Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
GEOGRAFIA AULA 1 Prof. Laércio de Mello 2 CONVERSA INICIAL Olá, caros(as) estudantes. Tudo bem? Nesta aula, antes de estudarmos métodos e procedimentos de ensino, vamos trabalhar com a evolução de como a geografia chegou na sala, ou seja, tornou-se uma disciplina escolar. Falaremos de alguns cientistas que deram a base para que a geografia se tornasse além de uma ciência, e sua importância para que as pessoas possam visualizar o mundo como um todo seja na distribuição dos climas, das populações, culturas, mercadorias, entre outros elementos. TEMA 1 – GEOGRAFIA: CARTOGRAFIA E VISÕES DE MUNDO Como surgiu a Ciência Geográfica? A aplicação de conhecimentos geográficos é muito antiga. Acredita-se que surgiu mesmo antes do que conhecemos como Pré-História, mas tem-se como referência o século XIX, momento em que a Geografia – fato que também aconteceu com outras ciências sociais – é organizada como uma ciência autônoma. Isso ocorreu devido a uma série de fatores que, nesse período histórico, estavam amadurecendo. Entre eles, está o desenvolvimento do capitalismo: o imperialismo (Hobsbawm, 2001, p. 23). Conhecer o planeta como um todo, desde a forma dos continentes, tamanho e recursos a serem explorados, ou seja, coletar informações o suficiente para que se tivesse uma base empírica para a comparação em Geografia. Lembre-se que, até as Grandes Navegações, o planeta era fragmentado. Os povos de cada continente apenas conheciam o que estava ao seu redor. Sair em busca de novas conquistas gerou um novo desafio, mapear os mundos desconhecidos pelos europeus. O mapa a seguir mostra uma dessas visões de mundo. 3 Crédito: steve estvanik/shutterstock. Nesse de mapa de Abraham Ortelius – 1570, 1571 –, foi registrado todo conhecimento acumulado por centenas de anos, seja de Marco Polo, Colombo, Cabral, da viagem iniciada por Fernando de Magalhães, entre outros andarilhes e navegadores. Confira no mapa que apenas as margens tinham uma cartografia mais definhada; o interior dos continentes ainda tinha que ser explorado para serem conhecidos. A Antártica foi cartografada de maneira extremamente desproporcional ao seu tamanho real. Há algumas leituras para entendermos a transformação da Geografia em uma ciência moderna. TEMA 2 – CARTOGRAFANDO O PLANETA Um dos pressupostos para a evolução da Geografia como ciência foi o desenvolvimento das técnicas cartográficas, pois os fenômenos até então catalogados pelos estudiosos com as grandes navegações e expedições exploratórias não poderiam ser representados graficamente em um mapa. 4 Crédito: Vector Tradition/shutterstock. Isso porque as técnicas cartográficas ainda eram muito arcaicas para desenvolver mapas mais elaborados e assim representar o espaço no qual as pessoas constroem suas relações afetivas, econômicas, de trabalho, poder, entre outros. Parece banal, mas é de extrema importância ter uma visão vertical para que um mapa seja construído com o número maior de detalhes possível. Essa visão vertical só vai se tornar comum com os aviões que possibilitaram as fotografias aéreas e, posteriormente, com os satélites. A comparação e a análise de dados só seriam possíveis se existissem uma representação gráfica, nesse caso, o mapa, ação não possível até então pelo fato de não se conhecer o planeta por inteiro. Pense, até nos dias de hoje, alguns questionam a forma da Terra. A Idade Média, principalmente entre os anos 300 e 500, trouxe grandes prejuízos para a Ciência como um todo e, consequentemente, para a Cartografia, pois todos os estudos desenvolvidos de Astronomia e Matemática foram substituídos por dogmas religiosos. O mundo passa a ser visto de acordo com a leitura bíblica feita pelo clero. Como o clero de então não achou nas escrituras consideradas sagradas referências de um planeta esférico e que esse girava ao redor do Sol, todo o 5 avanço até então desenvolvido foi jogado fora e foi aceito o que víamos durante o dia, ou seja, a sensação de que o Sol gira ao redor da Terra. Não é essa a ideia que temos? É isso que realmente acontece? A Terra, por “decreto religioso”, passou a ser o centro estático do universo: em torno dela, giravam planetas e estrelas. A forma que o clero entendia. Uma delas é o mundo tabernáculo (1109) – ver figuras –, o qual mostra a visão que se tinha do espaço nesse período da história. Fonte: FERREIRA, C. C.; SIMÕES, N. N. A evolução do pensamento geográfico. Lisboa: Gradiva, 1986. Outro mapa do mundo é chamado de “T.O”, datado por volta de 557 a 636. Nele, notamos não só a desproporção das terras mapeadas, mas chama a atenção também os nomes de personagens bíblicos que nele foram inseridos, mostrando, dessa forma, a preocupação de um mundo sobrenatural e não o físico em que vivemos. Análise no mapa cada continente rios e nomes: 6 Fonte: OLIVEIRA, C. Curso de Cartografia moderna. Rio de Janeiro: IBGE, 1993. O mercantilismo – século XV, fator muito importante para o desenvolvimento do capitalismo – fez crescer a necessidade de conhecer as colônias, poder calcular as rotas, a direção dos ventos, o clima, as condições do tempo, entre outros fenômenos da natureza. Uma importante ressalva já que estamos falando de mapeamento: a palavra cartografia é relativamente nova. Ela foi utilizada pela primeira vez em 8 de dezembro de 1839. Seu uso aconteceu na carta escrita em Paris, enviada pelo português Visconde de Santarém ao historiador Adolfo Varnhagen. Até então, a palavra usada no seu lugar era cosmografia. Um dos grandes estudiosos e pesquisadores brasileiros da história da cartografia, Céurio de Oliveira, descreve a palavra cartografia como sendo "Conjunto de estudos e operações científicas, artísticas e técnicas, baseado nos resultados de observações diretas ou de análises de documentos, visando à elaboração e preparação de cartas, projetos e outras formas de expressão, bem como sua utilização” (Oliveira, 1983, p. 97). Um marco importante para a cartografia foi a Revolução Francesa, pois, até então, o Estado era representado fisicamente por uma pessoa: um monarca. Com a Revolução Francesa, gradualmente, o território passa a ser um símbolo 7 cada vez mais forte de uma nação. É o território que deve ser defendido e não mais um indivíduo e os mapas passam a ser ensinados como uma linguagem que representa o território que a nação deve defender. TEMA 3 – GEOGRAFIA E O PENSAMENTO DETERMINISTA Você sabe o que é um pensamento determinista? Já ouviu esse pensamento, já leu em jornais ou livro didáticos ou agiu sem saber que aplicava um pensamento determinista? A geografia por muito tempo fez uso das ideias deterministas. O determinismo é uma maneira de explicar o comportamento do ser humano com base apenas na natureza, como se a natureza fosse capaz de determinar o meu caráter ou a caminha capacidade de criar. Esse pensamento atribui aos elementos da geografia – clima, solos entre outros – a capacidade de um povo se desenvolver ou ficar atrasado. Um filme que retrata bem esse pensamento é “Man to Man”, 8 Crédito: Photo 12 / Alamy / Fotoarena. Nesse caso, vale apreciar a obra para ampliar e reconhecer que, ainda em nossos dias, os preconceitos deterministas dos anos de 1870, quando europeus acompanhados por um grupo de caçadores indígenas na África e um antropólogo, que no filme é Jamie Dodd – o ator Joseph Fiennes –, transitam pela floresta africana na qual buscam uma nova espécie humana. Ao se deparar com um grupo de nativos, o antropólogo pensa ter encontrado o elo que explica a relação entre os seres humanos modernos com os primitivos. A história se desenrola e mostra como a Europa adotou a ideia de superioridade – determinismo – em relação às outras partes do planeta. Claro, temos quelembrar: a nação brasileira tem em sua elite uma formação europeia. O pensamento determinista por muito tempo prevaleceu não só na Geografia, mas na ciência como um todo. 9 TEMA 4 – GEOGRAFIA E O ESPAÇO VITAL Ratzel conceituou o termo “espaço vital”, ou seja, o espaço e suas condições naturais que consolidariam o poder do Estado, fortalecendo a sociedade. Para ele, a sociedade que estivesse com espaço vital melhor estaria mais apta para se desenvolver e conquistar outros territórios. Figura 6 – Geógrafo Friedrich Ratzel 1844/1904 Crédito: CC/PD. Esse é o pilar conceitual do determinismo geográfico e se tornou justificativa natural para o expansionismo alemão. Lembrando que a Alemanha é um país relativamente novo. Veja o mapa que mostra como era a região da atual Alemanha no início do século retrasado. Crédito: Laércio de Melo. 10 Alemanha atual: Crédito: Laércio de Melo. O mapa é a única forma que uma pessoa consegue saber como é o seu país, seu bairro, seu município ou o continente. Por exemplo, sem esse desenho cartografado, não teríamos ideia dos contornos geográficos do território que nos dá a identidade de brasileiros. Pense rapidamente: como é o desenho do país chamado Butão, ou Cazaquistão? Notou que esses contornos não fazem parte do nosso dia a dia e, portanto, não estamos familiarizados com essa cartografia? A Alemanha foi o primeiro país que institucionalizou a Geografia. Transformou em disciplina escolar, o que ajudou na criação o Estado alemão. A antiga Prússia – atual Alemanha – teve além de Ratzel outros dois grandes personagens da geografia – geógrafos clássicos, considerados os pais da Geografia Moderna. São eles: Alexander von Humboldt e Karl Ritter. TEMA 5 – HUMBOLDT E RITTER Humboldt, com suas viagens ao redor do mundo, desenvolveu inúmeros estudos e mapeamento a respeito de correntes marítimas, geologia, clima, 11 população, entre outros. É um dos homens que mais tem toponímias no planeta. Humbolt é homenageado por exemplo como nomes de ruas, cidades, escolas, correntes marítimas universidades. Na imagem a seguir, ele é a figura estampada em um selo, mas faça uma rápida pesquisa na internet para comprovar os inúmeros lugares do planeta que levam o seu nome. Crédito: irisphoto1/shutterstock. Karl Ritter não foi um viajante como Humbolt, mas seu papel foi o de estudioso, no qual juntou as informações e montou um grande quebra cabeça para explicar a relação do ser humano com a natureza. Crédito: Marzolino/shutterstock. 12 O mérito de ter dado o primeiro passo para a organização da Geografia como ciência é referendado principalmente aos trabalhos elaborados pelo prussiano Alexandre von Humboldt (1769-1859) e pelo saxônico Karl Ritter (1779-1859), que viveram o momento histórico do surgimento do capitalismo alemão. Por que a Alemanha é tão citada quando se fala de Geografia? Pense no quanto esse país influenciou e influência o mundo, seja pelas guerras – Primeira e Segunda Guerra Mundial – ou por sua importância em várias indústrias, por exemplo, a farmacêutica ou automobilística. É com base neles que a Geografia ministrada nas universidades passou a ser ensinada nas escolas tal como conhecemos hoje. Até então, a Geografia era apenas um amontoado de relatos de viagens, de curiosidades, de descrição de lugares exóticos, ou seja, nada sistematizado. Humboldt, um grande naturalista, não só se preocupou, ao longo de sua vida, em descrever que o observava, mas sim em buscar explicações para os acontecimentos. Para realizar seus estudos, fez uso intenso da Cartografia, que passava por um grande desenvolvimento (Andrade, 1987, p. 53). Entre suas obras, destaca-se “Viagem às Regiões Equinociais do Novo Continente” (1799-1804). Nesta obra, ele elabora um ensaio político do então Reino da Espanha – hoje México. Também publicou trabalhos sobre a Europa, Ásia Setentrional e América Latina. Inventou as linhas isotérmicas, estudou não só os continentes e suas populações, como também os oceanos, cabendo-lhe até seu nome a uma das correntes marítimas, a Corrente de Humboldt, na costa do Chile, no Oceano Pacífico. Quando não mais podia fazer grandes viagens, na cidade de Berlim, atuou como conselheiro do rei da Prússia, que mostrava interesse em criar o Estado alemão. Aos 74 anos, publica a sua mais célebre obra: “Cosmos: Ensaios de descrição física do mundo”. Esse procedimento vai ser depois copiado e transformado em livros didáticos que influenciaram pessoas mundo a fora Karl Ritter, que se confessava um discípulo de Humboldt, era professor na universidade de Berlim e foi professor de grandes geógrafos do Século XIX, entre eles, Friedrich Ratzel, Elisée Reclus, Vidal de La Blache, entre outros. Ele era elogiado até mesmo de adversário ideológicos, como Reclus, que era um anarquista e membro da I Internacional. Reclus se referiu a Ritter – um monarquista – da seguinte maneira: ele retirou a Geografia do miserável caminho das nomenclaturas, fez-nos estudar com espírito a história da Terra e dos astros, 13 apresentou-nos como dogma imutável a vida de nosso globo. Graças a ele, sabemos que os continentes, os planaltos, os rios são dispostos, não ao acaso, mas em virtude de leis do movimento, leis eternas (...) (Moraes, 1989, p. 206). NA PRÁTICA Como prática da nossa aula de hoje, gostaria de instigá-los, a pesquisar um pouco mais a respeito do pensamento geográfico e como esse se reproduz em sala de aula por meio da BCC que aponta os princípios do raciocínio geográfico. • Analogia: Um fenômeno geográfico sempre é comparável a outros. A identificação das semelhanças entre fenômenos geográficos é o início da compreensão da unidade terrestre. • Conexão: Um fenômeno geográfico nunca acontece isoladamente, mas sempre em interação com outros fenômenos próximos ou distantes. • Diferenciação: É a variação dos fenômenos de interesse da geografia pela superfície terrestre (por exemplo, o clima), resultando na diferença entre áreas. • Distribuição: Exprime como os objetos se repartem pelo espaço. • Extensão: Espaço finito e contínuo delimitado pela ocorrência do fenômeno geográfico. • Localização: Posição particular de um objeto na superfície terrestre. A localização pode ser absoluta (definida por um sistema de coordenadas geográficas) ou relativa (expressa por meio de relações espaciais topológicas ou por interações espaciais). • Ordem: Ordem ou arranjo espacial é o princípio geográfico de maior complexidade. Refere-se ao modo de estruturação do espaço de acordo com as regras da própria sociedade que o produziu (BNCC, p. 360). FINALIZANDO Chegamos ao final de uma aula com alguns conceitos teóricos e técnicos acerca de abordagens aplicada geografia. Entre eles, a cartografia. Lembre-se, a cartografia é uma linguagem da Geografia. Por meio dela, podemos ter a descrição da distribuição dos fenômenos pelo planeta, mas não podemos nos contentar apenas com a 14 distribuição; devemos é claro saber construir analogia, pois um fenômeno geográfico sempre é comparável a outros. Assim buscamos entender a ordem, a extensão, a distribuição, diferenciação a localização dos fenômenos geográficos. Lembrando que a geografia é sim um elemento que faz parte de todos nós, pois é no espaço geográfico que vivemos, que construímos nossas relações e retiramos a nossa sobrevivência. Também vimos nessa etapa de estudos personagens da Geografia que você vai encontrar sempre em citações; entre eles, Ritter, Ratzel e Humboldt. 15 REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Curricular Comum. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofi nal_site.pdf>. Acesso em: 22 fev. 2022. HOBSBAWM, E. J. A era das revoluções. São Paulo: Paz e Terra, 2001. MORAES,A. C. R. A gênese da geografia moderna. São Paulo: Hucitec, EDUSP, 1989. _____. Geografia: pequena história crítica. São Paulo: Hucitec, 1990.
Compartilhar