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22 Unesp 2019 Leia o trecho do ensaio “A transitorieda- de”, de Sigmund Freud (1856-1939), para responder à questão. Algum tempo atrás, fiz um passeio por uma rica paisa- gem num dia de verão, em companhia de um poeta jovem, mas já famoso. O poeta admirava a beleza do cenário que nos rodeava, porém não se alegrava com ela. Era incomo- dado pelo pensamento de que toda aquela beleza estava condenada à extinção, pois desapareceria no inverno, e assim também toda a beleza humana e tudo de belo e nobre que os homens criaram ou poderiam criar. Tudo o mais que, de outro modo, ele teria amado e admirado, lhe parecia despojado de valor pela transitoriedade que era o destino de tudo. Sabemos que tal preocupação com a fragilidade do que é belo e perfeito pode dar origem a duas diferentes tendências na psique. Uma conduz ao doloroso cansaço do mundo mostrado pelo jovem poeta; a outra, à rebelião contra o fato constatado Não, não é possível que todas essas maravilhas da natureza e da arte, do nosso mundo de sentimentos e do mundo lá fora, venham realmente a se desfazer. Seria uma insensatez e uma blasfêmia acreditar nisso. Essas coisas têm de poder subsistir de alguma forma, subtraídas às influências destruidoras. Ocorre que essa exigência de imortalidade é tão claramente um produto de nossos desejos que não pode reivindicar valor de realidade. Também o que é doloroso pode ser verdadeiro. Eu não pude me decidir a refutar a transitoriedade universal, nem obter uma exceção para o belo e o perfeito. Mas contestei a visão do poeta pes simista, de que a transitoriedade do belo implica sua desvalorização Pelo contrário, significa maior valorização! Valor de transitoriedade é valor de raridade no tempo. A limitação da possibilidade da fruição aumenta a sua preciosidade. É incompreensível, afirmei, que a ideia da transitoriedade do belo deva perturbar a alegria que ele nos proporciona Quanto à beleza da natureza, ela sempre volta depois que é destruída pelo inverno, e esse retorno bem pode ser considerado eterno, em relação ao nosso tempo de vida. Vemos desaparecer a beleza do rosto e do corpo humanos no curso de nossa vida, mas essa brevidade lhes acres- centa mais um encanto. Se existir uma flor que floresça apenas uma noite, ela não nos parecerá menos formosa por isso. Tampouco posso compreender por que a beleza e a perfeição de uma obra de arte ou de uma realização intelectual deveriam ser depreciadas por sua limitação no tempo Talvez chegue o dia em que os quadros e estátuas que hoje admiramos se reduzam a pó, ou que nos suceda uma raça de homens que não mais entenda as obras de nossos poetas e pensadores, ou que sobrevenha uma era geológica em que os seres vivos deixem de existir sobre a Terra; mas se o valor de tudo quanto é belo e perfeito é determinado somente por seu significado para a nossa vida emocional, não precisa sobreviver a ela, e portanto independe da duração absoluta. (Introdução ao narcisismo, 2010. Adaptado.) a) Explique sucintamente a diferença entre a visão de Freud e a visão do jovem poeta sobre a transi- toriedade do belo. b) Transcreva do segundo parágrafo uma oração em que a ocorrência de vírgula indica a supressão de um verbo. Identifique o verbo suprimido nessa oração 23 Efomm 2018 Passeio à Infância Primeiro vamos lá embaixo no córrego; pegaremos dois pequenos carás dourados. E como faz calor, veja, os lagostins saem da toca Quer ir de batelão, na ilha, comer ingás? Ou vamos ficar bestando nessa areia onde o sol dourado atravessa a água rasa? Não catemos pedrinhas redondas para atiradeira, porque é urgente subir no morro; os sanhaços estão bicando os cajus maduros É janeiro, grande mês de janeiro! Podemos cortar folhas de pita, ir para o outro lado do morro e descer escorregando no capim até a beira do açude. Com dois paus de pita, faremos uma balsa, e, como o carnaval é no mês que vem, vamos apanhar tabatinga para fazer formas de máscaras. Ou então vamos jogar bola- -preta: do outro lado do jardim tem um pé de saboneteira. Se quiser, vamos. Converta-se, bela mulher estranha, numa simples menina de pernas magras e vamos passear nessa infância de uma terra longe. É verdade que jamais comeu angu de fundo de panela? Bem pouca coisa eu sei: mas tudo que sei lhe ensino. Estaremos debaixo da goiabeira; eu cortarei uma forquilha com o canivete. Mas não consigo imaginá-la assim; talvez se na praia ainda houver pitangueiras Havia pitangueiras na praia? Tenho uma ideia vaga de pitangueiras junto à praia Iremos catar conchas cor-de rosa e búzios crespos, ou armar o alçapão junto do brejo para pegar papa-capim. Quer? Agora devem ser três horas da tarde, as galinhas lá fora estão cacarejando de sono, você gosta de fruta-pão assada com manteiga? Eu lhe dou aipim ainda quente com melado. Talvez você fosse como aquela menina rica, de fora, que achou horrível nosso pobre doce de abóbora e coco. Mas eu a levarei para a beira do ribeirão, na sombra fria do bambual; ali pescarei piaus. Há rolinhas. Ou então ir descendo o rio numa canoa bem devagar e de repente dar um galope na correnteza, passando rente às pedras, como se a canoa fosse um cavalo solto. Ou nadar mar afora até não poder mais e depois virar e ficar olhando as nuvens brancas. Bem pouca coisa eu sei; os outros meninos riram de mim porque cortei uma iba de assa- -peixe. Lembro-me que vi o ladrão morrer afogado com os soldados de canoa dando tiros, e havia uma mulher do outro lado do rio gritando. Mas como eu poderia, mulher estranha, convertê-la em menina para subir comigo pela capoeira? Uma vez vi uma urutu junto de um tronco queimado; e me lembro de muitas meninas. Tinha uma que era para mim uma adoração. Ah, paixão da infância, paixão que não amar- ga. Assim eu queria gostar de você, mulher estranha que ora venho conhecer, homem maduro. Homem maduro, ido e vivido; mas quando a olhei, você estava distraída, meus olhos eram outra vez os encantados olhos daquele menino feio do segundo ano primário que quase não tinha coragem de olhar a menina um pouco mais alta da ponta direita do banco. F R E N T E 1 19 Adoração de infância Ao menos você conhece um passarinho chamado saíra? E um passarinho miúdo: ima- gine uma saíra grande que de súbito aparecesse a um menino que só tivesse visto coleiros e curiós, ou pobres cambaxirras Imagine um arco-íris visto na mais remota infância, sobre os morros e o rio. O menino da roça que pela primeira vez vê as algas do mar se balançando sob a onda clara, junto da pedra. Ardente da mais pura paixão de beleza é a adoração da infância. Na minha adolescência você seria uma tor- tura Quero levá la para a meninice Bem pouca coisa eu sei; uma vez na fazenda riram: ele não sabe nem passar um barbicacho! Mas o que sei lhe ensino; são pequenas coisas do mato e da água, são humildes coisas, e você é tão bela e estranha! Inutilmente tento convertê-la em menina de pernas magras, o joelho ralado, um pouco de lama seca do brejo no meio dos dedos dos pés Linda como a areia que a onda ondeou. Saíra grande! Na adolescência me torturaria; mas sou um homem madu ro. Ainda assim às vezes é como um bando de sanhaços bicando os cajus de meu cajueiro, um cardume de peixes dourados avançando, saltando ao sol, na piracema; um bambual com sombra fria, onde ouvi silvo de cobra, e eu quisera tanto dormir. Tanto dormir! Preciso de um sossego de beira de rio, com remanso, com cigarras Mas você é como se houvesse demasiadas cigarras cantando numa pobre tarde de homem Julho, 1945 Crônica extraída do livro “200 crônicas escolhidas”, de Rubem Braga. Texto adaptado à nova ortografia Assinale a opção em que, conforme a norma culta, NÃO é possível acrescentar vírgula ao período. A Primeiro vamos lá embaixo (...). Agora devem ser três horas da tarde (...). C Na minha adolescência você seria uma tortura. Na adolescência me torturaria; mas sou um ho- mem maduro. E Inutilmente tento convertê-la em menina de pernas magras (...). 24 Em uma cidade pequena, o prefeito Joselino Natal mandou colocar o seguintecartaz: Cresça, trabalhe e Joselino Natal pague os impostos Uma semana após o cartaz ter sido colocado, um ci- dadão resolveu acrescentar uma vírgula no cartaz, que cou assim: Cresça, trabalhe e Joselino Natal pague os impostos a) Que interpretação o texto passa a ter após a co- locação da vírgula? b) Explique a mudança de interlocutor do ponto de vista gramatical Pontuação I É importante recordar que a língua é de natureza oral e que é, sobretudo, uma combinação de sons (ainda hoje temos as línguas ágrafas sem escrita). II. A pontuação é uma tentativa de reproduzir as pausas da linguagem oral. No início, a escrita não apresentava espaços (o espaço entre uma palavra e outra é marcado pela pausa na linguagem oral). Eventualmente, inseriu se um ponto depois da palavra e, posteriormente, a vírgula. III. Os sinais de pontuação apareceram no séc. XVI (primeiro o ponto, depois a vírgula e, posteriormente, o ponto e vírgula). IV. A ortografia é produto de um acordo (tem legalidade) – até o séc. XIX era apenas uma tendência. Todavia, a pontuação não possui esse caráter legal; o que temos são grandes tendências, ou seja, uma regularidade (regra, regularidade, régua: espaços regulares). V A pontuação é um demarcador de relação entre as frases; sua funcionalidade é dar sentido e expressividade ao texto Segundo estatísticas linguísticas, em um texto escrito teríamos 70% de vírgulas. Texto complementar Vírgula – regra geral I A associação lógica entre as palavras pode ser concebida como um critério (regra) geral: se entre duas palavras vizinhas não houver vírgula, é porque estão em relação, em associação lógica (AB); todavia, se entre elas houver uma vírgula, é porque não estão em associação. Em suma, A B = há associação lógica. A, B = não há associação lógica A regra geral acima descrita explica a ausência da vírgula entre certos termos da oração, por exemplo: a) não há vírgula entre sujeito (A) e predicado (B), pois estão em asso- ciação lógica. Resumindo LÍNGUA PORTUGUESA Capítulo 13 Pontuação20 b) não há vírgula entre verbo (A) e objeto (B), pois estão em associação lógica. c) não há vírgula entre o adjunto adnominal (A) e o núcleo (B), pois estão em associação lógica. d) não há vírgula entre o nome (A: substantivo abstrato, adjetivo ou advér- bio) e o complemento nominal (B), pois estão em associação lógica Por ser uma regra geral, convém observar as demais regras. Vírgula – regra geral II A intercalação também será tratada como regra geral, por isso, convém observar algumas exceções – as orações subordinadas adjetivas restritivas in- tercaladas, por exemplo, não recebem a vírgula (vide item das subordinadas). A intercalação pode ser traduzida como uma interrupção sintática; a ordem natural (sujeito + verbo + objeto (+ adjunto adverbial) tem sua sequência interrompida por uma palavra, expressão, oração etc. Se retirarmos o ter- mo intercalado, a sequência natural será recuperada. O termo intercalado receberá duas vírgulas (uma antes e outra depois). Veja os principais casos: y conjunção intercalada y adjunto adverbial intercalado. y oração intercalada y aposto explicativo intercalado. y predicativo do sujeito y expressões de caráter explicativo. A vírgula no período simples: objeto pleonástico A colocação do objeto antecedendo o objeto é um recurso expressivo, dá-se ênfase ao complemento do verbo. As gramáticas, todavia, não registram a vírgula nesses casos, mas observa-se a sua ocorrência em alguns textos. O consenso em torno da vírgula no que tange à topicalização do objeto ocorre quando o enunciado utiliza dois objetos: o objeto pleonástico. Nesses casos, coloca-se a vírgula após o primeiro objeto. Os sonhos, eu os busquei loucamente. OD OD Aos famintos, dei-lhes livros velhos. OI OI A vírgula no período simples: o adjunto adverbial 1. Iniciando a oração. No início do período ou da oração, o adjunto adverbial recebe a vírgula, salvo se for um advérbio de pequeno corpo 2 No meio da oração. Nessa posição, o adjunto adverbial (sobretudo se for longo) receberá duas vírgulas. Na realidade, a colocação do adjunto adverbial no meio do período pode ser caracterizada como uma intercalação. 3. No final da oração. No final do período ou da oração, o adjunto adverbial dispensa a vírgula, a não ser que se queira enfatizá-lo. 4. Caso facultativo Segundo Celso Cunha, em Gramática da Língua Portuguesa, quando os adjuntos adverbiais são de pequeno corpo (um advérbio, por exemplo), costuma se dispensar a vírgula A vírgula pode ser utilizada quando se pretende realçá los A vírgula no período simples: predicativo do sujeito O uso da vírgula para o predicativo do sujeito segue praticamente o mesmo raciocínio observado no emprego da vírgula para o adjunto adverbial. Repare. 1. No início da oração. Nessa posição, a vírgula é obrigatória. 2 No meio da oração, após o verbo. Depois do verbo, o predicativo do sujeito pode receber a vírgula ou não; mas, se ele estiver colocado após o sujeito, antes do verbo, deve-se pontuar, já que a omissão das vírgulas implicará mudança de sentido e de função sintática. 3 No fim da oração No final da oração (com verbos transitivos ou intransitivos), ou após o verbo de ligação, não se utiliza a vírgula para o predicativo do sujeito. A vírgula no período simples: vocativo Exceto na poesia, em que a omissão da vírgula é possível, o vocativo sempre estará separado por vírgula, em qualquer posição. A vírgula no período composto: as coordenadas 1. As coordenadas assindéticas são separadas por vírgula. 2 As conjunções que iniciam as orações coordenadas sindéticas adver- sativas, explicativas e conclusivas são precedidas de vírgula 3. Algumas conjunções coordenativas sindéticas adversativas e conclusivas (contudo, entretanto, no entanto, todavia, portanto, por conseguinte etc.) costumam, para efeito de ênfase, serem seguidas também de vírgula. 4 Nas coordenadas sindéticas alternativas, as correlações conjuntivas (ou ou / ora ora / quer quer) são separadas por vírgula na mudança de oração. 5. Nas orações coordenadas, o “e” poderá receber vírgula quando os sujeitos das orações forem diferentes (caso facultativo), quando a con- junção estabelecer uma oposição (caso facultativo) ou quando houver a repetição da conjunção. 6 Quanto às correlações conjuntivas (tanto. quanto / não só mas tam bém), costuma-se não utilizar a vírgula, mas a sua presença é observada em muitos textos. A vírgula no período composto: subordinadas substantivas Em ordem direta (a principal iniciando a oração), não há vírgula; em ordem indireta (a subordinada iniciando a oração), embora não seja consenso, costuma-se empregá-la. A vírgula no período composto: subordinadas adjetivas 1 Restritiva A adjetiva restritiva não recebe a vírgula; sua função é delimitar, res tringir o antecedente. 2. Explicativa A adjetiva explicativa recebe a vírgula (se estiver no meio do perío do, fica entre vírgulas); sua função é compartilhar um saber sobre o antecedente A vírgula no período composto: subordinadas adverbiais Separam-se por vírgula as subordinadas adverbiais, principalmente quando antepostas à principal. A vírgula na enumeração de palavras e orações A vírgula separa elementos de mesma função sintática. y orações; y palavras. A vírgula em elementos de valor explicativo Recebem a vírgula palavras ou expressões explicativas, retificativas, conclu- sivas e continuativas (por exemplo, isto é, digo, então, a saber, com efeito, ou melhor, além disso etc.) F R E N T E 1 21
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