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SISTEMAS TÉRMICOS E ENERGÉTICOS AULA 6 Prof.ª Ana Carolina Tedeschi Gomes Abrantes CONVERSA INICIAL Olá! Nesta aula iremos estudar os motores de combustão interna (MCI). Esse termo é familiar para você? Acredito que sim! Como você faz para ir ao trabalho, ao centro da sua cidade ou ao shopping? Você pega um ônibus coletivo, utiliza o próprio carro? Com as tecnologias atuais, talvez eles sejam movidos a motores elétricos, mas muito provavelmente utilizam-se de motores a combustão interna, para fornecimento da energia necessária para a locomoção. A aplicação desses motores se expande a outros meios de transporte, como caminhões e navios, assim como para aplicações comerciais e industriais, em maquinários que auxiliam o processo de produção. Independentemente da potência do MCI, você se deparará com esse equipamento em algum momento da sua vida profissional. Então, vamos aprender um pouco mais sobre essas máquinas térmicas? CONTEXTUALIZANDO Nos motores de combustão interna, “o combustível é queimado dentro do próprio motor. O aparecimento desses motores provocou um rápido desenvolvimento mecânico. Eles levaram vantagem sobre as máquinas a vapor” pela eficiência, versatilidade, menor peso, potência, arranque rápido e possibilidade de adaptação a diversos tipos de máquinas (Luz, 2013). A pólvora foi utilizada por um padre chamado Hautefoille, em 1652, como combustível para um motor que utilizava os gases da combustão como fonte de energia. Porém, não há registro escrito sobre o assunto. O mesmo combustível foi utilizado por Huygens, em 1680, em um motor com cilindro e pistão. “Em 1794, Robert Steet obteve a patente de um motor de combustão interna, que consistia em dois cilindros horizontais” (Varella, 2013). Se o motor tivesse sido construído, seria o primeiro motor a combustão interna com adição direta do combustível líquido no cilindro. “O inventor da iluminação a gás, Phillip Leben obteve em 1801, a patente de um motor de combustão, que funcionava tendo como princípio a expansão dos gases proveniente da combustão de uma mistura de ar e gás inflamado” (Varella, 2013). “W. Cecil (1821) desenvolveu um motor de combustão que trabalhava com a mistura de ar e hidrogênio. Esse foi realmente o primeiro motor a funcionar com sucesso” (Varella, 2013). Posteriormente (1860), Lenoir, um mecânico alemão, construiu um motor a combustão interna, com potência de 1 cv, trabalhando com gás de iluminação. Após Lenoir, um motor com compressão de ar e gás de iluminação foi construído em 1861, por Otto e Langen. Eles usaram a ignição por centelha elétrica. “Em 1862, o engenheiro francês Beau de Rochas publicou estudos teóricos e estabeleceu alguns princípios termodinâmicos com base no motor de Otto. Este, por sua vez, fundamentado no estudo de Rochas, desenvolveu o motor de ciclo Otto, apresentado em 1872. Esses motores usavam como combustível o gás de carvão ou o gasogênio, com ignição feita por centelha elétrica” (Luz, 2013). “Em 1889, fez-se a primeira aplicação do motor de ciclo Otto em veículos, utilizando-se como combustível a gasolina” (Luz, 2013). “Em 1893, o engenheiro alemão Rudolf Diesel descreveu um novo motor, no qual a ignição da mistura ar mais combustível era feita por compressão. Este motor, que Diesel denominou ‘motor térmico raciona’, acabou ficando conhecido como motor Diesel” (Luz, 2013). A partir daí pouca mudança de teve na fundamentação operacional dos motores de combustão interna, sendo o seu desenvolvimento mais focado no aumento de eficiência e na redução de emissões de gases poluidores ao meio ambiente. TEMA 1 – DEFINIÇÕES E CLASSIFICAÇÕES Os motores de combustão interna são máquinas térmicas motoras, os quais convertem a energia química dos combustíveis em trabalho mecânico utilizando-se dos produtos de combustão como fluido de trabalho. Podem ser classificados de acordo com seu projeto como se segue. Quadro 1 – Classificação de motores Propriedade do gás na admissão Ar (Ciclo Diesel) Mistura ar-combustível (Ciclo Otto) Ignição Por centelha (ICE) Por compressão (ICO) Ciclo de trabalho 2 tempos 4 tempos Número de cilindros Monocilíndricos Policilíndricos Disposição dos cilindros Em linha Opostos (boxer) Em V Em relação à aplicação, os motores de combustão interna podem ser divididos em: Estacionários: utilizados em equipamentos fixos, como bombas e geradores. Industriais: normalmente utilizado pela construção civil em equipamentos portáteis e veículos, como tratores, compressores de ar e máquinas de mineração. Veiculares: para acionamento de veículos de transporte em geral, como carros particulares, ônibus e caminhões. Marítimos: para propulsão de barcos e máquinas de aplicação naval. Os motores de combustão interna apresentam arranque rápido, trabalham com rotações baixas, são compactos e de manutenção fácil. Porém, apresentam limitação de potência, não utilizam combustíveis sólidos e são pesados em relação à potência fornecida. Também possuem muitas peças e baixa eficiência. Para avaliarmos o funcionamento destes motores, algumas definições necessitam ser conhecidas. Ponto Morto Superior (PMS) e Ponto Morto Inferior (PMI): representam as posições em que o movimento do pistão muda de sentido, sendo máxima na PMS e mínima na PMI. Cilindrada: é o volume total percorrido pelo pistão (cm3) entre os PMI e PMS, vezes a quantidade de cilindros do motor. Câmara de Compressão (Combustão): é o espaço acima do pistão, quando ele está posicionado no PMS. Nesse espaço, ocorre a compressão da mistura gasosa e seu volume define a taxa de compressão do motor. Quanto menor o volume, maior taxa de compressão e melhor o rendimento do motor. Octanagem: é um parâmetro criado para avaliar quanto um combustível resiste à detonação, sem fonte de ignição. Seu valor é parametrizado em zero para um combustível 100% n-heptano e 100 para um combustível composto unicamente por isoctano. Taxa de compressão: indica em quantas vezes a mistura gasosa é comprimida dentro dos cilindros antes da ignição. É calculada por: Onde: C = cilindrada do motor Vcc = volume da câmara de combustão Autoignição: ocorre quanto a queima do combustível é iniciada sem uma fonte de ignição proposital, principalmente devido a pontos quentes no interior da câmara. TEMA 2 – FUNCIONAMENTO DOS MOTORES ALTERNATIVOS Em um motor alternativo, a energia química é convertida em movimento mecânico por intermédio de pistões. Seu ciclo mecânico compreende: Injeção do combustível no cilindro. Compressão do combustível, consumindo trabalho. Queima do combustível. Expansão dos gases de combustão, gerando trabalho. Expulsão dos gases. Esse ciclo pode ser completado a dois ou a quatro tempos. Os motores a dois tempos são utilizados em aeromodelos, jet skis e motosserras, por exemplo. Sua construção é simplificada e mais leve, pois não têm as válvulas de admissão e escape. Esses motores apresentam uma explosão a cada giro do virabrequim, e o pistão funciona como válvula deslizante. Primeiro, o pistão comprime a mistura ar/combustível (para motor Otto) ou o ar (para motor Diesel) no cilindro com seu movimento ascendente. Em seguida, ocorre a ignição e a combustão da mistura. A expansão dos gases da combustão faz o pistão descer, sendo posteriormente eliminados. Para compreender melhor esse processo, assista ao vídeo indicado a seguir. Ele explica o funcionamento do motor dois tempos para gasolina. Como funciona o motor dois tempos. Laboratório Mecaniza UFSM, 20 nov. 2014. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=M-h4XhEy2M0> O motor quatro tempos é utilizado principalmente em caminhões e carros, pois apresenta um ganho considerável de potência em relação ao motor dois tempos devido à combustão ser realizada em intervalos de giros. Esse tipo de motor completa um ciclo a cada quatro cursos do pistão. O primeiro tempo (admissão) inicia-se com o pistão no PMS, com o movimento descendente e com a aberturada válvula de admissão. A mistura ar/combustível (para motor Otto) ou o ar (para motor Diesel) é admitido. No segundo tempo (compressão), o pistão sobe com as válvulas fechadas, comprimindo o fluido admitido na câmara de combustão. Nos motores a diesel, o combustível é adicionado no fim dessa etapa. No terceiro tempo (explosão), ocorre a ignição e a expansão dos gases da queima, o que provoca a descida do pistão do PMS ao PMI. Essa etapa é a única que transmite trabalho ao pistão. https://www.youtube.com/watch?v=M-h4XhEy2M0 https://www.youtube.com/watch?v=M-h4XhEy2M0 https://www.youtube.com/watch?v=M-h4XhEy2M0 Os gases da queima são comprimidos e descartados no quarto tempo, quando o pistão sobe e a válvula de escapamento se abre. Ao se comparar o funcionamento dos motores de ciclo Otto com os motores a diesel verificam-se suas principais diferenças: O motor a gasolina trabalha com a taxa de compressão entre 8:1 e 12:1, enquanto o motor diesel possui taxa de compressão que varia de 15:1 a 25:1. Por isso sua robustez em relação ao primeiro. Durante a admissão, o motor a gasolina admite uma mistura ar/combustível para o cilindro, enquanto que o motor Diesel aspira apenas ar. A ignição dos motores a gasolina é iniciada por uma faísca elétrica gerada pela vela de ignição antes da compressão máxima na câmara de explosão (> a 400°C). Em contrapartida, a combustão no motor Diesel ocorre no momento da injeção do combustível (> a 600°C). TEMA 3 – CICLO OTTO O motor a quatro tempos foi projetado por Nikolaus August Otto (1832-1891). O ciclo teórico ideal que recebe seu nome está representado na Figura 1. O funcionamento do motor é o mesmo do descrito na seção anterior, sendo constituído por quatro processos: 1 → 2 Compressão isoentrópica; 2 → 3 Aquecimento isocórico da mistura gasosa; 3 → 4 Expansão isoentrópica; 4 → 1 Rejeição isocórica de calor para o meio externo. Figura 1 – Estágios de um motor a quatro tempos (ciclo Otto). Fonte: Afonso, 2012. Nesse desenho, a condição 0 representa a admissão no início do primeiro tempo e a exaustão no fim do último tempo. Os diagramas da figura 2 representam as transformações termodinâmicas abordadas neste ciclo. Observe que a área central do diagrama P-v equivale ao trabalho gerado pelo motor em um ciclo completo. Figura 2 – Diagramas P-v e T-S do ciclo Otto Fonte: Afonso, 2012. O rendimento (%) do ciclo Otto pode ser calculado por: Onde Tn = temperatura no instante n. Uma vez que os processos de troca térmica ocorrem a volume constante, podemos afirmar que v2=v3 e v4=v1, sendo possível deduzir a correlação: Onde vn = volume específico no instante n. K = constante (1,667 para gases monoatômicos, 1,4 para o ar). A taxa de compressão (r) é calculada neste ciclo como: Onde: Vmax e Vmin = volumes máximos e mínimos do cilindro. A equação do rendimento pode então ser reescrita como: Esta equação pode ser resolvida em função da taxa de compressão, resultando no Gráfico 1. Gráfico 1 – Rendimento do ciclo Otto para ar Fonte: Afonso, 2012. TEMA 4 – CICLO DIESEL O ciclo Diesel foi descrito por Rudolf Diesel (1858-1913) para explicar o funcionamento de um motor que utiliza diesel como combustível. Neste motor, a combustão ocorre pelo aumento da temperatura devido a compressão do ar (autoignição). O ciclo Diesel teórico é composto pelos seguintes processos: 1 → 2 Compressão isoentrópica; 2 → 3 Aquecimento isobárico; 3 → 4 Expansão isoentrópica; 4 → 1 Rejeição isocórica de calor para o meio externo. Essas transformações podem ser compreendidas por intermédio da análise dos diagramas do gráfico 2. O ponto 0 refere-se ao processo de admissão do ar e de exaustão dos gases. Gráfico 2 – Diagramas P-v e T-S do ciclo Diesel Fonte: Afonso, 2012. O rendimento (%) do ciclo Diesel pode ser calculado por: Para que o rendimento seja determinado, é necessário, portanto, conhecer as razões de temperatura da equação. Ao utilizar a equação para os gases ideais e considerar o aquecimento e a pressão constantes (p2=p3), o resfriamento a volume também constante (v4-v1) e compressão e expansão com entalpia constante, é possível deduzir: A dedução desta fórmula pode ser encontrada nas referências citadas nesta aula. Para o ciclo Diesel também se aplica o conceito de taxa de compressão, assim como taxa de corte (rc): Substituindo na equação do rendimento: A resolução desta equação está representada no gráfico 3 a seguir. Gráfico 3 – Rendimento do ciclo Diesel em função da taxa de corte e da taxa de compressão Fonte: Afonso, 2012. TEMA 5 – COMPONENTES DE UM MOTOR Os principais componentes de um motor de combustão interna são: Peças fixas. Bloco do motor. Cabeçote. Cárter. Peças móveis. Pistão ou êmbolo. Biela. Árvore de manivelas ou virabrequim. Válvulas de admissão e escape. Árvore de comando de válvulas. O bloco motor (figura 2) é o local onde furos são usinados visando à instalação dos pistões. Na parte inferior, são colocados os mancais no centro, para apoio do virabrequim. Abaixo de os componentes, fica o cárter, o qual contém o óleo lubrificante. Figura 2 – Bloco do motor O cabeçote é a parte superior do motor, no qual os pistões comprimem a mistura ar/combustível (Otto) ou ar (Diesel). Tem furos com rosca para a instalação das velas de ignição ou bicos injetores, além das válvulas de admissão e escape. Os pistões (figura 3) são as partes móveis da câmara de combustão que transmitem a força da expansão dos gases para a biela, a qual, por sua vez, transmite ao virabrequim. O virabrequim é o eixo do motor. Este conjunto biela-virabrequim transforma o movimento do pistão em movimento de rotação (figura 4). Figura 3 – Pistão Figura 4 – Conjunto de acionamento das válvulas de admissão e exaustão As válvulas de admissão e escape são abertas pelo eixo de comando de válvulas nos seus respectivos tempos, com o auxílio do eixo de manivelas por meio de engrenagem, corrente ou correia dentada (figura 5). Figura 5 – Conjunto de acionamento das válvulas de admissão e exaustão NA PRÁTICA 1ª aplicação: cálculo de cilindrada A ficha técnica do motor do carro Chevrolet Onix LT 1.0 apresenta as seguintes informações: Instalação: Dianteiro Curso dos pistões: 62,9 mm Disposição: Transversal Potência: 80 cv (A) 78 cv (G) a 6400 rpm Aspiração: Natural Potência específica: 80,08 cv/litro Alimentação: Injeção multiponto Combustível: Flex Cilindros: 4 em linha Peso/potência: 12,74 kg/cv Comando de válvulas: Simples no cabeçote, correia dentada Torque: 9,8 kgfm (A) 9,5 kgfm (G) a 5200 rpm Tuchos: Hidráulicos Torque específico: 9,81 kgfm/litro Válvulas por cilindro: 2 Peso/torque: 103,98 kg/kgfm Diâmetro dos cilindros: 71,1 mm Rotação máxima: 6800 rpm Taxa de compressão: 12,6:1 Com base nessas informações, calcule a cilindrada desse motor. Resolução A cilindrada (C) corresponde ao volume do cilindro vezes o número de cilindros (n) do motor. O volume de um cilindro (V) é calculado multiplicando-se a área da base (com base no diâmetro do cilindro - d) pela altura (curso dos pistões - h). Como a cilindrada é medida em cm3, é conveniente obter o volume nessa unidade. O motor tem 4 cilindros, portanto, sua cilindrada é: Por isso, o motor recebe a denominação 1.0 ou 1,0 litro. 2ª aplicação: cálculo do volume da câmara de combustão No exemplo anterior, a taxa de compressão indicada na ficha técnica do motor é de 12,6:1. Conhecendo a cilindrada, calcule o volume da câmara de combustão. 3ª aplicação: cálculo da eficiência do ciclo térmico Ainda, no nosso exemplo, é possível calcular o rendimento do ciclo térmico. A equação do rendimento para o ciclo Otto é: Para sua resolução, é necessário conhecer a taxa de compressão (12,6:1) e o k (1,4 para ar). Substituindo, tem-se: SÍNTESE Com a conclusão desta aula, você deverá compreender o funcionamento dos motores à combustão interna e os ciclos termodinâmicos que os fundamentam. REFERÊNCIAS AFONSO, C. Termodinâmica para engenharia. Porto:FEUP edições, 2012. LUZ, M. L. G. S. Motores a combustão interna. UFPel, 2013. Disponível em: <http://wp. ufpel.edu.br/mlaura/files/2013/01/Apostila-de-Motores-a-Combust%C3%A3o-Interna.pdf>. Acesso em: 5 jan. 2017. TAYLOR, C. F. Análise dos motores de combustão interna. v. 1 e 2. São Paulo: Ed. Blucher 1988. VARELLA, C. A. A. Histórico e desenvolvimento dos motores de combustão interna. UFRRJ, 2014. Disponível em: <http://www.ufrrj.br/institutos/it/deng/varella/Downloads/IT154_motores_e_tratores/Aulas/ historico_e_desenvolvimento_dos_motores.pdf>. Acesso em: 5 jan. 2017.
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