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21_09 - Trabalho A Praia dos Ossos

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Faculdade de Direito
Sociologia Geral – MG2
São Paulo, 21 de setembro de 2021
Profª Dora Nogueira Porto
Ana Beatriz Mendes Simon Machado, Bruna Furlan Pedrosa, Júlia Mello Pinheiro, Julia Torres Silveira, Karoline Torres Ferreira.
Atividade I: Relacionar o podcast A Praia dos Ossos com os conceitos apresentados em sala.
O podcast A Praia dos Ossos, gravado em junho de 2019, tem como principal foco o assassinato da socialite mineira Ângela Diniz por seu namorado Raul Fernando do Amaral Street, também conhecido como Doca que a matou com três tiros no rosto e um na nuca na véspera do ano novo, no dia 30 de dezembro de 1976, na Praia dos Ossos, localizada em Búzios. No entanto, tendo em vista que a justiça no Brasil é lenta, mesmo nos casos com réu confesso, o caso só foi julgado três anos após o assasinato de Ângela, em 1979. Desse modo, o podcast aborda o julgamento como um todo, as histórias de vida de Ângela e Doca, além das consequências e desdobramentos que o crime teve na sociedade brasileira.
Nesse sentido, é importante problematizar o motivo pelo qual o crime ficou famoso e foi obsessivamente acompanhado pela mídia: ambos os envolvidos eram de elevada posição social. Desse modo, os delitos caracterizados pelo envolvimento de indivíduos marginalizados continuam invisíveis aos olhos da sociedade e da mídia, revelando uma relação com uma das Teorias Explicativas do crime, a Teoria do Conflito. Essas Teorias Explicativas buscam mensurar o crime e as formas de comportamento dos criminosos, de modo que, segundo a Teoria do Controle, existem desigualdades na aplicação da lei à população, fazendo com que grupos já marginalizados socialmente continuem ocupando essa posição, provocada pelas desigualdades capitalistas. Logo, essa visibilidade exacerbada pode ser explicada pela Teoria do Controle, da mesma maneira que a exclusão das comunidades periféricas também pode.
Além disso, é imprescindível apontar o efeito que o caso teve para a luta dos direitos das mulheres, uma vez que foi um divisor de águas na vida de muitas mulheres. Nesse sentido, o caso escancarou a forma injusta e contaditória pela qual as mulheres morriam e ainda morrem no Brasil, evidenciando que a luta por seus direitos ainda deve percorrer um longo caminho.
Episódio 01: O crime da praia dos ossos
O primeiro episódio, "O crime da praia dos ossos”, trata de um fato penal: o assassinato de Ângela Maria Fernandes Diniz por Raul Fernando do Amaral Street. Nesse sentido,tem como objetivo expor a forma com a qual se deu o crime, a postura de Doca após o crime, além das diversas versões que foram criadas a respeito do delito para ofuscar a culpa do verdadeiro assassino: Doca.
Nesse episódio, a narradora, Bianca Vianna, e a pesquisadora do podcast, Flora Thomson-DeVeaux, visitam a casa da Praia dos Ossos na qual se deu o assassinato de Ângela Diniz, a fim de darem vivacidade ao crime, ou seja, à conduta não conformista que infrige a lei. Na cena do crime, foi encontrada Ângela Diniz morta trajando um biquíni azul estampado de pantera, além de um carregador vazio e uma arma automática da marca beretta de calibre de 7,65 mm ao lado de seu ombro, a qual pertencia à Raul Fernando do Armaral Street.
Desde o início, a imprensa sempre mostrou-se extrema e obsessivamente presente no caso, de modo que, a primeira vez em que Doca apareceu depois do crime, enquanto ainda estava foragido, não foi para a polícia, mas para os repórteres em uma entrevista para a TV Globo. Desse modo, é possível observar a estratégia do advogado de Doca desde o início do caso: humanizá-lo aos olhos do público, de forma que a vítima deixasse de ser Ângela e passasse a ser ele, visto que o que teria motivado o assassinato seria o “amor excessivo e alucinado” que a dedicara. 
Nesse contexto, é possível fazer uma contraposição dessas alegações de Doca, sobre os motivos passionais que motivaram o assassinato à Teoria do Controle de Travis Hirschi, segundo a qual existem algumas particularidades que impedem que o crime seja cometido, de modo que, quanto mais forte for o controle social e mais próxima a rede de relacionamentos sociais, mais os indivíduos se comportarão em conformidade com a norma. Dessa forma, segundo essa teoria que se enquadra como uma Teoria Explicativa do crime, o apego e a afetividade são fatores determinantes para que o desvio seja impedido, entretanto, no caso de Doca, o que ocorre, é justamente o oposto, visto que, apesar de alegar que nutria grande afetividade por Ângela, acabou matando-a. À vista disso, é revelado um cenário contraditório, que inclusive faz com que essa afetividade nutrida por Doca seja questionada, de modo que, se ela realmente fosse verdadeira, segundo a Teoria do Controle, ele tenderia a não cometer esse desvio de modo que, consequentemente, não transgrediria as normas.
Para apontar o novo suspeito da morte de Ângela, é importante ressaltar os principais problemas que Newton Watzl, o delegado de Cabo Frio, afirmou que seriam vigentes na comunidade no próximo verão, no qual Ângela foi assassinada. Dentre eles, destacam-se os hippies, os excursionistas, os tóxicos e os ambulantes. Por esse motivo, para o delegado, o crime sediado na Praia dos Ossos não poderia ser justificado por um homem que brigou com a namorada e acabou matando-a, já que crimes dessa natureza não enquadravam-se em sua linha de investigação. Foi nesse momento que surgiu mais um personagem na “trama” do caso de Ângela Diniz, a qual era contada pela mídia e acompanhada diariamente pelas pessoas: Pierre.
Existiam duas versões para a participação de Pierre no crime: a primeira, era a versão de que a causa do asssasinato teria se dado por uma relação íntima de Ângela e Pierre na noite do crime, já a segunda, era a de que Pierre vendia drogas para o casal, as quais teriam enlouquecido Doca a ponto de fazê-lo matar Ângela. Contudo, apesar das buscas incessantes de Pierre pela polícia, nenhum indivíduo que fosse condizente com a descrição foi encontrado, tendo em vista sua inexistência.
Confirmada a inexistência de Pierre, outra personagem foi introduzida na investigação: Gabrielle Dayer, uma alemã que havia chegado em Búzios há poucos meses e que vendia bolsas na praia, sendo justamente essa figura “hippie” que o delegado buscava incriminar e enxotar da cidade. Ela foi introduzida ao caso, visto que, no dia anterior ao do assasinado de Ângela, ao passar pela Praia dos Ossos para vender suas bolsas, ela interagiu com o grupo no qual a protagonista da história se encontrava. Dessa forma, houve uma especulação de que Ângela teria tocado Gabrielle de “forma sensual”, sendo essa a justificativa pela qual Doca a assassinou, ou seja, ele teria agido por ciúmes, tendo em vista que Ângela teria se encantado pela alemã.
Desse modo, considerando a adição dessas duas figuras à história, é importante ressaltar que a insistência no envolvimento de Pierre e de Gabrielle no caso é uma tentativa generalizada de encontrar um outro motivo para o crime se enquadrar na linha de investigação do delegado Newton Watzl, ou seja, um crime provocado por hippies, excursionistas, tóxicos ou ambulantes. Esses estereótipos relacionam-se diretamente a esses personagens, caracterizando a Teoria Interacionista, a qual aponta que o desvio é um fenômeno construído socialmente, de modo que, enquanto alguns grupos são rotulados, outros não são.
Nesse viés, segundo essa teoria, a moralidade dos indivíduos de uma determinada localidade é socialmente construída, sendo relativa aos atores, ao contexto social e a um dado momento histórico. Essa moralidade, configurada pelo rótulo, é fornecida pelo indivíduo que representa a força da lei e da ordem, que, nesse caso, seria o delegado Newton. Dessa forma, Pierre e Gabriele representam esses grupos rotulados que foram envolvidos no caso simplesmente por enquadrarem-se ao conjunto de estereótipos que, segundo Newton, caracterizava-se por comportamentos desviantes. 
Ainda abordando a Teoria Interacionista, é importante ressaltarque essas acusações tinham como objetivo amenizar e até mesmo desviar a culpa de Doca, um homem branco de elevada posição social, que, justamente por esse rótulo, era colocado como a vítima do caso. É possível verificar essa situação por meio da forma com a qual Raul era tratado: depois de se entregar à polícia, Doca ficou preso por sete meses no estado do Rio de Janeiro até conseguir um habeas corpus. Além disso, o julgamento foi, por muitas vezes, adiado com base em recursos, de modo que quanto mais o tempo passava, mais o assassinato sumia no horizonte e com ele, Ângela Diniz também sumia como pessoa.
Com advento desses fatos, Doca passou a ser uma celebridade, tendo seu rosto estampado em camisetas e seu nome usado em pratos e bebidas em restaurantes. Dessa forma, é possível relacionar esse cenário à comunicação não verbal que visa a boa imagem e auto-estima, conceitos abordados pelo sociólogo Anthony Giddens. Tal situação possui tanto efeito na concepção da sociedade acerca de Doca, que foi problematizada em uma coluna do Jornal dos Sports que alegava que, no início Ângela Diniz era vítima, mas 15 dias depois, a situação mudou e Doca passou a ser a vítima. Além disso, fica evidente o viés machista da sociedade na época, dado que Ângela, que foi assassinada, foi promovida de mulher mais sexy a sapatão e Doca, foi promovido de assassino a “mito”, revertendo, assim, o foco do cenário de maneira drástica.
Por fim, nesse primeiro episódio, é importante ressaltar a versão dos fatos que esclarece a forma com a qual se deu o crime e é contada por Ivanira Gonçalves de Souza, que trabalhava na casa da Praia dos Ossos, inclusive no dia do crime. Ela alegou que, quando o casal voltou da praia, depois de uma discussão, Ângela decidiu mandar Doca embora. Ele pegou uma bolsa e foi para o carro, esperando que ela não o deixasse ir, mas ela não o fez, fazendo com que Doca voltasse para a casa com a pistola que estava escondida na bolsa. Ângela estava sentada em um banco na varanda quando ele voltou, de modo que depois de discutirem, ela pegou a bolsa que Doca carregava e bateu com ela em seu rosto. O golpe derrubou Raul e a bolsa no chão, expondo a pistola, de forma que, segundo Ivanira, depois disso “foi tiro para todo o lado”.
Episódio 02: O Julgamento 
O segundo episódio, “O Julgamento”, tem como ponto central relatar o júri que aconteceu em 1979, somente três anos após o acontecimento do assasinato. Nesse sentido, é evidenciado a lentidão da justiça brasileira que propiciou nessa demora, além da postura de vítima que Doca tinha adquirido. Todavia, isso não impediu que, nesse intervalo de tempo, as pessoas esquecessem da história, visto que o “Caso Doca Street” virou uma novela acompanhada nacionalmente, de modo que, finalmente, havia chegado o dia mais esperado: o julgamento. Ademais, nesse episódio é mostrada a mobilização de várias mulheres quanto à garantia de seus direitos, considerando que, durante o julgamento, a reputação de Ângela virou uma prova contra ela. 
Raul Fernando do Amaral Street foi recebido no fórum de Cabo Frio com gritos, aplausos e faixas de apoio, revelando, novamente, os conceitos de boa imagem e autoestima abordados pelo sociólogo Anthony Giddens, haja vista que o réu, por meio da elaboração de uma boa imagem para a opinião pública, conquistando, assim, sua grande maioria. Ademais, a imprensa, que sempre esteve intimamente envolvida no processo, era representada por um grande número de jornalistas que cobriram a audiência, a qual foi transmitida ao vivo na televisão e nos rádios. 
 O juiz era Francisco Motta Macedo e o caso, como se tratava de um crime contra a vida, deveria ser julgado pela sociedade, ou seja, por um corpo de jurados. Dessa maneira, o papel dos advogados excedia a evidenciação de provas baseadas na leis, visto que no júri popular, a decisão é tomada por leigos, de modo que a construção da narrativa, a verve argumentativa, a retórica dos atuantes do direito e as técnicas de persuasão, são de suma importância, sendo, inclusive, ainda mais importantes do que os fatos e as leis. 
Nesse sentido, o papel desempenhado pelo réu também é muito relevante para sustentar a história contada pelos advogados, de maneira que Doca seguiu à risca as instruções do advogado, interpretando seu papel na história: passou às 21 horas do julgamento de cabeça baixa e com as mãos entrelaçadas, interpretando a visão de viúvo inconsolável, quase sendo possível esquecer que ele ficou viúvo por sua própria vontade. Desse modo, é possível relacionar essa situação à comunicação não verbal, precisamente aos conceitos de controle da expressão facial, além do rosto e do corpo, abordados pelo sociólogo Anthony Giddens por meio da Teoria da Interação Social.
Dessa maneira, essa estratégia baseia-se na Teoria da Interação Social, que é o processo pelo qual os indivíduos agem e reagem às pessoas e às situações nas quais encontram-se ao seu redor. Sob essa perspectiva, tanto o controle do rosto e do corpo, quanto o de controle de expressão facial são fundamentais, visto que, por meio deles, é possível captar algo que não foi necessariamente falado. Logo, ambos buscam, por um lado, transmitir a ideia de que Doca era inocente e estava inconsolável pela morte de Ângela, e, por outro, ocultar sua verdadeira culpa em relação ao crime, convencendo, então, os jurados.
Os advogados do caso eram grandes criminalistas do país, de forma que o encontro de Evaristo Moraes Filho, representante da acusação, e Evandro Lins e Silva, representante da defesa, passou a ser chamado de “duelo de titãs”. Nesse sentido, cada advogado montou sua estratégia, de modo que Evandro buscou manipular a imagem de seu seu cliente para a opinião pública, e agora para os jurados, direcionando-os para a figura de um indivíduo desolado pela morte da esposa, o qual teria perdido a cabeça, pois estava apaixonado, e, sendo dominado por uma ideia fixa, teria sido levado a um gesto de violência, totalmente incomum à sua personalidade.
Dessa maneira, Evandro se utilizou da palavra "passional'' para descrever, tanto o crime, quanto Doca, alegando que “ser passional” seria uma característica física inerente ao réu. Os criminosos passionais seriam aqueles criminosos chamados “de boa companhia”, ou seja, cidadãos de bem que nunca cometeram nenhum tipo de violência antes do fato em julgamento, mas que agem por um impulso incontrolável e imprevisível motivados por seus sentimentos exacerbados. 
Nesse âmbito, novamente é possível fazer uma contraposição à Teoria do Controle, segundo a qual o apego e a afetividade seriam fatores determinantes para impedir que o desvio seja impedido. Entretanto, no caso do crime passional, o que ocorre, é justamente o oposto, visto que, apesar do indivíduo ser motivado pela intensidade de seus sentimentos, ele comete o delito da mesma forma, sendo, inclusive possível questionar a veracidade desses sentimentos. 
Durante o julgamento, o ponto central usado pela defesa foi a ideia de legítima defesa da honra, de maneira que, segundo ela, Doca teria matado para proteger a própria honra e imagem, ambas ameaçadas pelo comportamento de Ângela. Essa sustentação feita por Evandro possui raízes no período colonial, nas Ordenações Filipinas, que era a lei em vigor no Brasil colônia, segundo a qual o homem tinha direito de matar sua esposa, caso ela o traísse. Entretanto, apesar das mudanças legislativas, os novos Códigos brasileiros continuaram sustentando essa ideia de modo análogo, de modo que no Código Penal de 1890, por exemplo, eram absolvidos “os que se acharem em estado de completa perturbação de sentidos e de inteligência na hora de cometer o crime", inclusive os homens que matavam as mulheres por estarem totalmente perturbados pela paixão na hora do crime.
 Contudo, mesmo que essas leis não possuam mais vigência e que o argumento utilizado acima não exista no Código Penal, em um julgamento dessa natureza, cabe ao júri decidir quem é o culpado, de modo que, os jurados não têm ciência desses aspectos, cabendo à argumentaçãoconvencê-los da existência ou inexistência desse termo. À vista disso, a argumentação utilizada por Evandro, surtiu o efeito desejado, sendo esse o momento em que Doca começou a parecer como a verdadeira vítima do crime: vítima de Ângela que o provocou, levando-o a um estado de espírito capaz de cometer um assassinato. 
Quanto ao argumento de legítima defesa da honra, é possível fazer uma relação aos estudos de Pierre Clasters, um antropólogo e etnógrafo francês. Segundo ele, a vida social devia ser intepretada a partir de normas visíveis e escritas ou implícitas e não escritas. Contudo, as metas das ações devem, necessariamente, ser fundamentadas em instrumentos e meios legalizados, de maneira que esse argumento utilizado pela defesa não encontra-se na ordem jurídica e, portanto, não pode disciplinar a sociedade, já que não se constitui em um sistema coativo legal. 
Depois de traçar o perfil do acusado como um ser humano exemplar, Evandro partiu para um argumento que apoiava-se no ocorrido em 1975, quando a polícia encontrou maconha no apartamento de Ângela. Frente a isso, os advogados dela partiram para uma argumentação médica, afirmando que ela havia utilizado a droga pois estava deprimida sem a guarda dos filhos e que, por esse motivo, havia tentado suicidio diversas vezes. Evandro então, usou argumentação da acusação a seu favor, afirmando que o assassinato de Ângela teria sido, na verdade, um suicídio assistido e que a esposa de Doca teria feito dele um instrumento usado para se suicidar. Ele sustentou essa afirmação no fato de que, aos 26 anos, Ângela já teria elaborado seu testamento.
Já a acusação, se utilizou de outra estratégia de argumentação para defender Ângela: buscou ressaltar que Doca não era um criminoso passional, pois teria tido tempo para pensar antes de dar os disparos fatais, de modo que não teria agido de forma automática e por uma perda de controle, como fazem os passionais de fato. Para isso, Evaristo recorreu ao depoimento de Clébia, mulher que trabalhava na casa vizinha, a qual relatou com precisão o espaço de tempo entre o primeiro disparo e os três tiros seguintes. Assim, o advogado de Ângela, simulou os gestos da vítima se protegendo, além do resto da cena do crime, pintando uma imagem vívida na mente dos jurados, de maneira a evidenciar que, durante os disparos, Doca tinha tempo para parar e se arrepender.
O resultado do julgamento foi o aprisionamento de Doca por ter excedido culposamente os limites da defesa e, considerando que o acusado fugiu, evitando a prisão em flagrante, a pena foi aumentada de 18 meses para dois anos. Um detalhe importante a ser pontuado é que o papel das duas únicas mulheres do júri foi fundamental para a sentença branda, uma vez que as duas concordaram com o argumento da “legítima defesa da honra”.
Nesse viés, é possível fazer uma relação aos conceitos de acesso à justiça, os quais pressupõem dificuldades, tal como a técnica do direito, a qual nem sempre é conhecida pelos indivíduos. Desse modo, essa pode ter sido uma das dificuldades para que o caso pudesse ter sido compreendido de maneira plena pelos jurados, tendo em vista que a falta de conhecimento na área jurídica, a qual pode ter influenciado na elaboração do veredito.
A sentença foi vista de formas bem diferentes por cada núcleo da história, dado que a comparação jurídica feita era a de que Doca tinha sido condenado como se tivesse atropelado alguém por acidente. Dessa forma, para os apoiadores do Doca, o veredito era motivo de comemoração, enquanto para a acusação, o sentimento era de impunidade e de certeza de um recurso. 
	Após o julgamento, a repercussão do caso foi muito relevante, visto que representantes da luta pelos direitos das mulheres mostraram-se indignadas perante a sentença. Dessa maneira, Jacqueline Pitanguy, uma das lideranças feministas do manifesto contra o machismo na sociedade brasileira, afirmou que o caso de Doca Street era um símbolo do machismo na sociedade brasileira, expressando a forma com a qual a sociedade resolvia as relações de poder entre os sexos. Logo, além do julgamento de Raul, também houve um julgamento de Ângela Diniz e de todas as mulheres que, de algum modo, fugissem ao modelo de comportamento prescrito para o sexo feminino. 
Quanto a essa repercussão positiva do caso, pode-se citar a contribuição do direito para o desenvolvimento social, visto que em casos como esse, a justiça pode ser questionada e o direito pode ser um agente de mudança social, propondo alternativas para as questões injustas que continuam a permear o viés social. Logo, por meio do caso de Ângela Diniz, é possível que a luta pelos direitos das mulheres seja legitimada e que casos em que criminosos como Doca são vitimados, podem ser evitados. 
Logo, o segundo episódio é concluído com a certeza de que Ângela morreu duas vezes: a primeira quando Doca a assassinou, e a segunda no primeiro julgamento, no qual ela foi julgada moralmente, apesar de ter sido assassinada. Assim, é possível relacionar o motivo pelo qual Ângela foi julgada aos estudos estatísticos sobre a criminalidade feminina, a qual, na visão patriarcal da sociedade, é motivada pela visão de que as mulheres são “merecedoras” do crime. Desse modo, é necessário problematizar essa visão social de que Ângela teria sido assassinada e julgada moralmente pelo tribunal por ser uma mulher que não correspondia aos estereótipos e rotulações machistas da sociedade. 
Episódio 03: Ângela 
O terceiro episódio, “Ângela”, tem como ponto central o aprofundamento da história de Ângela Diniz. Nascida em Belo Horizonte, filha única de um casal extremamente rico, foi muito mimada e criada para ser a maior beldade da cidade, de forma que sua mãe, Maria Do Espirito Santo Diniz, certificava-se que sua filha fosse sempre perfeita, linda e atraente para todos. Dessa maneira, esse comportamento relaciona-se à Teoria da Interação, precisamente ao conceito de boa imagem, sendo ele a forma pela qual um indivíduo é visto pelos demais. Logo, a mãe de Ângela sempre prezava por sua boa imagem, de modo que ela fosse bem vista pelas pessoas de seu círculo social.
Educada no Colégio Santa Marcelina, um dos colégios de freira mais frequentados pela elite de Minas, que ministrava aulas de etiqueta, elegância, formava donas de casa exemplares. A mãe de Ângela, adorava a filha e fazia todas as suas vontades, de modo que se tornava difícil separar o que ela, a mãe, queria do que a própria filha almejava. Maria usava da beleza da filha, sonhando que ela casasse com um homem rico, respeitado e de elevada classe social.
A vida social, nesse contexto, era muito mais importante do que a escola. Então, Ângela abandonou os estudos, sem completar o que seria hoje o ensino médio, para focar em sua vida social. Após sua festa de 15 anos, sua mãe começou a dirigir cada vez mais sua vida, com o objetivo de fazer com que a vida de Ângela fosse cada vez mais perfeita e um espelho para a sociedade. 
Ângela tinha seu casamento marcado com Parker Gilbert para setembro de 1962. Entretanto, existem especulações de que esse noivado teria sido rompido por Maria Diniz, visto que Parker não possuía condições financeiras tão favoráveis. Esse ocorrido também pode ser relacionado ao conceito de imagem e autoestima, abordado na Teoria da Interação Social de Anthony Giddens, uma vez que o casamento entre os dois seria buscado apenas na imagem social e econômica que o noivo possuía, não em suas demais qualidades. 
Então, em consequência de seu noivado ter sido rompido, Ângela casou-se com Milton Villas Boas, um homem 15 anos mais velho de boa condição financeira que, segundo a mãe, lhe garantiria um futuro rico e estimado. O casal era amoroso e possuía uma relação harmoniosa, da qual foram fruto, em sete anos de casamento, três filhos. Entretanto, Ângela não parecia feliz com a vida que levava, parecia apagada, chegando inclusive, em uma entrevista, deixando escapar que possuía pensamentos suicidas.
Ignorando as consequências sociais que recaiam somente nas mulheres, Ângela, buscandoa felicidade, se divorciou de Milton e, pela primeira vez, caia no mundo, voando com as próprias asas, tornando-se dona de si. Depois da separação, Ângela fazia o que queria, não tentava preservar sua imagem e fugia dos padrões sociais, passando a ser conhecida pelo apelido que marcaria sua vida: “Pantera". Ela incorporou esse apelido, assumindo uma postura destemida, pois, apesar de levar uma vida pública, fazia o que queria, sem dar satisfação à ninguém. 
Episódio 04: Três crimes 
No quarto episódio do podcast, é contado o caso do caseiro com a ajuda de pessoas relacionadas a Ângela. O crime relatado é o assassinato de um adolescente negro, que estava com uma faca na mão e com vestígios de sêmen, e cujo corpo foi deixado na rampa de entrada da casa de Ângela. O corpo era de José Avelino dos Santos, que era conhecido como “Zé Preto” e trabalhava como vigia e lavador de carros na casa de Ângela, ou seja, era conhecido por ela e pela família.
Quando seus pais chegaram ao local do crime, sua mãe ligou para Maurício Aleixo, tio de Ângela e advogado da família, e contou para a apresentadora do podcast sob seu ponto de vista o caso do caseiro. A princípio, ela disse ao seu tio que tinha matado Zé Preto, no entanto, o advogado não acreditou nela e começou a fazer perguntas, até que Ângela confessou que não tinha sido ela a assassina do caseiro, mas sim Tuca Mendes, que era casado e tinha um caso com ela. Ele assumiu a responsabilidade, contudo, Ângela estava sendo indicada como corré, pois teria passado a arma do crime para Tuca.
Como Tuca Mendes e Ângela eram bem vistos na sociedade, o crime era relatado no jornal como um tropeço na vida dos dois. Além disso, enquanto José Avelino não era descrito com muitos detalhes, Tuca era descrito com um cuidado especial com a aparência e elegância. É possível comparar o assassinato que Ângela assumiu ter cometido com o assassinato dela própria por Doca Street. Logo, é perceptível que nem a vida de uma mulher e nem a de um homem negro valem muito, tendo em vista que mesmo que Ângela não tenha sido culpada pela morte de Zé Preto, foi julgada pela imprensa e pela opinião pública pelo acontecido. 
No contexto do crime cometido por Tuca Mendes, o sociólogo Anthony Gibbens define crime como uma conduta não conformista, que infringe a lei. O motivo do assassinato não fica evidente no podcast, no entanto segundo Gibbens fatores como apego, compromisso e envolvimento dão às pessoas o sentido de desvio, que consiste em uma ação que transgride as normas comumente defendidas. Outro conceito do autor que pode ser relacionado ao caso do caseiro é o da imagem que fica de Ângela, que é a estima pela qual um indivíduo é visto pelos outros, à medida que ela ganhou uma fama negativa por causa dessa história, não só pela relação com um homem casado, mas também com um menino negro e favelado.
Outrossim, também é possível estabelecer uma seleção entre essa imagem construída de Ângela e a Teoria Interacionista, a qual aponta que o desvio é um fenômeno construído socialmente, de modo que, enquanto alguns grupos são rotulados, outros não são. Dessa forma, a imagem de Ângela, ou seja, seu rótulo, influenciou não só na forma com a qual a ela era vista pela sociedade, mas também no primeiro julgamento de Doca, tendo em vista que a fama negativa dessa história, somada a fama negativa de sua postura, implicou em sua condenação moral. 
Por fim, no episódio, é apontado que outros dois crimes fizeram parte da vida de Ângela. Após o caso, ficou proibida de ter seus filhos com ela, mas em uma visita, trouxe a filha para o Rio de Janeiro, onde morava, contra a decisão judicial e foi acusada de sequestro da própria filha pelos Villas Boas. Além disso, depois de ficar proibida de ver os filhos, vivia entorpecida e, uma vez, chegou a ser detida por posse de maconha, o que fez ela ficar ainda mais mal vista. 
Episódio 05: A Pantera
O quinto episódio, cujo título é “A Pantera”, remete a um apelido que Ângela ficou conhecida. No episódio anterior foi contado sobre os crimes em que ela estava envolvida, mas talvez o pior crime dela seja seu poder sedutor, que é explicado nesse episódio, em conjunto com o efeito que ela tinha sobre os homens que passaram em sua vida. À respeito desse aspecto de sua personalidade, algumas ideias sociológicas de comunicação não-verbal podem ser observadas.
Ela era uma mulher que gerava desconto nos homens pela sua postura descrita como provocante, fascinante e extremamente sedutora. Nesse sentido, gestos e posturas corporais são usados para transmitir ideias, e, segundo amigos, ela gostava de ser admirada, brincar, o que começava apenas a partir de sua presença física. Ademais, dentro do conceito da comunicação não-verbal, a questão do gênero possui grande influência, visto que a percepção de gestos e expressões é diferente para homens e mulheres.
Ibrahim, o colunista que apelidou Ângela de Pantera é justamente com quem ela foi se envolver, um homem inteligente, perspicaz e agressivo. Ela se definiu como alguém que preferia atacar do que ser atacada, então o encontro dos dois era repleto de implicâncias e discussões. De acordo com uma amiga do casal, ela era bem provocadora e temperamental, o que fazia com que Ibrahim apontasse seu revólver para ela diversas vezes. Branca Vianna, outra amiga do casal, afirmou que se não fosse o Doca, Ibrahim seria um forte concorrente a assassino da Ângela, pois, como um homem médio daquela época, foi criado para que tivesse medo de uma mulher que segue seus desejos, e por isso, agia com violência.
Logo, é notável que o comportamento agressivo do colunista diante de uma mulher provocadora como Ângela, foi influenciado pela sua criação. A ideia de interação é o processo pelo qual agimos e reagimos às pessoas ao nosso redor, nesse caso, o modo de reação de Ibrahim pode ser analisado pela abordagem da micro sociologia, que estuda o comportamento dos indivíduos no cotidiano. Além disso, a criminologia também pode analisar as formas comportamentais criminosas, que ficam evidentes no podcast.
Episódio 06: Doca
O sexto episódio, “Doca”, tendo como ponto central a relação de Ângela com Doca, conta como o casal se conheceu, revelando o conturbado início do romance às escondidas, uma vez que ambos encontravam-se comprometidos. O episódio relata, por meio de amigos do casal, como era o relacionamento, o papel que as drogas e a bebida possuíam neste e como as crises de ciúmes de Doca levavam-no à violência.
Antes de envolver-se com Ângela, Doca era casado com Adelita. Existem registros fotográficos dela com um tapa olho, de modo que, apesar de as teorias que afirmam que Doca era violento com ela serem apenas especulação, esse fato é relevante posto que esse comportamento violento foi repetido em seu relacionamento com Ângela. Não obstante, Adelita ao descobrir a traição, culpava Ângela e não seu marido, dizendo que ele havia sido enfeitiçado por ela.
Essa narrativa foi assumida como verdadeira por inúmeros jornais, diversas pessoas e até mesmo, no primeiro julgamento, pelo Poder Judiciário. Esse episódio é repleto de testemunhas de caráter, amigas e amigos do Doca que confirmam o carisma dele e condenam a Ângela, evidenciando que ela era uma mulher libertina, que muitas vezes provocava o marido e, quando bebia, ficava fora de si.
Relatos contam que Ângela apenas desejava uma vida comum e que, ao conhecer Doca, acreditava no relacionamento no qual estava entrando. Ele era pai e homem correto para todos os aspectos da sociedade, sendo possível classificar seu comportamento como conformista em relação aos valores sociais da época. Tais características apenas auxiliaram no momento do julgamento, no qual, a vítima, Ângela Diniz, foi considerada culpada e teve sua imagem deteriorada perante o júri. O que ninguém via, eram as crises de ciúme, os ataques de raiva e o temperamento violento de Doca, descrito em seu livro, Mea Culpa, por ele mesmo. O assassinato chegou a ser descrito como um acidente de percurso por pessoas próximas a ele, algo que havia sidoprovocado por pelo temperamento da Ângela e por seu comportamento libertino. 
Esse fato pode ser relacionado aos dados estatísticos de criminalidade feminina, uma vez que, assim como Ângela, muitas mulheres são culpadas pela violência que lhes é direcionada, simplesmente por comportarem-se de forma distinta ao padrão imposto pela sociedade patriarcal. Nesse sentido, as mulheres, além de serem mortas, violentadas e assediadas, são culpadas por isso, evidenciando, inclusive, a discrepância entre dados oficiais e as verdadeiras experiências dessas mulheres.
O crime foi cometido quando o casal estava em Búzios, de modo que, durante uma briga, Ângela derrubou a bolsa de Doca, o qual pegou de dentro dela uma arma e atirou quatro vezes em sua esposa. É comprovado que a arma travou, dando a Doca tempo para repensar suas ações, de modo que o assassinato não teria sido cometido de maneira passional.
Episódio 07: Quem ama não mata 
O Brasil estava mudando e, o segundo julgamento aconteceu em um momento de abertura do país. A lei de Anistia havia sido promulgada e, com isso, diversos exilados voltaram ao país, trazendo consigo as teorias feministas que mostravam-se cada vez mais fortes no exterior. Desse modo, a pressão por uma verdadeira condenação era muito maior e o veredito alcançado foi uma verdadeira conquista para o movimento contra a violência das mulheres que instalava-se em todo o país, à luz dos recentes assassinatos. Pode-se relacionar este fato a contribuição do direito para o desenvolvimento social, pois este pode ser considerado uma instituição social que, sendo uma das instâncias da estrutura social, objetiva a realidade da sociedade. 
Um ponto importante e decisivo para a repercussão do caso tantos anos depois foi a onda de assassinatos de mulheres. Entretanto, diferentemente da Ângela, essas mulheres possuíam um comportamento conformista: donas de casa fieis a seus maridos, mulheres ideais aos olhos de uma sociedade conservadora. Nesse sentido, Ângela na época, não era a "vítima ideal", por comportar-se de maneira desviante do padrão, de forma que foi fácil taxá-la como uma mulher infeliz que provocou o próprio assassinato, diferentemente das outras duas, que apenas queriam a separação do marido.
Segundo a Teoria Interacionista, desvio é um fenômeno construído socialmente, de maneira que essa teoria questiona como estes são definidos e por qual motivo certos grupos são rotulados como desviantes e outros não. Tal teoria pode ser associada ao caso, uma vez que a sociedade que estabelece o comportamento de Ângela como desviante, marginalizando-o e se utilizando dele como justificativa para o crime cometido.
 Essa mesma teoria faz uso da teoria das janelas para explicar como certas atitudes podem influenciar, e até mesmo incentivar, futuros delitos, de modo que, se a janela fica quebrada, permanece a mensagem de abandono e ocorre o aumento de danos, como pixações, vandalismos. Nesse âmbito, é possível relacioná-la ao presente caso, no passo que, a quase impunidade de Doca no primeiro caso, fez com que futuros agressores não se sentissem ameaçados e a violência doméstica continuasse a aumentar. 
Outro aspecto importante abordado no episódio 7 é a repercussão do movimento feminista em relação ao julgamento de Doca, dado que, a pressão em torno do seu caso acabou fazendo a justiça chegar mais perto de ser alcançada. De maneira a especificar isso, cabe salientar que no primeiro julgamento, Doca foi condenado a dois anos e saiu com sursis. Já no segundo, ele foi condenado a 15 anos de reclusão por homicídio qualificado. 
No quadro desse crime, é importante ressaltar que os meios de comunicação, em relação ao julgamento de um modo geral, exerceram uma função de extrema importância, no sentido de uma certa conscientização da gravidade de se aceitar como costume a tese da legítima defesa da honra. Dessa forma, o julgamento foi simbólico e serviu de incentivo para outros trabalhos maiores, como o Centro da Defesa da Mulher em Minas Gerais, onde passou a se chamar “SOS Mulher”.
Dessa maneira, é possível observar uma normatização desses comportamentos e da contribuição do direito para o desenvolvimento social. Nesse sentido, segundo Peter Berger, sociólogo e teólogo, a atividade humana pressupõe a elaboração de hábitos, os quais, quando repetidos de forma regular e padronizada, formam instituições. Logo, o comportamento dos movimentos feministas, reivindicando a legitimação de seus direitos, fez com que esses direitos fossem consagrados pelas normas do ordenamento jurídico, instituindo-os na sociedade. À vista disso, evidencia-se que o direito possui um papel fundamental para o desenvolvimento social, tendo em vista que, por meio dele, são normatizadas as lutas de grupos marginalizados, fazendo com que a realidade social seja marcada pela justiça.
É interessante mencionar que o disque denúncia era controlado apenas por feministas, e esse canal servia apenas como uma tentativa de incentivo para que as mulheres vítimas de violência pudessem de fato denunciar os seus agressores. A situação-problema enfrentada na época era a falta de coragem das vítimas de denunciarem de fato a situação, dado que, ao chegar nas delegacias elas eram novamente humilhadas e ofendidas. Esse aspecto pode ser relacionado com a Teoria Positivista e Funcionalista, onde o crime é produto das tensões estruturais e da falta de regulação moral. Nesse sentido, as metas são de promover com que as vítimas passem a tomar providências contra os agressores, mas há a falta de oportunidades para isso, além do ambiente não ser o mais funcional, existindo, dessa maneira, um desencontro entre a meta valorizada na sociedade e os meios.
De modo a finalizar o episódio 7, é necessário mencionar que em uma entrevista feita para Ângela, é perguntado a ela o que achava sobre o “women’s lib”, que é women’s liberation, um termo antigo para o termo feminista. Contudo, ela rejeita em vida o próprio movimento que a defenderia e que luta pela sua memória. Poderia ser mencionado que ela não viveu o suficiente para ver o fortalecimento desse movimento e ser contagiada por ele, porém é notório que até os dias de hoje há muitas mulheres que pensam contra o feminismo. Sob essa perspectiva, é importante ressaltar que o feminismo é a luta pelos direitos de todas as mulheres, mesmo por aquelas que são contra o movimento, dado que, independente da conscientização, muitas mulheres são mortas simplesmente pelo seu sexo.
Episódio 08: Rua Ângela Diniz 
No início do episódio 8 é retratada uma reportagem na Tribuna da Imprensa, a qual aborda um grupo de mulheres que lutam contra a violência doméstica. Trata-se do grupo SOS Mulher, o qual discorre sobre as agressões que as mulheres sofrem, desde de ataques físicos até discriminação no ambiente de trabalho. Essa situação pode relacionar-se com os estudos estatísticos acerca da criminalidade feminina, onde os crimes mais comumente sofrida pelas vítimas dizem respeito ao estupro, a violência doméstica e ao assédio. 
É importante ressaltar que a carta enviada ao jornal aborda de maneira explícita o preconceito em relação a esse grupo, onde é dito que essas mulheres que participam desse ajuntamento são desocupadas e desprovidas de sexo, sendo esse o motivo de revolta contra impetualidades dos maridos para com as esposas. Branca Moreira Alves demonstra a sua indignação sobre esse pensamento, uma vez que a mulher deve ter o papel de ser bem comportada para que não seja agredida por um homem. Desse modo, pode-se relacionar também a questão da orientação em relação à criminalidade feminina, dado que a mulher deve ter cuidados dobrados e especiais, pois, caso aconteça algo, ela passará a se tornar “merecedora” daquilo. 
Um outro aspecto importante mencionado no episódio são as reflexões acerca do julgamento do Doca, que expressa a maneira pela qual a sociedade brasileira resolve as relações entre os sexos. Nesse âmbito, o sexo masculino, representado então por Raul Fernando do Amaral Street, pode punir impunentemente uma mulher quenão não corresponde ao seu papel tradicional. 
Nas entrevistas acerca do movimento “Quem Ama Não Mata” é objetivado o final do argumento da legítima defesa da honra que, como foi abordado anteriormente no episódio 2, nunca constou no Código Penal, porém era um ponto estratégico nas fundamentações dos advogados. Nesse sentido, apesar de o julgamento ter propiciado um símbolo importante no movimento do combate à violência da mulher, ainda não era o suficiente para a sua extinção de fato. 
Sobre esse aspecto, João Batista Cardoso, advogado criminal, abordou sobre o caso de João Lopes, o qual assassinou a sua esposa que o estava traindo e foi absolvido em Apucarana, em 1988. O argumento dado pelo advogado foi também o da legítima defesa da honra, sendo esse um caso que foi levado até a novo júri, havendo grande mobilização nacional, dado que o Superior Tribunal de Justiça promoveu dois votos de ministros reconhecendo a existência social desse argumento. Essa decisão aconteceu em 1991, porém o advogado perdeu, dado que três dos cinco votos foram contrários a essa ideia. 
Ainda sobre o argumento da legítima defesa da honra, percebe-se durante o podcast que esse não é mais usado em cidades grandes, dada a sua ilegitimidade. Após uma década do segundo julgamento de Doca, foi consagrada a ideia de que um homem não pode defender a sua honra atacando uma mulher. Todavia, é perceptível que ainda há resquícios desse tipo de pensamento na sociedade e na percepção dos fatos, sendo essa uma ferramenta na qual a defesa utiliza para obter outros tipos de benefício em casos de eventual condenação do réu. 
O parágrafo primeiro do artigo 121 do Código Penal descreve que, se o agente comete um crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Desse modo, percebe-se que isso pode ser uma tática para utilização nas reduções de pena caso os jurados reconheçam que o réu tenha agido dessa maneira. Trata-se, portanto, de um homicídio privilegiado, o qual sempre existiu e sempre é explorado pela defesa em casos de feminicídio para atenuar a responsabilidade do agressor, de modo que os dados estatísticos sobre a criminalidade feminina passam a ter ainda mais números, tendo em vista essa visão machista que se encontra enraizada nas correntes sociais.
Um dos assuntos destacados nesse episódio diz respeito à Lei do Feminicídio de 2015, que facilitou o procedimento de estender o feminicídio à homicídio qualificado. Dessa maneira, o simples fato de o crime ter acontecido nas circunstâncias objetivadas pela lei já oferece sua qualificação, sendo essas possuintes de pena mais grave. Assim, é possível relacionar essa lei com o conceito da confiabilidade das instituições e segurança jurídica, onde o papel do direito encontra-se mais como uma tentativa de prevenção do que controle do feminicídio, no intuito de haver uma reeducação na sociedade.
É de ímpeto valor dizer que a maior parte dos feminicídios registrados no país possui como vítimas mulheres pretas ou pardas. Nesse sentido, pode-se atribuir novamente a Teoria Interacionista, segundo a qual o desvio é um fenômeno construído socialmente e, nesse caso, está intimamente ligado à questão racial e aos estereótipos de que esse grupo é o principal agente dos crimes.
Além disso, é dito sobre a questão das prisões. No art. 1º da Lei de Execução Penal brasileira diz que a prisão serve para proporcionar condições para a harmônica integração social do indivíduo. Há uma reflexão a respeito desse objetivo carcerário por parte da população, dado que o próprio Evandro Lins e Silva, advogado do Doca no primeiro julgamento, sempre se opôs à pena de reclusão, alegando que a prisão não regenera ninguém. Pode-se fazer um paralelo com a expressão de pensamento do advogado com o conceito de anomia abordado por Durkheim, onde o colapso da vida tradicional na sociedade moderna propicia a perda da solidariedade dos indivíduos.
Como alternativa a esse tipo de problemática, há a figura da juíza criminal Catarina Corrêa, que coordena o programa de justiça restaurativa do Distrito Federal e explica sobre o papel dessa forma de justiça. Desde o princípio é evidente que será abordado uma visão diferenciada do conceito usual de justiça e castigo. Assim, é proposto uma mudança sobre o sistema prisional, de modo que deve ser feita uma audiência de conciliação onde a vítima entenderia melhor o ofensor e vice-versa. O fato do agressor participar desses tipos de audiência pode não possuir nenhum impacto em sua pena, porém pode ser de grande importância na vida dele e na da vítima, ou da família dela. 
Essa situação mostra a contribuição do direito para o desenvolvimento social, dado que ele pode antecipar-se à realidade, propondo alternativas e regulando situações não definidas socialmente. Dessa maneira, o direito, através dessa proposta de justiça restaurativa, contribuiria para a continuidade da solidariedade.

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