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0 SISTEMA DE ENSINO PRESENCIAL CONECTADO CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL Adriana Vieira Macena Oliveira A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER SOB A ÓTICA DA LEI 11-340 DE 2006 1 Arcoverde - PE 2020 ADRIANA VIEIRA MACENA OLIVEIRA A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER SOB A ÓTICA DA LEI 11-340 DE 2006 2 Trabalho apresentado ao Curso de Serviço Social e Sociologia da UNOPAR – Universidade Norte do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social. Professor Orientador: Ma. Valquíria Apª Dias Caprioli Professor Supervisor: Arcoverde - PE 2020 DEDICATÓRIA 3 Dedico esta monografia a Deus, espero que este trabalho seja instrumento de sua paz. 4 AGRADECIMENTOS A Deus pela minha vida, e por me ajudar a ultrapassar todos os obstáculos encontrados ao longo do curso. Aos meus pais e a minha filha e ao meu marido que me incentivaram nos momentos difíceis e que compreenderam a minha ausência enquanto eu me dedicava a realização desse trabalho. Aos professores, pelas correções e ensinamentos que me permitiram apresentar um melhor desempenho no meu processo de formação profissional. 5 EPÍGRAFE A violência não é força, mas fraqueza, nem nunca poderá ser criadora de coisa alguma, só destruidora. (BENEDETTO CROCE) 6 ARCOVERDE. Adriana Vieira Macena Oliveira. A violência doméstica contra a mulher sob a ótica da lei 11-340 de 2006. 2020. p. 40. Monografia. Graduação em Serviço Social e Sociologia. Sistema de Ensino Presencial Conectado - Universidade Norte do Paraná. 2020. RESUMO Quatorze anos após a publicação da Lei 11.340/2016, a Lei Maria da Penha, ainda nos deparamos diariamente com graves notícias de mulheres sendo agredidas diariamente por seus companheiros e, lamentavelmente na maioria das vezes chegando, muitas delas, à morte. O presente trabalho visa, portanto, abordar sobre a violência doméstica contra a mulher, no seu contexto histórico-social e jurídico. Para tanto, elenca-se primeiramente sua diretriz principal na qual se insere dentro do abuso físico, sexual ou psicológico de um componente da estrutura familiar em detrimento da mulher, e em seguida uma análise das normas legais de proteção as mulheres PALAVRAS- CHAVE: Violência doméstica. Feminicídio. Direito penal. Lei Maria da penha. 7 GREEN ARCH. Adriana Vieira Macena Oliveira. Domestic violence against women from the perspective of law 11-340 of 2006. 2020. p. 40. Monograph. Graduation in Social Work and Sociology. Connected Face-to-face Education System - Northern University of Paraná. 2020 ABSTRACT Fourteen years after the publication of Law 11.340 / 2016, the Maria da Penha Law, we are still faced daily with serious news of women being beaten daily by their companions and, regrettably most of the time, many of them reaching death. The present work, therefore, aims to address domestic violence against women, in their historical, social and legal context. To do so, it first lists its main guideline in which it falls within the physical, sexual or psychological abuse of a component of the family structure to the detriment of women, and then an analysis of the legal rules for protecting women. KEYWORDS: Domestic violence. Femicide. Criminal law. Maria da Penha Law. 8 Sumário .................................................................................................................................... 7 1- INTRODUÇÃO .................................................................................................... 10 2- OBJETIVOS ........................................................................................................ 11 3- OBJETIVO GERAL ............................................................................................. 12 4- OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................... 12 ✓ Contextualizar historicamente a trajetória da mulher. ......................................... 12 ✓ Contextualizar historicamente a violência contra mulher. ................................... 12 ✓ Identificar o perfil das vítimas da violência doméstica. ....................................... 12 ✓ Identificar o perfil do agressor da violência doméstica. ...................................... 12 ✓ Analisar a intervenção do Assistente Social quanto a garantia de direitos, bem como acesso aos programas, benefícios socioassistenciais..................................... 12 5- JUSTIFICATIVA .................................................................................................. 13 6- METODOLOGIA ................................................................................................. 15 7- MÉTODO ............................................................................................................ 15 8- PERSPECTIVA DE ESTUDO ............................................................................. 15 9- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .......................................................................... 16 10- DELIMITAÇÃO DO TEMA ............................................................................... 17 11- DESENVOLVIMENTO ..................................................................................... 17 12- ............................................................................................................................. 17 13- DO ÂMBITO FAMILIAR ................................................................................... 17 14- DA VIOLÊNCIA ............................................................................................... 18 15- VIOLÊNCIA FÍSICA ......................................................................................... 22 16- VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA ............................................................................ 23 17- VIOLENCIA SEXUAL ...................................................................................... 23 9 18- VIOLÊNCIA PATRIMONIAL ............................................................................ 24 19- VIOLÊNCIA MORAL ........................................................................................ 24 20- DAS SEQUELAS DO CRIME .......................................................................... 24 21- FEMINICÍDIO .................................................................................................. 24 22- CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 25 23- REFERÊNCIAS ............................................................................................... 27 ALAMBERT, Zuleika. Feminismo: o ponto de vista marxista. São Paulo: Nobel, 1986. .................................................................................................................................. 27 10 2.1 INTRODUÇÃO A violência contra a mulher é um problema que a cada dia ganha maiores proporções, partindo da discriminação de gênero, e relacionada principalmente aos papéis que foram aprendidos e assimilados por homens e mulheres na sociedade. Contudo, o efeito é social, econômico e político, constituindouma das principais formas de violação dos seus direitos humanos, atingindo-as em seus direitos à vida, à saúde, e à integridade física. Ela é estruturante da desigualdade de gênero. Além disso, a violência doméstica envolve mulheres, independente de condição social, opção sexual, religião, cor, etnia e idade. Onde deveria existir uma relação de afeto e respeito, existe uma relação de violência, que muitas vezes é mascarada por estar atrelada a estes papéis que foram impostos pela sociedade patriarcal. Tal situação torna difícil a denúncia, pois torna a mulher agredida ainda mais vulnerável à violência. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil está entre os dez países com maior número de homicídios femininos, esse número é ainda mais alarmante quando se verifica que, em mais de 90% dos casos, esses são cometidos com quem a vítima matinha relação afetiva e em suas próprias casas. Sobretudo, nesse momento de pandemia que o mundo tem enfrentado, com as medidas de isolamento social, governos em todo mundo relatam o aumento das denúncias de violência doméstica. Segundo a ONU Mulheres, é uma das preocupações durante a quarentena, já que não somente as mulheres estão afastadas de suas redes de apoio (familiares e amigos) mas estão tendo que conviver o tempo todo com o possível agressor. No Brasil, houve aumento de mais de 50% de denúncias desde que a quarentena começou em março. Os dados obtidos da pesquisa são oriundos de instituições públicas, os quais não penetram o estrato social dos mais abastados. Além disso, vale ressaltar que a presente pesquisa foi prejudicada no intuito de demonstrar a execução da Lei 11.340/06 pela ausência de dados estatísticos das instituições que tratam da violência doméstica, pois não possuem registros consistentes e efetivos desses delitos, que acabam sendo colecionados de forma generalizada e deficitária. Assim, o escopo desta pesquisa é contribuir para o debate sobre o tema na medida em que se propõe uma reflexão sobre a participação dos atores envolvidos no processo de vitimização 11 da mulher. Além de demonstrar que a Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006, é um mecanismo capaz de coibir, punir os agressores e promover a formação e reabilitação dos agentes. 2.2 OBJETIVOS 12 2.3 OBJETIVO GERAL Identificar as principais formas de violência doméstica contra a mulher e suas principais consequências, aplicação da Lei Maria da Penha e a atuação do Assistente Social no âmbito familiar. 2.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ✓ Contextualizar historicamente a trajetória da mulher. ✓ Contextualizar historicamente a violência contra mulher. ✓ Identificar o perfil das vítimas da violência doméstica. ✓ Identificar o perfil do agressor da violência doméstica. ✓ Analisar a intervenção do Assistente Social quanto a garantia de direitos, bem como acesso aos programas, benefícios socioassistenciais. 13 3 JUSTIFICATIVA Em um processo histórico, as mulheres estiveram enclausuradas dentro do lar por milênios, sendo encarregadas pelos trabalhos domésticos e assumindo a função de esposa e mãe em período integral. Abrir mão dessas funções era inadmissível, outros fatores culturais e morais da época, impediam que elas deixassem de priorizar os afazeres domésticos para trabalhar fora. As grandes significativas vitórias nesse sentido foram conquistadas pelas mulheres até o presente século, se lembrarmos que esta situação de inferioridade se arrastavam há séculos no mundo todo, havendo fases em que as mulheres e crianças nem mesmo eram cotadas nos censos demográficos e não tinham vontades e nem direitos respeitados. Uma ofensa a dignidade humana, que é caracterizada pela manifestação do “mito de superioridade masculina”. Pela manifestação de poder rigidamente hierarquizada entre homens e mulheres que está arraigada em todos os setores sociais. Portanto, a erradicação da violência contra a mulher é essencial para que as sociedades obtenham um amplo desenvolvimento sociocultural e a tão desejada igualdade. O lar, casa e família são termos que apresentam ideia de segurança, conforto, afetividade, a todo momento sabe-se por jornais ou por meio de pessoas próximas relatos de mulheres agredidas no local que deveria ser sinônimo de paz. Da mesma forma, o mito da família idealizada, leva-nos a pensar como um lugar de que deveria ser repleto de afetos, idealização esta, associada a outros mitos, mormente que a violência doméstica constitui um comportamento relativamente raro, além disso, que ocorre nas famílias consideradas anormais ou de classes baixas, com poucos recursos econômicos e que é praticada por indivíduos com perturbações psíquicas e de que se trata de um problema eminentemente privado, dentre outros quarenta. Assim são as ideias prologadas por grande parcela da população, pode-se afirmar que o senso comum domina o pensar da população. Neste contexto, a grande vítima da violência doméstica é a mulher e o agressor (sujeito ativo), em sua maioria, é o homem, ademais, apresenta como característica dominante o fato de manter ou ter mantido relação afetiva com a vítima. Ressalta-se que a violência doméstica cometida por mulheres é estatisticamente inexpressiva, correspondendo a 1% dos casos registrados. Igualmente, em pesquisa apresentada por Sonia Rovinski, extraída de sua experiência de Psicóloga em acompanhar mulheres vitimizadas de maus-tratos 14 e violência, revela-se que “o relacionamento vítima e agressor apresenta dois núcleos predominantes: o de companheiro atual e o do desconhecido” Nessa pesquisa, demonstra-se que a mulher agredida, geralmente, possui um vínculo afetivo com o agressor, pois 56,0% das mulheres vitimizadas foram agredidas pelo companheiro atual, 25,7% não conhecem seu agressor, 9,2% são agredidas por ex-parceiros e 8,2% por conhecidos. Além disso, no que concerne às vítimas de maus-tratos domésticos, divide-se em categorias: companheiro atual 85,9%, ex-companheiro 12,7% e namorado 1,4%. Já as vítimas (73,7%) de violação sexual afirmam que não conhecem o agressor. Diante do aspecto vida e tempo entre agressor e vítima, destaca-se que as agressões sofridas se tornaram periódicas, assim, o tempo médio encontrado foi de 6,03 anos de relação, sendo o mínimo de 1 ano e o máximo de 20 anos, mas o desvio padrão é de 5,3585. A autora aponta outro aspecto investigado quanto ao uso de instrumentos por parte do agressor ao longo do processo. Os resultados demonstraram que o agressor geralmente não utiliza instrumentos durante a agressão, compreendendo 43,6%, entretanto, quando o faz utiliza-se de facas 26,4% e contundentes 20,0% que compreendem objetos da própria casa e a arma de fogo é empregada em 17,3% dos casos86. Nessa pesquisa, observa-se que as mulheres são vitimizadas por seus parceiros, com os quais elas se relacionam afetivamente e a violência é efetuada por meio da força física, uma vez que baseado nos laços de afeto e confiança não sofrem grande resistência ao se aproximarem. Em relação à conduta do agressor, são apontados três grupos distintos: 1) o agressor apresenta característica antissocial e tendência a exercer atos com extrema violência sexual e física (5-8%); 2) o agressor apresenta característica de personalidade antissocial e tende a cometer atos como violência física e verbal, mas não violência sexual (30-40%); 3) o agressor que não apresenta um perfil psicológico marcado por abuso verbal e físico, porém em níveis menos severos que os outros grupos (52-65%)87 . Portanto, diante de tal violência, a mulher torna-se um ser subjugado e inferiorizado,o que afeta o desenvolvimento social, econômico e cultural da sociedade, mormente, seu próprio desenvolvimento, uma vez que a mulher agredida, violentada e humilhada acaba tendo suas potencialidades comprometidas, assim como sua capacidade de trabalho, sua relação na família com os filhos e demais familiares e em quaisquer lugares, pois a violência age em loco e atinge globalmente. 15 4 METODOLOGIA O presente estudo, constitui-se numa pesquisa de delineamento bibliográfico, para o levantamento de obras na literatura. Esta metodologia possibilita a identificação de tendências, recorrências e lacunas no campo de conhecimento investigado a partir da literatura existente. Segundo (Gil 2002) tem como objetivo aprofundar o conhecimento sobre o tema proposto e contribuir para o estudo, através da pesquisa em livros, artigos científicos e legislações referentes ao tema. 4.1 MÉTODO O método do trabalho foi realizado em etapas. Na primeira etapa foi realizada a coleta de dados para aperfeiçoamento da temática em estudo. A segunda etapa discorre da leitura individual feita em livros, revistas a artigos publicados e apreciadores da literatura brasileira com relevância ao tema. A terceira etapa foi a concretização do texto escrito com fundamentação teórica e revisão bibliográfica. O objetivo geral foi alcançado com sucesso. 5 PERSPECTIVA DE ESTUDO Nesse trabalho foi realizada uma pesquisa bibliográfica com o intuito de abordar o tema A violência doméstica contra a mulher sob a ótica da lei 11-340 de 2006. Na visão geral o trabalho visa esclarecer as diversas formas de violência contra a mulher, que atualmente é considerado um problema de saúde pública. Os procedimentos para a coleta de dados foram feitos através da leitura em revistas, livros e artigos publicados em sites sobre a temática em estudo. A linha de investigação se deu através dos diversos fatores de risco no âmbito familiar. 16 Uma questão cultural, que vem sendo arrastadas por séculos por essa sociedade patriarcal da qual fazemos parte. 6 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A lei de número 11-340/2006, ou Lei Maria da Penha, compreende como violência doméstica ou familiar, qualquer ação ou omissão que lhe cause morte, lesão, violência sexual, qualquer sofrimento físico, dano moral ou patrimonial, condenando assim o agressor a cumprir uma pensa de seis meses a três anos, conforme apresentado no art. 129,9, ainda podendo ser aumentada de um terço, se for crime contra pessoa portadora de deficiência, presente no 11. “A popular Lei Maria da Penha, ganhou o reconhecimento da ONU como uma das três melhores legislações do mundo no enfrentamento à violência contra as mulheres, resultou de uma luta histórica dos movimentos feministas e de mulheres por uma legislação contra a impunidade no cenário mundial de violência contra a mulher”. contra a impunidade no cenário nacional de violê ncia doméstica e familiar contra a mulher”. WENDLAND, Henrique Klassmann. Fundamentos conceituais e hermenêuticos para a aplicação da Lei Maria da Penha. Embora a lei tenha apoio significativo de toda a sociedade, sua implementação trouxe à tona muitas resistências. Resistências que conviviam com a aceitação da violência doméstica como crime de menor poder ofensivo e reforçavam as relações de dominação do sistema patriarcal. É necessário esclarecer a grande importância de se conhecer a Lei Maria da Penha, ter real dimensão dos direitos e assim conscientizar a todos que-hoje contam com a proteção e o amparo dela. Deve-se dar a conhecer que todos devem respeitar e valorizar a dignidade e todos os direitos cabíveis ao ser humano. “A lei visa coibir a violência doméstica, tendo em vista aqueles que sofrem os diversos tipos de agressões.” FILHO, Euro Bento Maciel todos os direitos inerentes ao ser humano. “A lei visa coibir a violência doméstica tendo em vista àqueles que sofrem os diversos tipos de agressão”. FILHO, Euro Bento Maciel. Lei Maria da Penha: ainda estamos longe da solução. 17 6.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA Como coibir a violência doméstica contra a mulher, tratar com mais rigor punitivo o agressor e confirmar a ratificação da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher e da convenção para erradicá-la cumprindo as recomendações dos órgãos competentes? 6.2 DESENVOLVIMENTO 6.3 DO ÂMBITO FAMILIAR O lar, casa e família são termos que apresentam a ideia de segurança, afetividade e carinho, no entanto, a todo o momento sabe-se, por meio de pessoas próximas e conhecidas, e pelos meios de comunicações, de mulheres que são violadas e agredidas no local que deveria ser sinônimo de paz e felicidade. Da mesma forma, o mito da família idealizada leva-nos a pensá-la como o lugar dos afetos e da harmonia, idealização está associada a outros mitos, mormente, que a violência doméstica constitui um comportamento relativamente raro, além disso, que ocorre entre as famílias consideradas anormais ou de classes baixas com poucos recursos econômicos e que é praticada por indivíduos com perturbações psíquicas e de que se trata de um problema eminentemente privado, dentre outros. Assim são as ideias propagadas por grande parcela da sociedade; pode-se afirmar que o senso comum domina o pensar da população. Em suma, durante décadas as mulheres se encontraram em uma posição completamente subalterna ao homem, inclusive, frente ao Direito. Várias foram as modificações sofridas na estrutura familiar, tomando por base a família do século passado e suas transformações, até chegar ao modelo da família contemporânea, no entanto, as cicatrizes desta forma de pensar arcaica e patriarcal ainda persistem, assim como afirma ALAMBERT (1986, p.119): 18 O domínio do homem e a subordinação da mulher não se baseiam, portanto unicamente em diferenças biológicas, mas se estabelecem através de relação sociais, e é através dessas relações sociais que a diferença biológica aparece como diferença humana. Esta configuração social da diferença e da contradição homem/mulher adquiriu uma relativa autonomia, e se reproduziu durante tanto tempo em circunstâncias tão diversas, que aparece como um dado “natural”. Ademais, outrora a violência contra a mulher era entendida como uma mera questão individual, "natural" da vida privada do casal. Todavia, com a evolução da luta das mulheres por seus direitos, essa visão foi sendo superada aos poucos até a atualidade em que a violência doméstica é uma questão de saúde pública, inclusive, sendo dever de todos denunciar e prevenir esses delitos, pois, não se pode mais aceitar a ideia de que "Em briga de marido e mulher, ninguém 'mete' a colher". Esse entendimento foi confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça a partir da súmula 542, de 2015, a qual afirma que "A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada", portanto, não depende mais da representação da vítima para que a ação penal seja instaurada. Em outro contexto, para a lei Maria da Penha, considera-se como unidade doméstica, o espaço doméstico que envolve as pessoas com ou sem vínculo familiar, que se consideram aparentados, unidos por vínculo natural, afetivo ou por vontade expressa, incluindo eventuais agregados, não dependendo de coabitação entre as partes. Sobre isso, ALVES (2012) afirma que: Essa definição abrange, inclusive, os empregados domésticos, ou seja, os 'esporadicamente agregados' - assunto, aliás, muito debatido no Congresso Nacional. O termo 'esporadicamente' aqui dá uma noção de relacionamento provisório, típica da relação de emprego doméstico. 6.4 DA VIOLÊNCIAO vocábulo violência é composto pelo prefixo vis, força em latim. Sugere, em primeiro lugar, as ideias de vigor, potência ou impulso. A etimologia da palavra violência, porém, também traz ainda as ideias de excesso e de desmedida. Neste sentido, mais 19 do que uma simples força, a violência pode ser compreendida como o próprio abuso da força. Violência vem do latim violentia, que significa caráter violento ou bravio. O verbo violare significa tratar com violência, profanar, transgredir. Tais termos devem ser referidos a vis, que mais profundamente significa a força em ação, o recurso de um corpo para exercer a sua força e, portanto, a potência, o valor, a força vital. Entender-se-á que violência contra a mulher inclui violência física, sexual e psicológica: que tenha ocorrido dentro da família ou unidade doméstica ou em qualquer outra relação interpessoal, em que o agressor conviva ou haja convivido no mesmo domicílio que a mulher e que compreende, entre outros, estupro, violação, maus-tratos e abuso sexual [...] Ademais, a Violência Doméstica é reconhecida pela Constituição Federal que afirma, no parágrafo 8.º do artigo 226: O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Para a recente Lei de proteção à mulher, denominada como Lei Maria da Penha, nos termos do artigo 5.º, tem-se o seguinte: Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I – No âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II – No âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III – Em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.” A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos. Neste sentido, pode-se dizer que a violência doméstica é a força, a violação, agressividade empregada dentro de casa, no lar, na família, na relação afetiva, contra a mulher. 20 Heleieth Saffioti, ao trabalhar com os conceitos de violência doméstica e violência intrafamiliar, traça um paralelo entre a organização de um galinheiro, no qual impera a “ordem das bicadas” e o galo mais forte enfrenta os rivais e domina as galinhas, e a organização das famílias, da estrutura de uma família patriarcal, na qual o homem adulto é o “chefe da casa”, paga as contas e define o destino da mulher e dos filhos. Ao comparar as duas estruturas, Saffioti traça distinções interessantes para que possamos compreender a violência doméstica. Ou seja, o território de cada galo é demarcado geograficamente. No primeiro caso, se uma galinha fugir o galo não a segue, pois ela deixa de pertencer ao território dele. Já para os seres humanos, o território é simbólico. Quando há uma separação, muitas vezes o homem passa a perseguir a mulher, ou seja, para ele a relação continua existindo, pelo menos simbolicamente, o que pode levá-lo a atos caracterizados como violência doméstica, ainda que praticados fora da residência da família. Dessa forma, o espaço onde se dá a violência doméstica é um território simbólico Além de tudo, a violência doméstica trata-se de uma questão de saúde pública, assim explica Teles e Melo: Estudos realizados no Brasil e em outros países mostram que as mulheres que vivem em situação de violência são frequentadoras dos serviços públicos de saúde, conhecidas como poli queixosas, ou aquelas que sentem vários sintomas, dores e incômodos, difíceis de serem localizados, e que não conseguem nem explicar seus sofrimentos. São mais suscetíveis a sofrer de doenças pélvicas inflamatórias, gravidez indesejada, aborto, espontâneo, depressão, comportamentos obsessivo-compulsivo. Neste contexto, compreende-se que a violência doméstica interfere nos diversos aspectos da vida da pessoa agredida e violada, tais como, social, econômico, profissional, cultural, dentre outros. Pois, uma mulher agredida falta mais ao trabalho, é frequentadora dos serviços médicos que oneram o serviço público do Estado e também onera o bolso da pessoa agredida que tem que tomar medicamentos; muitas vezes, é impedida de crescer profissionalmente, além do grande prejuízo social, pois se isola das pessoas e do mundo. A Lei 11.340/06, denominada de Lei Maria da Penha, que aumentou o rigor punitivo da violência contra a mulher e trouxe uma ampla abrangência das formas de violência, dispõe no artigo 5.º: Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial . 21 Além disso, o artigo 7.º, da Lei 11.340/06, prevê: São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher: I – A violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e a autodeterminação; III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV- a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades. Ainda mais, é provocada pela dilapidação de bens materiais ou não de uma pessoa e causa danos, perdas destruição e outros. V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. Percebe-se que a Lei Brasileira e os Tratados Internacionais preocuparam-se em conceituar os tipos de violência, bem como determinar condutas que considera violência doméstica, assim sanando várias dúvidas e provendo a aplicabilidade da Legislação. Além disso, esses tipos de violência são praticados contra a mulher com frequência no seio familiar e doméstico, também nos relacionamentos amorosos, nos relacionamentos extraconjugais. Neste contexto, as distintas formas de violência apresentam algumas características: 22 Ademais, Violência é um comportamento agressivo que resulta em danos a outrem. Invade a autonomia, integridade física ou psicológica do outro. É, portanto, o uso excessivo de força para obter determinado objetivo. Assim, a violência dissocia-se de força, palavras que costumam estar próximas na línguae no pensamento cotidiano, pois, enquanto força designa, em sua acepção linguística, a energia ou "firmeza" de algo, a violência caracteriza-se pela ação corrupta, impaciente e baseada na ira, cujo objetivo é agredir. Qualquer ato considerado violento é um tipo de violação à integridade física, moral e psicológica da vítima que pode causar danos irreversíveis. Há inúmeras formas de violência que podem ser observadas no cotidiano, cada uma inserida em um tipo diverso de contexto. A Organização Mundial da Saúde (OMS) em seu Relatório Mundial sobre a Violência e Saúde, publicado em 2002, define a violência como: [...] uso da força física ou do poder real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha qualquer possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação. 6.5 VIOLÊNCIA FÍSICA Violência Física compreende atos que agridem o físico, mediante o uso da força física ou utilizando instrumentos com o escopo de ofender a mulher em sua integridade ou a saúde corporal; podem ou não apresentar marcas aparentes. A violência verbal precede a violência física, mas normalmente dar-se-á concomitantemente, é a forma mais evidente e de fácil visualização de violência que existe. Caracteriza-se pela agressão à integridade física, à vida ou à saúde da vítima. Em geral, resultam em hematomas, equimoses, queimaduras, fraturas e, entre outros, danos ao sistema nervoso. Afirma CUNHA (2007, p. 37): Violência física é o uso da força, mediante socos, tapas, pontapés, arremesso de objetos, empurrões, queimaduras e etc. visando, desse modo, ofender a integridade. São condutas previstas, por exemplo, no Código Penal, configurando os crimes de 23 lesão corporal e homicídio (arts. 129 e 121), e mesmo na Lei das Contravenções Penais, como as vias de fato (art. 21). Em uma pesquisa realizada pelo instituto DATASENADO (2017), 67% das vítimas entrevistadas responderam já terem sofrido com a violência física, estando essa categoria em primeiro lugar nos índices apresentados pela pesquisa. 6.6 VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA Violência Psicológica compreende toda agressão que afete a psique da pessoa, deixando-a em estado de perturbação, angústia e instabilidade emocional. Por violência psicológica, entende-se agressão emocional (tão ou mais grave que a física). O comportamento típico se dá quando o agente ameaça, rejeita, humilha ou discrimina a vítima, demonstrando prazer quando vê o outro se sentir amedrontado, inferiorizado e diminuído, configurando a vis compulsiva. Esta violência é cruel e silenciosa, pois a mulher agredida, humilhada e subjugada, geralmente, não fala sobre tais atos, além disso, a sociedade é muito passiva em relação à violência psicológica, uma vez que não deixa marcas visíveis aos olhos. Da mesma forma, entende Rovinski (2004, p.8). 6.7 VIOLENCIA SEXUAL Violência Sexual é compreendida como qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual indesejada, utilizando de intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, por meio de coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos. Agressões como essas provocam nas vítimas, não raras vezes, sentimento de culpa, vergonha e medo, o que as faz decidir, quase sempre, por ocultar o evento. 24 6.8 VIOLÊNCIA PATRIMONIAL Violência patrimonial compreende qualquer conduta que consubstancie em retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos que seriam para satisfazer suas necessidades e da família, geralmente é apresentada separada das demais, servindo, quase sempre, como meio para agredir, física ou psicologicamente a vítima. 6.9 VIOLÊNCIA MORAL Violência moral compreende qualquer conduta que consista em calúnia (imputar à vítima fato criminoso sabidamente falso, artigo 138 do CP ); difamação (imputar à vítima fato ofensivo à sua reputação, artigo 139 do CP) ou injúria (ofender a dignidade e o decoro da vítima, artigo 140 do CP)60. 6.10 DAS SEQUELAS DO CRIME Diante de tais formas de violência, a mulher torna-se um ser subjugado e inferiorizado, o que afeta o desenvolvimento social, econômico e cultural da sociedade, sobretudo, seu próprio desenvolvimento, uma vez que a mulher agredida, violentada e humilhada acaba tendo suas potencialidades comprometidas, assim como sua capacidade de trabalho, sua relação na família com os filhos e demais familiares e em quaisquer lugares, pois a violência age em loco e atinge em todos os aspectos 7 FEMINICÍDIO 25 Apesar desses enormes avanços, a lei Maria da Penha não trouxe em seu texto previsão legal do feminicídio. Assim como foi dito anteriormente, a lei Maria da Penha trouxe somente alterações na legislação processual no tocante a violência contra a mulher, sem tipificar novos crimes, salvo a alteração no art. 129 do CP. O feminicídio só foi incluído na ordem jurídica brasileira pela lei n° 13.104/2015, publicada em março de 2015, com o intuito de responder à altura dos delitos de feminicídio que, infelizmente, ainda hoje são muito altos. A referida lei prevê o novo tipo penal, feminicídio, como qualificadora do crime de homicídio, por meio da adição do inciso IV ao § 2º do art. 121 do CP, bem como o lançamento deste crime ao rol dos crimes hediondos. Tal crime, pode ser conceito, de acordo com CAVALCANTE (2015), da seguinte maneira "Feminicídio é o homicídio doloso praticado contra a mulher por 'razões da condição de sexo feminino', ou seja, desprezando, menosprezando, desconsiderando a dignidade da vítima enquanto mulher, como se as pessoas do sexo feminino tivessem menos direitos do que as do sexo masculino". Nesse diapasão, é auto evidente que para a adequação de uma conduta à esse tipo penal é imprescindível que o sujeito passivo seja um indivíduo do sexo feminino, que sofra o atentado contra sua vida no contexto das seguintes hipóteses: quando houver violência doméstica e familiar; e quando houver menosprezo ou discriminação à condição de mulher, de acordo com a § 2º-A do art. 121. Dessa forma, aquele que cometer o crime de feminicídio, mesmo que seja em sua modalidade tentada, guardadas as devidas proporções nos casos de crimes tentados, estará incurso a uma pena em abstrato maior do que a do homicídio simples, e também poderá ter sua conduta enquadrada em causas de aumento de pena específicas do tipo penal em questão. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Por fim, pontua-se que historicamente as mulheres foram colocadas em uma posição social inferior ao homem, no entanto, em razão da luta dos movimentos feministas, as mulheres conseguiram seu espaço e evoluíram gradativamente a proteção de seus direitos e também a busca da igualdade jurídica entre ambos os 26 sexos. No direito brasileiro, a lei Maria da Penha é, inegavelmente, um marco, que trouxe para a ordem jurídica uma série de mecanismos hoje indispensáveis. No entanto, ainda há um longo caminho para que a referida lei tenha seus objetivos de fato cumpridos, para além da frieza da norma, pois pouco funciona e falta diversos investimentos para o devido cumprimento do prometido pelo Estado. Em primeiro lugar, há 14anos após sua publicação, uma falha estrutural do sistema de polícias. Somente poucas cidades do Brasil possuem as delegacias especializadas em defesa da mulher, de acordo com a Norma Técnica de Padronização das Deams (BRASIL, SPM. 2010).Nesse sentido, o cerne desta lei, que é trazer igualdade entre a vítima e o agressor, torna-se prejudicado, à medida que para a realização no plano fático de seu conteúdo é necessário que os profissionais que trabalham nesta área, bem como a estrutura dos próprios departamentos de polícia e sociedade estejam preparados para receber as vítimas e proceder conforme o disposto no diploma legal para atendê-las com máxima efetividade na garantia de seus direitos, em especial, a proteção de sua dignidade. 27 9 REFERÊNCIAS ALAMBERT, ZULEIKA. FEMINISMO: O PONTO DE VISTA MARXISTA. SÃO PAULO: NOBEL, 1986. ALVES, FABRÍCIO DA MOTA ALVES. LEI MARIA DA PENHA: DAS DISCUSSÕES À APROVAÇÃO DE UMA PROPOSTA CONCRETA DE COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. 2012. 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