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- -1 ORIGEM E CONCEITO DE CURRÍCULO - -2 Introdução Neste tema, você estudará tanto a origem da palavra quanto o seucurrículo surgimento no contexto educacional. Também terá uma visão sócio-histórica de currículo, ou seja, localizando-o ao longo da história a partir da sua reflexão na prática e como foi estabelecido até o momento atual. Isso porque o currículo é um elemento central no projeto pedagógico que representa a concepção de educação e como se compreende o processo ensino-aprendizagem. Mas, afinal, você sabe o que significa e qual a origem da palavra ?currículo - -3 Origem e conceito de currículo O termo origina-se da palavra latina , que significa correr, pista decurriculum corrida ou trajetória. Considerando o seu significado e a sua origem epistemológica, entende-se a palavra como um curso ou caminho a ser seguido.currículo Quando essa definição é transportada para o campo educacional, este assume o papel de guia do conteúdo apresentado ou trajetória do conhecimento a ser seguida no processo de escolarização. Agora, responda: a partir de quando a palavra foi incorporada àcurrículo educação? Antes de explicar sua introdução no dia a dia da educação, é necessário conhecer como a estrutura e a hierarquização do conhecimento se deu no contexto social e foi incorporada ao contexto educacional. Segundo Goodson (2013, p. 31), citando Hamilton e Gibbons, “as palavras classe e currículo parecem ter entrado no tratamento educacional numa época em que a escolarização estava se transformando em atividade de massa”. Embora os primeiros registros sobre classes tenham aparecido em 1509 na College of Montaign, na França, a primeira ocorrência do uso da palavra foi em 1633, na Universidade decurriculum Glasgow, na Escócia. A Universidade de Glasgow, no final do século XVI (1501-1600), estava sob a influência política, cultural e teológica dos discípulos de Calvino, que exerciam ascendência sobre o Estado e as demais esferas de poder. Com isso, os princípios calvinistas permeavam a prática educacional. Um dos conceitos centrais da prática social calvinista era a disciplina, portanto, naquele momento, houve a primeira relação entre currículo e disciplina. A partir de então, surgiu uma forte relação entre conhecimento e controle, que permeará toda a história do currículo e da construção do conhecimento como práxis social, ou seja, a construção do conhecimento como uma ação ordenada com fins sociais. Nos séculos seguintes, o conceito de classe e a sua diferenciação foram ampliados e aprimorados. Goodson (2013, p. 3) menciona que, no século XIX (1801- 1900), a Universidade de Glasgow exercia bastante influência sobre o que ele chamou de pedagogias de classe. você sabia? O que significam pedagogias de classe? Trata-se do ensino diferenciado conforme a classe social dos alunos, mesmo que frequentassem a mesma escola. As crianças pertencentes às - -4 Naquele momento também se estabeleceram duas situações: a transição do sistema de classe para o conceito de sala de aula e a constatação do poder diferenciador, em que, como dissemos, o ensino foi diferenciado pela classe. Com a Revolução Industrial, cuja primeira etapa ocorreu na Inglaterra entre os séculos XVIII e XIX, o processo de escolarização sofreu novas mudanças, impactado pelas transformações sociais e políticas dessa época. As pessoas estavam migrando dos ambientes rurais para as cidades, que se encontravam em processo inicial de organização e urbanização. Antes da industrialização, as pessoas concentravam-se nas regiões rurais e ficavam próximas ao seu núcleo familiar. Era dentro desse núcleo familiar que os artesãos ensinavam o seu ofício para os membros mais jovens. A família era responsável pela transmissão do conhecimento, pela formação emocional (transmissão de valores, crenças e símbolos presentes na sociedade) e pela transmissão dos comportamentos esperados por essa sociedade. Figura 1 - Migração das zonas rurais para as cidades em desenvolvimento. Fonte: Shutterstock Com o processo de industrialização, os jovens passaram a migrar para as cidades, que estavam em processo de formação. O conhecimento, principalmente o conhecimento profissional (se é que se pode chamá-lo dessa forma nesse momento histórico), obtido no núcleo familiar não era mais suficiente para atender às novas demandas do mercado de trabalho, que também estava se formando. classes dominadas tinham acesso aos conteúdos que reforçavam essa condição. Por sua vez, as crianças da classe dominante tinham acesso aos conteúdos que promoviam e reforçavam a mensagem de dominação aos demais. - -5 Surgiu então a necessidade de se organizar o conhecimento e transmiti-lo de forma que os cidadãos aprendessem o que era necessário para atender ao mercado e não mais o que era uma tradição familiar. Começou-se a pensar na ligação do currículo com a pedagogia. O conhecimento educacional formal foi potencializado quando se acrescentou o processo de avaliação em 1850, com a criação das primeiras juntas examinadoras universitárias. No começo do século XX, o currículo já funcionava como elemento de diferenciação social. Já havia o sistema de sala de aula, em que as aulas e disciplinas tinham seu fluxo, horário, notas e demais padronizações estabelecidas. O currículo passa a ser entendido como matéria escolar. Atualmente, usamos os termos disciplinas escolares ou listagem de conteúdos para nos referirmos a essa sistematização. Em 1904, alguns países, como a Inglaterra e os Estados Unidos, definiram os regulamentos secundários, que subsidiaram a definição das matérias básicas a serem contempladas no currículo. Segundo Goodson (2013, p. 35), em 1917, esse processo já estava consolidado. A partir desse momento, o currículo passou a ser um campo de tensão entre o conteúdo que realmente deveria ser aplicado o conteúdo que seria excluído –versus situação similar à existente atualmente na visão de Goodson (2013, p. 36). Outra preocupação que emergiu nesse contexto era como ministrar tantos conteúdos dentro do horário escolar. Dessa forma, os horários passam a ocupar um espaço privilegiado, segundo Goodson (2013, p. 36), sendo sistematizados e organizados de acordo com as exigências dos especialistas. Em 1944, influenciado pelo ato educacional e pelo currículo universitário, o currículo ganha força. Em 1951, por meio do Certificado Geral de Educação, há a separação dos conteúdos em “conteúdos principais” vinculados aos currículos universitários dos demais conteúdos. Essa visão marcada pela “transferência instrumental de teorizações americanas e inglesas” (LOPES; MACEDO, 2002, p. 13) permaneceu no Brasil até o início da década de 1980. Segundo Lopes e Macedo (2002, p. 13-14), foi a partir da década de 1990 que o currículo passou a ter um enfoque mais sociológico, sendo compreendido dentro dos contextos político, econômico e social, devido ao início da redemocratização brasileira. No Brasil, a partir de 1996, estruturaram-se os parâmetros curriculares nacionais com o seguinte objetivo: [...] ao definir as diretrizes e bases da educação nacional, estabeleceu como objetivo geral, tanto para o ensino fundamental (primeiro grau, com oito anos de escolaridade obrigatória) quanto para o ensino médio (segundo grau, não-obrigatório), proporcionar aos educandos a formação necessária ao - -6 Em 20 de dezembro de 1996, foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da educação nacional, que tem por objetivo propiciar a todos os cidadãos uma formação básica comum e consolidar a organização curricular. desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto- realização, preparação para o trabalho e para o exercício consciente da cidadania. (BRASIL, 1997, p. 13). você sabia? O que são parâmetros curriculares nacionais? É um documento elaborado pelo Ministério da Educação com as principais diretrizes e objetivos curriculares para todas as escolas brasileiras. Tem como foco garantira coerência dos investimentos no sistema educacional. Para conhecê-los, consulte: <http://portal.mec.gov.br /seb/arquivos/pdf/livro01.pdf>. - -7 Conceito de currículo Segundo Coll (1987, p. 43-44), o currículo é o campo de estudo, dentro da área da educação, que traduz e concretiza a orientação do sistema educacional. Espera-se que o currículo organize e estruture a coerência entre o que é planejado (pensa ser feito) no âmbito educacional com o que é feito na prática por meio de estratégias de aplicação do conteúdo. Para o acompanhamento de sua eficácia e efetividade, usam- se metodologias de aplicação e avaliações de resultados. Esse campo é capaz de influenciar as propostas curriculares oficiais e as práticas pedagógicas a partir do processo de ressignificação das suas propostas. Segundo o art. 13 da Resolução n 4, de 13 de julho de 2010, “currículoo configura-se como o conjunto de valores e práticas que proporcionam a produção, a socialização de significados no espaço social e contribuem intensamente para a construção de identidades socioculturais dos educandos”. Ainda nesse artigo, o currículo deve difundir os valores de interesse social e os direitos e os deveres dos cidadãos, além de atuar na organização da proposta curricular promovendo um percurso formativo adequado e contextualizado de acordo com os interesses e as necessidades dos estudantes. O termo currículo, no sentido de organizador e guia do conhecimento a ser transmitido, passou a ser utilizado mais recentemente, segundo Silva (2007, p. 21), em países europeus influenciados pela literatura educacional americana, entre os quais França e Espanha. No Brasil, a preocupação e a discussão sobre a questão do currículo aconteceram por volta da década de 1980, com o início da redemocratização do país e o término da ditadura. O marxismo, a pedagogia histórico-crítica e a pedagogia do oprimido (de Paulo Freire – 1968) começam a ser discutidos no âmbito do currículo. você sabia? A Resolução n 4, de 13 de julho de 2010, foi elaborada pelo o Ministério da Educação e define as diretrizes curriculares nacionais gerais para a educação básica, para que todas as crianças, jovens e adultos tenham acesso à educação de maneira igualitária, gratuita e com o objetivo de promover a cidadania e a democratização do ensino. Para saber mais e conhecer o texto na íntegra, acesse o : <http://portal.mec.gov.br/dmdocumentslink /rceb004_10.pdf>. - -8 Ainda que a obra de Paulo Freire tenha sido concebida na década de 1960, ela passou a ser usada e discutida apenas após o fim da ditadura. Os pensadores da área curricular, como Apple e Giroux, este último citado por Lopes e Macedo (2002, p. 21), também influenciam as discussões nesse campo (você conhecerá melhor esses autores no tópico que apresenta a teoria crítica). você sabia? Você sabe o que é marxismo? Trata-se de um movimento intelectual, filosófico e político iniciado por Karl Marx e Friedrich Engels, no século XIX, que criticava a sociedade liberal burguesa da época. A crítica era dirigida à classe dominante, que detinha o poder econômico e procurava obter o maior lucro possível a partir da opressão da classe dos trabalhadores, conhecida como classe dominada ou proletariado. Embora o movimento tenha se iniciado no século XIX, as críticas permanecem atuais. Leia mais na obra , de Maria Lucia Aranha e Maria Filosofando: introdução à filosofia Helena Pires Martins (1993). - -9 Vertentes da produção curricular Lopes e Macedo (2002, p. 19-20) citam que a produção curricular no Brasil baseia-se em três vertentes principais, conforme representadas na Figura 2 e descritas nos itens a seguir: Figura 2 - Vertentes que basearam a produção brasileira na área do currículo. Fonte: Mendes, 2015. · Vertente pós-estruturalista Para entender a vertente pós-estruturalista, primeiro você aprenderá, e de forma breve, o que é estruturalismo. Esse movimento teve origem com Ferdinand de Saussure em 1916 e é uma abordagem que, posteriormente, tornou-se um dos métodos utilizados para analisar a língua, a cultura, a filosofia da matemática e a sociedade na segunda metade do século XX. De acordo com esse método, qualquer língua pode ser analisada como um sistema no qual cada um dos elementos linguísticos só pode ser definido pelas relações de equivalência ou de oposição que mantém com os demais elementos. Esse conjunto de relações forma a estrutura, e essa estrutura é produzida dentro da cultura em que os indivíduos estão inseridos. - -10 Na vertente pós-estruturalista, esses elementos linguísticos não possuem mais uma relação direta, podendo ter uma representação em unidades descentralizadas ou criar novas relações. Nos séculos anteriores, os grupos minoritários ficavam à margem da sociedade, e o conhecimento produzido ficava restrito a esse grupo. A partir do começo do século XXI, a partir dos movimentos políticos que emergiram dos grupos minoritários, esses saberes passam a compor a construção do conhecimento e da cultura, ou seja, não estão mais localizados em classes sociais ou nas questões tradicionais. O pós-estruturalismo ignora a “antiga” ordem de estruturar o conhecimento e organizá-lo somente por classe social e pela economia política. · Currículo e conhecimento em rede Conforme Lopes e Macedo (2002, p. 31), ainda que essa vertente não trate especificamente do currículo, ela discute qual é o sentido da escola a partir das seguintes reflexões: por que a escola deve ensinar? Para quem a escola deve ensinar? Como esse conhecimento será importante para o aluno, e como o aluno o usará em sua realidade social? Seu principal precursor é o português Boaventura de Sousa Santos, e o enfoque fundamental é na categoria cotidiano e na formação de professores. Figura 3 - Representação dos conhecimentos que o aluno recebe e de suas conexões. Fonte: Shutterstock O conhecimento deve ser entendido como viável, social e histórico, sem linearidade ou hierarquização, mas seguindo redes de referências na prática social. Dessa forma, seria composto por disciplinas e atividades múltiplas e abarcaria experiências tanto individuais (de cada aluno) quanto coletivas (da sociedade e da cultura em que a escola está inserida), promovendo a integração da realidade individual do aluno com o papel social da escola. - -11 O currículo conseguiria incluir e tematizar problemas modernos, como o mercado de trabalho, a produção científica e a compreensão das relações modernas. O currículo seria produzido e significado no senso comum. · História do currículo e constituição do conhecimento escolar Sob esta vertente, estudiosos brasileiros questionavam a efetividade das teorias existentes na realidade do currículo brasileiro. A transferência educacional, pensada por Antonio Flávio Moreira a partir da década de 1990, foi ampliada agregando categorias como globalização, hibridização cultural (junção ou “mistura” de culturas) e cosmopolitismo. O cosmopolitismo enxerga os homens como uma única nação, sendo que esse homem não está limitado pelas barreiras geográficas de seu país ou pela cultura a qual pertence. A partir desse trabalho, o currículo no Brasil passou a proporcionar subsídios para as políticas curriculares básicas e para a constituição de campo e das práticas vividas. Incentiva-se o estudo da história das disciplinas escolares. Com isso, a escola passa a ter uma autonomia relativa, como “uma totalidade em que o cultural e o social se apresentam mediatizados pelo pedagógico.” (LOPES; MACEDO, 2002, p. 44). Conclusão Você viu a origem da palavra e o seu surgimento no contextocurrículo educacional. Também teve uma visão sócio-histórica de currículo e entendeu que o currículo é um elemento central no projeto pedagógico que representa a concepção de educação e como se compreende o processo ensino-aprendizagem. BRASIL. Ministério da Educação. , de 20 de dezembro de 1996.Lei n 9.394o Estabelece as diretrizese bases da educação. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br >. Acesso em: 7 ago. 2015./arquivos/pdf/ldb.pdf ______. Ministério da Educação. : introdução aosParâmetros curriculares nacionais parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf>. Acesso em 7 ago. 2015. http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf - -12 ______. Ministério da Educação. , 13 de julho de 2010.Resolução CNE/CEB n 4o Define as diretrizes curriculares nacionais gerais para a educação básica. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_10.pdf>. Acesso em: 7 ago. 2015. COLL, C. : uma aproximação psicopedagógica à elaboração doPsicologia e currículo currículo escolar. Tradução de Cláudia Schilling. São Paulo: Ática, 1987. GOODSON, I. F. : teoria e história. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 2013.Currículo LOPES, A. C. L.; MACEDO, E. O pensamento curricular no Brasil. In: Debates . São Paulo: Cortez, 2002.Contemporâneos SILVA, T. T. : uma introdução às teorias do currículo. 2.Documentos de identidade ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. Introdução Origem e conceito de currículo Conceito de currículo Vertentes da produção curricular Conclusão
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