as modalidades que mais tem sido empregadas e divulgadas: a TREC, de Ellis, a Terapia Cognitiva de Beck e o treinamento auto-instrucional, de Meichenbaum. As terapias de reestruturação cognitiva assumem que o estresse emocional é a conseqüência de pensamentos mal adaptados. Portanto, a meta destas intervenções clínicas é estabelecer mais padrões adaptativos de pensamento. Terapia Racional Emotivo-comportamental (TREC): Considerada o primeiro exemplo de abordagem cognitivo-comportamental, a teoria e a prática da TREC foi formulada por Albert Ellis, nos anos 50, a partir de seus questionamentos à eficácia dos métodos psicanalíticos clássicos. Ellis formulou gradativamente a teoria do distúrbio emocional e uma série de métodos de tratamento que enfatizavam uma forma prática de lidar com os problemas da vida. O nome original da abordagem era TRE, até 1993, quando foi mudado, em razão do caráter comportamental do seu processo terapêutico. De acordo com a TREC os pensamentos e as emoções humanas estão significativamente interligados. Os sintomas neuróticos ou conseqüências são determinados pelo sistema de crenças do indivíduo frente às experiências ou eventos. De acordo com o modelo ABC de Ellis, o papel do terapeuta é possibilitar que o cliente perceba que as crenças o levam a ter esse ou aquele comportamento, e a partir disso, reorganizar suas crenças para fazer escolhas ou opções que o levem a viver feliz. Essas escolhas ou opções que o indivíduo fará resultam de aprendizagem, ou seja, Ellis elabora um modelo de aprendizagem para o tratamentode distúrbios emocionais e desvios de comportamento. Esse modelo de aprendizagem chama-se ABC da Terapia Racional Emotivo-Comportamental, o qual pressupõe que os eventos ativadores – “A” – constituem pessoas e coisas com as quais os indivíduos se deparam; que os pensamentos, cognições ou idéias – “B” – constituem as noções e crenças que os indivíduos têm de “A”; e que os comportamentos e sentimentos – “C” – constituem as reações provocadas por “B”. Esse modelo de aprendizagem se completa com o debate das crenças (D) e pela percepção de mudanças das crenças irracionais por parte do cliente (E). Para Albert Ellis, o próprio cliente é responsável pela sua mudança comportamental. A TREC sustenta que os indivíduos possuem tendências inatas e adquiridas para pensar e agir irracionalmente. De modo a manter um estado de saúde emocional, os indivíduos podem monitorar constantemente e questionar o seu sistema de crenças básico, e é papel do terapeuta auxilia-lo nessa tarefa. Ellis (1970) identificou 11 crenças irracionais que tomam a forma de expectativas não realistas. A substituição de necessidades irrealistas e supergeneralizadas por desejos, preferências ou expectativas realistas, poderão gerar maiores mudanças nas emoções e comportamentos. No que se refere às técnicas empregadas, a TREC propõe uma abordagem multidimensional, que incorpora técnicas cognitivas, emotivas e comportamentais. Entretanto, o mais importante instrumento terapêutico mantém um “método lógico- empírico de questionamento científico, questionamento e debate” destinado a ajudar os indivíduos a mudarem suas crenças irracionais. Além disso, a TREC utiliza outras técnicas, tais como: desempenho de papéis, modelação, imagem racional-emotiva, exercícios que provocam vergonha, métodos de relaxamento, condicionamento operante e treinamento de habilidades. As metas mais importantes da TREC são: auto-interesse, interesse social, auto- direção, tolerância em relação a si e aos outros, flexibilidade, aceitação da incerteza, confiança em interesses vitais, auto-aceitação, pensamento científico e uma perspectiva de vida não utópica. Terapia Cognitiva: Abordando a Psicologia Cognitiva de Beck, especificamente, Falcone (2001) destaca que a mesma surgiu na década de 60 propondo que os transtornos psicológicos são resultado de um modo distorcido ou disfuncional do indivíduo perceber os acontecimentos. Estando altamente centrada na variável pensamento, a terapia cognitiva identifica três níveis deste: os pensamentos automáticos, as crenças intermediárias, e as crenças centrais. Os pensamentos automáticos representam o primeiro nível do funcionamento cognitivo são ativados a partir de situações corriqueiras do nosso dia-a-dia e, segundo Falcone (2001), podem surgir em forma de sentenças ou de imagens. É comum a presença de pensamentos automáticos distorcidos nos transtornos psicológicos, apresentando nestes casos as distorções cognitivas e será a partir da análise dos pensamentos automáticos que temos acesso às distorções. A importância da discriminação destas distorções reside no fato de que estas sustentam os transtornos psicológicos aos quais nos defrontamos, apresentando padrões característicos nas diferentes patologias (Rangé, 1995). As crenças intermediárias representam o segundo nível de pensamento. Sua característica principal é que estes não estão diretamente relacionados à exposição às contingências, ocorrendo assim sob forma de suposição ou regras. No caso de suposições, seu conteúdo concentra-se em uma relação do tipo “Se ... então”. No formato de regras, seu conteúdo possui a característica básica de sinalizar um “dever”. As crenças centrais podem ser definidas como verdades absolutas que o sujeito faz de si, dos outros e de seu mundo. São desenvolvidas desde a infância, como resultado de circunstâncias presentes em seu ambiente, tendo com características principais a rigidez, a generalização e a globalização (Beck, 1997; Freeman e Dattilio, 1998). No tocante aos níveis de pensamento proposto pela Terapia Cognitiva, as crenças centrais constituem o nível mais profundo da estrutura cognitiva. Também chamadas de esquemas, são compreendidos como estruturas cognitivas que “orientam o indivíduo ao lidar com uma situação, ajudando-o a selecionar detalhes sobre o ambiente e a lembrar dados relevantes”. Conforme Dobson e Block (1988), os esquemas são estruturas cognitivas que organizam e processam a entrada de informação e representam os padrões de pensamento adquiridos na infância no desenvolvimento de uma pessoa. Erros lógicos adquiridos durante o período de desenvolvimento vão formar a substância do esquema e predispor o indivíduo a ter problemas emocionais. Enquanto o esquema de um indivíduo bem ajustado faz concessões para a avaliação realista de eventos da vida, o esquema de indivíduos mal ajustados resulta na distorção da realidade e facilita o transtorno psicológico. A noção de esquemas é fundamental para o entendimento do que é patológico dentro da teoria cognitiva. Os esquemas selecionam, organizam e orientam o comportamento, pois sustentam e estabelecem critérios avaliativos da realidade, preparando o indivíduo para um certo tipo de atividade cognitiva a fim de perceber eventos como aditivos e apetitivos (alegria, felicidade), como subtrativos (tristeza, pesar), como ameaçadores (medo, pavor), invasivos (raiva, agressão). Padrões persistentes de interpretação da realidade, inflexibilidade e rigidez de esquemas densos e hiperativos são fatores mantenedores da psicopatologia. (Lopes, Lopes & Lobato, 2006). O esquema negativo é caracterizado por uma tríade negativista. Os indivíduos depressivos vêem a si mesmos, seu mundo e seu futuro de forma negativa. Quanto mais severa é a depressão, mais este esquema domina os processos cognitivos. Vejamos um exemplo: Fulano tem dificuldade de falar em público. O pensamento que vem a sua cabeça quando está numa situação em que é necessário falar a um grupo, por exemplo, é de que não será compreendido, e, conseqüentemente, pensarão que ele não sabe do que fala. Isso quer dizer que ele é burro e incompetente. Situação Problema: falar em público Pensamento automático: não vão me compreender Crença de Suporte (pressuposição condicional decorrente do pensamento automático): pensarão que não sei sobre o assunto Crença Central: Sou burro, incompetente. Outro exemplo com sistematização gráfica diferente: Silvana entra no escritório e Maria a cumprimenta polidamente. (situação) O que essa situação diz a meu respeito (Silvana)? As pessoas não me dão atenção. (pensamento automático) O que isso gera em decorrência? Nunca terei um relacionamento íntimo de amizade (crença periférica) E isso quer dizer que... Sou desagradável (Crença central) Quanto às técnicas empregadas, a terapia cognitiva envolve a aplicação de procedimentos empíricos aos processos cognitivos, comportamentais e afetivos do cliente e representa uma extensão lógica do modelo cognitivo de Beck. A meta da terapia é substituir avaliações distorcidas dos eventos da vida por avaliações cognitivas realistas. O tratamento envolve um programa específico de experiências aprendidas, de modo a ensinar os clientes: 1) a monitorar pensamentos automáticos; 2) a reconhecer as relações entre cognição, emoção e comportamento; 3) a testar a validade dos pensamentos automáticos; 4) a substituir pensamentos distorcidos por cognições mais realistas; 5) aprender a identificar e alterar crenças ou suposições subjacentes que predispõem o indivíduo a se engajar em padrões de pensamentos disfuncionais. Treinamento Auto-Instrucional: De acordo com Dobson e Block (1988) os estudos de Donald Meichenbaum se desenvolveram em um período em que florescia a terapia comportamental, bem como as idéias de Ellis e Beck. Meichenbaum realizousua pesquisa de doutoramento investigando os efeitos do procedimento operante no tratamento de pacientes esquizofrênicos internos, treinados a emitir “conversas saudáveis”. Ele observou que os pacientes que se engajavam em uma auto-instrução espontânea para “conversar saudavelmente” eram menos perturbados e demonstravam performance de conversa superior em uma variedade de medidas. Estes achados levaram-no a focalizar-se no papel dos fatores cognitivos na modificação do comportamento. Meichenbaum foi influenciado fortemente por Luria e Vygotsky (soviéticos), que estudaram a relação desenvolvimental entre linguagem, pensamento e comportamento. Eles sugeriam que o desenvolvimento do controle voluntário sobre o próprio comportamento envolve uma progressão gradual, desde regulação externa por outros significantes (instruções parentais) à auto-regulação como um resultado da internalização dos comandos verbais. A partir daí, Meichenbaum propõe que os comportamentos cobertos operam de acordo com os mesmos princípios dos comportamentos manifestos e que os comportamentos cobertos estão, portanto,sujeitos a modificação, usando as mesmas estratégias comportamentais empregadas para modificar comportamentos manifestos (Meichenbaum, apud Dobson e Block, 1988). Quanto às técnicas, Meichenbaum tentou explorar o desenvolvimento de um programa auto-instrucional, designado a tratar deficiências mediacionais de crianças impulsivas. As metas do programa de tratamento eram: 1) Treinar crianças impulsivas a produzir auto-comando e respondê-lo apropriadamente. 2) Fortalecer as propriedades mediacionais da fala interna das crianças, de modo a trazer seus comportamentos sob seus próprios controles verbais. 3) Superar quaisquer deficiências mediacionais, de compreensão ou de produção. 4) Encorajar as crianças a auto-reforçar seus comportamentos apropriadamente. O programa de treinamento auto-instrucional aumentou significativamente o desempenho nas tarefas de crianças impulsivas através de um número de medidas relativas aos grupos de controle. Meichenbaum enfatisa a técnica de treinamento auto- instrucional, no que respeita às tarefas graduais, modelação cognitiva, treinamento mediacional direto e auto-reforçamento. Entretanto, o alvo desta abordagem não é significativamente diferente das de Ellis (1962) ou Beck (1963). O treinamento auto-instrucional provê um paradigma de tratamento básico que pode ser modificado para se adequar às necessidades especiais de uma população clínica particular. Em suma, como propõe Borba (2004) existem três proposições da Terapia Cognitivo-Comportamental (o que se aplica às TCCs de modo geral): 1) A atividade cognitiva afeta o comportamento (declaração derivada do modelo mediacional básico). A atividade cognitiva pode ser monitorada e alterada (Se podemos ter acesso à atividade cognitiva, cognições podem ser identificáveis e acessíveis). A mudança do comportamento pode ser afetada pela mudança cognitiva (há métodos alternativos para a mudança do comportamento, além das contingências de reforçamento manifesto) A prática da TCC: síntese das terapias cognitivas (ou cognitivo- comportamentais) Resta tratar em breve do que chamamos de Terapia cognitivo-comportamental tal como a conhecemos, apresentada por Range (1997), e que teve origem em meio à evolução da própria terapia comportamental e à revolução cognitiva (podendo-se tomar como suas precursoras as modalidades referidas acima, de Beck, Ellis e Meichenbaun, entre outras). De acordo com o autor, a concepção do modelo cognitivo, que envolve as noções de esquemas, modos e pensamentos automáticos gerou a prática da TCC, que pode ser tomada como uma integração dos princípios e práticas das terapias comportamental e cognitiva. Há um grupo de autores, como Costa (2002), que entendem que tal tentativa - de mesclar conceitos, métodos e práticas da terapia cognitiva com a terapia comportamental - representa um desconhecimento dos princípios de ambas as orientações: "defender a compatibilidade, complementaridade e/ou integração entre Behaviorismo Radical e Cognitivismo constitui em uma incoerência teórica que só pode ser explicada pela ausência de familiaridade com os pressupostos de uma ou outra orientação" (p. 44). Essa discussão é relevante, mas foge ao objetivo desse ensaio. Por ora tomaremos o termo TCC como vem sendo tratado no nosso meio, mais ou menos como um plano geral que contempla todas as terapias que de uma forma ou de outra adotam o modelo S-O-R, considerando os componentes cognitivos mediacionais na determinação do comportamento. A TCC adota o modelo S-O-R, que identifica a presença de um organismo e de processos cognitivos mediacionais entre um estímulo e a emissão de uma resposta. Conforme Knapp (2004), enquanto o comportamentalismo enfatiza o determinismo ambiental, a TCC pressupõe que a testagem da realidade seja dirigida ao pensamento do paciente, e não ao seu comportamento encoberto. Conforme Rangé (1997), trata-se de uma “...abordagem ativa, diretiva e estruturada, usada no tratamento de problemas psiquiátricos, fundamentada nos modelos cognitivo e comportamental, e caracterizada pela aplicação de uma série de procedimentos clínicos, como a introspecção, teste de realidade, insight, e inúmeros procedimentos comportamentais que conduzem a aprendizagens, visando aperfeiçoar discriminações e corrigir concepções equivocadas, modificar estados emocionais e mudar comportamentos julgados inadequados. (p. 24)” Conforme Borba (2004), a TCC estimula a percepção das relações funcionais entre pensamentos, sintomas físicos e emocionais e determinados acontecimentos, evidenciando que as perturbações sofridas podem ser compreendidas e modificadas com o desenvolvimento de habilidades mais saudáveis e relacionadas com a realidade e necessidades do paciente. Range (1997; 1998) refere o uso do método socrático no trabalho cognitivo, o que se dá na forma de perguntas que o terapeuta faz para que o paciente questione o fundamento de suas crenças. Os questionamentos, que visam a reestruturação cognitiva, são dirigidos às possíveis evidências que sustentam as crenças e pensamentos automáticos. O paciente é conduzido a uma espécie de “teste de hipóteses” no que diz respeito aos fundamentos de seus pensamentos automáticos e crenças, evidenciando-se, nesse sentido, o .emprego do método indutivo, na medida em que se toma as evidencias dos dados como instrumento de avaliação na credibilidade das hipóteses. A TCC é orientada para o problema e não para a personalidade. É estruturada e dirigida para as mudanças pretendidas tendo em vista a problemática em questão. Baseia num modelo educacional que tem como meta ensinar ao paciente recursos para lidar sozinho com novas situações, no futuro. (Range, 1997; 1998). As tarefas de casa são consideradas um aspecto central do tratamento e podem incluir o emprego de técnicas (por exemplo, de exposição com prevenção de resposta no caso dos transtornos ansiosos), e o registro diário de pensamentos disfuncionais (RDPD), que permite o registro da ocorrência dos comportamentos-alvo (“sintomas”), os quais serão trabalhados na sessão seguinte, e fornecerão dados para a condução do processo. A detecção dos pensamentos disfuncionais e das crenças durante a sessão é fundamental para a adequada demonstração das distorções cognitivas. Mas com o RDPD o paciente aprende a detecta-los e maneja-los por si mesmo, identificando os eventos situacionais (dia, hora, situação), emocionais (sentimentos, reações corporais) ecognitivos (pensamentos e imagens) relevantes. (Bahls & Novolar, 2004; Range, 1997; 1998). A análise dos RDPD permitirão o estabelecimento de um conjunto de sintomas- alvo (desânimo, tristeza, ansiedade, dificuldade de concentração, evitações, etc.), o que está relacionado ao quadro apresentado pelopaciente. A partir daí busca-se a alteração das cognições que sustentam esses sintomas-alvo. Parte da sintomatologia pode ser atribuída à incompreensão sobre a problemática, de forma que faz parte da instalação da aliança terapêutica – um importante elemento da relação terapêutica e parte do processo de mudança- uma explanação sobre a lógica da TCC, sua compreensão dos problemas e em especial da problemática do paciente. Estas informações já oferecem algum alívio, uma vez que se sente compreendido e com esperança de resolução, aumentando a possibilidade de que o paciente se empenhe de forma ativa em direção à mudança pretendida. (Rangé, 1997; 1998). À medida que o paciente aprende a lógica do processo, que envolve a detecção e “teste” dos fundamentos de seus pensamentos disfuncionais, busca-se a generalização para fora do contexto terapêutico. Isto pelo caráter educativo do tratamento, já que se busca tornar o próprio paciente capaz de mudar seu comportamento pela modificação de suas cognições e interpretações dos eventos aos quais se expõe. Acerca dos procedimentos terapêuticos, destacam-se os comportamentais,que incluem o Plano de Atividades Diárias (PAD) e a prescrição de tarefas graduadas para pacientes deprimidos, a auto-exposição a certas situações nos quadros ansiosos, a prevenção de respostas para o Toc, entre outros que podem auxiliar no combate aos sintomas-alvo e para testes da realidade na modificação de crenças distorcidas. As técnicas permitem a identificação, teste na realidade, correção de concepções errôneas e avaliação mais objetiva e realística da realidade. Envolvem ensinar o paciente a observar e controlar seus pensamentos automáticos (reconhecendo o vínculo entre cognições, afetos e comportamentos); examinar evidências para seus pensamentos automáticos; substituir as cognições automáticas e tendenciosas por outras mais orientadas para a realidade; e aprender a identificar e alterar as crenças (esquemas) disfuncionais que sustentam e geram os pensamentos automáticos. (Range, 1997; 1998). Entre as técnicas cognitivas e comportamentais para detectar e modificar tais crenças e comportamentos decorrentes, podem-se citar: TÉCNICAS CLÁSSICAS: relaxamento (respiração, treino e relaxamento muscular progressivo); dessensibilização sistemática e treino da assertividade (parada do pensamento). TÉCNICAS MODERNAS: auto-instrução; inoculação do estresse e treinamento de habilidades sociais (solução de problemas, exposição, prevenção de respostas). 8.3. Convergências e divergências: uma tentativa de síntese Abordando divergências entre os enfoques cognitivo e comportamental Falcone (1993) destaca que a terapia cognitivo-comportamental considera que os problemas psicológicos podem ser compreendidos em termos de sistemas de respostas intercalados: o cognitivo, afetivo/fisiológico e o comportamental. O modo como uma pessoa percebe o ambiente a sua volta (reação cognitiva) é seletivo e depende de um conjunto de regras e crenças adquiridas no desenvolvimento desta pessoa. As reações cognitivas influenciam e são influenciadas pelas reações afetivas, fisiológicas e comportamentais. Assim, nas desordens de ansiedade e na depressão, o indivíduo percebe e avalia a situação de forma distorcida, tendenciosa (distorção cognitiva), propiciando a ocorrência de afetos desagradáveis (angústia, desânimo, etc), de reações fisiológicas correspondentes (sudorese, taquicardia, tonteira, fraqueza, etc), e de comportamento (bloqueio, colapso, tremor, fuga, evitação, etc), que acabam confirmando as hipóteses negativistas acerca de situação e da auto-imagem. Behavioristas radicais, numa posição claramente monista admitem o estudo científico de fenômenos privados. Assim, "... pensamentos não são substancialmente diferentes em virtude de sua natureza privada. Eles podem ter propriedades especiais porque são verbais, mas ainda são comportamentos". Com base nesta proposição, os behavioristas radicais encontram uma forma de estudar as reações humanas fazendo uma distinção entre público e privado, em vez de físico e mental, considerando esta última como falsa e dualista. (Hayes, 1987, p.330, apud Falcone, 1995). Mantendo a ênfase na determinação ambiental, os behavioristas radicais procuram compreender as contingências que apoiam a relação entre pensamentos e outras formas de ação humana, através do estudo do comportamento controlado por regras ou controle verbal (Alvarez, 1991). Deste modo, regras verbais produzidas pela comunidade social-verbal influenciam outras formas de ação humana. As implicações clínicas desta proposição referem-se a possível distorção verbal que um indivíduo pode ter da realidade e de si mesmo, a partir de controle instrucional generalizado, mostrando efeitos nocivos no comportamento, mesmo quando as contingências são contactadas (Alvarez, 1991). Isto é "tradicionalmente entendido como distorção cognitiva" na perspectiva da TCC. (Alvarez, 1991, p.77). "A reestruturação cognitiva, por sua vez, seria reconhecida como uma forma de modificação de conduta verbal". Para os behavioristas radicais, aceitar o uso da palavra "cognição" seria aderir a uma postura dualista, o que constituiria um sério problema metodológico. Deste modo, a referência às reações cognitivas como "comportamentos encobertos" foi uma estratégia brilhante que estendeu o modelo operante à compreensão de fenômenos mais complexos. Cognitivistas-comportamentais também consideram as cognições como um sistema de respostas, mas não de uma forma tão compromissada com contingências e com termos precisamente impostos. Embora preocupados com validade empírica e expressão de conceitos operacionais, eles não são tão rigorosos do ponto de vista científico. Behavioristas radicais costumam ser bem mais flexíveis na aplicação de técnicas terapêuticas do que na construção de suas teorias ao adotarem um ecletismo técnico assumido, o que talvez seja uma forma de suprir as limitações impostas pelo rigor metodológico do behaviorismo radical.(Falcone, 1993). Outra diferença encontrada entre cognitivistas e behavioristas radicais está na ênfase dada às contingências ambientais e às cognições. O primeiro grupo enfatiza que os eventos cognitivos - crenças centrais, crenças intermediárias, pensamentos automáticos - são as variáveis determinantes dos comportamentos e dos sentimentos; consequentemente, o recorte da sua intervenção é internalista. Os terapeutas comportamentais, embora atribuam extrema importância para os eventos privados, assevera que é nas relações com o ambiente externo que devem ser buscadas as explicações pertinentes para todo e qualquer comportamento, ou seja, o recorte da análise e da intervenção é externalista. Deste modo behavioristas radicais enfatizam a determinação ambiental na compreensão dos comportamentos (abertos e encobertos) do indivíduo, enquanto cognitivo-comportamentais priorizam os processos cognitivos, considerando que o homem reage a um ambiente percebido e não a um ambiente real. (Falcone,1993). Um diferença importante diz respeito ao emprego de categorias nosológicas, como usadas no diagnóstico psiquiátrico pelos dois paradigmas. Pode-se dizer que seu emprego é irrelevante e inadequado para uma análise do comportamento. Considerando- se que a análise do comportamento tem como pressupostos os princípios da aprendizagem, não há por que considerar princípios subjacentes ao comportamento que possam agir como causadores dos comportamentos "normais" e "anormais". Além disso, ao behaviorismo radical interessa a análise de casos particulares, o que iria contra um sistema classificatório tal como o DSM, já que dois indivíduos classificados como portadores de "transtorno do pânico", por exemplo, teriam idiossincrasias que deveriam ser objeto de análises individuais, ou seja, suas histórias pessoais seriam maisimportantes para um diagnóstico "correto", bem como para o tratamento daí decorrente. (Lopes, Lopes & Lobato, 2006). Na abordagem cognitiva não há nenhuma restrição ao uso de sistemas classificatórios. O uso do sistema DSM dentro dessa abordagem se faz de forma a procurar como os perfis psicológicos se encaixam nas classificações dos transtornos psiquiátricos, a partir dos quais os terapeutas planejam com seus clientes os passos da terapia. Além disso, o diálogo com a psiquiatria se faz pelo fato de essa abordagem encarar os fenômenos psicológicos mais propriamente como fenômenos psicobiológicos, donde o uso de psicofármacos poder ser feito conjuntamente com o tratamento psicoterapêutico (Lotufo Neto & Araújo, 1995). Em suma, enquanto que as Terapias Comportamentais têm como principal objetivo, através da utilização dos princípios da aprendizagem, a modificação dos comportamentos desadaptativos, as Terapias Cognitivas visam modificar as crenças disfuncionais e os erros no modo como é processada a informação para, deste modo, modificar as perturbações emocionais e/ou comportamentais, destacando-se, portanto, o modelo mediacional neste grupo. Ao longo deste processo, é assumida e modificada a discrepância existente entre a interpretação que o indíviduo faz das situações e as circunstâncias reais das mesmas. Ressalta-se entretanto os aspectos comuns entre as terapias comportamentais e as cognitivas, que podem ser assim sintetizados, conforme Borba (2005): a) a semelhança metodológica, no sentido de primarem por um estudo objetivo, baseado em evidências, cientificamente comprovado; b) o desenvolvimento de hipóteses e práticas sistematizadas, e portanto perfeitamente passíveis de replicação; c) o pragmatismo, pelo objetivo de aplicar o conhecimento desenvolvido; d) a perfeita compatibilidade entre as intervenções cognitivas e as comportamentais, que maximizam a eficiência do tratamento e provocam mudanças significativas à qualidade de vida de uma pessoa; e) a noção de grande parte dos problemas apresentados por um indivíduo tem a ver com sua história de aprendizagem. REFERÊNCIAS: ABREU, C.N. (2004). Introdução às terapias cognitivas. In: C. N. ABREU; H. J. GUILHARDI (org), Terapia comportamental e cognitivo-comportamental: práticas clínicas (pp. 277-285). São Paulo: Roca. BECK, A. 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