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Atendimento socioassistencial a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto - LA e PSC Modulo I Programa de Capacitação do Estado de Minas Gerais 2022/2023 1 Autora: Karla Luciano. Coordenação Pedagógica: Maysa Nuermberg de V. Costa. Diagramação: Luara de Carvalho. Revisão: Heitor Vinicius Pereira da Mata. Revisão Técnica: Juliannie Ester Nunes da Silva e Rafael Henrique Roquette Andrade. 2 Lista de Siglas: ABMP: Associação Brasileira de Magistrados e Promotores da Infância e Juventude CONANDA: Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente COVID 19: doença por coronavírus 2019 CRAS: Centros de Referência de Assistência Social CREAS: Centro de Referência Especializado de Assistência Social ECA: Estatuto da Criança e do Adolescente FONACRIAD: Fórum Nacional de Organizações Governamentais de Atendimento à Criança e ao Adolescente LA: Liberdade Assistida MSE-MA: Medida Socioeducativa Educativa em Meio Aberto PAEFI: Serviço de Proteção e Atendimento às famílias e Indivíduos PAIF: Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família PEC: Proposta de Emenda Constitucional PNAS: Política Nacional de Assistência Social PSC: Prestação de Serviço à comunidade PSE: Proteção Social Especial SEDH: Secretaria Especial dos Direitos Humanos SGD: Sistema de Garantia de Direitos SINASE: Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo SPDCA: Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente SUAS: Sistema Único de Assistência Social UNICEF: Fundo das Nações Unidas para a Infância 3 Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................................................................ 4 CARTA AS/AOS TRABALAHDORAS/ES DO SERVIÇO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA EM MEIO DE ABERTO DE LA E PSC ................................................... 5 1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO - SINASE ....................................................................................... 6 2. SERVIÇO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE (PSC) E AS EQUIPES DE ATENDIMENTO ................................................................................................................ 13 3. REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 24 4 APRESENTAÇÃO O presente material tem como objetivo contribuir para o processo de formação continuada, promovida pela SEDESE, das trabalhadoras e dos trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social - SUAS do estado de Minas Gerais e tem, como temática, o Atendimento Socioassistencial a adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto. A formação continuada faz parte de uma proposta de abordagem de diferentes temáticas identificadas como necessárias e que vem sendo tratadas de forma sistemática, buscando abranger um número significativo de gestores(as), conselheiros(as) e trabalhadores(as) do SUAS, visando a qualificação desta importante política pública. As ações realizadas pela SEDESE vem de encontro com a descentralização político administrativa, enquanto uma das diretrizes do SUAS estabelecida na LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social de 1993 e NOB/SUAS - Norma Operacional Básica do SUAS de 2012, por meio das quais são definidas responsabilidades e atribuições a serem compartilhadas entre os entes federados, sendo parte das responsabilidades dos estados a assessoria e apoio técnico aos municípios nos processos de gestão e execução da Política de Assistência Social. No primeiro módulo teremos os seguintes conteúdos: 1. Contextualização Sinase; 2. Política de Assistência Social: Proteção Social Básica e Especial; 3. Serviço de MSE em meio aberto PSC e LA; 4. Atribuições da equipe do CREAS; 5. Atendimento Familiar; 6. A Vigilância Socioassistencial; 7. Mapeamento de Parcerias no território. Boa Leitura e bons estudos!! 5 CARTA AS/AOS TRABALAHDORAS/ES DO SERVIÇO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA EM MEIO DE ABERTO DE LA E PSC Caros/as colegas de trabalho, peço licença para iniciarmos este dialogo sobre o Serviço de Medida Socioeducativa, eu me chamo Karla, sou Assistente Social, trabalhadora do SUAS aqui na cidade de Foz do Iguaçu, no Paraná, isso mesmo a terrinha das Cataratas ou então O destino do Mundo, como bem o turismo local gosta de usar para o marketing. Eu atualmente trabalho em um Centro de Referência Especializado e de Assistência Social - CREAS, estou na coordenação desta unidade de atendimento do SUAS há 3 anos, local este que executamos os Serviços de Medida Socioeducativa em Meio Aberto/ MSE-MA e o PAEFI. Iremos buscar neste período do curso resgatar alguns conceitos, e criar outros, resgatar algumas discussões que ficaram obsoletas em nosso cotidiano de trabalho, especialmente depois do período mais crítico da Pandemia, pois é esse fenômeno que veio como uma avalanche e nos mostrou o quanto o nosso sistema de proteção é frágil. Enfim, iremos transitar por esse diálogo, sem rótulos, buscando em nós mesmas/os as respostas para muitas inquietações, mas com a certeza que não estamos sozinhas/os neste mundão. Fiquem bem, um abraço fraterno e até logo. Karla Luciano 6 1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO - SINASE Para iniciar nosso diálogo, iremos começar com duas perguntas que retomaremos ao final de nossas aulas para então sabermos se chegamos a uma resposta. O que é socioeducação para além dos nossos manuais e cadernos de orientação? E como fazemos socioeducação em Meio Aberto? No Brasil, são consideradas inimputáveis pessoas menores de 18 anos de idade, a eles são aplicadas leis especiais, regras contidas na Constituição Federal de 1988 em seu Art. 227, que garantem o pleno e formal conhecimento da atribuição do ato infracional, a igualdade na relação processual e a defesa técnica por profissional habilitado, e a obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento no decorrer de todo o procedimento socioeducativo e, em particular, por ocasião da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade. Instituído pela Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, se opõem a um passado de controle e de exclusão social sustentado na Doutrina da Proteção Integral. O ECA expressa direitos da população infantojuvenil brasileira, pois afirma o valor intrínseco da criança e do adolescente como ser humano, a necessidade de respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento e o reconhecimento da sua situação de vulnerabilidade, o que as tornam merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado; devendo este atuar mediante políticas públicas e sociais na promoção e defesa de seus direitos. A adoção dessa doutrina de Proteção Integral em substituição ao velho modelo da situação irregular do Código de Menores – Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979, acarretou mudanças de referenciais e paradigmas com reflexos, inclusive, no trato da questão infracional. No plano legal, essa substituição representou uma opção pela inclusão social do adolescente em 7 conflito com a lei e não mais um mero objeto de intervenção, como era no passado. Desta forma, adolescentes ficam sujeitos à aplicação de Leis especiais; o ECA prevê que para fins de aplicação de medida socioeducativa o(a) autor(a) do ato infracional tem que ter 12 anos completos, sendo assim, pessoas menores dessa faixa etária não cometem ato infracional, a esses são aplicadas medidas de proteção quando se identifica seu envolvimento com açõesque lhe trarão prejuízos. A Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei do SINASE, ratificam e consagram princípios e diretrizes contidos em outros documentos internacionais que lhes são precedentes ou contemporâneos, com destaque a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (1989); as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude (1985); Regras de Beijing (1985); as Regras Mínimas das Nações Unidades para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade (1990); as Diretrizes das Nações Unidas para Prevenção da Delinquência Juvenil Diretrizes de Riad (1990); e as Estratégias- Modelo e Medidas Práticas das Nações Unidas para acabar com a Violência contra Crianças na Prevenção do Crime e Justiça Criminal, resolução da Assembleia-Geral 69/194 (2014). O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), responsável por articular, fomentar e fiscalizar a política pública, voltada para a população infantojuvenil, iniciou, em 2002, uma série de reuniões para articular e debater, com o Sistema de Garantia de Direito, ações voltadas para os(as) adolescentes que praticam ato infracional, com o intuito de garantir maior proteção, tendo como princípio a prioridade absoluta. Participaram desses encontros a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH/SPDCA), em parceria com a Associação Brasileira de Magistrados e Promotores da Infância e Juventude (ABMP) e o Fórum 8 Nacional de Organizações Governamentais de Atendimento à Criança e ao Adolescente (FONACRIAD). Essas reuniões tinham como propósito debater e avaliar, com os operadores do Sistema de Garantia de Direito (SGD), a proposta de lei de execução de medidas socioeducativas da ABMP, bem como a prática pedagógica desenvolvida nas Unidades socioeducativas, com vistas a subsidiar o CONANDA na elaboração de parâmetros e diretrizes para a execução das medidas socioeducativas. Como fruto desses encontros foi constituído dois grupos de trabalho específicos que tinham como tarefa, elaborar um projeto de lei de execução de medidas socioeducativas e a elaboração de um documento teórico- operacional para execução dessas medidas (BRASIL, 2006). De acordo com Brasil: Em fevereiro de 2004 a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), por meio da Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (SPDCA), em conjunto com o Conanda e com o apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), sistematizaram e organizaram a proposta do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Em novembro do mesmo ano promoveram um amplo diálogo nacional com aproximadamente 160 atores do SGD, que durante três dias discutiram, aprofundaram e contribuíram de forma imperativa na construção deste documento, que se constituirá em um guia na implementação das medidas socioeducativas. (2006, p. 16), O SINASE, instituído pela Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, regulamenta a execução das medidas socioeducativas aplicadas aos adolescentes que praticam ato infracional, por meio de um coletivo de regras, princípios e diretrizes. Portanto as medidas socioeducativas têm por objetivos: I - a responsabilização do adolescente quanto às consequências lesivas do ato infracional, sempre que possível incentivando a sua reparação; II - a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais, por meio do cumprimento de seu plano individual de atendimento; III - a desaprovação da conduta infracional, efetivando as disposições da sentença como parâmetro máximo de privação de liberdade ou restrição de direitos, observados os limites previstos em lei. (BRASIL, 2012, art. 1º § 2). 9 Para que tenhamos êxito na medida socioeducativa, sua intervenção precisa dispor de um conjunto articulado de ações das diversas políticas públicas setoriais, que reconhecem e compreendam as particularidades do público do atendimento socioeducativo, destacando que os(as) adolescentes que se encontram em situação de vulnerabilidade social, são aqueles(as) que possuem menor reconhecimento social e os(as) que estão cumprindo medidas socioeducativas, o que pode ter sua situação de vulnerabilidade agravada devido a estigmatização social (BRASIL, 2012). Desta forma, quando dialogamos e refletimos acerca das categorias: adolescente, ato infracional e medida socioeducativa; muitas vezes logo pensamos na responsabilização do(a) adolescente devido ao ato infracional cometido, sua punição e o que iremos exigir dele(a) enquanto pessoa. Como entender essa ação do(a) adolescente sem perder de vista que é uma pessoa em situação peculiar de desenvolvimento, um sujeito constitucionalmente concebido como prioridade absoluta, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente? A análise construída parte de um olhar profissional inquieto, reflexo do cotidiano de trabalho, que se opõe às desigualdades reproduzidas pelo sistema e que cerceiam liberdades desses sujeitos, através da ausência de oportunidades efetivas para o seu desenvolvimento, culpabilizando e punindo-os pelas ações que quase sempre são arquitetadas por algum adulto explorador, derivados das precarizações e dificuldades, produzidas pela ausência de um Estado que produza proteção social. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), traz em seu Título III, todo o caminho que deve ser seguido a partir do momento em que se identifica a prática de um ato infracional, sendo complementado, posteriormente, pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), que regulamenta todo o atendimento devido ao(a) adolescente que cometeu ato infracional. 10 Deste modo, a própria lei já apresenta as bases conceituais que devem nortear tanto o que é a socioeducação, como o que deve ser organizado em termos de medida socioeducativa em meio aberto. Partindo da base legal, em especial da Resolução 109, de 11 de novembro de 20091, do Conselho Nacional de Assistência Social, a Medida Socioeducativa Educativa em Meio Aberto (MSE-MA) trata-se de um serviço socioassistencial que: Tem por finalidade prover atenção socioassistencial e acompanhamento a adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, determinadas judicialmente. Deve contribuir para o acesso a direitos e para a ressignificação de valores na vida pessoal e social dos adolescentes e jovens. Para a oferta do serviço faz-se necessário a observância da responsabilização face ao ato infracional praticado, cujos direitos e obrigações devem ser assegurados de acordo com as legislações e normativas específicas para o cumprimento da medida. (BRASIL, 2014, p. 34). Portanto, promover atenção socioassistencial, enquanto serviço da Política de Assistência Social, implica pensar ações que permitam a este(a) adolescente ressignificar seus atos, considerando, desde os condicionantes que o(a) levaram até o ato infracional, até os processos que deverão ser mobilizados para superar essa condição, nos rumos da ressocialização pretendida. Nessa direção, urge entender o(a) adolescente e sua incompletude enquanto sujeito em desenvolvimento, atento(a) à incidência de situações de ordem familiar, afetiva, social, comunitária, emocional, psicológica, educacional e, a partir de então, prospectar ações articuladas que permitam ao(a) adolescente se perceber como sujeito de direito, como parte essencial de sua própria história e, assim, decidir mudar sua forma de ser e estar neste mundo. Nos termos legais, segundo Volpi, (2015, p. 17), as medidas socioeducativas constituem-se em condição especial de acesso a todos os 1 RESOLUÇÃO Nº 109, DE 11 DE NOVEMBRO DE 2009 - Aprova a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. 11 direitos sociais, políticos e civis. Todavia, o que seapresenta no cotidiano do trabalho com adolescentes, em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto, são vidas permeadas pela vulnerabilidade, risco social e pessoal. No ano de 2020, com a pandemia do Covid-19, esse cenário subtraiu vidas e ceifou direitos de grupos populacionais imensos, evidentemente os mais vulneráveis e pobres; e resultou na volta da fome ou insegurança alimentar, da insegurança social, do desemprego, da crise de moradia, das violências, do adoecimento psíquico e a atos de desespero diante de tamanha desproteção. Os principais atingidos foram os mais pobres e, dentre estes, os mais vulneráveis, onde se inserem os adolescentes em cumprimento de MSE-MA. A outra parte da explicação está marcada na história das políticas sociais em nosso país, com tropeços, fragilidades, clientelismos, descontinuidades, desvios de recursos e ainda subalterna às outras políticas de corte social. Nesta realidade, nem sempre a máquina governamental aposta na Assistência Social e investe no gasto social, condição que por si só já geraria uma melhora na resposta social e profissional oferecida nos termos da proteção integral de crianças e adolescentes, ou seja, trabalhamos com recursos precários, paliativos, descontínuos e ainda uma desmotivação profissional – aliada a um Burnout 2– ante a falta de perspectivas efetivas e eficazes em atenção ao trabalho que deveria ser desenvolvido. Vive-se assim um sistema de proteção social parco e irrisório, sem a potência necessária para agir e impactar nas garantias e seguranças devidas às populações que dele necessitam. Diante disso, como construir uma resposta qualificada e potente nos termos que competem à Política de Assistência Social, ao que tange à oferta da Proteção Social, aos mais vulneráveis, que quando recepcionados em 2 Conforme Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), Burnout é uma síndrome conceituada como resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso. 12 programas sociais recebem muito pouco, ou não raras vezes, têm seus princípios de cidadania e direitos violados? Presenciamos, inclusive, o quanto o velho Código de Menores ainda se faz presente no dia a dia do atendimento socioeducativo, enquanto ideologia, inclusive pelos próprios operadores das políticas sociais, com aclamações em defesa da redução da idade penal para adolescentes. Essa postura comunga com a criminalização da adolescência, e reproduz a já notória intersecção cárcere e raça, ao favorecer que ante a escassez de proteções que pretos e pobres vitimados pelo Estado, sejam cooptados pela indústria do crime. Aliás, a questão raça/etnia merece aqui um destaque. Em pesquisa realizada pela Assistente Social Giane Franciele Negri, técnica do serviço do MSE-MA, realizada em 2021, sobre a relação da escola e os(as) adolescentes e jovens que cumpriram medida em meio aberto no ano de 2019, apresentou- se o perfil de 75 adolescentes, tendo perguntado a estes sua raça/etnia. O resultado da pesquisa apontou dois elementos de relevante preocupação: sendo o primeiro, que da amostra geral, 09 adolescentes que se autodeclararam brancos, mas que pelo critério da heteroidentificação3 estariam classificados como negros ou pardos; e o segundo elemento, o reconhecimento da falta de habilidade de equipe em trabalhar essa questão. Segundo Negri, (2021, p. 18 e 19), da amostra dos 75 adolescentes, 42 declararam-se brancos, 26 como pardos, 4 negros e 3 não se declararam em termos de raça/etnia. Ainda segundo a mesma autora, realizando a heteroidentificação, tendo por base os atendimentos/fotos dos(as) adolescentes/jovens, pode-se inferir que há uma sub-representação em relação aos dados de raça/etnia. Sarita Amaro4 em algumas de suas produções (AMARO, 2020, 2020) analisa a raiz do problema que se situa no desvio, desconforto ou 3De acordo com Panizzi, et all Negri, 2021, heteroidentificação, é quando um terceiro define a que grupo racial o sujeito pertence (NEGRI, 2021). 4 Sarita Amaro é uma premiada Assistente Social e professora universitária. Tem Mestrado e Doutorado em Serviço Social (Brasil) e é Pós-Doutora em Serviço Social na Educação (Portugal). 13 desinteresse de profissionais em geral, em pautar, considerar e basicamente preencher o quesito etnia/raça nos formulários institucionais e documentos técnicos, dificultando os processos sociais que incidiriam em maior visibilidade da questão nos rumos de seu enfrentamento. Essa produção da invisibilidade dos negros serve à dominação secular que os mantém nos porões da sociedade, perpetuando as assimetrias vigentes (AMARO, FARIAS, 2020). Como alerta Meneghetti (2021), aos olhos críticos de quem se importa não há dúvidas do entrelaçamento da questão social à racial em nosso país, e a fragilidade desse debate por parte da equipe de trabalho neste quesito só reforça o racismo estrutural, quando deveria, ao contrário, agir em seu combate e desconstrução no cotidiano das políticas sociais (MENEGHETTI, 2021; AMARO, FARIAS, 2020). 2. SERVIÇO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE (PSC) E AS EQUIPES DE ATENDIMENTO. A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas. Através do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), a política se dividi em Proteção Social Básica e Proteção Social Especial de Alta e Média Complexidade. A Proteção Social Básica tem como objetivos prevenir situações de vulnerabilidade sociais, presentes especialmente no território, através de ações coletivas que visem a convivência familiar e comunitária, despertando potencialidades e acesso a benefícios e serviços. No território a política se materializa através dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), que tem como serviço principal o Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Família (PAIF). 14 A Proteção Social Especial é dividida em Alta e Média complexidade, a Média Complexidade executada no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), enquanto a Alta complexidade são os serviços de acolhimento institucional seja para crianças, adolescentes, pessoas idosas, pessoas com deficiência e pessoas em situação de rua. Assim, o Serviço de Medida Socioeducativa em Meio Aberto (MSE – MA) é um serviço de Média complexidade, pois, embora estejam em situação de risco, os(as) adolescentes que são inseridos neste serviço ainda têm vínculos familiares, muitos fragilizados, mas existentes. É importante destacar que quando falamos do Serviço de MSE-MA, como um serviço tipificado da Assistência Social tem suas particularidades, questões estas pautadas acima. Todavia, o serviço de MSE-MA não é serviço exclusivo para um Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) este serviço pode ser executado dentro do CREAS, todavia não é obrigatório. O Serviço Inerente a um CREAS é o Serviço de Proteção e Atendimento a famílias e Indivíduos (PAEFI), não existe CREAS se não tiver PAEFI, logo os CREAS temáticos que vimos surgir em um dado momento são incoerentes. Com relação aos municípios pequenos de porte I e II, estes muitas vezes não têm uma unidade de atendimento CREAS, assim precisam se organizar em nível de gestão municipal para destinar profissionais para que realizem os atendimentos devidos, estes profissionais podem estar ligados ao órgão gestor da Política Municipal de Assistência Social, entretanto sabemos que muitas vezes um(a) profissional executa todos os atendimentos em todos os níveis de proteção, o que porvezes acaba por fragilizar os atendimentos. O diálogo é sempre o melhor caminho, conhecer a realidade local, as potencialidades, desafios e sistematizar o serviço prestado é fundamental para que técnicos e o órgão gestor se comuniquem e busquem a melhor forma para executar a política local. 15 Ao analisarmos a medida de Prestação de Serviço à comunidade, percebemos que ela deveria ser um elo entre o(a) adolescente e sua comunidade. Volpi (2015) reforça que: Prestar serviços à comunidade constitui uma medida com forte apelo comunitário e educativo, tanto para o jovem infrator quanto para a comunidade, que por sua vez poderá responsabilizar-se pelo desenvolvimento integral desse adolescente (p. 29). Entretanto, o cotidiano profissional nos apresenta uma outra realidade: ao buscarmos os espaços comunitários para inserir o(a) adolescente, encontramos um ambiente hostil, fechado e muitas vezes violento, avesso a sua história, indiferente a sua vida e desacreditando em sua ressocialização, muitas vezes apenas baseado em preconceito por sua aparência física ou vestimenta. Isso nos faz refletir como executar socioeducação em meio aberto, se o próprio território se fecha aos seus. Segundo Volpi (2015): Entendemos que a prestação de serviços à comunidade será cada vez mais efetiva, à medida que houver adequado acompanhamento do adolescente pelo órgão executor, o apoio da entidade que o recebe, e a utilidade real da dimensão social do trabalho realizado (p. 29). O que se apresenta do cotidiano é uma negação destes(as) adolescentes em espaços de convivência social. Inexiste alinhamento entre órgão executor e mesmo o apoio de entidades parceiras na comunidade mostra-se muito frágil, uma vez que o que percebemos é uma desqualificação total deste(a) adolescente, reduzindo-o(a) apenas ao ato infracional, sem reconhecer outros aspectos destes que deveriam ser estimulados e fomentados, a começar pela valorização de suas potencialidades e sonhos. Outra questão que consideramos intrigante e contraditória, é o fato de que alguns(mas) adolescentes são encaminhados(as) ao serviço de MSE-MA pelo Ministério Público, entretanto, ao analisarmos o processo, percebemos que foi aplicada a remissão, porém, com MSE. Aqui cabe ressaltar que 16 quando se trata da remissão o(a) adolescente não será processado, ou seja, não terá processo judicial contra ele(a). O ECA em seus Arts. 126, 127 e 128, apresenta a forma jurídica da aplicação da remissão ao(a) adolescente. Podemos ainda compreender melhor essa questão ao vermos o ECA comentado5 pelo Drº Promotor de Justiça do Estado do Paraná Murillo José Digiácomo. Ora, se a MSE é uma medida imposta ao(a) adolescente que comete um ato infracional, ato este equivalente a crime e no processo de apuração entendeu que não houve a prática de ato infracional, porque uma remissão com MSE? O que percebemos é a prática de um “castigo”, imposto ao(a) adolescente por parte do próprio Ministério Público. Importante destacar que quando aplicada a remissão, embora feita pelo MP, não há a garantia do contraditório, uma vez que se não há processo instaurado contra o(a) adolescente, este(a) não terá que responder por prática de ato infracional, ferindo assim os direitos ao contraditório e ampla defesa. O que queremos pautar é o quanto tratamos este(a) adolescente ainda pela concepção de punição e não da proteção, pois quando este(a) adolescente adentra no Serviço de “proteção” de MSE, na maioria dos casos, o(a) mesmo só foi “visto” pelo Estado6, quando praticou algo compreendido como ato infracional, entretanto a ausência de uma rede de proteção ainda nos primeiros anos de vida foi tão evidente que suas demandas anteriores não foram pautadas – dado que antes era, ainda mais, invisível ao Estado e à sociedade. Isso é tão importante que quando realizamos os primeiros atendimentos, nos deparamos com a realidade, por exemplo, de um adolescente que aos 15 anos não está alfabetizado, que apenas desenha seu nome. 5 Link ECA Comentado: https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/caopca/eca_anotado_2020_8ed_mppr.pdf. 6 Entende-se Estado como ente, nação responsável por garantir proteção social, conforme dispõe a CF/88. 17 Nesse cenário, a frase “isso é problema da assistência social” reaparece “batida” e desgastada. Mas como esse(a) adolescente foi levado(a) ao ato infracional? Onde estava toda a rede de proteção? E quando ele(a) adentra no sistema, com o que ou quem pode contar, se é falha ou precária a articulação Inter políticas? Como se pode executar a socioeducação partindo somente de uma única política pública? Como articular o SINASE, se os atores/atrizes envolvidos não se reconhecem como socioeducadores(as)? E, principalmente: como realizar socioeducação quando os(as) adolescentes são vistos(as) por muitos(as) profissionais como bandidos? Aqui cabe um importante destaque para a atuação de trabalhadores(as) que atuam no serviço de MSE-MA, uma vez que a compreensão que este(a) tem sobre o(a) adolescente ou sobre a incompletude que permeia o ciclo de vida da adolescência, será fundamental no atendimento e acompanhamento do(a) adolescente. Sobre essa questão dos(as) trabalhadores(as) destacamos: O referencial teórico apresentado até esse momento, permitiu evidenciar que ainda persistem no imaginário social, nas práticas cotidianas profissionais, muitos mitos sobre trabalho infantil, sobre pobreza, sobre drogas, violência e crime. Também que a efetivação do SGDCA e a possibilidade de proteção integral dependem, além dos serviços e políticas ofertadas, da qualidade da atuação dos agentes públicos e privados para a implementação desses (SCHELBAUER, 2022, p.99). Sim, são muitas perguntas. E na base de todas elas estão a necessidade de defesa coerente e competente dos direitos de crianças e adolescentes, direito a vida, ao lazer, a educação, à vida comunitária, com dignidade e respeito a sua individualidade e estágio de desenvolvimento humano. Mas é exatamente nesse período que se inscrevem as maiores violações, por incompreensão, crise geracional ou opressão adulta. Além da desacreditação por ser socioeducando(a), o(a) adolescente sofre uma série de segregações e todas elas são um convite a se manter no circuito do ato infracional. O afastamento da escola, é uma delas. Ele(a) tem direito à continuidade dos estudos, mas a vaga na escola é sempre algo difícil 18 e que demanda ser “negociada”, perante argumentos de gestores(as) de não oferecer risco à escola, medo de prejudicar os alunos e evitar “problemas”. Como resultado, mantém-se adolescentes em lista de espera para acesso à uma vaga na escola, espera esta que muitas vezes tem um hiato temporal entre idade/série de dois ou três anos. De acordo com a pesquisa realizada por Negri (2021, pg. 24), do total de adolescentes, apenas 28 estavam em situação regular com os estudos, isto é, frequentando regularmente ou concluído o Ensino Médio, enquanto 47 mantinham-se em situação irregular o que se pode entender como desproteção social, em outras palavras, o avesso ao direito. As finalidades do serviço do MSE-MA estão dispostas em vários documentos, Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (2009), Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (1990), SINASE (2012) e Cadernos de Orientações, entretanto, quando falamos com os(as) operadores(as) deste serviço percebemos profissionais perdidos(as), sem mesmo saber o que de fato é ofertar um serviço de socioeducação. Isso porque o que podemos perceber, com o cotidiano profissional, é que os(as) adolescentes em cumprimentos de MSE-MA não estão fora da sociedade para ser ressocializados, estão justamente dentro desta sociedade, porém marginalizados por serem pobres, negros e residirem em locais periféricos7, impedindo muitas vezesde acessarem até mesmo mercado de trabalho, devido aos estigmas e os trabalhadores do serviço se deparam com toda essa desigualdade, quando recebe um adolescente para cumprimento da MSE-MA. E então o que é mesmo socioeducação em meio aberto? As políticas públicas são de fundamental importância na vida de todo(a) cidadão(ã), especialmente quando é criança e adolescente, justamente devido estes(as) estarem em um período singular do 7 Vide relatório da pesquisa Nacional das MSE-ME – MDS 2018. https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/relatorios/Medidas_Socioeducativ as_em_Meio_Aberto.pdf . https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/relatorios/Medidas_Socioeducativas_em_Meio_Aberto.pdf https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/relatorios/Medidas_Socioeducativas_em_Meio_Aberto.pdf 19 desenvolvimento, neste sentido destacamos que nesta fase políticas como saúde, educação, assistência social, esporte, cultura e lazer, deveriam ser efetivas na oferta de serviços que garantissem a proteção social de crianças e posteriormente na adolescência, o princípio da incompletude institucional precisa ser reconhecido e executado de forma eficaz na vida de cidadãos e cidadãs A escuta qualificada, o acolhimento dos(as) adolescentes e suas famílias é a tarefa inicial dos(as) trabalhadores(as), o primeiro contato permite estabelecer já de início a relação de respeito que estes(as) devem ser tratados(as). Destaca-se aqui, que a acolhida inicial deve ser tarefa para todos(as) os(as) trabalhadores(as), independente da formação ou nível de escolaridade, para posterior os atendimentos especializados, isso porque todos(as) os(as) atores/atrizes do serviço de MSE-MA, precisam estar preparados(as) para ouvir e acolher a quem eles(as) procuram. Cabe uma ressalva que não se trata da acolhida de famílias e indivíduos em unidades de acolhimento, mas sim, da forma como o serviço de Medida Socioeducativa vai recepcionar este(a) adolescente e sua família quando for encaminhado(a) para cumprir MSE-MA. Faz-se fundamental uma acolhida com respeito e orientação sobre seus direitos e deveres em relação a sua MSE, a sua obrigatoriedade, informando que a medida é do(a) adolescente e isso precisa ficar nítido no primeiro atendimento. Importante posicionar o direito da família e seus deveres no apoio ao(a) adolescente e quais os deveres e relacionamento com a equipe técnica do serviço. Quando paramos para olhar todo o conjunto de leis que temos, orientações técnicas e normativas técnicas que envolvem as MSE, percebemos que todas dispõem sobre a importância da responsabilização do(a) adolescente, entretanto, sempre seguido dos princípios de proteção, do acesso as diversas políticas públicas, do direito a convivência familiar e comunitária e etc. Isso nos permite pensar que: se este(a) adolescente tivesse tido esses acessos antes, não teria praticado o ato infracional? Se o ECA estabelece os deveres da família, sociedade e do Estado, na proteção dos(as) 20 adolescentes, então estes serão punidos também por não cumprirem seus deveres? São com todas essas inquietações que os(as) trabalhadores(as) lidam diariamente e precisam dar respostas das situações que atendem. O atendimento às famílias precisa ser cuidadoso, regado de empatia e capacidade de escuta, isso porque muitas famílias precisam ser protegidas para poder proteger, e nosso maior desafio é despertar nas famílias sua capacidade protetiva, pois é neste contexto familiar que o(a) adolescente volta depois dos atendimentos realizados pelos(as) atores/atrizes do serviço de MSE-MA. Neste momento é importante compreender se a família deverá ser inserida no serviço do PAEFI, concomitante com o cumprimento da MSE, pois o reconhecimento desta família como unidade protetora é decisiva para que a MSE tenha o máximo de eficácia. Neste sentido, os vários saberes contidos nas diferentes formações da equipe de referência, contribui para que estas aprofundem o conhecimento sobre as desproteções sociais, sobre estilo de vida e formas como se dão as relações de gêneros, raciais, religiosas, intergeracionais entre outras, nas próprias famílias e nos territórios em que vivem. No Caderno de Orientação do PAIF (MDS, 2012), o processo de acompanhamento orienta que as equipes sejam capazes de: • Conhecer as situações de vulnerabilidades e as potencialidades das famílias e sua incidência no território; • Levantar as principais demandas coletivas; • Aprofundar conhecimento de alguns temas e fenômenos, inclusive estudando materiais produzidos por especialistas; • Preparar encontros com famílias do território. O desafio na sustentação dos grupos é usar estratégias que contribuam para explicitar, dialogar e superar modos de relação que fragilizam os vínculos e, consequentemente, geram desproteções sociais. Essa fragilidade de vínculos pode ocorrer no processo do próprio grupo ou deste com outros grupos sociais. As ferramentas/estratégias utilizadas no 21 trabalho social precisam ser coerentes e materializar a direção de proteção social presente nas normativas e orientações éticas e técnicas do SUAS. E trazendo ao debate o território, esse é essencial na vida do(a) adolescente em cumprimento de MSE–MA, pois, é justamente neste território que a vida acontece, que as relações se constroem, e que os(as) adolescentes se reconhecem como sujeitos. E neste mesmo território as violações e os riscos são eminentes. Torna-se fundamental a equipe conhecer o local/território onde vive o(a) adolescente e sua família, justamente para que possamos, nos atendimentos (grupo e/ou individual), dialogar com o(a) socioeducando(a) que lugar é esse, quais suas potencialidades, quais os desafios, onde estão os riscos e como se apresentam em sua vida e de sua família, e onde estão as proteções, sejam estas representadas pelos serviços públicos ou privados presentes naquele espaço, diálogo este que permite aos(as) adolescentes desenvolver mecanismos de proteção, lembrem-se, se estivermos na chuva com guarda-chuva, iremos nos molhar menos. Conforme Brasil (2017), a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) define que se pode prevenir vulnerabilidades e riscos sociais, a partir de potencialidades e aquisições em conjunto com o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. Da mesma forma, é de fundamental importância a articulação do Serviço de MSE-MA, com o trabalho do CRAS, pois muitas vezes este é a unidade de atendimento da Assistência Social que está no território. No Sistema Único de Assistência Social (SUAS), a Proteção Social Básica opera garantindo seguranças de convívio, acolhida e sobrevivência, ou seja, evitando, prevenindo riscos sociais, perigos e incertezas para grupos vulneráveis, tanto do ponto de vista material quanto do ponto de vista relacional (BRASIL, 2017 p. 9). Esse trabalho tem o propósito de despertar nos(as) adolescentes, e suas famílias, sua autonomia, isso porque: A provisão das seguranças socioassistenciais pressupõe que as ofertas disponibilizadas pelo SUAS contribuam para o desenvolvimento das capacidades e autonomia dos usuários, o fortalecimento das relações no âmbito da família e da comunidade e a ampliação do acesso a direitos socioassistenciais e das redes de 22 relacionamento no território onde vivem e convivem (SNAS, 2017, p.7). Outro fator de grande relevância é o trabalho entre serviço de MSE- MA e vigilância socioassistencial, a qual visa identificar no território as potencialidades, riscos e o conhecimento das condições socioeconômicas das famílias, para que juntos(as) possam pensar ações coletivas que intencionam o desenvolvimento de ações em cada localidade. Isso porque, vigiar também é um ato de proteção. Significa dizer que a VigilânciaSocioassistencial deve responder não só pela identificação das situações de vulnerabilidade e risco que incidem sobre as famílias e dos eventos de violação de direitos presentes nos territórios, mas também deve permitir compreender por que e como se configuram territorialmente as necessidades e demandas por seguranças socioassistenciais. Somente assim, poderá produzir uma visão territorializada e interligada entre demandas e respostas de proteção social e de defesa de direitos socioassistenciais, orientando os parâmetros dos serviços e benefícios da política de assistência social na direção da prevenção e restauração das desproteções e violações de direitos socioassistenciais. (BRASIL, 2013, p. 26). Dessa forma, é necessário constante diálogo entre os serviços de MSE e Vigilância, já que se faz importante a sistematização dos dados produzidos pelos trabalhadores da MSE-MA, haja vista que são através de dados e informações subjetivas que se propõem ações nos territórios. Conhecer o território permite ainda, que sejam mapeados os locais pra possíveis parcerias para o cumprimento da MSE-MA, uma vez que é de responsabilidade do serviço essas parcerias, que visem acolher o(a) adolescente para o cumprimento da PSC, lembrando que esses locais precisam estar em constante capacitação para receber os(as) adolescentes da mesma forma que a equipe também precisa se capacitar constantemente. O cotidiano profissional impõe aos(as) trabalhadores(as) do Serviço Socioeducativo o enfrentamento das expressões da questão social que incidem diretamente na vida destes(as) adolescentes inseridos no Serviço de MSE-MA, isso implica em entregar um serviço de qualidade nos rumos da 23 superação da situação vivida, mesmo diante da ineficiência da política social em que nos situamos. Todos esses questionamentos críticos, ao passo que expressamente renunciam à produção de respostas conservadoras e fatalistas, nos potenciam a sair do básico (AMARO, 2020a), quebrar correntes opressoras e compor estratégias de ultrapassagem desse cotidiano. O que nos move é a intenção de mudança: compor “caminhos nos rumos de um horizonte mais democrático e humano” (AMARO, 2021, p. 60.). Nas palavras de Amaro, em uma de suas obras – como em mentoria8 “ao vivo” – é inadiável que o assistente social seja presente e potente em suas ações e mediações. Segundo ela: É, portanto, papel político do assistente social, assumida sua identidade de classe, com os setores oprimidos. (...) É nos rebatimentos dessa posição e oposição política que se converte a prática profissional em prática social, única forma de dar um “basta” ao sucateamento das políticas públicas e dos serviços sociais, bem como ao apartheid social posto em marcha pela artimanha neoliberal das elites brasileiras (Amaro,2021, p. 61). Precisamos reafirmar nosso compromisso com as camadas sociais empobrecidas e excluídas, e compor ações educativas em meio aberto, que efetivamente visem o pleno desenvolvimento dos adolescentes. É preciso acreditar que estar ali na socioeducação não é o fim da história, que há um porvir e um recomeçar. 8 Processo de formação realizado sob orientação da Phd Sarita Amaro. 24 3. REFERÊNCIAS AMARO, Sarita. O assistente social como cartógrafo. In: AMARO, S. CRAVEIRO, A, MIKOSKI, V. (Orgs). A materialização do pensamento crítico na produção de documentos técnicos do Serviço Social. 1. Ed. Porto Alegre: Nova Práxis Editorial, 2020a.89-126p. AMARO, Sarita. O desafio dos três “C” do Serviço Social. 1. ed. Porto Alegre: Nova Práxis Editorial, 2020b. AMARO, Sarita. Subsídios para superar o racismo nas instituições: o preenchimento do indicador etnia/cor em debate. O assistente social como cartógrafo. In: AMARO, S. CRAVEIRO, A, MIKOSKI, V. (Orgs). A materialização do pensamento crítico na produção de documentos técnicos do Serviço Social. 1. Ed. Porto Alegre: Nova Práxis Editorial, 2020c.705-735p. AMARO, Sarita; COSTA. Francisco P. Perícia social em crimes raciais: convite à reflexão-ação. In: PONCE DE LEÓN, A.; AMARO, S.; FERREIRA, D. (Orgs) Perícia social e defesa de direitos: principais demandas e pormenores técnicos segundo expertos de seis países. 1. ed. Porto Alegre: Nova Práxis Editorial, 2020d.403-427p. AMARO, Sarita; FARIAS, Eduardo. 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