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Unidade V - Capelania Carcerária

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UNIDADE 05 
CAPELANIA CARCERÁRIA: 
FÉ, ESPERANÇA E AMOR COMPROMETIDOS COM O PRÓXIMO 
Prof. Dr. Edilson Soares de Souza 
 
 Introdução 
 Observamos uma relação muito próxima entre capelania, em suas diversas 
formas, e aconselhamento pastoral. Sendo a capelania uma expressão da teologia cristã, 
esperamos e trabalhamos para que ela se constitua em instrumento de humanização, 
sobretudo, em situações adversas e opressivas, como nos casos de reclusão ou 
encarceramento. Das múltiplas formas de se exercer a capelania, aquela que se volta 
para o atendimento no contexto carcerário apresenta-se desafiadora. Assim, podemos 
entender que elementos como fé, esperança e amor comprometidos constituem-se em 
aspectos de humanização no desempenho da Capelania Carcerária, como observaremos. 
 
 Sistema carcerário: espaço de opressão e de humanização 
 Nesta unidade que encerra as nossas reflexões acadêmicas, priorizando a 
discussão sobre a relevância da Capelania Carcerária, não podemos deixar de destacar 
que a realidade do sistema carcerário, seja no Brasil ou em outras sociedades, oculta 
uma forma de exclusão social. O que está encarcerado é alguém que experimenta, em 
maior ou menor grau, uma forma de exclusão do convívio familiar e social. Desta 
forma, a Capelania Carcerária é chamada, além de outros aspectos e objetivos, a 
trabalhar com a inclusão daquele ou daquela que se encontra em estado de exclusão, 
tanto no sentido físico quanto psicológico. Trabalhar com esta forma de capelania – a 
carcerária – é colocar-se, primeiramente, contra o esforço de exclusão do semelhante, 
visando a sua inclusão, mesmo em condições de contenção física. 
 Há, no entanto, outra forma de exclusão, que explica, em parte, alguns dos 
problemas associados aos que, excluídos socialmente, também experimentam a 
condição de encarcerados. O sistema carcerário brasileiro pode ser visto como a 
expressão de uma realidade mais complexa, expondo somente um segmento marcado 
pela pobreza material e pela ausência de oportunidades de uma vida mais digna. Esta 
realidade social brasileira é objeto de estudos de sociólogos e antropólogos, que buscam 
explicações para o aumento da degradação urbana, como também do crescente nível de 
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violência e criminalidade. Diante da complexidade social e política no Brasil do século 
XXI, quando estudiosos dos fenômenos sociais e urbanos procuram respostas às 
inquietações existenciais e coletivas, a teologia cristã também pode comparecer ao 
debate indicando soluções para desafios que mobilizam toda a sociedade. 
 Para Cristina Costa, que analisa a relação entre urbanização e criminalidade, 
 
a urbanização tem resultado no crescimento da pobreza urbana, atraindo para 
os centros industriais populações expulsas do campo pela mecanização do 
trabalho agrícola, pela baixa produtividade do meio rural e pela concentração 
da terra. Um verdadeiro fluxo populacional se estabelece do campo para a 
periferia das grandes cidades ou para os centros das cidades que se 
deterioram. Recentes estatísticas demonstram que o desenvolvimento 
econômico tem aumentado a pobreza e a desigualdade social (COSTA, 2005, 
p. 256). 
 
 A autora deixou claro que associar a violência ou a criminalidade aos excluídos 
do campo que chegam e ocupam as grandes metrópoles é tratar o tema com 
superficialidade, sem considerar outras variantes relevantes. Segundo Costa, “o perfil 
social dos criminosos também ajuda a reforçar essa associação entre pobreza e 
criminalidade: os autores dos crimes oficialmente denunciados são geralmente 
analfabetos, trabalhadores braçais e predominantemente de cor negra” (COSTA, 2005, 
p. 255). No entanto, embora o perfil social de alguns criminosos apresente tais 
características, existem outras formas de criminalidade que são comentidas por 
indivíduos que não se enquadram nas estatísticas sobre violência urbana. Neste sentido, 
“é contra a população pobre e estigmatizada que se conduz a prática policial, a 
investigação e as formas de punição” (COSTA, 2005, p. 255). 
 Por outro lado, é importante lembrar que o sistema carcerário pode ser entendido 
como um sistema de controle social. Para Eva Lakatos e Marina Marconi, que tipificam 
os sistemas de controle como internos e externos, “à medida que a sociedade se torna 
mais complexa, aumentando o número de seus componentes e tornando-se heterogênea, 
o controle informal, baseado no conhecimento e na opinião do grupo, não é mais 
suficiente para manter a conformidade” (LAKATOS e MARCONI, 2009, p. 240). 
Surge, então, a necessidade de outras formas de controle social, inclusive, o controle 
externo, que pretende ser organizado e formal. Partindo das considerações das autoras, 
podemos tipificar o sistema carcerário como de “controle social externo, artificial, 
organizado, formal, jurídico, estatal” (LAKATOS e MARCONI, 2009, p. 241). Desta 
forma, a capelania carcerária não busca atender somente ao pobre e marginalizado, que 
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aparece recorrentemente nos veículos midiáticos, mas ao indivíduo que se percebe 
punido por algum tipo de desvio social. Cabe lembrar ainda o índice crescente de 
mulheres e adolescentes que sofrem com a reclusão por envolvimento, consciente ou 
não, em delitos criminosos, pressionados por um sistema corrompido, o que não 
significa negar responsabilidades individuais. 
 
 Fé, esperança e amor: inspiração para a Capelania Carcerária 
 Quando o apóstolo Paulo escreveu aos cristãos na cidade de Corinto, tratando 
entre outros temas sobre relacionamentos, destacou a importância de três aspectos 
relacionais: a fé, a esperança e o amor. Após discorrer sobre a excelência de alguns dons 
espirituais e lembrar o sacrifício de alguns em favor de outros, entregando bens 
materiais ou a própria vida, o autor cristão concluiu dizendo: “assim, permanecem agora 
estes três: a fé, a esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor” (I Coríntios 
13.13). Podemos aplicar esta passagem dos textos do cristianismo como uma referência 
ao trabalho de capelania carcerária, por dois motivos principais: a) a capelania precisa 
desenvolver como fundamento estes três aspectos – a fé, a esperança e o amor; e b) a 
capelania constitui-se em instrumento para levar estes três aspectos aos que se 
encontram em situações de reclusão forçada, envolvendo toda a comunidade religiosa. 
 Ao tratar do aconselhamento direcionado aos prisioneiros e seus familiares, Gary 
Collins fez algumas considerações importantes. 
 Para Collins, 
 
o aconselhamento de prisioneiros exige abordagens especiais que não se 
aplicam a outros casos. O conselheiro precisa de uma permissão para ter 
acesso ao preso, talvez não seja possível ter privacidade, e a confidência pode 
ser mais difícil de manter (principalmente quando o conselheiro fica sabendo 
de atos violentos ou desordens que podem ser evitados se comunicados às 
autoridades) (COLLINS, 2004, p. 685). 
 
 O que foi colocado anteriormente indica a complexidade do trabalho de 
acompanhamento pastoral daqueles que estão em situação de reclusão compulsória, 
destacando a relação que a capelania carcerária pode desenvolver com outros 
profissionais, como administradores prisionais e agentes carcerários, entre outros, que 
vivem o cotidiano de uma prisão. Além dos cuidados que envolvem a relação da 
capelania com os diversos profissionais que atuam no sistema carcerário, é importante 
reconhecer que as técnicas e os métodos utilizados precisam contemplar uma realidade 
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diferente daquela que outros capelães vivenciam em outras áreas de atuação. Segundo 
Collins, “as técnicas e objetivos do aconselhamento terão que ser adaptados às 
necessidades de cada preso, e os conselheiros terão que avaliar suas próprias ideias 
tendenciosas, seus preconceitos e temores antes de aceitar este tipo de trabalho” 
(COLLINS, 2004, p. 685). 
 Simultaneamente ao acompanhamento pastoral daqueles que experimentam aprivação de sua liberdade, sofrendo as mais variadas situações estressantes, os 
familiares também vivenciam as mais diversas emoções, com suas respectivas formas 
comportamentais. Compreendendo que os familiares sofrem em função das condições 
adversas de um ente que está preso, a capelania carcerária pode volta-se também para o 
atendimento de famílias que experimentam a dor e as incertezas com relação ao 
presente e ao futuro de uma pessoa querida, que vive a reclusão prisional. 
 O ministério religioso que se especializa na capelania carcerária se percebe, 
muitas vezes, diante de enormes desafios e limitações, impostas pela burocracia e 
exigências legais. Diante deste quadro, entre outras coisas e posturas, a capelania 
carcerária pode apontar para a fé num Deus amoroso, para a esperança num processo de 
recuperação e para o amor que se expressa além dos muros de contenção prisional. 
 
 Breves considerações 
 Podemos encerrar estas breves reflexões sobre a importância da capelania 
carcerária dizendo que esta área pastoral, de grande importância para a sociedade, exige 
um preparo especializado por parte daqueles ou daquelas que se motivam a atuar em 
situações tão estressantes, apoiando pessoas e fortalecendo famílias. 
 
 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
BÍBLIA SAGRADA: Nova Versão Internacional. I Coríntios. Traduzida pela 
Comissão de Tradução da Sociedade Bíblica Internacional. São Paulo: Editora Vida, 
2001. 
 
COLLINS, Gary. Aconselhamento cristão: edição século 21. São Paulo: Vida Nova, 
2004. 
 
COSTA, Maria Cristina Castilho. Sociologia: introdução à ciência da sociedade. 3.ed. 
revi. e ampl. São Paulo: Moderna, 2005. 
 
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Sociologia geral. 7.ed. ver. e 
ampl. 9.reimpr. São Paulo: Atlas, 2009.

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