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ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL ISQUÊMICO (AVCi) AVCi é o infarto de estruturas encefálicas por conta da redução do aporte sanguíneo a elas por múltiplos mecanismos possíveis. • Quando os sintomas do paciente persistem por menos de 24 h (tipicamente menos de 1 h) e não há evidência radiológica de infarto encefálico, denomina-se o quadro de ataque isquêmico transitório (AIT) • A redução do aporte sanguíneo leva à formação de uma área menor de tecido isquemiado (cuja função é comprometida de forma irreversível), e uma área maior de penumbra adjacente (cuja função pode ser recuperada caso seja obtida a reperfusão tecidual). • A cada minuto que passa, a área de isquemia cresce sobre a área de penumbra e a probabilidade de recuperação funcional do paciente diminui. Ou seja, tempo é cérebro! • Os principais fenômenos etiopatogênicos que promovem a isquemia e a penumbra isquêmica são a aterosclerose de grandes e pequenos vasos (causa mais comum), a cardioembolia e as causas mais raras, como a dissecção arterial. • As causas hematológicas e reumatológicas também fazem parte de etiologias de AVC isquêmico, principalmente em pacientes jovens • Com a morte dos neurônios, haverá entrada de sódio e água na célula, gerando o edema citotóxico. O aumento do volume do parênquima encefálico poderá causar aumento da pressão intracraniana, com consequente herniação cerebral e morte Os AVCs são classificados em isquêmicos (80%) e hemorrágicos (20%). • A única forma de identificar qual é o tipo do AVC é por meio de um exame de imagem. Fatores de risco • Principais: HAS, hipercolesterolemia, aterosclerose carotídea e fibrilação atrial QUADRO CLÍNICO Deve-se suspeitar de AVCi quando da ocorrência de qualquer déficit neurológico de início súbito. • Cada território arterial encefálico afetado produzirá um conjunto de sinais e sintomas, o que recebe o nome de síndrome neurovascular • vertigem e/ou tontura, mesmo quando isolados, podem ser provocados pelo AVCi (< 5% dos casos) Diagnóstico diferencial MANEJO DO AVCi O objetivo do tratamento inicial do AVCi é permitir a reperfusão cerebral o quanto antes, além de prevenir e tratar as suas complicações MANEJO INICIAL • Obter história com paciente, familiares e acompanhantes. • Estabelecer o tempo do último momento em que o paciente estava assintomático • Obter dados sobre antecedentes mórbidos e medicações em uso. Se uso de anticoagulantes, questionar quando foi administrada a última dose. • Avaliar a presença de contraindicações para trombólise endovenosa (TEV). • Monitorizar sinais vitais e coletar glicemia capilar. • Aferir PA em quatro membros*. • Realizar exame neurológico sucinto e calcular o NIHSS *A assimetria significativa da PA entre membros superiores, ou entre membros superiores e inferiores, pode sugerir dissecção aórtica. Pensar também nessa possibilidade em paciente com dor torácica e sinal focal agudo. Estabilização inicial Obedecer a sequência de avaliação ABC: A. Via aérea; B. Breathing/respiração; C. Cardiovascular e hemodinâmico. Condutas: ➢ Considerar IOT se Glasgow ≤ 8 ou risco de aspiração significativo por disfagia. ➢ Manter saturação de oxigênio > 94% ➢ Tratar hiperglicemia com alvo terapêutico de glicemia de 140 a 180 mg/dL. ➢ Evitar e tratar a hipoglicemia (*Não manter soro glicosado de manutenção: piora penumbra!) ➢ Hipotensão: corrigir utilizando expansão volêmica (SF 0,9%) e vasopressores se necessário. A presença de hipotensão é infrequente no AVCi, e deve motivar investigação de causa subjacente (infecção, infarto agudo do miocárdio, dissecção de aorta etc.). A estratégia de controle de PA depende do contexto clínico do paciente ➢ Caso haja indicação de trombólise endovenosa, recomenda-se manter a PA < 185 × 110 mmHg até a infusão do trombolítico, e mantê-la ≤ 180 × 105 mmHg durante e por até 24 h após a sua infusão ➢ Também, entre pacientes com indicação de trombectomia mecânica, recomenda-se manter a PA < 185 × 110 mmHg até o procedimento e ≤ 180 × 105 mmHg por até 24 h após a sua realização ➢ Se o paciente não foi submetido a trombólise e estiver com PA ≥ 220 × 120 mmHg, deve- se considerar reduzir 15% da PA inicial nas primeiras 24 h ➢ Por outro lado, hipotensão e hipovolemia devem ser sempre corrigidas para manter a perfusão sistêmica necessária à função dos órgãos Reduções mais agressivas de PA podem ser consideradas, mediante análise individual de risco-benefício de cada caso, em situações de condições comórbidas que requeiram tratamento agudo da PA (ex.: IAM, IC aguda, dissecção aórtica, préeclâmpsia/eclâmpsia) Exames iniciais Exame de imagem do encéfalo (TC sem contraste) é obrigatório em toda suspeita de AVCi agudo • Objetivos: excluir diagnósticos diferenciais, identificar complicações do AVCi e, em casos selecionados, identificar os pacientes que poderiam se beneficiar de trombectomia mecânica e/ou craniectomia descompressiva • TC pode ser normal ou evidenciar sinais discretos de isquemia encefálica (p. ex., a perda de diferenciação da atenuação entre as substâncias branca e cinzenta, edema cortical leve, hipoatenuação discreta no local do infarto, artéria cerebral média hiperdensa). • Na fase aguda do AVC, a função mais importante da TC é descartar hemorragia. Só pelo quadro clínico é impossível definirmos o tipo de AVC. Os únicos exames laboratoriais que devem preceder a TEV são: Outros exames que devem ser colhidos são: ➢ Troponina; ➢ ECG; ➢ Hemograma; ➢ Ureia e creatinina; ➢ Eletrólitos; ➢ Radiografia de tórax Terapias de reperfusão cerebral TEV com alteplase: considerar para todo paciente com AVCi cujo último tempo em que estava assintomático foi há < 4,5 h. ➢ A eficácia da terapia é eminentemente tempo-dependente e ela deve ser iniciada o quanto antes. ➢ Deve-se evitar atrasos no início da TEV para realizar exames complementares desnecessários Em situações em que o momento exato do ictus é desconhecido, mas o déficit foi reconhecido há < 4,5 h, a TEV também deve ser considerada para certos pacientes. Os critérios de indicação recomendados são: • Último momento em que o paciente estava sabidamente assintomático ocorreu há > 4,5 h. • Déficit/sintoma atribuído ao AVCi reconhecido há < 4,5 h. • Presença de lesão com hipersinal em sequência DWI da RM de encéfalo. • Ausência de alteração de sinal visível em sequência FLAIR da RM de encéfalo em território do AVCi agudo. • Ausência de contraindicações a TEV A déficits neurológicos incapacitantes: afasia, alteração de marcha, comprometimento de campo visual, fraqueza em membro no qual o paciente não vence a gravidade. B Devido ao risco de complicações hemorrágicas relacionadas ao traumatismo encefálico grave subjacente, a administração de alteplase EV não é recomendada em infartos póstraumáticos que ocorrem durante a fase aguda intra-hospitalar. C AAS EV não deve ser administrado dentro dos primeiros 90 minutos após o início da alteplase EV. D Provas de coagulação: INR, TTPa, contagem de plaquetas, tempo de trombina, tempo de coagulação de ecarina, atividade de fator Xa direto calibrado para o novo anticoagulante em questão Mesmo quando há dúvida quanto à hipótese diagnóstica, deve-se considerar administrar a TEV, desde que não haja contraindicações a ela. • A realização da trombólise endovenosa em pacientes nos quais a suspeita clínica de AVCi não se confirmou apresenta riscos de complicações muito baixos, desde que não haja contraindicações a essa intervenção • Isso é recomendado, pois por um lado o risco de complicações relacionadas à TEV em pacientes com diagnósticos diferenciais de AVCi é baixo, e por outro, deixar de administrar TEV em paciente com indicação pode privá-lo dos benefícios da terapia Complicações da infusão de Alteplase Principal: transformaçãohemorrágica sintomática • Suspeite se: paciente desenvolver hipertensão aguda e/ou refratária, náuseas, vômitos, cefaleia intensa e/ou deterioração neurológica Angioedema orolingual • A suspeita clínica se dá quando há edema de língua, lábios ou orofaringe, em geral contralateral à isquemia cerebral. Trombectomia mecânica (TM) • Consiste na retirada do trombo agudo de grandes artérias que participam da vascularização cerebral, por meio de dispositivos específicos, como stent-retrievers e cateteres de aspiração Deve ser considerada tanto em pacientes que receberam quanto nos que não receberam TEV. • TM e a TEV não são terapias mutuamente exclusivas: pacientes elegíveis para TEV devem receber o trombolítico mesmo que também tenham indicação de TM; da mesma forma, deve ser considerada a TM tanto em pacientes que receberam quanto nos que não receberam a TEV • Da mesma forma que a TEV, a eficácia da trombectomia mecânica é tempo- dependente. Os critérios de indicação de trombectomia mecânica variam de acordo com o tempo de ictus (ou seja, a última vez que o indivíduo estava assintomático). • A trombectomia mecânica pode ser considerada até 24 h do último momento em que o paciente estava assintomático. Deve-se solicitar uma angiotomografia (ATC) de artérias cervicais e intracranianas para os pacientes que preencham os critérios seguintes: • Se ictus ≤ 6 h: NIHSS ≥ 6 e ASPECTS ≥ 6; • Se ictus entre 6 h e 16 h: preencher os critérios de inclusão dos estudos DAWN e/ou DEFUSE 3 • Se ictus entre 16 h e 24 h: preencher os critérios de inclusão do estudo DAWN Caso a ATC encontre oclusão de arteria carótida interna (ACI) e/ou segmento M1 da artéria cerebral média (ACM), o paciente tenha sofrido o ictus entre 6 h e 24 h, e preencha os critérios de seleção dos estudos DAWN e/ou DEFUSE 3, recomenda-se avaliar o volume de isquemia e de penumbra para indicação de trombectomia mecânica com RM sequência DWI e/ou as sequências de perfusão da RM ou TC Edema cerebral associado ao AVCi O edema cerebral relacionado ao AVCi é uma complicação potencialmente letal que tende a atingir seu ápice entre o 3º e o 4º dia após o ictus. ➢ A monitorização em ambiente de UTI é necessária em todo AVCi agudo, especialmente em caso de edema cerebral e/ou cerebelar significativo. ➢ Medidas clínicas para hipertensão intracraniana (p. ex., decúbito a 30°, terapia osmótica e hiperventilação moderada breve) devem ser consideradas nesses casos, quando houver sinais de deterioração neurológica ➢ Para infartos extensos de artéria cerebral média unilateral com deterioração neurológica por edema cerebral nas primeiras 48 h após ictus, a despeito do tratamento clínico, particularmente quando há rebaixamento do NC, pode ser considerada a hemicraniectomia descompressiva CUIDADOS PARA O PACIENTE COM AVCI RECENTE Administrar ácido acetilsalicílico (AAS) 160 a 300 mg 1 x/dia. • A medicação deve ser iniciada em até 48 h do ictus. • Se o paciente foi submetido a TEV, introduzir medicação após 24 h da infusão do trombolítico e após realização de TC ou RM de controle. • Alternativas: clopidogrel 75 mg 1x/dia, ou a combinação de AAS 25 mg com dipiridamol de liberação estendida 200 mg de 12/12h • Se o doente já utilizava AAS quando sofreu AVCi, o benefício de trocar a medicação antiagregante ou aumentar sua dose não é bem estabelecido • Da mesma forma, nos casos de AVCi não cardioembólicos que ocorreram em vigência de uso regular de antiagregante, não é recomendada a sua troca por varfarina • A depender do resultado da investigação do mecanismo de AVC, pode-se optar posteriormente por trocar a medicação por outra para profilaxia secundária de AVCi. Em doentes com AVCi não cardioembôlico que não recebeu TEV e NIHSS ≤ 3 ou acidente isquêmico transitório (AIT) com escore ABCD2 ≥ 4, pode-se considerar dupla antiagregação em vez de monoterapia com AAS. • Nesses casos, a dupla antiagregação iniciada em até 7 dias do ictus (mas de preferência em até 12 a 24 horas do mesmo) e continuada por 21 a 90 dias é efetiva em reduzir o risco de recorrência de AVCi por um período de até 90 dias após o ictus • Dose: AAS 100 mg/dia + clopidogrel com dose de ataque de 300 mg no primeiro dia (se ≤ 75 anos de idade) seguido de 75 mg/dia É seguro introduzir medicações anti-hipertensivas ou reintroduzir aquelas de uso prévio, durante a internação hospitalar, em pacientes que mantêm PA > 140 × 90 mmHg e apresentam- se neurologicamente estáveis, na ausência de contraindicações. • É razoável iniciar ou reiniciar medicamentos anti-hipertensivos durante a hospitalização para pacientes com PA> 140/90 mmHg que estejam neurologicamente estáveis, a menos que seja contra-indicado • Isso pode ser feito 24 a 48 horas após o início do AVC para a maioria dos pacientes hospitalizados, com o objetivo de controlar gradualmente a hipertensão dentro de alguns dias a uma semana Outros cuidados: • Evitar hipertermia (> 38°C) e investigar e tratar possíveis focos de infecção que a justifiquem • Realizar rastreio para disfagia em todos os pacientes antes de introdução de dieta oral • Caso seja considerado que o paciente não tem condições de receber dieta por via oral, a dieta enteral deverá ser iniciada em até 7 dias após o ictus • Instituir profilaxia para doença trombótica venosa em pacientes com imobilidade, de preferência com compressão pneumática intermitente Profilaxia secundária A profilaxia secundária do AIT ou AVC vai depender do mecanismo etiológico envolvido. • Antiagregação (dupla antiagregação ou monoterapia); • Anticoagulação; e • Procedimentos vasculares (endarterectomia ou angioplastia com stent). Anticoagulação: Pacientes com AVCi de etiologia cardioembólica devido à fibrilação atrial devem receber profilaxia secundária com anticoagulantes • O tratamento com anticoagulantes diretos (dabigatrana, rivaroxabana, edoxabana e apixabana) está indicado apenas nos casos de FA não valvar • Os anticoagulantes devem ser iniciados entre o 4º e 14º dias após AVC, exceto nos casos de AVC extenso, com ou sem transformação hemorrágica, quando esse prazo deve ser maior. A anticoagulação com warfarina está indicada nos outros mecanismos cardioembólicos de alto risco, exceto na endocardite infecciosa e mixoma atrial (situações com contraindicação à anticoagulação). São eles: • prótese valvar sintética; • FA valvar (estenose mitral); • trombo atrial esquerdo séssil; • doença do nó sinusal; • IAM recente (< 4 semanas); • trombo ventricular esquerdo; • cardiomiopatia dilatada; • segmento acinético do ventrículo esquerdo. Antiagregação plaquetária • Os AITs e AVCs sem indicação de anticoagulação devem ser tratados com antiagregantes em monoterapia, indefinidamente. A antiagregação plaquetária em monoterapia ou com a combinação de dois fármacos pode ser realizada com AAS (mais usado), clopidogrel, dipiradamol e ticagrelor. • AAS: iniciado na dose de 100-300 mg, em dose única diária, em todos os pacientes com AVC isquêmico, entre 24 h-48 h de início dos sintomas nos pacientes não trombolisados, e após 24 h da trombólise • Nos pacientes com mecanismo cardioembólico de alto risco, a partir do 4º ao 14º dia, a antiagregação será trocada para anticoagulação, ou seja, a anticoagulação de urgência não está indicada no AVC isquêmico Em alguns pacientes, estará indicada a dupla antiagregação plaquetária (AAS+ clopidogrel ou AAS + ticagrelor) e estará indicada por um período pré-determinado, após o qual deve-se prescrever apenas um deles (monoterapia): • Pacientes com AIT com escore ABCD2 ≥ 4 pontos ou AVC com NIHSS ≤ 5 pontos (AVC menor): durante 21 dias; • Pacientes submetidos à colocação de stent carotídeo: durante 1 ano; • Pacientes com oclusão de grande vaso intracraniano: durante 90 dias Transformação hemorrágica esangramento sistêmico • Para pacientes que desenvolvem complicações hemorrágicas sistêmicas ou intracranianas graves, incluindo transformação hemorrágica sintomática do infarto isquêmico, suspendemos toda terapia anticoagulante e antiplaquetária por 1 a 2 semanas ou até que o paciente esteja estável, momento em que antiplaquetário oral ou o tratamento anticoagulante pode ser iniciado ou retomado conforme indicado. • O desenvolvimento de transformação hemorrágica assintomática de um infarto isquêmico não exclui necessariamente o uso precoce de antiplaquetários. Neste cenário, é provavelmente razoável continuar com a aspirina . • Se a terapia antiplaquetária não tiver sido iniciada, pode ser razoável adiar o início da terapia antiplaquetária em pacientes com hemorragia parenquimatosa até que a condição neurológica do paciente se torne estável. • Evitamos a terapia antiplaquetária dupla em pacientes com transformação hemorrágica. https://www.uptodate.com/contents/aspirin-drug-information?search=avc%20antiagreaga%C3%A7%C3%A3o&topicRef=1082&source=see_link AAS: ácido acetilsalicílico; AVC: acidente vascular cerebral; AVCi: AVC isquêmico; *NIHSS: National Institutes of Health Stroke Scale; RM-DWI: sequência difusão de ressonância magnética de encéfalo; RM- DWI-P: sequência de difusão e perfusão de ressonância magnética de encéfalo; TC: tomografia computadorizada; TCP: perfusão cerebral por tomografia computadorizada; UTI: unidade de terapia intensiva ** Critérios Clínicos de Indicação de Trombectomia Mecânica: ➢ < 16 h de ictus: NIHSS ≥ 6 ➢ 16-24 h de ictus: NIHSS ≥ 10 *** AVCi que compromete > 50% do território da artéria cerebral média ou tem > 145 mL de volume no território dessa artéria. /--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------/ ACIDENTE ISQUÊMICO TRANSITÓRIO (AIT) AIT é um episódio transitório de disfunção neurológica provocado por uma isquemia focal do encéfalo e/ou retina, com duração de sintomas tipicamente < 1 hora, e na ausência de evidência de infarto agudo do encéfalo. • A presença de sinais clínicos persistentes ou de anormalidades características em exame de imagem define a presença de um AVCi • Os diagnósticos diferenciais ao AIT são os mesmos que para o AVCi, com ênfase na aura de enxaqueca, síncope e crises epilépticas O paciente com AIT apresenta alto risco de sofrer um AVCi, principalmente nos primeiros 2 dias após o evento. • Dessa forma, ele deve ser submetido o quanto antes à investigação do mecanismo etiológico subjacente ao AIT. • Apesar de o AIT não resultar, por definição, em infarto encefálico, os mecanismos etiológicos potenciais subjacentes a essa doença são os mesmos do AVCi. • Baixo risco - 0-3 pontos; • Risco moderado - 4-5 pontos; • Alto risco - 6-7 pontos. Recomenda-se a internação hospitalar do paciente com AIT que se apresente a serviços de saúde nas primeiras 72 h do evento e tenha quaisquer dos seguintes critérios • Escore ABCD2 ≥ 3 • Escore ABCD2 de 0 a 2 e incerteza de que a investigação diagnóstica do mecanismo do AIT possa ser completada em menos de 2 dias em ambiente extra-hospitalar • Escore ABCD2 de 0 a 2 e outra evidência que indique que o evento do paciente foi provocado por AVCi, e não AIT Quadro clínico os sintomas são súbitos e de causa neurovascular, mas não há morte neuronal porque o sangue volta a circular pelo tecido antes que essas células morram. • O paciente fica sem qualquer déficit neurológico ao final do evento. /--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------/ AVCh Os acidentes vasculares cerebrais hemorrágicos (AVCh) podem ser divididos em: A. Hemorragias intraparenquimatosas (HIP): sangramento não traumático do parênquima cerebral. B. Hemorragia subaracnóidea (HSA): hemorragia que ocorre no espaço entre as membranas pia-máter e aracnoide. C. Causas não traumáticas de HSA incluem aneurismas cerebrais, malformações arteriovenosas, tumores, angiopatia amiloide cerebral e vasculopatias (como vasculite). HEMORRAGIAS CRANIANAS INTRAPARENQUIMATOSAS A hemorragia intracraniana parenquimatosa (HIP) é uma forma de sangramento intracraniano não traumático, na qual o sangramento ocorre dentro do parênquima cerebral Localizações preferenciais da HIP: • Lobos cerebrais. • Gânglios da base. • Tálamo. • Tronco cerebral (principalmente em ponte). • Cerebelo. As HIP não são eventos monofásicos e apresentam expansão em cerca de 30% dos casos. • A expansão pode ocorrer por sangramento contínuo ou ruptura mecânica de vasos adjacentes. Quadro clínico ➢ Cefaleia e vômitos ocorrem em 50% dos casos. ➢ Convulsões ocorrem em 4 a 29% dos casos nos primeiros dias de apresentação (principalmente em hemorragias lobares). ➢ Manifestações neurológicas dependem do local da hemorragia: putâmen (35%), subcorticais (30%), cerebelo (16%), tálamo (15%) e ponte (5- 12%). ➢ Em pacientes com rebaixamento do nível de consciência, a presença de vômitos, PAS > 220 mmHg, cefaleia intensa, coma ou diminuição do nível de consciência, bem como a progressão dos sintomas ao longo de minutos ou horas, sugerem o diagnóstico de HIP. ➢ Pacientes inicialmente alertas podem, em até 25% dos casos, apresentar deterioração do nível de consciência durante a evolução, que ocorre principalmente por expansão do hematoma. Exames • Os exames incluem função renal, eletrólitos, hemograma, coagulograma, glicemia, troponina, exame toxicológico, urina 1 e urocultura, teste de gestação para mulheres, além de eletrocardiograma, que deve ser realizado em todos os pacientes. Diagnóstico A neuroimagem é mandatória • A TC é muito sensível e é considerada exame de escolha • A TC de crânio evidenciará uma área hiperdensa no parênquima encefálico, associada ou não à inundação ventricular Em pacientes com quadro e localização típicos e apresentando pico hipertensivo à admissão, em geral nenhum outro exame é necessário para estabelecer sua etiologia, que deve ser HAS MANEJO Os pacientes com coagulopatia ou trombocitopenia graves devem receber terapia com fator apropriado de substituição ou transfusão de plaquetas. • Os pacientes com HIP, cujo INR é elevado por causa do uso de antagonista de vitamina K, devem ter esse uso descontinuado, receber terapia para substituir fatores dependentes de vitamina K e corrigir o INR, bem como receber 10 mg de vitamina K endovenosa. • Os pacientes com HIP devem realizar compressão pneumática intermitente para prevenção de tromboembolismo venoso • Reversão de sangramento com os novos anticoagulantes • Em pacientes com HIP com PAS entre 150 e 220 mmHg e sem contraindicação para tratamento pressórico, a diminuição para níveis de PAS de 140 mmHg é segura e desejável. • Os pacientes devem ser transferidos assim que possível para UTI. • Os níveis glicêmicos devem ser vigiados, evitando-se hiperglicemia e hipoglicemia (valores entre 70-180 mg/dL) • Se convulsões clínicas devem-se iniciar anticonvulsivantes • Avaliação para disfagia antes de iniciar ingestão oral. • Os pacientes com hemorragia cerebelar que apresentam deterioração neurológica ou que têm compressão do tronco cerebral e/ou hidrocefalia por obstrução ventricular devem ser submetidos à remoção cirúrgica da hemorragia assim que for possível. Manejo da HIP associada a uso de anticoagulantes e outros agentes • HIP associada a infusão de heparina intravenosa: sulfato de protamina em injeção intravenosa a uma dose de 1 mg/100 U de heparina (dose máxima de 50 mg). • HIP com INR alterado: plasma fresco congelado (PFC) 15-20 mL/kg, juntamente com a vitamina K1 dose de 5-10 mg administrada lentamente EV (nunca utilizar vitamina K isoladamente). Outra opçãomais rápida é o uso de complexo concentrado de protrombina (CCP) ou complexo concentrado de protrombina ativado. Indicação de cirurgia • Hemorragias cerebelares > 3 cm (principalmente se associadas a compressão do tronco cerebral). • Considerar ainda cirurgia em hemorragias lobares de 10 a 100 mm3 localizadas a 1 cm da superfície cortical Momento da cirurgia controverso, variando entre 4-96 horas do aparecimento dos sintomas. HEMORRAGIA SUBARACNÓIDEA NÃO TRAUMÁTICA HSA é definida como o preenchimento do espaço subaracnóideo por sangue. • A causa mais frequente é a ruptura de aneurismas cerebrais, que consistem em protrusões anormais das paredes das artérias do polígono de Willis e seus ramos principais. • Outras causas: coagulopatias, malformações arteriovenosas, trombose venosa cerebral, dissecção arterial intracraniana e angiopatia amiloide • Em alguns casos a causa da HSA pode não ser identificada Epidemiologia • Representa 20% de todos os AVC e 50% dos AVC hemorrágicos. • Cerca de 80-85% dos casos são causados por aneurismas intracranianos. • É mais frequente em mulheres, na 5ª ou 6ª décadas de vida • Está associada a hipertensão, tabagismo, uso de drogas simpaticomiméticas (p. ex., cocaína), abuso de álcool e história familiar. Quadro clínico O principal sintoma apresentado é a cefaleia, geralmente descrita como quadro súbito e de forte intensidade, que pode atingir a máxima intensidade em poucos segundos (thunderclap headache). • Cerca de 80% dos pacientes referem como a “pior cefaleia da vida”. • A cefaleia está presente em 97% dos casos e em 40% dos casos é o único sintoma. Outros sinais de alerta para cefaleia incluem: Alteração do nível de consciência. Crise convulsiva. Início súbito. Piora progressiva da cefaleia. Cefaleia de início recente em paciente com > 50 anos de idade ou mudança do padrão habitual. Cefaleia agravada ou desencadeada por esforço físico, tosse ou manobra de Valsalva. Cefaleia com interrupção do sono. Presença de sintomas sugestivos de doença secundaria, como febre e perda de peso. Cefaleia em pacientes imunossuprimidos ou em uso de anticoagulantes. Carca de 43% dos pacientes com HSA também podem apresentar a chamada cefaleia sentinela, que consiste em uma cefaleia de moderada a forte intensidade, autolimitada, que precede a ruptura do aneurisma em 1 a 2 semanas. Outros sintomas incluem: ➢ náuseas e vômitos (77%); ➢ perda transitória da consciência (53%); ➢ sinais meníngeos (35%); ➢ déficits neurológicos focais; ➢ alterações visuais e fotofobia. Exame físico Os pacientes podem apresentar um amplo espectro de apresentações clínicas, desde cefaleia isoladamente até crises convulsivas, rebaixamento de nível de consciência e, de forma menos frequente, coma. • A avaliação do paciente com suspeita de HSA deve incluir exame neurológico completo e fundo de olho. As alterações mais frequentemente encontradas são: • Hipertensão arterial sistêmica. • Sinais meníngeos. • Hemorragia vítrea (sinal de pior prognóstico) • Papiledema (associado a hipertensão intracraniana). • Alterações neurológicas focais: ➢ Paralisia do III nervo craniano (aneurisma de comunicante posterior). ➢ Paralisia do VI nervo craniano (por conta do aumento da pressão intracraniana). ➢ Paresia de ambos os membros inferiores (aneurisma de comunicante anterior). ➢ Hemiparesia, afasia e heminegligência (aneurisma de artéria cerebral média). Regra de Ottawa A regra de Ottawa é utilizada para pacientes sem rebaixamento do nível de consciência, e auxilia na avaliação clínica de pacientes que apresentam quadro de cefaleia súbita e não traumática: • A presença de um fator positivo indica investigação para HSA. • O uso dessa ferramenta apresenta uma sensibilidade de 100% e especificidade de 15% para HSA, excluindo apenas 14% dos pacientes da necessidade de investigação adicional Diagnóstico Diante da suspeita clínica de HSA está indicada a realização da TC de crânio sem contraste como primeiro exame para todos os pacientes. • A TC de crânio quando realizada nas primeiras 24 horas tem 92% de sensibilidade e > 95% se realizada na 1° hora A ausência de diagnóstico ou o diagnóstico tardio estão associados a atrasos no tratamento e piores desfechos. • Na TC de crânio da HSA observa-se presença de sangue (imagem hiperatenuante) nas cisternas basais, fissuras sylvianas, fissuras interhemisféricas, fossa interpeduncular e cisternas suprasselares. • Além disso, a depender da gravidade do sangramento, também podem ocorrer sangramentos intraparenquimatosos e hemoventrículo Punção lombar A punção lombar está indicada em pacientes com suspeita clínica de HSA, mas com TC de crânio normal. Devem ser realizadas avaliação de pressão de abertura, inspeção visual do liquor e análise bioquímica. • A pressão de abertura elevada é sugestiva de HSA. • A coloração do liquor é hemática e apresenta a característica de não diminuir conforme se coletam outros tubos de exames, o que diferencia a HSA do acidente de punção. • Além disso, a análise laboratorial realiza a centrifugação do liquor, o aspecto xantocrômico após centrifugação também sugere HSA e é utilizado para diferenciar do acidente de punção. • A análise bioquímica apresenta como principal característica a contagem elevada de hemácias, além de proteínas normais ou discretamente aumentadas e leucócitos normais Outros exames • RM tem sensibilidade similar à da TC de crânio, mas é pouco disponível. • Os exames complementares incluem função renal, eletrólitos, hemograma, coagulograma e glicemia, além de eletrocardiograma, que deve ser realizado em todos os pacientes. Determinando a etiologia da HSA • O exame de escolha é a angiografia cerebral digital ( padrão-ouro). Quando o exame é negativo, recomenda-se repeti-lo em 4 a 14 dias, quando se identifica um aneurisma previamente oculto em cerca de 24% dos casos. • Outras opções: angiotomografia arterial intracraniana e angiorressonância magnética • A angiotomografia pode ser o primeiro exame, em razão de ser mais disponível e menos invasiva, reservando a realização de angiografia cerebral para casos de angiotomografia negativa. Principais complicações da HSA • Ressangramento: trata-se da principal complicação em pacientes que não foram submetidos a correção do aneurisma. A apresentação clínica pode ser variada a depender da intensidade do ressangramento, mas em geral manifesta-se como deterioração clínica e rebaixamento do nível de consciência. • Vasoespasmo: a maior incidência de vasosespasmo ocorre do 7º ao 10º dia, com resolução em 21 dias. Maioria é assintomática. Os pacientes com vasoespasmo podem apresentar cefaleia, sinais meníngeos, febre baixa, taquicardia, confusão mental, alteração do nível de consciência ou sinais neurológicos focais. • Hidrocefalia aguda: uma das complicações mais graves, ocorre em 15-20% dos casos. É secundária à obstrução da drenagem liquórica nas cisternas devido à presença de sangue no espaço liquórico. Cerca de 40% dos casos são sintomáticos e a clínica cursa com cefaleia intensa, rebaixamento do nível de consciência e hipertensão intracraniana. Os sintomas tendem a piorar progressivamente até o paciente ser abordado cirurgicamente. • Convulsões: ocorrem em 6 a 18% dos casos, podendo ser manifestação de outras complicações como o ressangramento. • Hiponatremia: secundária à secreção inapropriada de ADH ou síndrome cerebral perdedora de sal. • Hipertensão intracraniana (HIC): todas as complicações descritas podem levar a um aumento da pressão intracraniana, o qual pode se estabelecer em diferentes graus e com diferentes apresentações clínicas, a depender do volume da hemorrargia, área de isquemia, presença ou não de hidrocefalia. TRATAMENTO Medidas gerais• Internação em UTI. • Deve-se reverter a anticoagulação e manter profilaxia de tromboembolismo venoso (TEV) com compressão pneumática. • Manter pacientes normotérmicos e normoglicêmicos • Manter níveis de hemoglobina > 8 g/dL. • Manter PAS < 160 mmHg, pressão intracraniana < 20 mmHg e perfusão cerebral > 70 mmHg. • Utilizar medicações parenterais como nitroprussiato de sódio se necessário. • IOT se rebaixamento do nível de consciência e ausência de proteção de vias aéreas, aumento de pressão intracraniana ou hipoxemia. • Realizar exame neurológico sumário a cada 1 a 4 horas e manter aferição contínua dos sinais vitais Condutas medicamentosas específicas • Nimodipino: dose de 60 mg VO ou por sonda a cada 4 horas em todos os pacientes por 21 dias (não reduz vasoespasmo, mas está relacionado com melhor prognóstico neurológico). • Anticonvulsivantes: indicados para pacientes que apresentaram crise convulsiva secundária a HSA. • Ácido tranexâmico pode ser uma opção nas primeiras 72 h em pacientes que não foram submetidos à correção do aneurisma, a fim de reduzir o risco de ressangramento precoce. • A hipervolemia profilática com a intenção de prevenir vasoespasmo não é recomendada Manejo da hipertensão intracraniana As medidas para hipertensão intracraniana devem ser instituídas no departamento de emergência como medidas de ponte até o tratamento cirúrgico definitivo, e incluem: • Manter cabeceira elevada a 30°. • Evitar acessos cervicais. • Intubação orotraqueal. • Sedação adequada do paciente visando RASS-5. • Hipocapnia com pCO2 entre 31 e 35 mmHg visando vasoconstrição de vasos cerebrais (não deve ser instituída de rotina e quando utilizada não deve permanecer por períodos prolongados devido ao risco de hipoperfusão cerebral). • Em casos mais graves com sinais de herniação cerebral também está indicada administração de solução salina hipertônica ou manitol Manejo de vasoespasmo A manutenção da euvolemia e do volume circulante efetivo é recomendada, com a intenção de prevenir o surgimento de isquemia cerebral tardia. • Há um benefício controverso na indução de hipervolemia em casos de vasosespasmo já instituído. • Benefício controverso com uso de estatinas. • Pode-se considerar terapia com indução de hipertensão com alvos de PAM em torno de 100 mmHg (uso de fenilefrina), mas a evidência de benefício é pequena. • O tratamento definitivo é realizado com angioplastia ou uso intraarterial de vasodilatadores Tratamento cirúrgico • Em casos de hidrocefalia não comunicante e pressão intracraniana elevada estão indicadas derivação ventrículo externa (DVE) e colocação de cateter de pressão intracraniana para monitorização. • Deve-se realizar a clipagem cirúrgica ou abordagem endovascular do aneurisma o mais precocemente possível, a fim de reduzir o risco de ressangramento. • A abordagem endovascular deve ser considerada para pacientes que possam ser submetidos a ambos os procedimentos, porém a decisão deve ser multidisciplinar e baseada na experiência da equipe
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