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Autor: Prof. Maurício Felippe Manzalli Colaboradora: Profa. Rachel Niza Economia Monetária Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Professor conteudista: Maurício Felippe Manzalli Bacharel em Economia pela Universidade Paulista – UNIP (1995) e mestre em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2000). Atualmente é professor da UNIP nos cursos de Ciências Econômicas e Administração e também é coordenador do curso de Ciências Econômicas na mesma Universidade, tanto na modalidade presencial quanto a distância. Tem experiência em administração e finanças, notadamente aquelas ligadas ao setor de transporte de passageiros, atuando há vinte e nove anos no ramo. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) M296e Manzalli, Maurício Felippe. Economia monetária. / Maurício Felippe Manzalli. - São Paulo: Editora Sol, 2017. 104 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIII, n. 2-073/17, ISSN 1517-9230. 1. Economia monetária. 2. Oferta de moeda. 3. Política monetária. I. Título. CDU 336.7 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Carla Moro Juliana Mendes Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Sumário Economia Monetária APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7 Unidade I 1 FUNÇÕES E EVOLUÇÃO DA MOEDA ............................................................................................................9 1.1 Caracterização e funções básicas da moeda ............................................................................. 10 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA MOEDA E DOS SISTEMAS MONETÁRIOS ......................................... 18 3 DA MOEDA AOS MEIOS DE PAGAMENTO .............................................................................................. 27 3.1 O multiplicador monetário ............................................................................................................... 43 4 A OFERTA DE MOEDA..................................................................................................................................... 46 Unidade II 5 AS TEORIAS DE DEMANDA POR MOEDA ............................................................................................... 56 5.1 Teoria Quantitativa da Moeda (Fischer e Escola de Cambridge) ....................................... 56 5.2 A teoria monetária de Keynes ......................................................................................................... 62 5.3 Os modelos neoclássicos keynesianos ......................................................................................... 66 5.4 Teoria quantitativa moderna: as contribuições de Friedman ............................................ 70 5.5 A teoria novo-clássica ........................................................................................................................ 73 6 POLÍTICA MONETÁRIA ................................................................................................................................... 76 7 REGIME DE METAS PARA INFLAÇÃO ....................................................................................................... 90 8 A POLÍTICA MONETÁRIA: MECANISMOS DE TRANSMISSÃO MONETÁRIA ............................... 96 7 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 APRESENTAÇÃO Tratar de economia monetária é tratar de algo bastante importante nas economias capitalistas: o dinheiro. Esse objeto pode ser considerado de desejo por parte de alguns, enquanto outros podem bem viver sem ele. Afinal, o que é o dinheiro, qual o papel que ele representa na economia capitalista? É o que pretendemos demonstrar neste livro-texto. Não trataremos do dinheiro especificamente, mas, sim, com o rigor que é solicitado por uma disciplina dessa envergadura, trataremos da moeda. Dessa forma, entraremos em um espaço bastante complexo. O entendimento da economia monetária insere-se no ambiente de exploração tanto por parte da contabilidade social quanto por parte da própria macroeconomia, pois uma economia moderna é aquela considerada monetizada, em que a moeda se apresenta como um instrumento que oferece à coletividade as condições necessárias de se fazer o lado real da economia funcionar. Ou seja, a moeda é o elo entre as relações de produção, distribuição, consumo e acumulação de capital que uma sociedade pode fazer. Daí a importância da moeda, bem como de seu estudo. INTRODUÇÃO Este livro-texto destina-se aos que estão iniciando seus estudos sobre economia monetária. Procurando distanciar-se dos jargões muito específicos da área, mas sem incorrer na questão da simplicidade, apresentaremos os principais conceitos, abordagens e desdobramentos dessa parte da macroeconomia para que se possa entender o mundo monetário. Trata-se também de material de apoio à disciplina Economia Monetária. O objetivo é introduzir o conhecimento nas questões monetárias não financeiras, apresentando de maneira clara a vasta quantidade de conceitos e definições que a disciplina nos oferece. Inicialmente, abordaremos conceitos referentes à moeda e às suas funções. Efetuaremos uma viagem pelo tempo, explanando sobre a evolução da moeda, desembocando na discussão sobre o que são meios de pagamento e as formas de criação de moeda, tanto pela autoridade monetária quanto pelos bancos comerciais, agentes que também merecem destaque em nosso texto. Ou seja, trataremos basicamente das condições de oferta monetária. Em seguida, abordaremos as teorias explicativas acerca da demanda de moeda e suas principais vertentes. Apresentaremos a teoria quantitativa da moeda e suas versões, bem como a política monetária, com seus mecanismos, instrumentos e operacionalidade. 9 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA Unidade I Para tratar da economia monetária e do sistema monetário, é necessário ter em mente o sistema capitalista de produção, bem como a divisão social do trabalho que está nele inserida. Em relação a isso, quanto maior for a quantidade de bens que uma coletividade conseguir produzir, maior será a quantidade de transações que essa mesma coletividade fará. Assim, o volume de trocas aumenta e, com ele, as dificuldades de serem satisfeitas as mais diversas necessidades. É nesse aspecto que entra a moeda: instrumento que facilitará as trocas entre os agentes econômicos devidoao seu uso generalizado. Vamos entender como isso acontece. 1 FUNÇÕES E EVOLUÇÃO DA MOEDA Considerando a questão histórica e suas sociedades chamadas de pré-capitalistas, a exemplo do antigo sistema feudal, as trocas de bens entre as sociedades praticamente não aconteciam e, quando aconteciam, eram consideradas diretas, ou seja, bem por bem, mercadoria por mercadoria, não ensejando a necessidade do uso da moeda como facilitador de tais transações. Pensando em uma economia simples, não moderna e não monetizada, a produção exercida pelos homens era trocada em sistema de escambo, o que limitava a atuação dos agentes. Com a evolução das sociedades, dos mercados e, portanto, das trocas, a intermediação monetária começa a se fazer presente, e a sociedade avança para um sistema de trocas indiretas. Nesse novo sistema, bens são trocados por moeda e moedas são trocadas por bens. Com esse avanço, a moeda passa a fazer parte das economias e a ser considerada como uma necessidade social, exercendo suas funções e fazendo parte da vida das pessoas. Contudo, como definir moeda? Por primeira aproximação, moeda é todo ativo capaz de liquidar quaisquer compromissos contratuais à vista ou futuros. Assim, vamos refletir sobre o que vem a ser moeda. A moeda é um artigo utilizado para efetuar trocas. Dá-se moeda em troca de algo. Trabalhamos em troca de moeda. O termo moeda designa moedas metálicas e papel-moeda, as cédulas que utilizamos. A moeda tem valor? Você, por acaso, já encontrou alguém nas ruas de sua cidade vendendo moedas, vendendo dinheiro? Possivelmente não. Por qual motivo? Antes da resposta, reflita mais um pouco! Qual o valor de uma cédula, nota, de R$ 20,00? Quanto vale uma nota de R$ 100,00? Qual o valor de uma moeda metálica de R$ 1,00? Parece estranho dizer, mas, nas economias modernas, as notas, bem como as moedas, não têm valor. Na verdade, elas representam valor! Representar valor significa ter poder aquisitivo. Uma cédula de R$ 50,00 representa um poder de compra de cinquenta unidades monetárias. Uma cédula de R$ 10,00 representa um poder de compra de dez unidades monetárias e assim por diante. Logo, esse deve ser o motivo pelo qual não encontramos pessoas nas ruas vendendo moedas, pois qualquer pessoa não aceitaria vender uma nota de R$ 100,00 por um valor mais baixo do que ela vale e também ninguém aceitaria pagar mais do que esse valor pela nota. Nesse aspecto, Carvalho et al. (2007, p. 1) dizem que: 10 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I A moeda é um objeto que responde a uma necessidade social decorrente da divisão do trabalho. A divisão social do trabalho, característica da economia capitalista moderna, especializou unidades de produção e indivíduos. Os agentes econômicos se tornaram, assim, extremamente independentes. Necessitam fazer inúmeras compras e vendas em períodos, às vezes, bastante curtos. Uma sociedade sem moeda teria uma vida econômica pouco ágil. O tempo para se concretizar uma transação comercial aumentaria demasiadamente, e o desgaste físico e mental para se realizar tal operação seria, talvez, insuportável. Por exemplo, diante de uma chuva inesperada, um indivíduo desejoso de adquirir um guarda-chuva e que tivesse um excedente em laranjas teria que encontrar alguém que tivesse um excedente de guarda-chuvas. Esse tipo de coincidências é chamado de coincidência mútua e complementar de necessidades. Elas podem ocorrer, mas certamente são raras e sua busca desgasta física e mentalmente os interessados em transações específicas. 1.1 Caracterização e funções básicas da moeda Podemos pensar que a moeda seja uma mercadoria, mas não qualquer mercadoria. Ela é muito específica e reúne a propriedade de ser trocada por qualquer outra mercadoria. Basta ter em mãos cédulas ou moedas metálicas para poder trocar por qualquer artigo que represente exatamente as unidades monetárias incorporadas na moeda. Se tivermos em mãos R$ 80,00, poderemos adquirir qualquer mercadoria que tenha um preço idêntico ou menor do que esse valor e que esteja disponível para venda, obviamente. A característica especial que a moeda reúne é a de ser aceita em qualquer situação. Veja um exemplo: seria muito difícil, em uma economia moderna, adquirir mercadorias pagando, ou trocando, por outras mercadorias, como à época do escambo. Caso você queira um sapato novo, você não conseguirá trocar no mercado pelo seu trabalho direto. Haveria a necessidade de dupla coincidência de desejos: o seu desejo de ter os sapatos e o do vendedor em utilizar sua força de trabalho. Agora, de posse da moeda, tudo fica mais fácil. Se o vendedor coloca à venda os sapatos que você deseja, basta que você tenha poder de compra, representado pela moeda, e os compre, pagando em moeda. Pronto. Efetuamos uma troca indireta. Moeda por mercadoria, no caso do comprador, e mercadoria por moeda, no caso do vendedor. Carvalho et al. (2007, p. 2) destacam: Em uma economia monetária, os agentes recebem suas remunerações em moeda e podem, portanto, fazer planos mais flexíveis. Adquirem liberdade para comprar o que desejarem e quando desejarem, em geral, sem qualquer perda de tempo ou desgaste físico e mental com as dificuldades em realizar transações que requerem coincidências muito específicas. Quando desejarem comprar guarda-chuvas, utilizam moeda, que possui aceitação geral a qualquer tempo. 11 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA Observação Se a moeda pode ser pensada como uma mercadoria, mas uma mercadoria especial, ela deve também desempenhar algumas funções. Devido ao desenvolvimento da divisão do trabalho, que especializou pessoas e empresas enquanto produtores de mercadorias, nas economias modernas, há um volume absurdamente grande de mercadorias à disposição da sociedade. Com a divisão do trabalho, os agentes econômicos tornaram-se cada vez mais interdependentes, em que cada um depende do trabalho do outro ou depende, para seu bem-estar, da produção do outro (JUDENSNAIDER; MANZALLI, 2011). Dessa forma, um volume grandioso de trocas indiretas é realizado e, nesse aspecto, a moeda desempenha uma de suas principais funções: ser intermediária de trocas (meio de trocas). A função intermediária de trocas, meio de troca ou, ainda, meio de pagamento permite que mercadorias sejam compradas e vendidas em diferentes períodos de tempo sem dependerem da coincidência de desejos. Entende-se que meio de pagamento, ou meio de troca, é a função de intermediar milhares de trocas entre os agentes, permitindo que vendas e compras sejam realizadas em datas diferentes. Com isso, é possível separar a venda da compra. Para Carvalho et al. (2007, p. 2): A troca com intermediação monetária separa as transações comerciais em operações de compra e operações de venda, permitindo um sistema de trocas indiretas. É muito mais fácil vender mercadorias e/ou serviços por moeda e, posteriormente, comprar outras mercadorias e/ou serviços pagando em moeda do que trocar coisas diferentes por coisas diferentes. A função de intermediário de trocas é uma função básica da moeda. Ao permitir que vendas e compras sejam feitas em datas diferentes, a moeda exerce a função de meio de pagamento. Além de servir como intermediário de trocas, a moeda exerce outras funções básicas: servir como unidade de conta e reserva de valor. A função unidade de conta da moeda está representada nos diversos contratos existentes na economia. Em um contrato de trabalho, por exemplo, a função unidade de conta aparece no valor do salário ali grafado: x unidades monetárias. Em um contrato de prestação de serviços, a moeda também desempenha sua função unidade de conta no valor que será pago pelo contratante ao contratado, mediante o serviço prestado. Essa função está ainda representada nos preços dos produtos. Uma camisa, por exemplo, que está exposta na vitrine de uma loja qualquer.Lá está, possivelmente em uma etiqueta, a indicação do valor daquele produto: x unidades monetárias. Desse modo, a moeda exerce sua função de unidade de conta. Outro nome que pode ser atribuído a essa função da moeda é moeda de conta, que aparece nos contratos ou nos preços dos produtos e determina qual o montante de moeda corrente necessário para aquela troca. 12 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I A função unidade de conta está relacionada à função de meio de troca. Nesta, a moeda é a unidade de medida monetária da economia, ou seja, é a medida do valor das diferentes mercadorias que são trocadas no mercado. A moeda foi capaz, com a disseminação das trocas comerciais, de ser uma mercadoria peculiar para mensurar o valor das outras mercadorias. Dessa maneira, é possível que as mercadorias sejam trocadas entre si a partir dessa medida comum que a moeda permite avaliar. Imaginemos uma sociedade como nos dias de hoje. Há uma diversidade enorme de contratos estabelecidos entre os agentes econômicos que precisam ser liquidados. Como garantir essa liquidação? Inicialmente, é necessário que todos os contratos tenham uma unidade monetária comum. É dessa maneira que a moeda exerce sua função de unidade de conta, ou seja, no caso brasileiro, a maior parte dos contratos internos é realizado em reais. Por exemplo, em um supermercado onde os preços das mercadorias são todos dados em uma única moeda, qual seja, o real. A função unidade de conta é extremamente importante. Nas sociedades capitalistas modernas, a divisão do trabalho transformou a produção de mercadorias e serviços em um processo complexo. Por vezes, inúmeras firmas participam da produção de uma única mercadoria (automóveis, por exemplo). Assim sendo, é necessário que existam instrumentos que coordenem as decisões de produção desses diversos agentes econômicos. São os contratos estabelecidos entre tais agentes que possibilitam a refinada coordenação que é necessária entre os participantes desse complexo processo produtivo. Os contratos entre os trabalhadores e as firmas fixam as tarefas que serão desempenhadas, o número de horas da jornada de trabalho, o salário-monetário a ser recebido, entre outros quesitos. Os contratos entre as firmas estabelecem as datas de entrega de insumos, as suas especificações técnicas, o valor monetário dos pagamentos a serem feitos pelo comprador, etc. Os contratos entre as firmas e os bancos fixam o limite de crédito entre as partes, a taxa de juros, os pagamentos mínimos que podem ser efetuados pela empresa e muito mais. Percebe-se que há algo que é comum a todos os contratos: a unidade de medida monetária da economia. (CARVALHO et al., 2007, p. 2). Lopes e Rossetti (2005, p. 21-22) denominam essa função da moeda como medida de valor e apresentam suas principais vantagens: • racionaliza e aumenta o número de informações econômicas, via sistema de preços, tornando possível uma atuação mais racional de produtores e de consumidores e ampliando as margens de eficiência operacional do sistema econômico como um todo. • torna possível a contabilização da atividade econômica e a administração racional das unidades de produção, fator de importância crucial para o desenvolvimento da economia e a resultante ampliação do bem-estar. 13 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA • permite a construção de sistemas de contabilidade social, para cálculo dos valores agregados da produção, do investimento, do consumo, da poupança e de outros fluxos macroeconômicos, de grande importância no planejamento e na administração da economia como um todo. Outra função desempenhada pela moeda é servir de reserva de valor, pois a moeda permite alocar nossas transações ao longo do tempo de acordo com nossas conveniências. Assim, dá ao detentor de moeda a possibilidade de reter recursos por períodos longos sem que tal atitude lhe imponha qualquer custo de carregamento. De posse de unidades monetárias, e dada a existência de mercados à vista e a prazo, seu possuidor tem o direito de reservar tal moeda para consumo ou para pagamento futuro. Conforme destacam Lopes e Rossetti (2005, p. 22), Até a Teoria Geral, de Keynes [...], esta função da moeda era desprezada, embora reconhecida. Ao enfatizar a incerteza inerente a uma economia monetária, Keynes trouxe a função reserva de valor para o primeiro plano. A proporção da moeda conservada em relação aos outros ativos depende de uma série de fatores que interferem na preferência do público. Após Keynes, a análise desses fatores e do grau em que é exercida a preferência pela liquidez passou a constituir-se em importante área de investigação teórica e de interesse prático. As duas principais razões que levam à preferência pela utilização da moeda como reserva de valor são, sem síntese, as seguintes: a) a pronta e mediata aceitação da moeda, quando da decisão de convertê-la em outros ativos, financeiros ou reais. A essa aceitação adiciona-se a particularidade de ser a moeda um ativo conversível em ampla área geográfica. b) A imprevisibilidade do valor futuro de outros ativos, sobretudo os não financeiros. Nada garante que o valor desses outros ativos esteja a um nível adequado quando vierem a ser utilizados. Na maior parte dos casos, os ativos reais perdem (alguns quase completamente) a reversibilidade. Há bens de uso durável que, imediatamente após sua aquisição em primeira mão, não são mais reversíveis ao valor com que foram adquiridos. Em economias com estabilidade monetária (sem inflação), a moeda consegue exercer tal função, de poder reservar, ou preservar seu valor ao longo do tempo. Em períodos de inflação elevada, a erosão dos ativos monetários será uma consequência. Um agente, quando detém riqueza, pode guardá-la sob diversas maneiras. Por exemplo, uma aplicação financeira em um banco, em bens imóveis ou mesmo na forma monetária. Essa segunda opção é escolhida quando a moeda apresenta uma estabilidade de valor e, por isso, a economia não pode apresentar inflação. Lembrete Para que um ativo ou um bem sejam considerados uma moeda, é necessário que ele desempenhe as três funções. Caso algumas dessas funções 14 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I não sejam satisfeitas, o uso da moeda passa a ser questionado e pode não ser aceito, deteriorando-a até a invalidade. No Brasil, durante a segunda metade dos anos 1980, devido ao problema da inflação elevada, e, portanto, à perda da sua função de reserva de valor, o País teve várias moedas. Lopes e Rossetti (2005) apontam mais funções que são desempenhadas pela moeda: uma delas é a função liberatória, ou seja, a capacidade de saldar dívidas, liberar quem efetuou um pagamento de ser cobrado no futuro, ou seja, liberar o possuidor da moeda de uma situação passiva no futuro. Os autores acrescentam que esse poder é garantido pelo Estado, que pode forçar o curso da moeda, impondo sua aceitação como forma de pagamento, desde que a sociedade a aceite. Continuam: Há assim, fortes vínculos entre a função liberatória da moeda e o grau em que esta é aceita pela sociedade. A aceitação generalizada, que se estabelece essencialmente como uma manifestação de natureza social, é que, em realidade, garante à moeda o exercício dessa importante função (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 23). Outra função a ser destacada é de a moeda servir como padrão de pagamentos diferidos, que significa a facilidade da distribuição de pagamentos ao longo do tempo. Aqui, surge o crédito. Observação Na sociedade moderna, a moeda como padrão de pagamentos diferidos aparece nas compras a prazo e com pagamentos de prestações ao longo do tempo. Trata-se de uma função relevante para o funcionamento de uma economia moderna. Ela viabiliza os fluxos de produção e renda, que, embora simultâneos e interdependentes, desenvolvem-sepor etapas, exigindo que, ao longo delas, sejam antecipados diferentes tipos de pagamento. Os salários, de forma geral, constituem um exemplo bastante claro de um pagamento diferido. Na maior parte dos casos, os salários representam, em essência, uma forma de adiantamento. Embora a empresa não possa dispor daquilo que produz antes que o ciclo de produção esteja terminado, os trabalhadores que se ocupam das diferentes fases da produção não podem esperar que o processo produtivo se conclua, para que seu trabalho seja remunerado. De igual forma, os empresários recorrem a empréstimos para variadas finalidades, desde os que se destinam ao financiamento do giro de seus negócios até os que atendem a necessidades relacionadas a investimentos em capital fixo (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 24). Por fim, cabe destacar outra função da moeda: a de servir como instrumento de poder, seja ele econômico, político ou social, a partir do momento em que se admite ser também a moeda um 15 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA instrumento de crédito, um título de crédito. “Os que o detêm possuem direitos de haver sobre os bens e serviços disponíveis no mercado, tanto maiores e mais amplos quanto maior for o montante disponível de moeda” (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 24). Para que a moeda desempenhe suas funções, algumas características particulares devem ser reunidas. Dentre elas, estão as econômicas, entendidas como custo de estocagem e custo de transação negligenciáveis ou próximos de zero. O que isso significa? Significa que, para manter e transportar a moeda, seu custo é zero. Observação Claro que aqui não se está pensando no caso das aplicações financeiras em que os juros recebidos pelo não uso da moeda representariam um custo de oportunidade para as economias modernas. O trigo, por exemplo, tem reduzidas chances de se tornar moeda em uma economia desenvolvida porque o seu custo de estocagem não é desprezível e seu custo de transporte ao mercado (custo de transação) pode ser elevado. O trigo, o sal, a soja, dentre outros, se eleitos socialmente como moeda, onerariam em demasia seus possuidores (CARVALHO et al., 2007, p. 3). As outras características da moeda, as físicas, dizem que a moeda deve apresentar indestrutibilidade e inalterabilidade, homogeneidade, divisibilidade, transferibilidade, além de facilidade de manuseio e transporte. Vejamos a importância de cada uma. A indestrutibilidade e a inalterabilidade são importantes, pois a moeda não deve se deteriorar na medida em que os agentes econômicos a utilizam na troca. Nesse sentido, a moeda deve ser durável, isto é, deve manter suas características físicas para que a sua condição de ser aceita de forma generalizada seja mantida e não prejudique o seu último detentor. Além disso, “a indestrutibilidade e a inalterabilidade são obstáculos à sua falsificação, tornando-se, assim, atributos acessórios, também importantes para a confiança do público e a aceitação geral da moeda” (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 26). Dessa forma, tal característica combina com outra, a de a moeda reunir homogeneidade, ou seja, de ser conhecida em qualquer localidade, ser igual em qualquer local e tempo para que seja reconhecida e, assim, aceita. Perceba que, no caso das economias modernas, monetizadas e, particularmente, no caso da economia brasileira, a característica de homogeneidade aparece nas cédulas que o Banco Central coloca à disposição da coletividade para que esta efetue suas trocas produtivas. Uma cédula de R$ 100,00 tem a mesma representatividade, enquanto instrumento de troca e unidade de conta, em qualquer local do território nacional. Admite-se que o cidadão comum reconheça naquele papel, naquela cédula, a representatividade de R$ 100,00. Apenas devemos pensar com cuidado quanto à função reserva de valor em diferentes regiões. Isso diz respeito aos diferentes preços das mercadorias e, portanto, ao custo de vida em diferentes regiões; assim, R$ 100,00 valem mais ou menos em diferentes localidades. 16 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I Observação Perceba que estamos chamando a atenção para os diferentes níveis de inflação em diferentes regiões do País e que, portanto, o poder de compra da moeda também é diferente. Quanto ao assunto, Lopes e Rossetti (2005, p. 26) esclarecem que: Duas unidades monetárias distintas, de igual valor, devem ser rigorosamente iguais. Suponhamos, por exemplo, nos primórdios da evolução histórica da moeda, uma determinada mercadoria usada como instrumento de intermediação de trocas. As diferentes unidades dessa mercadoria devem, necessariamente, ser iguais, homogêneas quanto às suas características intrínsecas. Admitamos que o arroz, em dada época e lugar, atendesse a essa função. Neste caso, se dois indivíduos chegassem a um acordo sobre o valor de uma transação, poderia acontecer que o comprador pensasse pagar a dívida com arroz de grãos miúdos e quebrados, enquanto o vendedor imaginasse receber arroz de grãos graúdos e inteiros. A possibilidade deste tipo de desentendimento, resultante da não homogeneidade, é um exemplo claro da necessidade de que unidades monetárias do mesmo valor sejam efetivamente iguais para que a moeda possa exercer suas funções essenciais. O que há para destacar sobre a característica divisibilidade? A divisibilidade é necessária porque a moeda deve poder ser fracionada em múltiplos e submúltiplos para que as transações que exigem valor fracionado ou transações que movimentam grandes valores sejam realizadas sem custos adicionais. Imagine se existisse na economia monetária apenas um tipo de cédula, digamos, de R$ 50,00. Todos os produtos deveriam ter, no mínimo, esse preço, desde uma bala até qualquer outro produto ou mesmo serviços prestados pelos correios; daí em diante somente seriam admitidos múltiplos de R$ 50,00. Os preços seriam, então, R$ 100,00, R$ 150,00, R$ 200,00. Assim, a característica de divisibilidade permite que os valores monetários sejam quebrados em diferentes valores, desde os centavos, as dezenas, os milhares e assim por diante. Sobre o assunto, Lopes e Rossetti (2005, 26-27) elucidam que: A moeda deve possuir múltiplos e submúltiplos em quantidade e variedade, que tanto as transações de grande porte quanto as pequenas possam realizar-se sem dificuldade. Se, por hipótese, em uma economia só existirem cédulas monetárias de determinado valor, a maior parte das transações será dificultada, senão mesmo impraticável. Se o valor da única cédula em circulação fosse excepcionalmente baixo e se não existissem outros meios para se efetuarem pagamentos, as transações de maior vulto 17 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA esbarrariam em inúmeras dificuldades operacionais. Contrariamente, se existisse uma única cédula de elevado valor, ficariam prejudicadas as transações menores. Outra característica física que um instrumento deve reunir para ser reconhecido como moeda e assim exercer suas funções é a característica da transferibilidade, ou seja, a capacidade de que seja trocada de mãos, digamos, de possuidor, à medida que as transações econômicas são efetuadas. É fácil visualizar tal característica: pense em uma feira livre, nas quais produtos do tipo frutas, verduras e legumes sejam comercializados. Você está defronte a um vendedor de frutas e se interessa pelas laranjas que ele está vendendo. Você adquire uma dúzia delas e pagará R$ 6,00. Você paga com três cédulas de R$ 2,00 e as entrega para as mãos do vendedor no mesmo momento em que ele lhe entrega um saco plástico com uma dúzia de laranjas. Agora, o que você tem são laranjas e o que o vendedor tem são suas cédulas. Então, chega, na mesma barraca, outro comprador também interessado em adquirir uma dúzia de laranjas ao mesmo preço, R$ 6,00, só que esse comprador passaao vendedor uma cédula de R$ 10,00. Como a compra é somente de R$ 6,00, o vendedor deve dar de troco ao comprador o valor de R$ 4,00. Ele entrega duas cédulas de R$ 2,00 e repassa ao comprador como troco. Observe então que as cédulas que você passou para as mãos do vendedor possivelmente foram parar nas mãos de outro comprador. Vejamos o que Lopes e Rossetti (2005, p. 27) dizem sobre tal característica: Outra característica essencial da moeda diz respeito à facilidade com que deve processar-se sua transferência, de um possuidor para outro. Se a moeda estiver materializada em uma mercadoria qualquer ou em uma cédula emitida e garantida pelo Estado, é desejável que tanto a mercadoria quanto a cédula não tragam quaisquer registros que identifiquem seu atual possuidor. Recorrendo [...] ao clássico exemplo do gado, sua utilização como moeda-mercadoria ficaria prejudicada se cada um de seus sucessivos proprietários tivesse necessidade de gravar a fogo sua marca na pele do animal. Ao cabo de certo número de transações, não restariam mais espaços para novas marcas. O mesmo aconteceria caso as transferências de cédulas se processassem unicamente via endosso de um possuidor para outro. Embora, de um lado, esta característica reduza a segurança dos que possuem a moeda em uso, de outro lado, facilita o processo de troca. E, tendo em vista que uma das funções básicas da moeda é a de facilitar esse processo, sua perfeita e fácil transferibilidade converte-se em um de seus atributos mais importantes. A moeda deve ser, na medida do possível, difícil de falsificar – já que tal característica aumenta a confiança do público de que não há reprodução indevida – auxiliando consequentemente a sua aceitação generalizada. Além das características acima identificadas, a moeda ainda deve ser manuseável e transportável para que a função meio de troca não seja prejudicada, impondo ao seu detentor custos de transação. Sobre isso: 18 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I O manuseio e o transporte da moeda não podem prejudicar nem dificultar sua utilização. Se o porte da moeda for dificultado, sua utilização certamente será pouco a pouco descartada. Os primeiros metais, não preciosos, utilizados como moeda, foram um a um descartados à medida que a descoberta de novas minas e o desenvolvimento da tecnologia da fundição e usinagem os tornou abundantes, reduzindo seu valor por unidade de peso. Sua substituição por ouro e prata decorreu essencialmente de fatores ligados à facilidade de manuseio e transporte, dado que uma pequena quantidade (reduzido peso) desses metais preciosos sempre correspondeu a um grande valor (LOPES; ROSSETTI, 2002, p. 27). Observação Somente reunindo características físicas e econômicas a moeda consegue exercer suas funções de intermediário de trocas, unidade de conta e reserva de valor. É interessante destacar que, com o avanço da tecnologia, notadamente no âmbito da tecnologia de informação promovida pela revolução da microeletrônica e dos computadores, novas formas de moeda surgem, a exemplo da moeda eletrônica representada pelos cartões, chamada de dinheiro eletrônico. 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA MOEDA E DOS SISTEMAS MONETÁRIOS É necessário efetuar um passeio pela história e conhecer as diversas formas que a moeda assumiu ao longo dos tempos. Desde a antiguidade, os povos utilizam moeda para efetuar trocas de mercadorias. Inicialmente, as trocas eram feitas de forma direta, pois o homem vivia em pequenas comunidades, nas mais primitivas culturas, nas quais a economia funcionava à base de escambo. Esse sistema exigia a coincidência de desejos, pois apenas produtos encontravam-se disponíveis para trocas. Conforme Passos e Nogami (2003, p. 446): imaginem um indivíduo que tenha maçãs e queira castanhas. Seria uma coincidência fora do comum encontrar um outro indivíduo que tivesse gostos exatamente opostos, ansioso por vender castanhas e comprar maçãs. Ainda que aconteça o fora do comum, não há garantia de que os desejos das duas partes, no que se refere às quantidades e aos termos de troca exatos, coincidam. Da mesma forma, a menos que um alfaiate faminto encontre um fazendeiro nu que tenha alimentos e o desejo de ter um par de calças, nenhum dos dois pode realizar o negócio. 19 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA Figura 1 – Trocas de produtos por produtos: escambo Observação Percebe-se, então, que com o desenvolvimento da divisão do trabalho e a maior especialização na produção de mercadorias a prática rudimentar de escambo é dificultada. Nos primórdios, o homem vivia em pequenas comunidades de uma única família e se utilizava da vegetação e da caça disponíveis na região que habitava. Esses recursos eram os únicos com os quais contava para a sua subsistência. Imagine um agricultor de cenouras, por exemplo. Se ele produz cenouras, o produto de seu trabalho são cenouras. Só que não só de cenouras vive tal agricultor e sua família; eles dependem da produção alheia para sobreviver. Dependem, portanto, da troca de seu excedente pelo excedente de produção de outra pessoa. Suponha que tal agricultor de cenouras precise adquirir carne para sua alimentação. O que ele tem para trocar são cenouras, e precisará encontrar no mercado algum produtor que venda carnes e que deseje cenouras em troca. Fácil, não? Não, não é fácil. E o manuseio, o transporte, a durabilidade, características físicas da moeda? E a divisibilidade? Parece realmente não ser fácil. Assim, as sociedades se empenharam para desenvolver um sistema em que um equivalente geral fosse aceito como meio de trocas, iniciando um sistema de trocas indiretas que passa a ser intermediado por algum bem que represente aceitação e curso geral. Estamos tratando da Era Mercadoria-Moeda ou, simplesmente, Moedas-Mercadorias. Foram utilizadas como moeda-mercadorias o gado, o fumo, o azeite de oliva, os escravos, o sal, dentre outros produtos. Saiba mais Para que veja quais os tipos de moeda e também em quais períodos foram pelos povos utilizadas, acesse o site do Banco Central do Brasil. Você encontrará um breve histórico da origem e evolução do dinheiro. <http://www.bcb.gov.br/htms/origevol.asp>. 20 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I Lembrete Para que uma mercadoria possa ser utilizada como moeda, ela deve apresentar as características de durabilidade, divisibilidade, homogeneidade, bem como facilidade no manuseio e transporte, características que não eram reunidas em alguns dos exemplos anteriormente citados, apesar de as moedas-mercadorias terem facilitado um pouco a vida dos agentes. Lopes e Rossetti (2005, p. 28) destacam que: No princípio, as primeiras moedas foram mercadorias. Estas deveriam ser suficientemente raras (para que tivessem valor) e deveriam atender a uma necessidade comum e geral (para que pudessem ser aceitas sem restrições por todos os integrantes dos grupos envolvidos em operações de trocas indiretas). Desta forma, os primeiros tipos de mercadorias tinham, essencialmente, valor de uso. Sendo este comum e geral, passavam a ter, concomitantemente, valor de troca. Só com o correr do tempo, com a passagem de um tipo de moeda para outro, os instrumentos monetários foram submetidos a um processo gradual, porém lento, de desmaterialização, em decorrência do qual a exigência de valor de uso foi progressivamente abandonada, enfatizando-se de forma crescente o valor de troca. O quadro a seguir, adaptado de Lopes e Rossetti (2005, p. 30), oferece exemplos dos principais tipos de moedas-mercadorias utilizadas pelos povos da Antiguidade, da Idade Média e da Idade Moderna. Quadro 1 Épocas e regiões Principais moedas-mercadorias Antiguidade Egito Cobre, anéis de cobre, como subdivisão da unidade-peso. Babilônia e Assíria Cobre, prata e cevada. Lídia Peças metálicascunhadas. Pérsia Gado, sobretudo bovinos e ovinos. Bretanha Barras de ferro, espadas de ferro, escravos. Índia Animais domésticos, arroz, metais a exemplo do ouro e cobre. China Conchas, seda, metais, instrumentos agrícolas, cereais e sal. Idade Média Ilhas Britânicas Moedas de couro, gado, ouro e prata em unidades-peso Alemanha Gado, cereais a exemplo de aveia e centeio, mel, moedas cunhadas – ouro e prata. Islândia Gado, tecidos, peixes secos a exemplo do bacalhau. Noruega Gado bovino, tecidos, manteiga, peles curtidas. Rússia Gado bovino, peles de esquilo e de marta, pratas em unidades-peso. 21 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA China Arroz como instrumento de troca e unidade de conta, chá, sal, peças de ferro, estanho e prata. Japão Anéis de cobre cobertos com ouro e prata, pérolas, ágata, arroz. Idade Moderna Estados Unidos Época colonial: fumo, cereais, carnes-secas, madeira e gado. Austrália Rum, trigo e carne. Canadá Peles e cereais. França Metais preciosos e cereais. Alemanha e Áustria Terra como denominador comum de valores, gado como instrumento de troca. Japão Arroz e warrants, emitidos por depósitos desse cereal. Se pararmos para pensar um pouco nos tipos de moeda que foram utilizados até então, não será difícil compreender que deixaram de ser utilizadas devido à dificuldade de representar as características essenciais exigidas dos instrumentos monetários para o desempenho de suas funções. Dessa forma, sua aceitação geral estaria comprometida; ficaria extremamente difícil manter a confiança em mercadorias que não se apresentariam como homogêneas ou mesmo naquelas em que a ação do tempo destruiria ou mesmo alteraria suas próprias características. Percebe-se claramente que a maioria delas não apresentava divisibilidade ou transferibilidade e, portanto, sua manuseabilidade estava comprometida. A tais dificuldades, acrescentamos aquilo que se reconhece por justaposição entre o valor de uso e o valor de troca na mercadoria que seria utilizada como instrumento de troca. Podendo a unidade monetária, ou seja, a mercadoria, ser utilizada como bem de consumo ou como instrumento de trabalho, as operações de troca com base nessa unidade acabavam por não apresentar diferenças pronunciadas em relação ao escambo. A partir das dificuldades advindas daí, as mercadorias de expressivo valor de uso tornam-se pouco satisfatórias como unidades monetárias. Outra forma de moeda utilizada pelas sociedades antigas foram as moedas preciosas, representando a Era da Moeda Metálica, ou do Metalismo, notadamente pelo uso do ouro e da prata. Também fizeram parte desse período o cobre, o bronze e o ferro. O ouro, em barra, tem um valor incorporado. O mesmo ocorre com as unidades de prata. São mercadorias que, por não apresentarem depreciação, carregam seu valor ao longo dos tempos, permitindo às pessoas guardá-las para serem utilizadas em trocas de mercadorias no melhor momento. Para Lopes e Rossetti (2005, p. 29): De forma geral, os metais foram as mercadorias que mais se ajustaram às funções monetárias, não só porque suas características intrínsecas aproximam-se das características essenciais que se exigem dos instrumentos monetários, como também porque seu valor de uso não compromete nem compete tão diretamente com seu valor de troca. Mais ainda: a utilização de metais viabilizou o processo de cunhagem, por meio do qual se certificava seu peso e se garantia sua circulação, notadamente quando esse processo era realizado ou administrado por chefes de Estado. Os metais, como o cobre, o bronze ou mesmo o ferro, geralmente eram apresentados em sua forma mercantil, em lingotes, em barras ou cunhados. Porém, como existem em abundância na natureza, 22 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I não conseguem reunir determinadas características necessárias para sua aceitação geral. O fato de ser abundante, bem como a possibilidade de descoberta de novas jazidas, compromete uma de suas funções básicas, qual seja, a de servir como reserva de valor. Daí em diante, sua progressiva substituição pelo ouro e pela prata admitidos como metais monetários por excelência decorreu fundamentalmente dessas razões. O ouro e a prata, além de atenderem de forma mais satisfatória às funções principais da moeda, ainda possuem características intrínsecas que se ajustam de modo mais perfeito às características essenciais que a moeda deve preencher. Lopes e Rossetti (2005, p. 31-32) destacam algumas razões para o uso de ouro e prata: • em todos os países em todas as épocas os metais preciosos sempre foram muito procurados e desejados, quer em razão de seus usos materiais, quer em razão de seu caráter simbólico e de seu valor mítico, como meios de expressão de poder e riqueza. • o ouro e a prata, enquanto instrumentos monetários, eram suficientemente escassos e as novas quantidades descobertas eram insignificantes em relação ao estoque existente, de tal forma que seu valor se mantinha relativamente estável ao longo do tempo, confirmando a confiança do público e favorecendo sua aceitação irrestrita. Apesar de se assemelharem mais às funções e características da moeda, o ouro e a prata são também mercadorias que, para serem trocadas por outras, dependem da dupla coincidência de desejos. Novamente: e o manuseio, o transporte, a durabilidade e características físicas da moeda? E a divisibilidade? Parece que o ouro e a prata também não foram as melhores alternativas para a moeda. Então, a sociedade caminha para outra forma alternativa: a Era da Moeda-Papel (JUDENSNAIDER; MANZALLI, 2011). Essa Era será favorecida pela multiplicação das trocas entre povos de uma mesma região e entre regiões e países diferentes, o que provoca mais dificuldades para que a moeda metálica continue sendo utilizada como instrumento de pagamento. Seu transporte tornou-se relativamente difícil e muito suscetível a riscos, como roubo. Assim, as sociedades se empenharão para a criação e uso de instrumentos monetários mais adaptáveis àquele tempo e necessidade, inclusive com a efetivação de operações de crédito. “Ademais, as relações comerciais só poderiam desenvolver-se se esse novo instrumento monetário passasse a ser aceito de forma ampla, ainda que tivesse a necessária contrapartida de lastro metálico integral” (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 32). Conforme Passos e Nogami (2003, p. 451), a moeda representativa ou moeda-papel veio eliminar, portanto, as dificuldades que os comerciantes enfrentavam em seus deslocamentos pelas regiões europeias, facilitando a efetivação de suas operações comerciais e de crédito, especialmente entre as cidades italianas e a região de Flandres. A sua origem está na solução encontrada para que os comerciantes pudessem realizar os seus empreendimentos comerciais. Em vez de partirem carregando a moeda metálica, levavam apenas um pedaço de papel denominado 23 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA certificado de depósito, que era emitido por instituições conhecidas como “Casas de Custódia”, e onde os comerciantes depositavam as suas moedas metálicas, ou quaisquer outros valores, sob garantia. Esta modalidade de moeda, um papel, um certificado de depósito, desempenhava boa função. Tinha nele incorporado um valor representativo, inicialmente com lastro de 100% e garantia de aceitação, uma vez que representava uma determinada quantidade de valor. Com a circulação espontânea de certificados representativos de depósitos de ouro e prata, estava criada uma nova modalidade de moeda, denominada moeda representativa ou moeda-papel, com lastro de 100% e com garantia de plena conversibilidade, já que seus detentores podiam, a qualquer momento e sem prévio aviso, trocá-la pelos metais depositados que deram origem à sua emissão. Essa garantia, regularmente confirmada pelo nomee honradez das casas de custódia de maior tradição, acabou por transformar essa nova moeda em instrumento preferencial de troca e de reserva de valor, generalizando-se e ampliando-se seu uso com o passar do tempo. (LOPES e ROSSETTI, 2001, p. 33). Dessa modalidade, a sociedade avança para outro tipo de moeda: a moeda fiduciária, ou papel-moeda. Para Lopes e Rossetti (2005, p. 33), a experiência de custódia e da conversibilidade mostrou que o lastro metálico integral (de 100%) em relação aos certificados em circulação não era necessário para a operacionalização desse novo sistema monetário. Essa constatação decorreu da percepção de que a reconversão da moeda-papel em metais preciosos não era solicitada por todos os seus detentores ao mesmo tempo. Além disso, enquanto uns solicitavam a reconversão, outros ensejavam novas emissões, levando às casas de custódia novas quantidades de ouro e prata para depósito. Vamos entender melhor. As casas de custódia funcionavam como uma espécie de banco, onde alguns agentes depositavam barras de ouro e peças de prata; em troca, recebiam um papel representando aquele valor. Quilos de ouro x preço do ouro = valor do ouro. Valor do ouro depositado = um papel escrito o quanto vale. De posse de tal documento, papel-moeda, exerciam suas trocas comerciais. O recebedor de tal documento possuía agora o direito de ir até a casa de custódia e resgatar o valor ali identificado. Tal reconversão nem sempre era necessária, de forma que grande quantidade de ouro permanecia depositada em tais casas, e os “guardiões dos metais preciosos” podem começar a emitir papéis não mais lastreados (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 33). Inaugura-se, então, um período em que a emissão de papel-moeda será exercida por particulares até que o governo chame para si tal responsabilidade. Vale destacar as características do papel-moeda: 24 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I • seu lastro era inferior a 100%, pois as emissões poderiam ser efetuadas em maior quantidade do que o próprio metal precioso reservado na casa emissora do certificado de depósito; • menor garantia de conversibilidade, já que todos, ao mesmo tempo, não podiam transformar papéis em metal, pois o volume de moeda representado nos papéis era maior do que o volume de ouro verdadeiramente existente na casa de custódia; • se todos os depositários tivessem necessidade de, ao mesmo tempo, efetuarem a conversão dos papéis em ouro, o sistema quebraria; • como a emissão era efetuada por particulares e ainda não estava nas mãos do Estado, o sistema era frágil por naturalidade, porém, ainda como destacam Paulani e Braga (2012, p. 260), os fiéis depositários de metais preciosos e que se tornariam, tempos depois, os bancos na forma como conhecemos [...] perceberam uma coisa interessante: era extremamente pequena a probabilidade de que todos aqueles que lá tinham depositado suas moedas de ouro e prata viessem reclamá-las ao mesmo tempo. Logo, uma vez que os recursos eram ali depositados, eles podiam ser emprestados a outros agentes, mediante o pagamento de juros. Assim, se se dispusesse, por exemplo, de $ 100.000 em moedas de ouro depositadas, poder-se-ia emprestar uma parcela razoável delas, digamos $ 80.000, a outros agentes, pois dificilmente mais do que 20% do valor desses depósitos viria a ser simultaneamente exigido por seus detentores. Feito isso, o montante de moeda na economia teria sido imediatamente transformado em $ 180.000, pois aqueles que tomaram os empréstimos ficaram com um poder de compra de $ 80.000 em mãos, sem que os proprietários originais desses recursos tivessem perdido seu direito a eles – não nos esqueçamos de que eles tinham em mãos seus recibos de depósitos, os quais passaram a ser tão aceitos como forma de pagamento quanto as próprias moedas de ouro e prata. Desse modo, cada depósito feito gerava, para a economia, um valor adicional de moeda da ordem de 80%. Assim que as casas que guardavam as moedas de ouro e prata descobriram esse fenômeno, elas se transformaram em bancos. Entretanto, a cargo de quem ficava o controle de tais emissões pelas casas de custódia? Diante da inexistência de controle das emissões de certificados e da facilidade de ruína do processo, o Estado viu-se obrigado a regulamentar as emissões via estabelecimento de alguns mecanismos. Vejamos o que destacam Lopes e Rossetti (2005, p. 34) acerca do assunto. Sistema de cobertura integral. Este sistema consiste em tornar as emissões iguais ao montante do encaixe metálico. Foi adotado na Inglaterra, em 1844 (Pell Act), tendo sido o Banco da Inglaterra autorizado a emitir notas até o limite de seu encaixe-ouro, mais um montante fixo, de 18 milhões de libras, inexpressivo em relação ao capital do banco. O mesmo sistema foi 25 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA adotado pelos Estados Unidos, em 1874, quando as emissões passaram a ser limitadas pelo montante dos depósitos dos bancos no Tesouro Nacional. Sistema de reserva proporcional. Este sistema consiste em estabelecer uma relação legal entre a emissão e o encaixe metálico. Esta relação variou muito entre os países, dentro de uma faixa de 30% (Alemanha e Bélgica) até 40% (Estados Unidos, com a implantação, em 1913, dos Bancos Federais de Reserva, Itália, Suiça e Holanda). Sistema de teto máximo. Este sistema consiste na fixação de um teto máximo de emissão, sem relação com o encaixe metálico. Foi praticado pela França, de 1870 a 1928. Esse sistema apresentou a vantagem de ser mais flexível que os de cobertura integral e de reserva proporcional, ensejando a mais fácil regulação da oferta monetária em relação às necessidades da economia. Para o caso do Brasil, o uso mais intenso da moeda fiduciária estará no período entre 1815 e 1913, período marcado por tensão e medo provocados por alguns desastres financeiros mundiais. Percebia-se que as economias das moedas fiduciárias eram instáveis e que controles rigorosos se faziam necessários. Será no período de 1888 a 1890 que a moeda, também chamada de inconversível, encontrará no Brasil uma tendência à regulação, que estará a cargo de um banco central instigado pelo governo na promoção de estabilidade tanto cambial quanto monetária. Conforme Abreu e Coelho (2009, p. 67), Para o Brasil, a adoção da moeda fiduciária significava liberar as medidas relacionadas ao crescimento econômico com o balanço de pagamentos. A moeda fiduciária permitia livrar as condições domésticas das oscilações dos movimentos de capital e das relações de troca, mas impunha sobre o país a instabilidade cambial, pois a taxa de câmbio seria ajustada no caso de choque de qualquer natureza. Assim, a taxa de câmbio influenciava a economia brasileira a custo de uma crescente instabilidade. Saiba mais Para maiores detalhes acerca da moeda na economia brasileira, indicamos o livro: HUGON, P. A moeda: introdução à análise e às políticas monetárias e à moeda no Brasil. São Paulo: Pioneira, 1967. Em economia mundial, algumas tentativas de conversibilidade foram adotadas com a criação de dois sistemas: o primeiro, chamado de Gold Exchange Standard, previa conversibilidade de notas nacionais em divisas internacionais que deveriam ser conversíveis em ouro. No segundo sistema, Gold 26 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I Bullion Standard, as notas deveriam ser conversíveis em lingotes de ouro, uma vez que estes não seriam utilizados como meio de pagamento na economia nacional. Porém, Com a crise de 1929-1933 (Grande Depressão), esses esforços resultaram inúteis, tendo sido abandonada desde então a ideia destas modalidades de conversão. A partir de então, com a exceção do dólar, que manteve até 1971 a tradição e a garantia de lastro metálico proporcional, as moedas nacionais deixaram de ter garantias metálicas. Oslastros, sob a forma de metais preciosos, ficaram no passado (LOPES; ROSSETTI, 2005, p. 35). Lembrete Lembre-se das principais características da moeda fiduciária: não existência de lastro metálico, total inconversibilidade e monopólio estatal das emissões. Da modalidade de moeda fiduciária até a modalidade da moeda bancária, manual ou escritural, como conhecemos na atualidade, foi questão de tempo. É possível compreender que, na atualidade, o papel-moeda é a forma dominante de moeda, o que também serve para as cédulas às quais estamos acostumados e também para as moedas metálicas, de menor valor representativo, mas não menos importantes para o sistema monetário, devido a seus múltiplos e submúltiplos. O que diferencia o papel-moeda das moedas da Antiguidade é que temos as moedas apenas como algum material que carrega consigo seu poder de compra, e não mais seu valor intrínseco, assim como acontecia com metais preciosos, por exemplo. O uso de papel-moeda como moeda ainda é efetuado na base da confiança e, portanto, seu uso é generalizado. Ao lado da moeda fiduciária, de emissão não lastreada e monopolizada pelo Estado, de curso forçado e de poder liberatório garantido por disposições legais, desenvolveu-se uma outra modalidade de moeda: a moeda bancária, escritural ou invisível. O desenvolvimento desta moeda aconteceu de forma acidental. Foi precipitado pela independência do poder decisório dos departamentos bancários e monetário do Banco da Inglaterra, no século XIX. A não conscientização de que os depósitos bancários, movimentados por cheques, eram uma forma de moeda, ajudou a expansão dos meios de pagamento, pelo efeito multiplicador desses depósitos. (LOPES; ROSSETTI, 2002, p. 35). Com a chegada da moeda bancária, que representa na atualidade a maior parcela dos meios de pagamento utilizados pela coletividade, transforma-se o que vem a ser moeda enquanto representante de valor, meio de pagamento, unidade de conta ou mesmo reserva de valor ao longo do tempo. Tal forma de moeda, criada pelos bancos comerciais, acaba por responder pela totalidade dos depósitos à vista de curto prazo existentes nesse tipo de estabelecimento, da mesma maneira que transforma o sistema de crédito na economia capitalista moderna. Como sua movimentação dá-se basicamente 27 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA por uso dos cheques – e, atualmente, pelo uso da moeda de plástico (cartões eletrônicos) e transações eletrônicas, seu caráter invisível fica cada vez mais visível. 3 DA MOEDA AOS MEIOS DE PAGAMENTO Consideradas todas as formas que a moeda assumiu durante os tempos, podemos verificar as formas que assume em uma economia moderna como a de nossos tempos. Assim, podemos dizer que o montante de moeda que temos a nossa disposição, ou os meios de pagamento (MP), divide-se em papel-moeda em poder do público (PMPP) e depósitos à vista nos bancos comerciais (DVbc). Portanto, MP = PMPP + DVbc Ademais, podemos considerar ser PMPP moeda manual (cédulas e moedas metálicas) e DVbc moeda escritural (depósitos ou representação de saldos positivos e/ou negativos em contas-correntes). Conforme destaca Teixeira (2002, p. 20), No sistema fiduciário, o papel-moeda é a moeda por excelência. Quando alguém tem algum pagamento para realizar, pode, sem nenhuma restrição, usar dinheiro – papel-moeda – para efetuá-lo. Caso não tenha a disponibilidade em dinheiro, tem a alternativa de emitir um cheque contra a sua conta de depósito à vista nos bancos comerciais. A conversibilidade do cheque em dinheiro – quando há saldo – faz dele um instrumento monetário de aceitação generalizada. Sendo assim, o saldo dos depósitos à vista, contra o qual cheques são emitidos, faz parte do estoque de meios de pagamento da economia. Mas por que não os depósitos de poupança ou de qualquer outra aplicação financeira? E se alguém resgatar uma dívida ou fizer um pagamento utilizando diretamente um ativo, como um lote de terreno ou um carro? Seriam esses ativos também incluídos no conceito de moeda? Com a pergunta deixada pelo autor, podemos pensar em diversos artigos que podem ser utilizados como meio de troca, já que possuem certa propriedade monetária. Pense em quantas pessoas, ao adquirirem uma casa, por exemplo, não oferecem um carro como parte de pagamento. Outra pessoa que tenha uma dívida com um amigo, mas não possui dinheiro para pagá-la, pode oferecer uma joia como meio de pagamento. Se pensarmos assim, em economia monetária, voltaríamos à época do escambo, das trocas diretas, em que bens são adquiridos por bens. A nós parece não existir tal intenção. Respondendo à pergunta do autor, carros e casas, joias e quadros, por exemplo, não podem ser incluídos nos conceitos de moeda pelo simples motivo de que seu valor é variável e apresentam, na maioria das vezes, baixo grau de liquidez. Pense, por exemplo, o valor de um carro zero-quilômetro que acaba de ser retirado de uma concessionária. Que valor ele terá a partir do momento em que seu possuidor sair com ele da loja? Será o mesmo de quando estava efetuando a compra? Certamente não. A partir do momento em que está nas ruas, deteriora-se por mais impecável que esteja, se deprecia, e, portanto, seu valor é relativo: perde valor com o passar do tempo. 28 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I Entretanto, se pensarmos de forma contrária: um automóvel daqueles produzidos, digamos, nos anos 1940. Na atualidade, ele seria considerado uma relíquia, por ser um item de colecionador. Qual valor tem esse automóvel? Será o mesmo para quem o possui e para quem poderia possui-lo? Se seu amigo fosse o possuidor desse automóvel antigo e tivesse uma dívida com você, vocês dois dariam o mesmo valor para o automóvel? Exemplo de aplicação Faça uma breve reflexão sobre as obras de arte, um quadro de algum pintor famoso. O valor que está ali inserido é mais sentimental do que comercial. É interessante notar a dificuldade em se estabelecer, ou mesmo mensurar, o grau de liquidez de um ativo que não seja a moeda. Teixeira (2002, p. 21) é ainda mais específico: De forma semelhante, um cheque dá ao cliente acesso à sua conta-corrente de depósitos à vista. O cheque é descontado pelo seu valor de face, mas um cliente não pode, no arranjo atual, emitir diretamente um cheque contra a sua conta de depósitos de poupança ou contra qualquer outra aplicação financeira a prazo. Restrições impostas limitam a liquidez dessas aplicações. Saques ou transferências fora das datas preestabelecidas implicam perdas. Obviamente, as aplicações com liquidez diária e vinculadas com a conta-corrente gozam do mesmo grau de liquidez dos depósitos à vista. Como essas facilidades variam ao logo do tempo, fica clara a razão das mudanças, no longo dos tempos, dos conceitos de moedas. O fato é que o questionamento deixado pelo autor nos remete efetivamente ao que, do ponto de vista da economia monetária, deve ser considerado como meio de pagamento de maneira conceitual e convencional. Estamos nos referindo a algo que tenha liquidez, que esteja associado à noção de liquidez. A questão da liquidez aqui colocada refere-se, num primeiro momento, à diferença entre preços: de compra e de venda de algo que possa ser considerado como ativo. Imagine uma situação hipotética em que notas, papel-moeda em poder do público, possam ser compradas. Vamos supor que você esteja interessado em adquirir duas notas de R$ 50,00. Quanto terá que pagar? Certamente a conta rápida que acabou de fazer em sua cabeça foi R$ 100,00. Ou que seu desejo seja adquirir cinco moedas metálicas de R$ 0,25. Quanto custará? No mínimo, você deverá dispor de R$ 1,50 para tal aquisição acontecer. Diante das situações apresentadas, a única coisa que percebemos é que valores estão sendo trocados por valores, objetos monetários estão sendo trocados por objetos monetários que apresentamo mesmo valor entre si. Portanto, não houve ganho para quem vendeu ou comprou, e não houve perda para quem vendeu ou comprou. Nessa situação hipotética, a liquidez é tão absoluta que não haverá nenhum ganho ou perda. O preço de venda é igual ao preço de compra. 29 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA Observação O que poderíamos admitir em uma situação como essa é que em algum momento pessoas necessitam trocar unidades monetárias: tenho uma cédula de R$ 100,00, mas necessito, por algum motivo, de duas de R$ 50,00. Isso é uma prática corriqueira nas mais diferentes transações comerciais de nosso tempo. Ainda do ponto de vista da economia monetária e da dinâmica das economias capitalistas, em termos de evolução, não há que se afirmar em definitivo para os tempos qual tipo de ativo monetário deve sempre ser considerado como moeda e qual deve ser excluído. Tal classificação, ou consideração, dependerá do grau de liquidez que consegue alcançar em diferentes épocas. Como a história econômica mostrou, e a nós não cabe aqui resgatar, alguns ativos apresentam variabilidade em seu grau de liquidez e, dessa forma, a definição de moeda também se altera ao longo do tempo. É o que destacam Lopes e Rossetti (2005, p. 125): Há ativos que dão ao agente econômico que os possui um certo rendimento sob a forma de juros ou de dividendos; são assim, respectivamente, os títulos de renda fixa ou as ações. Outros, como o capital instrumental, podem ser acionados no processo de produção e assim gerar futuros rendimentos aos seus detentores. Outros ainda, como os bens de consumo possuídos em dado instante, podem atender a relevantes necessidades correntes, satisfazendo exigências essenciais. Todos, porém, excetuando-se a moeda, sofrem desgastes ou, então, acarretam despesas de manutenção ou estocagem com o correr do tempo. [...]. cabe acrescentar que os ativos podem ter diferentes graus de liquidez, aqui entendida a liquidez como a capacidade que o ativo revela em se transformar em moeda. Consequentemente, a moeda é então admitida como a liquidez por excelência. E é exatamente este seu atributo que a diferencia dos demais ativos, além do fato de o seu custo de manutenção ou estocagem ser negligenciável, evidentemente inexistindo inflação. Considerando a declaração acima, podemos perceber que somente será considerado moeda, do ponto de vista da economia monetária, se tal ativo apresentar os seguintes atributos: • seu rendimento, em espécie, deve ser zero, resultado da inalterabilidade de seu valor de face, nominal; • o custo de mantê-la estocada é praticamente imperceptível; • deve apresentar a liquidez máxima. 30 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I O que diferencia a moeda dos ativos financeiros, bem como dos bens físicos, é justamente a reunião dos atributos anteriores, pois os ativos financeiros, representados pelas aplicações financeiras, ou títulos, como preferem os teóricos da economia monetária, oferecem a possibilidade de render juros quando aplicados. Aqui, quando convertida em aplicação financeira, a moeda perde sua principal característica de liquidez imediata, liquidez por excelência. Pense: você tem tantos reais depositados em sua conta-corrente em um determinado banco e não tem a perspectiva de utilizar tal saldo no momento. Aproveitará as oportunidades oferecidas pelo mercado financeiro e efetuará uma aplicação do valor que não será utilizado. Para tanto, deverá efetuar uma transferência de sua conta-corrente para uma aplicação financeira: retirará saldo de DVbc, depósito à vista nos bancos comerciais e, portanto, do ponto de vista convencional da economia monetária, haverá uma diminuição de MP, meios de pagamento. Por qual motivo fará tal aplicação? Certamente, para fazer render aquele saldo que não será, no momento, utilizado. Tal aplicação gera algum rendimento e, portanto, mudará o valor de face da moeda que estava depositada em conta-corrente. Isto é importante reter: o fato de efetuar uma aplicação financeira altera um dos atributos da moeda. Observação É fato que tal aplicação financeira pode alterar o valor de face, nominal, da moeda para mais ou para menos. Tudo dependerá do tipo de aplicação financeira escolhida e se seus rendimentos serão positivos ou negativos. E no caso dos bens físicos? Estes certamente apresentam custos de estocagem e manutenção significativos e devem ser considerados. Portanto, se apresentam custos significativos, diferenciam-se da moeda liquidez por excelência. Vamos melhorar tal raciocínio. Imaginemos que aquela aplicação financeira por você efetuada tenha um objetivo: adquirir um patrimônio, uma casa, por exemplo. A aquisição da casa requer certo volume monetário, que deve ser acumulado por algum tempo – se pensarmos em uma compra à vista, certamente. Pronto, a casa já foi adquirida e com ela alguns custos, no mínimo, de manutenção, aquilo que chamamos de depreciação do patrimônio. É a isso que estamos nos referindo quando afirmamos que os ativos físicos, os bens físicos, apresentam custo de estocagem e manutenção consideráveis. Berchielli (2003, p. 17) também contribui: O grau de liquidez de um ativo depende de dois fatores: custos de transação incorridos quando o agente transforma seu ativo em moeda. Por exemplo, para negociar uma ação no mercado secundário (Bolsa de Valores), seu portador deve pagar uma comissão à corretora encarregada da operação. A esse custo podemos acrescentar o recolhimento de impostos ao governo; e tempo gasto para transacionar o ativo no mercado a um preço razoável, 31 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA ou o prazo de aplicação, no caso de alguns ativos financeiros. Tomemos como exemplo os imóveis: para vender um imóvel a um preço próximo do preço potencial é necessário, às vezes, aguardar vários meses até que surja um comprador disposto a pagá-lo. Alternativamente, o proprietário poderia reduzir o preço para vender o imóvel mais rapidamente. Isso implica uma perda de capital, o que representaria um custo. Uma empresa, por exemplo, deve decidir qual montante monetário manter em caixa físico, ou moeda física, em suas dependências para despesas correntes; quanto de moeda manter depositada em conta- corrente em banco para as despesas que estão programadas conforme determina sua administração de fluxo de caixa; quanto pode manter em aplicações financeiras se seu fluxo de caixa é positivo e está trabalhando com certa segurança financeira. Por fim, quanto de sua produção final deve ser mantida em estoque para atender possível demanda; quanto de insumos de produção manter em estoque para atender à necessidade do setor de produção; e quanto manter para a questão de custo de estocagem. Pois bem: quais os atributos que devem reunir os títulos e os bens físicos para que sejam diferenciados da moeda? Novamente, recorremos a Lopes e Rossetti (2005, p. 126-127) para esclarecer. • possibilidade de gerar ou estar gerando rendimentos ou serviços que satisfaçam às necessidades correntes do agente econômico. • custos de manutenção e de estocagem significantemente diferentes de zero, observando-se que, quanto a este aspecto, os bens físicos, de uma forma geral, apresentam estes tipos de custos mais elevados que os dos títulos. • graus diferentes de liquidez, mas necessariamente inferiores ao da moeda; cabe assinalar que certos bens físicos (talvez mesmo a maioria deles) são praticamente ilíquidos. O quadro a seguir, adaptado de Lopes e Rossetti (2005, p. 126), sumariza os atributos tanto da moeda quanto de outros ativos. Quadro 2 Formas de ativo Rendimentos proporcionados Custo de manutenção e estocagem Grau de liquidez Ativos monetários Zero Negligenciável Máximo Títulos Fixo ou variável (normalmente superior a zero) Significativo Inferior ao dos ativos monetáriosBens físicos Possíveis, mas, necessariamente, incertos Superior ao dos títulos Geralmente inferior ao dos títulos. Em termos de economia monetária, convenciona-se classificar os ativos por ordem decrescente de liquidez, iniciando pela moeda manual (cédulas e moedas metálicas) e os depósitos à vista de 32 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I conta-corrente em bancos comerciais; segue-se a classificação para ativos financeiros não monetários, a exemplo dos títulos públicos, depósitos de poupança e aqueles a prazo. Nesse conjunto ainda estão os títulos privados até que seja possível chegar aos bens físicos dos mais variados tipos, quais sejam, automóveis, obras de arte, imóveis, máquinas que apresentam baixa liquidez. Para o caso da economia brasileira, podemos ter em mente que as cédulas e as moedas metálicas que estão em poder do público, MM, os depósitos à vista da coletividade em poder dos bancos comerciais, DBC, dos bancos múltiplos, DBM, do Banco do Brasil, DBB, e também das caixas econômicas, DCE, representam a máxima liquidez em moeda. Assim, a oferta de moeda no Brasil, M, considerando seu conceito restrito, qual seja, o de meios de pagamento, pode ser representada por: M = MM + DBC + DBM + DBB + DCE Saiba mais Convidamos você a buscar o livro do Keynes, Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, e ler atentamente o capítulo 17 intitulado “As propriedades essenciais dos juros e do dinheiro”. Neste capítulo, Keynes aborda os principais atributos da moeda e de outros ativos, empregando uma visão ímpar. KEYNES, J. M. As propriedades essenciais dos juros e do dinheiro. In: ___. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. São Paulo: Atlas, 1982. Para que PMPP seja efetivamente utilizado pela coletividade, o Banco Central, na qualidade de autoridade monetária, precisa, junto à Casa da Moeda, emitir moeda, PME, ou seja, ter Papel-moeda Emitido. Mas, nem todo PME converte-se em PMPP, pois o próprio Banco Central retém parte desses recursos. Portanto, são necessárias algumas distinções. Será considerado Papel-moeda Emitido (PME) o total de moeda manual que foi criado pela Casa da Moeda mediante pedido do Banco Central e que se encontra em poder do público não bancário, no caixa dos sistemas bancários comerciais ou como reserva no caixa do próprio Banco Central. Do conceito de PME desembocamos no conceito de PMC, Papel-moeda em Circulação. Este é representado pela diferença entre o saldo de papel-moeda emitido e a reserva em caixa do Banco Central. Por fim, o saldo de Papel-Moeda em Poder do Público (PMPP) estará representado quando se considera a diferença entre o saldo de papel-moeda em circulação e o caixa do sistema comercial. Observação O sistema não bancário é representado por todos os agentes da economia, excetuando-se o Banco Central e o sistema bancário comercial. 33 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 ECONOMIA MONETÁRIA Esquematizando: Papel-moeda em Circulação = Papel-moeda Emitido – Caixa do Banco Central (retenção) Por sua vez, os bancos comerciais também não colocam à disposição da sociedade todo o volume monetário que o Banco Central injetou. Parte desses recursos os bancos comerciais retêm em encaixe técnico. Assim, Papel-moeda em Circulação = Papel-moeda Emitido – Caixa do Banco Central – Encaixe técnico bancário. Assim: Papel-moeda em Poder do Público = Papel-moeda Emitido – Caixa do Banco Central – Caixa do sistema bancário comercial. Já que estamos tratando dos meios de pagamento, é importante trazer o que destacam Lopes e Rossetti (2005, p. 129) acerca do assunto. Com relação ao papel-moeda e moedas metálicas em poder do público, MM, componente da oferta monetária também denominado moeda manual ou moeda corrente, cumpre esclarecer que não se trata efetivamente do saldo em circulação nem do saldo emitido. [...]. São considerados como moeda apenas os meios de pagamento possuídos pelos agentes econômicos não bancários. A moeda manual que se encontra de posse das unidades familiares, nos caixas das empresas não bancárias (aqui também incluídas as do setor de intermediação financeira não bancária, isto é, as demais instituições do sistema financeiro do país com exclusão dos bancos comerciais, do Banco do Brasil e das caixas econômicas), e das instituições das três esferas do governo é que se considera para o efeito desse conceito convencional de meios de pagamento. Cabe observar que é exatamente esse critério que leva à caracterização dos depósitos à vista, também denominados moeda bancária ou moeda escritural como o segundo componente dos meios de pagamento e uma economia moderna. Isto porque, como indica o próprio senso comum, os agentes econômicos citados incluem entre suas disponibilidades monetárias imediatas as somas disponíveis de moeda manual e os seus depósitos à vista, sacáveis a qualquer instante e sem prévio aviso, mediante o simples preenchimento de uma ordem de pagamento, representada, no caso, pelo cheque. Como estamos de uma forma convencional tratando dos meios de pagamento, estamos também abordando uma das principais funções da moeda, qual seja, a de servir como intermediário de trocas. Assim, do ponto de vista da economia monetária, considerar os meios de pagamento é considerar exclusivamente a moeda como intermediária de trocas. Caso o tratamento da oferta monetária passe 34 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o- 0 1/ 08 /2 01 7 Unidade I a considerar outra função da moeda, a reserva de valor, teríamos outro conceito do ponto de vista da economia monetária: o conceito de quase moeda. Entende-se por quase moeda tudo aquilo que não é moeda no seu sentido de liquidez. Se papel-moeda em poder do público e depósitos à vista nos bancos comerciais são considerados moeda por terem liquidez por excelência do ponto de vista da economia monetária, qualquer outro ativo financeiro que não seja esses dois, bem como ativos físicos, passam a ser considerados como quase moeda. Assaf Neto (2012, p. 12) pode nos ajudar a compreender: São designados por quase moeda os títulos emitidos pelo Governo Federal, ou por instituições financeiras e empresas públicas, e negociados no mercado por um valor inferior ao de sua emissão (deságio). O deságio verificado na negociação desses títulos é geralmente explicado pela longa maturidade do resgate ou inadimplência do emitente. Por essa desvalorização no mercado esses papéis foram, muitas vezes, conhecidos por moedas podres. Estes títulos podem ser utilizados para pagamentos de determinadas dívidas junto ao Governo Federal. Os quase moeda foram também adquiridos por investidores estrangeiros interessados em participar das privatizações das companhias estatais brasileiras, ocorridas nas décadas de 1980 e 1990. [...]. No caso brasileiro, podem ser classificados por quase moedas os títulos da dívida externa conhecidos por bradies, Títulos da Dívida Agrária (TDA), debêntures da Siderbras (antiga holding estatal do setor siderúrgico), entre outros ativos não monetários. O autor continua: O conceito de quase moeda também pode ser explicado, de forma mai ampla, pelos ativos financeiros que costumam pagar algum rendimento, apresentam alto grau de liquidez e risco bastante reduzido. São representados, em sua maior parte, por títulos públicos. Alguns exemplos, títulos emitidos pelo Tesouro Nacional, depósitos de poupança, etc. A própria moeda pode ser considerada como quase moeda, porém apresenta duas importantes diferenças: (a) a moeda é sempre usada para transações, e o ativo quase moeda não é aceito em todas as transações (em geral, é aceito para pagamento de tributos); (b) a moeda não rende juros, e a quase moeda costuma oferecer rendimentos (ASSAF NETO, 2012, p. 12). Sabemos que a moeda manual é aquela disponibilizada pelo Banco Central à coletividade. Contudo, como surgem os depósitos à vista e
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