Prévia do material em texto
CAMPO GRANDE/MS 2023 VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: A violência obstétrica e a penalização para este crime no Brasil. VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: A violência obstétrica e a penalização para este crime no Brasil. Campo Grande/ MS 2023 RESUMO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Instituição de Ensino UNIDERP como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. Orientador: Este estudo, que tem como tema, a violência contra a mulher, com foco na violência obstétrica e a penalização deste crime no Brasil. A violência obstétrica é caracterizada pela falta de respeito pela autonomia e pelos processos reprodutivos das mulheres, resultando em violência verbal, física ou sexual, bem como em intervenções desnecessárias e sem embasamento científico. Essa violência pode ocorrer durante a gestação, parto e pós-parto, e viola os direitos da mulher, incluindo sua integridade física, mental, emocional e psicológica, além de sua dignidade. O objetivo geral desta monografia, é apresentar um aspecto geral da violência contra a mulher, principalmente a violência obstétrica. Os objetivos específicos, são: elucidar os aspectos dos tipos de violência contra a mulher; apresentar, de forma mais objetiva, a violência obstétrica; elencar as punições previstas no código penal para este tipo de violência, além de abordar se é necessária ou não uma lei específica para isso. Utiliza-se para a realização desta pesquisa o formato de revisão; buscando garantir a obtenção das informações mais relevantes dentro do campo de estudo do Direito. Assim, os descritores de revisão, no que tange à Violência contra a mulher, a violência obstétrica e a penalidade deste tipo de ação no ordenamento jurídico brasileiro. A violência obstétrica é uma forma de violência contra a mulher que ocorre no contexto do parto e do pós-parto. Ela pode ser caracterizada por ações ou omissões dos profissionais de saúde que violam os direitos humanos das mulheres, como a negação de tratamento digno, abuso de poder, violência física e psicológica, além da realização de procedimentos desnecessários e dolorosos. No Brasil, essa violência é reconhecida como crime e pode ser penalizada de acordo com as leis penais brasileiras. Palavras-chave: Violência Obstétrica. Direitos da Mulher. Código Penal. Ordenamento Jurídico Brasileiro. OLIVEIRA, Nilaine Santos de. Violence against women: obstetric violence and the penalty for this crime in Brazil. 28 sheets. Completion of course work (Graduation in Law) – UNIDERP, Campo Grande/MS, 2023. . ABSTRACT This study focuses on violence against women, with a focus on obstetric violence and its criminalization in Brazil. Obstetric violence is characterized by a lack of respect for women's autonomy and reproductive processes, resulting in verbal, physical, or sexual violence, as well as unnecessary and unscientific interventions. This violence can occur during pregnancy, childbirth, and postpartum, violating women's rights, including their physical, mental, emotional, and psychological integrity, as well as their dignity. The general objective of this monograph is to present a general aspect of violence against women, mainly obstetric violence. The specific objectives are to elucidate the aspects of types of violence against women, to present obstetric violence more objectively, to list the penalties provided for in the penal code for this type of violence, and to address whether a specific law for this is necessary or not. The research uses a review format to ensure the most relevant information is obtained within the field of Law. Thus, the review descriptors regarding violence against women, obstetric violence, and the penalty for this type of action in the Brazilian legal system are used. Obstetric violence is a form of violence against women that occurs during childbirth and postpartum. It can be characterized by actions or omissions of healthcare professionals that violate women's human rights, such as the denial of dignified treatment, abuse of power, physical and psychological violence, as well as the performance of unnecessary and painful procedures. In Brazil, this violence is recognized as a crime and can be penalized according to Brazilian penal laws. Keywords: Obstetric Violence. Women's Rights. Penal Code. Brazilian Legal System. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 6 2 NOÇÕES PROPEDÊUTICAS DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER ................... 8 3 A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: CONTEXTO HISTÓRICO E SUAS VARIAÇÕES . 13 4 O ORDENAMENTO JURÍDICO NO QUE TANGE A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL ..................................................................................................................... 18 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 24 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 25 6 1 INTRODUÇÃO A violência baseada no gênero tem consequências psicológicas, econômicas e de saúde adversas. A violência por parceiro íntimo é uma das formas mais comuns. Mulheres e meninas jovens também são vítimas desproporcionalmente de violência e assédio sexual, tráfico de pessoas, mutilação genital feminina e casamento infantil, entre outros tipos. A violência de gênero pode acontecer em qualquer lugar: em casa, na escola, no local de trabalho, escondida e à vista de todos. A violência obstétrica é caracterizada pela falta de respeito pela autonomia e pelos processos reprodutivos das mulheres, resultando em violência verbal, física ou sexual, bem como em intervenções desnecessárias e sem embasamento científico. Essa violência pode ocorrer durante a gestação, parto e pós-parto, e viola os direitos da mulher, incluindo sua integridade física, mental, emocional e psicológica, além de sua dignidade. A mesma é considerada inconstitucional e viola o inciso II do art. 1º da Constituição Federal, que garante os direitos fundamentais da pessoa humana. Embora existam convenções internacionais que apoiam a eliminação da violência obstétrica e a proteção das mulheres, elas são pouco conhecidas e utilizadas no Brasil. O aumento da violência contra a mulher no Brasil, incluindo a violência obstétrica, é alarmante, e embora leis tenham sido regulamentadas para proteger as mulheres e punir os agressores, a violência continua a aumentar. A falta de legislação específica sobre violência obstétrica é uma preocupação, já que as taxas de mortalidade materna e de violência traumatizante no período pré e pós-natal estão em ascensão. Portanto, é necessário discutir a violência obstétrica no Brasil e conscientizar a sociedade sobre sua importância social e jurídica. O problema de pesquisa visa responder, se a falta de tipificação da violência obstétrica no sistema jurídico brasileiro, gera mais incidentes dessas agressões, ou se as leis e artigos já existentes, são o suficiente para evitar este crime? O objetivo geral desta monografia, é apresentar um aspecto geral da violência contra a mulher, principalmente a violência obstétrica. Os objetivos específicos, são: 7 elucidar os aspectos dos tipos de violência contra a mulher; apresentar, de forma mais objetiva, a violência obstétrica; elencar as punições previstas no código penal para este tipo de violência, além de abordar se é necessária ou não uma lei específica para isso. Utiliza-se para a realização desta pesquisa o formato de revisão; buscando garantir a obtenção das informações mais relevantes dentro do campo de estudo do Direito. Assim, os descritoresde revisão, no que tange à Violência contra a mulher, a violência obstétrica e a penalidade deste tipo de ação no ordenamento jurídico brasileiro. Desta forma, utiliza-se da informação científica disponibilizada nos dados eletrônicos em livros, periódicos e artigos referentes aos sites de pesquisa Google acadêmico e SCIELO. 8 2 NOÇÕES PROPEDÊUTICAS DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER A violência contra a mulher pode ter origem no seio da família, adquirindo um caráter privado, o que muitas vezes não facilita a intervenção para a resolução do problema, e só quando a própria vítima denuncia e pede ajuda, é que pode dar apoio. Na esfera pública, a violência pode se manifestar desde os locais de trabalho ou de estudo, até a violência comum vivida nas ruas, a que todas as mulheres estão expostas e que tem caráter de impunidade, pois não é evitável, nem medidas são tomadas contra os perpetradores (BRASIL, 2018). Ambos os tipos de violência privam as mulheres de sua liberdade de funcionar em um ambiente que estimula seu desenvolvimento e desempenho na sociedade. É por isso que você deve estar ciente da situação e tomar medidas preventivas e ações que reduzam os riscos que o tornam vulnerável (BRASIL, 2018). A violência de gênero pode assumir várias formas e se manifestar em episódios isolados ou o tempo todo. A violência nem sempre envolve o aspecto físico; às vezes causa o mesmo dano, mas aparece verbalmente (BRASIL, 2018). Violência física, sexual e psicológica inclui estupro, abuso sexual, assédio sexual e intimidação no trabalho, em instituições de ensino e outros lugares, tráfico de mulheres e prostituição forçada. A violência perpetuada contra a mulher restringe seu direito à liberdade, prejudicando sua dignidade e integridade, prejudicando sua autoestima e limitando suas relações sociais por medo de ser vítima em qualquer contexto social (SILVA; et al, 2007). O Estado tem a obrigação de investigar, processar e punir os autores dos atos de violência contra as mulheres, sejam eles ocorridos no domicílio, na esfera pública ou cometidos por agentes do Estado. Os Estados-Nação devem condenar a violência contra a mulher, criando os mecanismos jurídicos pertinentes para sua erradicação, por meio dos internacionais relacionados com a violência doméstica como a Convenção. Belém do Pará, a resolução da Comissão Interamericana do caso Maria da Penha. também devem definir políticas sociais nas quais se especifiquem novas formas de proteção, participação ativa dos setores envolvidos, com ênfase na prevenção da violência, e 9 os fundamentos são criados para uma sociedade equitativa e justa, onde as mulheres atuam com dignidade. Segundo o artigo 7°, inciso I, da Lei Maria da Penha (LMDP) (2006) a violência física é entendida como “qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal”. Dessa forma atinge o corpo da mulher causando-lhe dor, dano ou risco, seja isso, qualquer forma de abuso ou agressão que afete sua integridade física. Sucessivamente, no artigo 7°, inciso II, da LMDP a violência psicológica é entendida como: qualquer conduta que lhe cause danos emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação (BRASIL, 2006). Dessa forma, é um dano emocional que diminui a autoestima, prejudica e perturba o pleno desenvolvimento pessoal da mulher, bem como, que busca degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, por meio de ameaça, assédio, restrição, humilhação, desonra, descrédito, manipulação ou isolamento. Com base no artigo 7°, inciso III, da LMDP a violência sexual é entendida como: qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos (BRASIL, 2006). Dessa forma, qualquer ação que implique a violação do direito da mulher de decidir voluntariamente sobre sua vida sexual ou reprodutiva por meio de ameaças, coerção, uso de força ou intimidação, incluindo estupro dentro do casamento com ou sem convivência, bem como exploração, escravidão, assédio, abuso sexual e tráfico de mulheres. Ainda no mesmo artigo 7°, inciso IV da LMDP, inciso IV, a violência patrimonial é entendida como “qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição 10 parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades” (BRASIL, 2006). Dessa forma, se constitui como sendo uma forma de violação que visa causar prejuízo nos recursos econômicos ou patrimoniais da mulher, por meio da perturbação da sua posse, propriedade de seus bens, seja por meio de furto, destruição, retenção indevida de objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos econômicos. Por fim no inciso V, do artigo 7°, da LMDP se tem a violência moral, entendida como “qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria”. Ou seja, é aquela que por meio de padrões estereotipados, mensagens, valores, transmite e reproduz a desigualdade e a discriminação nas relações sociais, naturalizando a subordinação das mulheres na sociedade. De acordo com as formas que se manifestam nas diferentes áreas, as modalidades são: violência doméstica: encontra-se descrita no artigo 5°, caput, da LMDP, e é definida como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Sendo aplicada conforme os incisos que seguem: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. Art. 6º A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos. Assim, é uma prática criminosa exercida contra a mulher por membro do agregado ou de relação de afeto, independentemente do espaço físico onde ocorra, que prejudique a dignidade, o bem-estar, a integridade física, psicológica, sexual, económica ou patrimonial, a liberdade, incluindo a liberdade reprodutiva e o direito ao 11 pleno desenvolvimento das mulheres. Entende-se por grupo familiar aquele originado do parentesco por consanguinidade ou por afinidade, casamento, união estável ou de fato e a lei inclui até mesmo por afinidade. Inclui relacionamentos atuais ou encerrados, a coexistência não é um requisito; A outra modalidade é a chamada violência institucional, segundo as informações do Ministério Público de São Paulo (2021, pág., única) este tipo de violência não é tão discutido, masafeta “as mulheres que são pobres, negras, imigrantes, lésbicas ou transexuais”. Essa conduta tem como agente ativo funcionários públicos, e sua prática visa retardar, dificultar ou impedir a mulher de ter acesso às políticas públicas e de exercer os direitos previstos nesta lei. Os tipos mais comuns de violência institucional são: “As mais comuns são: Mau atendimento, recusa em prestar atendimento e orientação, agir de forma discriminatória e preconceituosa e omissão para os relatos de casos de violência” (BRASIL, 2013). Violência no trabalho ou assédio sexual, já que segundo o artigo 216-a do código penal essa conduta é caracterizada pelo constrangimento “com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual”, onde o agente ativo se prevalece da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Aquele que discrimina a mulher no ambiente de trabalho público ou privado e que impede seu acesso ao emprego, contratação, promoção, estabilidade ou permanência nele, exigindo requisitos sobre estado civil, maternidade, idade, aparência física ou realização de testes de gravidez. A violência contra as mulheres no local de trabalho também é uma violação do direito a salário igual para a mesma tarefa ou função. Da mesma forma, inclui o assédio psicológico sistemático a uma determinada trabalhadora para conseguir sua exclusão do trabalho (SIQUEIRA; SAMPARO, 2017). Outra modalidade, segundo Trajano e Barreto (2021), se pode falar da violência obstétrica, que é exercida pelos profissionais de saúde sobre o corpo e os processos reprodutivos das mulheres, expressa-se no tratamento desumanizado, no abuso da medicalização e na patologização dos processos naturais. A autora cita que existe alguns recursos legais no Brasil com políticas e programas que combatem essa 12 prática como o “Programa Nacional de Humanização do Parto e Nascimento (2000); Lei do Acompanhante (2005), Rede Cegonha – Rede de Atenção Materno Infantil (2011) e Diretriz Nacional de Atenção à Gestante (2015/2016)”, mas ainda há poucos estudos sobre essa violência. Dessa forma, como se observou ao longo do texto entende-se por violência contra a mulher toda conduta, ação ou omissão que, direta ou indiretamente, tanto na esfera pública como na privada, baseada em uma relação desigual de poder, afeta sua vida, liberdade, dignidade, integridade física, psicológica, sexual, econômica ou patrimonial, bem como sua segurança pessoal. A violência indireta é qualquer conduta, ação, omissão, disposição, critério ou prática discriminatória que coloque a mulher em desvantagem em relação ao homem. Partindo desse problema da violência no próximo capítulo será exposto formas de combate a essa violência (BRASIL, 2013). 13 3 A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: CONTEXTO HISTÓRICO E SUAS VARIAÇÕES O princípio da dignidade humana é um dos mais importantes princípios jurídicos utilizados para definir os direitos fundamentais, e, portanto, um princípio que desenvolve todos os outros direitos fundamentais garantidos em sistema legal. É ele quem possibilita diferentes dimensões de direitos. Neste espírito, a dignidade da pessoa humana é o valor máximo que atrai conteúdo de todos os direitos humanos fundamentais, começando pelo direito à vida (SILVA, 1988). Portanto, acredita-se que a dignidade da pessoa humana é uma característica intrínseca e distinção reconhecida por todo homem, tornando-o digno do mesmo respeito e reconhecimento do Estado e da comunidade, ou seja, neste sentido, um conjunto de direitos e obrigações a que uma pessoa tem direito contra quaisquer atos de natureza degradante e desumana, e garantir condições mínimas de vida para toda a vida saudável, além de garantir e promover sua atividade e corresponsabilidade pelo destino da própria existência e vida em comunhão com outros seres humanos, através do devido respeito pelos outros seres que compõem a teia da vida (SILVA, 1988). O indivíduo, pelo simples fato de pertencer à raça humana, já se torna possuidor de dignidade, tal qualidade é inerente a todas as pessoas, é um ser decorrente da própria condição do homem, que o torna digno de respeito e respeito maneira igualitária. Este princípio constitucional está elencado no inciso III do art. 1 da lei da Constituição Federal e é um dos alicerces de um Estado Democrático de Direito Lei relativa à República Federativa do Brasil, como princípio básico garantir que a pessoa humana tenha os direitos mínimos que deveria ter respeitados pela sociedade e pelo Estado, preservando assim a liberdade individualidade e personalidade. Quando este princípio não é respeitado, a infração se torna muito mais nociva e tem muito mais peso do que o infrator de uma simples regra. Se este é o mandamento fundamental de qualquer ordem, é dele Violação significa transgressão não apenas contra uma ordem específica, mas contra toda a norma. pátria, todo o nosso sistema. Sendo então a forma mais grave de ilegalidade ou inconstitucionalidade, não havendo sequer disciplina na adoção de valores 14 fundamentais, constituindo-se assim em violação do princípio da dignidade da pessoa humana um ato que ofende toda a estrutura constitucional (PIOVESAN, 2004). A violência obstétrica é um tema de grande importância e atualidade, que tem recebido cada vez mais atenção nos últimos anos. Esse tipo de violência é caracterizado por qualquer tipo de agressão física ou psicológica que ocorra durante o parto ou o período pós-parto, afetando tanto a mãe quanto o bebê. Para compreender melhor esse fenômeno, é necessário conhecer seu contexto histórico e as variações que ocorrem ao longo do tempo (AZEVEDO, 2022). No contexto histórico, a violência obstétrica remonta aos primórdios da humanidade, quando as mulheres eram tratadas como objeto de reprodução e submetidas a procedimentos dolorosos e desumanos durante o parto. Durante séculos, o parto foi considerado um processo natural e sem importância, o que levou muitos profissionais a negligenciarem a saúde e o bem-estar das parturientes (SILVA et al., 2023). Diante da violência obstétrica, a mulher deve ter a liberdade de administrar seu próprio parto e ter autonomia para ser a heroína de sua própria história. Ela deve ter o poder de decidir sobre seu corpo e sua liberdade de dar à luz, tendo acesso a serviços apropriados, seguros, competentes, benevolentes, humanos e valiosos. É importante ressaltar que não se trata apenas de agressão física, mas sim de uma violação da liberdade de escolha da gestante e seu direito a um parto digno (SILVA et al., 2023). O princípio mencionado no parágrafo anterior aplica-se absolutamente ao caso da proteção da integridade física, moral e psicológica da mulher. Portanto, é um princípio que pode justificar o fim da prática da violência de gênero feminino. O princípio da dignidade humana tem poder de aplicação e deve estar equipado com todos os meios para impedir a publicação de normas e regras que violam os direitos das mulheres. A agressão contra as mulheres deve ser vista como uma violação dos direitos humanos, ou seja, uma sociedade que não cria mecanismos de proteção à defesa e repreensão dessa violação mostra-se como aliada desse fato, prejudicando seus próprios princípios constitucionais (AZEVEDO, 2022). A violência obstétrica é uma forma de intervenção inapropriada, não consentida e abusiva que prejudica os direitos fundamentais da mulher, como autonomia, 15 liberdade, privacidade, informação, escolha e participação nas decisões. Essa violência pode se manifestar de várias formas, incluindo negligência médica, discriminação e práticas desnecessárias e extremas, sem embasamento científico na medicina, podendo deixar sequelas físicas ou psicológicas tanto para a mãe quanto para o recém-nascido (SILVA et al., 2023). Os diferentestipos de violência obstétrica podem ser observados durante o pré- parto, durante o parto e após o parto, podendo ser físicas, psicológicas, verbais, simbólicas e/ou sexuais (AZEVEDO, 2022). Na fase pré-natal, ocorre violência obstétrica quando informações essenciais sobre a gestação não são passadas adequadamente e recomendações desnecessárias para cesarianas são feitas sem explicar os riscos do procedimento. Isso evidencia a falta de autonomia da mulher para escolher o tipo de parto e o local em que deseja que ocorra. A negligência médica também se manifesta quando a gestante é negada atendimento emergencial ou quando regras são impostas para dificultar o recebimento de serviços médicos, levando a situações em que a gestante precisa percorrer vários hospitais em busca de atendimento (SILVA; SILVA, 2023). No entanto, ao longo do tempo, a visão sobre o parto e a atenção à saúde da mulher foram evoluindo, e novas práticas e tecnologias foram desenvolvidas para tornar o parto mais seguro e confortável. No entanto, mesmo com essas mudanças, a violência obstétrica ainda persiste em muitos lugares do mundo, muitas vezes devido à falta de conhecimento ou empatia dos profissionais de saúde (SILVA; SILVA, 2023). Uma das variações mais comuns da violência obstétrica é a falta de informação e consentimento das mulheres em relação aos procedimentos médicos que serão realizados durante o parto. Muitas vezes, as mulheres são submetidas a intervenções médicas desnecessárias, como cesarianas, episiotomias e uso excessivo de medicamentos, sem terem sido informadas sobre as alternativas e os possíveis riscos envolvidos (WEY, 2022). Outra variação da violência obstétrica é o tratamento inadequado e desrespeitoso que muitas mulheres recebem durante o parto e o período pós-parto. Muitas vezes, elas são tratadas com desdém, ignoradas ou ridicularizadas pelos profissionais de saúde, o que pode causar traumas emocionais e prejudicar a saúde mental e física tanto da mãe quanto do bebê (AZEVEDO, 2022). 16 Durante o parto, os procedimentos invasivos são predominantemente físicos e muitas vezes são realizados sem embasamento científico e sem considerar o bem- estar da gestante, podendo causar desde lesões leves até aquelas que podem levar à morte. Infelizmente, o sistema de saúde brasileiro ainda utiliza muitos procedimentos considerados ultrapassados pela OMS, como uso de ocitocina sintética para acelerar o trabalho de parto, episiotomia excessiva, manobra de Kristeller, tricotomia, enema e exame de toque repetido para verificar a dilatação da mulher, entre outras práticas abusivas e violentas (SILVA; SILVA, 2023). Após o parto, outras formas de violência podem ocorrer, como o chamado "ponto do marido", técnica antiquada e machista que envolve dar um ponto na sutura final da vagina para torná-la menor e mais apertada, aumentando assim o prazer do parceiro. Também é comum expor recém-nascidos a procedimentos sem permitir que eles tenham contato com a mãe ou se alimentem do leite materno primeiro. Além disso, os pais podem ser tratados inadequadamente, não sendo permitidas visitas diárias ou acompanhamento da mãe e do bebê, e a separação da mãe e do bebê pode ocorrer sem justificativa plausível, prejudicando o aleitamento e deixando as mães inseguras quanto à forma correta de amamentar (WEY, 2022). Além disso, os pais também podem ser tratados de maneira inadequada, sem lhes ser permitido visitas diárias ou acompanhamento da mãe e do bebê. Proibir a presença de um acompanhante também é uma violação da Lei nº 11.108. É comum que tanto a mãe quanto o bebê sejam submetidos a procedimentos médicos exclusivamente para o treinamento de estudantes e residentes, o que configura uma violação de seus direitos (BRASIL, 2005). A separação da mãe e do bebê também pode ocorrer sem motivos concretos, dificultando o aleitamento e deixando as mães inseguras quanto à forma correta de amamentar. Infelizmente, muitos profissionais não têm respeito ou consideração pelas mães, realizando procedimentos sem explicar adequadamente ou causando desconforto desnecessário (SILVA; SILVA, 2023). Além disso, a violência obstétrica também pode ocorrer devido à falta de recursos e infraestrutura adequados nos serviços de saúde. Em muitos lugares, as mulheres são submetidas a condições precárias de atendimento, como falta de 17 higiene, falta de privacidade e falta de acompanhamento adequado, o que pode aumentar os riscos de complicações e infecções (WEY, 2022). Outro aspecto importante da violência obstétrica é a discriminação e o preconceito que muitas mulheres enfrentam durante o parto. Mulheres negras, indígenas, LGBTQIA+ e de baixa renda são particularmente vulneráveis à violência obstétrica, devido a estereótipos e preconceitos arraigados na sociedade (SILVA; SILVA, 2023). 18 4 O ORDENAMENTO JURÍDICO NO QUE TANGE A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL A violência contra a mulher é vista como uma violação dos direitos humanos pela sociedade. Quando essa violação não é combatida com mecanismos adequados de proteção, defesa e punição, a sociedade acaba sendo conivente com esse tipo de comportamento, o que vai contra seus próprios princípios constitucionais (SILVA et al., 2022). A Convenção de Belém do Pará pode ser usada como base para compreender melhor o que é a violência contra a mulher. Essa convenção define violência como qualquer ação ou conduta com base no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico, tanto no âmbito público quanto no privado. Em outras palavras, a violência é o uso de força física, psicológica ou intelectual para coagir uma pessoa a fazer algo contra sua vontade, tirando dela o direito à liberdade e à expressão de seus desejos e vontades. De acordo com Silva et al., (2023), a violência contra a mulher é uma violação grave dos direitos humanos fundamentais. É importante destacar que a violência contra a mulher pode se manifestar de diversas formas, como agressão física, sexual ou psicológica, coerção, intimidação e controle. Além disso, esse tipo de violência pode ocorrer em diferentes contextos, como no âmbito doméstico, no trabalho e na comunidade em geral. Tudo isso deve ser levado em consideração quando se trata de combater a violência contra a mulher. Foi realizada uma convenção com o objetivo de eliminar todas as formas de discriminação contra a mulher, a qual definiu que qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, é contrária à igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo (BRASIL, 2002). A violência contra a mulher é uma forma extremamente grave de discriminação baseada em gênero, que representa uma violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Ela afeta significativamente a vida em sociedade das mulheres, restringindo seu direito de tomar decisões livre e 19 autonomamente, de ir e vir, manifestar opiniões e desejos, direitos inalienáveis que todas as pessoas devem possuir (SILVA et al.., 2023). A Lei Maria da Penha é uma importante medida de proteção que defende diversas mulheres no Brasil, processando e punindo agressores. Sua aplicação respeita os princípios legais e não viola a dignidade humana. No entanto, sua abrangência se limita às violências ocorridas no âmbito familiar ou doméstico. A lei traz em seus artigos 5º, 6º e 7º as definições e as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher (BRASIL, 2006). O artigo 7º menciona que a violência física é caracterizada por ações que violam a integridade ou saúde da mulher, causando danos físicos através do uso de força, podendoou não envolver armas. A violência psicológica é qualquer ato que cause danos emocionais à mulher, diminuindo sua autoestima e prejudicando seu desenvolvimento pessoal e social. Já a violência sexual é caracterizada como qualquer ato que constranja a mulher a manter ou participar de relação sexual não consentida, utilizando-se de intimidação, ameaça, coação ou força. A violência patrimonial e moral é definida, respectivamente, como qualquer conduta que resulte em retenção, subtração ou destruição de bens da vítima, e qualquer ato que caracterize calúnia, difamação ou injúria (BRASIL, 2006). Infelizmente, a violência obstétrica não recebe a mesma atenção e reconhecimento que a violência de gênero, embora seja perpetrada contra mulheres. A prática tem suas raízes em motivos históricos relacionados ao poder e hierarquia em que os homens exerciam controle sobre as mulheres. Na sociedade patriarcal, as mulheres eram submissas aos homens, considerados chefes de família, e eram vistas como responsáveis apenas por dar à luz e cuidar dos filhos, devido à sua condição de gênero. Essa visão desvalorizava as mulheres e limitava suas oportunidades na vida (SILVA et al.., 2023). A Lei 17.097, sancionada em Santa Catarina em 17 de janeiro de 2017, é uma das primeiras leis sobre a violência obstétrica, garantindo a proteção e informação das gestantes e parturientes contra a violência obstétrica. O conceito de violência obstétrica, descrito no artigo 2º da Lei, abrange qualquer ação que cause ofensa verbal ou física às gestantes em trabalho de parto ou pós-parto, seja por profissionais de saúde, familiares ou acompanhantes. Infelizmente, a violência obstétrica é mais 20 comum do que se imagina e pode ocorrer por meio de comentários preconceituosos e desrespeitosos, que muitas vezes carregam um tom irônico e ignorante, como "na hora de fazer estava bom" ou "você não gritou assim na hora de fazer". Essas ofensas desnecessárias podem transformar um momento que deveria ser especial em uma lembrança negativa e triste para as mulheres (SANTA CATARINA, 2017). Na Venezuela, a Lei Orgânica sobre o direito das mulheres a uma vida livre de violência entrou em vigor em 23 de janeiro de 2007, definindo a violência obstétrica como uma forma de violência contra a mulher. De acordo com o artigo 15, inciso 13, a violência obstétrica ocorre quando os profissionais de saúde se apropriam do corpo e dos processos reprodutivos das mulheres, tratando-as de maneira desumanizadora e abusiva, além de dos processos naturais. Como resultado, as mulheres perdem sua autonomia e capacidade de tomar decisões livres sobre seus corpos e sexualidade, tendo sua qualidade de vida impactada negativamente (UNESCO, 2015). Além disso, em seu artigo 51, a lei estabelece uma lista de ações consideradas como violência obstétrica, que são praticadas por profissionais da saúde. Essas ações incluem: não responder prontamente às emergências obstétricas, obrigar a mulher a dar à luz em posição dorsal e com as pernas levantadas, informando incorretamente que esta é a única forma de realizar o parto, impedir que a recém-nascida vá imediatamente para os braços da mãe, sem apresentar justificativa, realizar técnicas para acelerar o parto sem o consentimento da mãe e realizar cesarianas sem a clara vontade da mãe (AZEVEDO, 2022). Quanto à necessidade de tutela penal para regular a violência obstétrica, conforme mencionado anteriormente, o artigo 1º da Constituição Federal estabelece a dignidade da pessoa humana como o princípio mais importante do sistema jurídico brasileiro. A partir deste artigo, as mulheres grávidas deveriam sentir-se seguras e confiantes de que receberão um tratamento humanizado durante a gestação e um parto responsável. Além disso, esse princípio pode ser utilizado para responsabilizar os profissionais que têm a obrigação de proteger e amparar essas mulheres, mas que acabam desrespeitando-as e cometendo diversas violações obstétricas (BRASIL, 1988). No entanto, no Brasil, não há uma lei específica ou um dispositivo no Código Penal que trate desse tipo de violência contra a mulher. Mesmo assim, é possível 21 enquadrar esses casos em outros crimes sem a necessidade de criar um novo artigo específico (WEY, 2022). A maioria das práticas consideradas violência obstétrica no Brasil pode ser enquadrada em diferentes tipos penais presentes no Código Penal. Em casos de violações durante o parto que resultem na morte da mãe ou do recém-nascido, os responsáveis podem ser acusados de homicídio simples, previsto no artigo 121 da Lei n° 2.848 de 1940, com pena de reclusão de seis a vinte anos. A violência obstétrica também pode resultar em danos físicos, como a episiotomia, que pode ser considerada lesão corporal, conforme prevê o artigo 129 do Código Penal. A pena pode variar de detenção de três meses a um ano ou de reclusão de um a cinco anos, dependendo da gravidade da lesão. Em casos de lesão corporal seguida de morte, o agente pode ser condenado a uma pena de reclusão de quatro a doze anos, mesmo que não tenha havido intenção de produzir esse resultado. Portanto, apesar da ausência de uma lei específica sobre violência obstétrica no Brasil, as condutas abusivas podem ser punidas pelos dispositivos já existentes no Código Penal. A violência obstétrica pode ser enquadrada em várias tipificações criminais, tais como o crime de lesão corporal seguida de morte, que prevê a pena de reclusão de quatro a doze anos, nos casos em que a violência resulta em morte, mas o agente não quis ou não assumiu o risco de produzi-la. Também pode ser aplicado o crime de maus-tratos, que estabelece a pena de detenção de dois meses a um ano, ou multa, e pode ser agravado em caso de lesão corporal grave ou morte. Exemplos de maus-tratos incluem exames de toque excessivos e sem necessidade, negação de medicamentos ou anestesia e falta de tratamento digno (SILVA; SILVA, 2023). Além disso, o crime de maus-tratos, previsto no artigo 136 do Código Penal, pode ser aplicado caso o agente exponha a vida ou a saúde da paciente sob sua autoridade, guarda ou vigilância, a perigo. Isso pode ocorrer, por exemplo, quando médicos ou enfermeiros realizam exames de toque excessivos e desnecessários, negam tratamento digno e humanizado, ou privam a paciente de medicamentos, injeções ou anestesias. O crime de maus-tratos pode acarretar pena de detenção de 22 dois meses a um ano, além de multa, podendo ser agravado em caso de lesão corporal grave ou morte decorrente da violência obstétrica. A violência psicológica é uma forma comum de violência obstétrica e pode ser enquadrada em diversas tipificações criminais. O crime de injúria, por exemplo, estabelece a pena de detenção de um a seis meses, além de multa, para aqueles que ofendem a dignidade ou o decoro da pessoa. A ameaça, definida como a ameaça de causar mal injusto e grave, pode resultar em detenção de um a seis meses. Já o crime de constrangimento ilegal, que consiste em coagir alguém a fazer o que a lei não permite ou a não fazer o que a lei manda, pode resultar em detenção de três meses a um ano, mais multa (WEY, 2022). Ademais, a legislação brasileira estabelece circunstâncias agravantes quando a violência obstétrica é cometida contra uma mulher grávida, devido à sua vulnerabilidade física e ao seu estado durante o parto. Assim, os profissionais de saúde que praticam violência obstétrica podem ser processados e condenados de acordo com as leis penais brasileiras (SILVA; SILVA, 2023). Cabe destacar que existem dispositivos legais específicos que agravam a punição para casos em que ocorrem óbitos decorrentes de procedimentos inadequados realizados por profissionais da área da saúde (WEY, 2022). Um exemplo é apresentado por meio de um caso judicial relacionado à realização da episiotomia durante o parto:APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO CULPOSO. Parto normal com episiotomia. ART. 121, § 3º, DO cp. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE DO § 4º DO MESMO DISPOSITIVO LEGAL. (inobservância de regra técnica de profissão). Pena que não merece redimensionamento. Demonstrado que o réu agiu com negligência, imprudência e imperícia, e que dita conduta levou a paciente a óbito, pois, após o parto com episiotomia, deixou de realizar procedimento de revisão do reto, o que propiciou a comunicação do conteúdo fecal com o canal vaginal, culminando com infecção generalizada, que evoluiu com a morte da vítima, mostra-se correta a sua condenação pela prática do delito de homicídio culposo. Aplicabilidade da causa de aumento de pena prevista no § 4º do art. 121 do CP, por inobservância de regra técnica de profissão. Pena definitiva de dois anos de detenção, substituída por duas restritivas de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, que se mostra adequada ao caso, não ensejando redimensionamento. APELAÇÃO DESPROVIDA (TJRS, 2013). Neste caso julgado, foi constatado que um médico foi condenado por homicídio culposo agravado por não ter seguido as normas técnicas de sua profissão, 23 apresentando negligência, imprudência e inexperiência ao não revisar o exame retal após uma episiotomia, o que teria evitado a morte da mulher se detectado a tempo. Sendo assim, não é necessário criar um novo artigo no Código Penal especificamente para a violência obstétrica, uma vez que é possível identificá-la como uma forma de violência contra a mulher e responsabilizar os profissionais na esfera civil e ética. A violência obstétrica pode ser enquadrada em diversos artigos já existentes no Código Penal, permitindo a denúncia e condenação dos agressores pela Justiça. 24 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A violência obstétrica é uma forma de violência contra a mulher que ocorre no contexto do parto e do pós-parto. Ela pode ser caracterizada por ações ou omissões dos profissionais de saúde que violam os direitos humanos das mulheres, como a negação de tratamento digno, abuso de poder, violência física e psicológica, além da realização de procedimentos desnecessários e dolorosos. No Brasil, essa violência é reconhecida como crime e pode ser penalizada de acordo com as leis penais brasileiras. A penalização da violência obstétrica é uma questão importante para garantir que as mulheres tenham seus direitos respeitados durante o parto. As leis brasileiras preveem diversas tipificações criminais que podem ser aplicadas a casos de violência obstétrica, como o crime de maus-tratos, injúria, ameaça e constrangimento ilegal. Além disso, há circunstâncias agravantes quando o crime for cometido contra uma mulher grávida. É fundamental que as vítimas denunciem a violência obstétrica e que os profissionais de saúde sejam responsabilizados pelos seus atos. A possibilidade de punição também pode servir como um fator de dissuasão para os profissionais que praticam a violência obstétrica, conscientizando-os sobre as graves consequências jurídicas e éticas de tais práticas. A penalização também envia uma mensagem clara de que o Estado não tolerará qualquer tipo de violência contra a mulher, mesmo quando cometida por profissionais de saúde durante o parto. Por fim, é importante ressaltar que a violência obstétrica não deve ser tratada apenas como um problema individual dos profissionais de saúde, mas como um problema estrutural do sistema de saúde como um todo. 25 REFERÊNCIAS AZEVEDO, Isabela Dias de. A importância do direito contra a violência obstétrica no brasil. Artigo científico apresentado à Pontifícia Universidade Católica de Goiás, para a Escola de Direito Negócios e Comunicação, 2022. BRASIL. Conselho Nacional do Ministério Público. Violência contra a mulher: um olhar do Ministério Público brasileiro / Conselho Nacional do Ministério Público. – Brasília: CNMP, 2018. BRASIL. Lei 11.340, de 07 de agosto de 2006: Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal [...]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm. Acesso em 21 de mar. 2023. BRASIL. Lei nº 11.108, de 7 de abril de 2005: Altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para garantir às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11108.htm. Acesso em 30 de abr. 2023. BRASIL. Decreto nº 4.377, de 13 de setembro de 2002. Promulga a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, e revoga o Decreto no 89.460, de 20 de março de 1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4377.htm. Acesso em 30 de abr. 2023. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 16 de abr. 2023. BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro-RJ, 31 dez. 1940. BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização. 2013. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_fol heto.pdf. Acesso em 02 de nov. 2022. BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde mental / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília: Ministério da Saúde, 2013. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos, o princípio da dignidade da pessoa humana e a Constituição de 1988. São Paulo: Max Limonad, 2004. p. 92. 26 SILVA, José Afonso da. A dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 212, p. 92-94, 1988. SANTA CATARINA. Câmara dos Deputados. Lei nº 17.097, de 17 de janeiro de 2017: Dispõe sobre a implantação de medidas de informação e proteção à gestante e parturiente contra a violência obstétrica no Estado de Santa Catarina. Disponível em: http://leis.alesc.sc.gov.br/html/2017/17097_2017_lei.html. Acesso em 30 de mar. 2023. SIQUEIRA, D. P.; SAMPARO, A. J. F. Os direitos da mulher no mercado de trabalho: da discriminação de gênero à luta pela igualdade. Revista Direito Em Debate, 26(48), 287–325, 2017. DOI: https://doi.org/10.21527/2176- 6622.2017.48.287-325. Disponível em: https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/view/7233. Acesso em: 25 de mar. 2023. SILVA, Rita de C. R. et al. Influência da violência familiar na associação entre desnutrição e baixo desenvolvimento cognitivo. Jornal de Pediatria [online]. 2012, v. 88, n. 2, pp. 149-154. Disponível em: <https://doi.org/10.2223/JPED.2176>. Acesso em: 25 de mar. 2023. SILVA, J. C. O. .; BRITO, L. M. C. .; ALVES, E. S. .; MEDEIROS NETO, J. B. de .; SANTOS JUNIOR, J. L. P. dos .; MARQUES, N. M. .; LOPES, T. M. de O. .; ALEXANDRE, J. de A. .; SANTOS, L. J. R. P. . Impacts of obstetric violence in Brazil: a literature review. Research, Society and Development, [S. l.], v. 12, n. 2, p. e10812239950, 2023. DOI: 10.33448/rsd-v12i2.39950. Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/39950. Acesso em: 30 mar. 2023. SILVA, M. F. da.; SILVA, E. A. da. Violência obstétrica na perspectiva da enfermagem obstétrica no Brasil. Brazilian Journal of Health Review, 6(1), 3210–3224. 2023. DOI: https://doi.org/10.34119/bjhrv6n1-250. Disponível em: https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BJHR/article/view/57186. Acesso em 31 de mar. 2023. TRAJANO, A. R.; BARRETO, E. A. Violência obstétrica na visão de profissionais de saúde: a questão de gênero como definidora da assistênciaao parto. Rev. Interface, eISSN 1807-5762, Botucatu, 2021. Disponível em: https://www.scielo.br/j/icse/a/PDnDR5XtNdJy47fkKRW6qcw/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 26 de mar. 2023. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL (TJMS). 2ª Câmara Criminal. Apelação Crime nº 70053392767. Relatora: Des. Lizete Andreis Sebben. Data de julgamento: 14 nov. 2013. Disponível em: https://tj- rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113388642/apelacao-crime-acr-70053392767-rs. Acesso em 31 de mar. 2023. 27 UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura. Ley Orgánica sobre el Derecho de las Mujeres a una vida libre de violência. 2007. Disponível em: https://siteal.iiep.unesco.org/pt/node/1121. Acesso em 31 de mar. 2023. WEY, Gabrielle Damiati. A invisibilidade da violência obstétrica no Brasil: lacuna legislativa ou ausência de políticas públicas. 2022. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) - Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022.