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MANEJO DE PACIENTE COM TRANSTORNOS RELACIONADOS AO USO DE SUBSTÂNCIA PSICOATIVA NA EMERGÊNCIA PSIQUIÁTRICA Ricardo Amaral André Malbergier Arthur de Andrade Os transtornos por uso de substâncias são comumente observados em setores de emergência, incluindo prontos- socorros gerais e psiquiátricos, representando cerca de 28% das ocorrências. Contudo, é notável que profissionais da emergência identifiquem menos de 50% dos casos relacionados ao uso de álcool. INTRODUÇÃO O objetivo deste artigo é oferecer uma base fundamentada em evidências para o tratamento específico de pacientes que atendam aos critérios diagnósticos para transtornos por uso de substâncias e que busquem auxílio no pronto-socorro devido a quadros de intoxicação ou abstinência. A intenção é garantir um tratamento eficaz, adequado e baseado em protocolos específicos para essas situações emergenciais. IMPACTO DOS TRANSTORNOS POR USO DE SUBSTÂNCIAS O uso de substâncias não afeta apenas os indivíduos que as consomem, mas também tem um impacto significativo na saúde e na sociedade. Aproximadamente 6% da população brasileira, equivalente a 11 milhões de pessoas, apresentam transtornos por uso de substâncias considerados graves. O uso de álcool está fortemente associado a diversos tipos de acidentes e doenças, como homicídios, suicídios, acidentes automobilísticos, queimaduras, afogamentos e quedas fatais. Outras substâncias, como cocaína e ecstasy, também estão relacionadas a sérios problemas de saúde, reforçando a necessidade de uma abordagem eficaz e baseada em evidências para o tratamento desses transtornos. MÉTODO A metodologia baseou-se em uma revisão crítica da literatura, utilizando a base de dados Medline. Foram selecionados artigos empíricos e de revisão escritos em inglês, com descritores específicos relacionados à intoxicação aguda, abstinência e manejo de substâncias psicoativas, como álcool, cocaína, cannabis, opioides e inalantes. O objetivo foi obter uma compreensão abrangente e informada para embasar as recomendações apresentadas neste artigo. AVALIAÇÃO E TRATAMENTO A avaliação abrangente inclui: histórico detalhado do uso de substâncias e seus efeitos no paciente histórico médico geral e psiquiátrico e exame físico A avaliação e o tratamento dos pacientes com transtornos por uso de substâncias são fundamentais para garantir uma abordagem adequada. AVALIAÇÃO E TRATAMENTO histórico de tratamentos anteriores história familiar e social triagem da substância utilizada outros testes laboratoriais relevantes permissão do paciente para contatar pessoas que possam fornecer informações adicionais para auxiliar no processo de avaliação. ATENDIMENTO EMERGENCIAL O atendimento inicial aos pacientes com transtornos relacionados ao uso de substâncias é crucial e muitas vezes ocorre em prontos- socorros gerais ou psiquiátricos. Isso se justifica pela natureza clínica primária dos quadros de intoxicação e abstinência. A desintoxicação é parte integrante do cuidado inicial, mas é importante ressaltar que não visa apenas os aspectos psicológicos e comportamentais decorrentes do uso de substâncias. Profissionais de emergência devem estar cientes da importância da desintoxicação no continuum de cuidados para transtornos por uso de substâncias. INTOXICAÇÃO AGUDA E OBJETIVOS DE TRATAMENTO A intoxicação aguda é caracterizada pelo desenvolvimento de síndromes específicas devido à recente ingestão ou exposição a substâncias psicoativas. O tratamento da intoxicação aguda tem como objetivos principais a redução da exposição a estímulos externos, a identificação das substâncias utilizadas, a remoção das substâncias do corpo e a estabilização dos efeitos físicos das substâncias. É fundamental reverter os efeitos da substância por meio da administração de antagonistas apropriados e utilizar abordagens que garantam a segurança e a estabilidade física do paciente. DESINTOXICAÇÃO E CONTINUIDADE DO TRATAMENTO A desintoxicação, embora seja uma forma de cuidado paliativo para reduzir a intensidade do transtorno, representa o primeiro passo crucial para a recuperação de alguns pacientes. A decisão sobre o local mais adequado para a continuidade do tratamento pode variar, mas deve levar em consideração a situação clínica do paciente e suas necessidades específicas. A existência de familiares ou cuidadores capazes de compreender as dificuldades e necessidades do paciente é um aspecto importante a ser considerado na liberação do paciente após o processo de desintoxicação. O cuidado de pessoas com transtornos por uso de substâncias deve ser abrangente, envolvendo avaliação completa, tratamento dos quadros diagnosticados, sensibilização do paciente para realizar tratamento se necessário e elaboração de um encaminhamento apropriado. As decisões sobre o tratamento devem ser orientadas pelas melhores práticas e diretrizes estabelecidas para garantir um cuidado eficaz e adequado aos pacientes com transtornos relacionados ao uso de substâncias. DEPRESSORES Bem variada Depende do nível de álcool no sangue (Alcoolemia) Nível de tolerância do paciente Estado alimentar Alguns fatores ambientais influenciam ÁLCOOL Nível de alcoolemia : Entre 20mg% e 80mg% (duas a quatro doses) = Ocorre perda de coordenação muscular, alteração de humor e comportamento, e aumento na atividade motora. Entre 80mg% e 200mg% = Ocorrem alterações neurológicas progressivas, ataxia e fala pastosa. Funções cognitivas também prejudicadas! Deve-se tomar cuidado com a aspiração de vômito! Entre 200mg% e 300mg% = Possibilidades de náuseas e vômitos ocorrendo junto com uma sedação, que pode aumentar o risco de aspiração do vômito. Superior a 300mg% = Hipotermia e comprometimento do nível de consciência. Acima de 400mg% até 600mg% = Coma pois o álcool não é mais absorvido, trazendo complicações na respiração, parte cardiovascular, e temperatura corporal. Soro fisiolológico caso indivíduo estiver com desidratação e glicose hipertônica se estiver hipoglicêmico. Indicações: Pacientes gravemente intoxicados ou em coma, devem ter um procedimento igual a de uma pessoa normal que está em coma, havendo uma monitoração dos sinais vitais, tomando um cuidado com sua aspiração e respiração por conta do conteúdo gástrico, hipoglicemia e tiamina. BENZODIAZEPÍNICOS São depressores do Sistema Nervoso Central, com efeitos de intoxicação aguda semelhantes ao do álcool. Corre o risco de depressão respiratória, hipotensão e bradicardia, porém são mais comuns quando a intoxicação está associada a outras substâncias junto, pois uma potencializa a outra. A ingestão excessiva somente de benzodiazepínicos dificilmente induz ao coma profundo e ao óbito, porém o paciente pode necessitar de ventilação assistida e terá que ser monitorado com drogas vasoativas e com o antagonista do benzodiazepínico, que é o flumazenil. Contraindicado para pacientes que utilizam antidepressivos tricíclicos, aminofilina ou cocaína. OPIOIDES Substancias derivadas da papoula de ópio e suas variações sintéticas e semissintéticas. Tratamento: Níveis leve a moderado - o tratamento específico normalmente não é necessário. Superdosagem - Em sinais de miose, bradicardia acentuadas, depressão respiratória, estupor ou coma o paciente deve ser internado em ambiente de emergência e o médico deve considerar a necessidade de assistência ventilatória e tratamento com naloxone. ESTIMULANTES Efeitos agudos dos estimulantes e as respostas fisiológicas que o corpo emana: • Aumento da pressão arterial • Aumento das frequências cardíacas e respiratória • Da temperatura corporal • Dilatação pupilar • Estado de alerta elevado e aumento da atividade motora. COCAÍNA E OUTROS ESTIMULANTES São frequentemente usados em padrões intensos, com o alto consumo seguido por períodos de abstinência A intoxicação geralmente melhora sozinha ao longo do tempo e não requer tratamento médico ativo, apenas monitorização e apoio ao paciente Entretanto,muitas vezes pode ocorrer hipertensão, taquicardia, convulsões e delírio persecutório, hipertermia, agressividade e hostilidade. O que exigir um tratamento específico para isso. Pacientes agitados podem ser tratados com benzodiazepínicos, antipsicóticos ou por ambas as medicações. Podendo ser aplicadas via oral ou intramuscular. A combinação de álcool e cocaína intensifica os efeitos psicoestimulantes da cocaína, resultando em um aumento da frequência cardíaca. Usuários de estimulantes podem desenvolver sensibilização à substância com exposição repetida. Sensibilização pode levar a convulsões, mesmo em padrões de consumo anteriormente considerados inofensivos. Risco de hipertermia associado a atividade muscular elevada, efeitos nos sistemas serotoninérgico, dopaminérgico e adrenérgico, e suscetibilidade individual. Doses elevadas de anfetaminas podem exigir lavagem gástrica, com consideração do tempo de absorção da substância. PERTUBADORES E ALUCINÓGENOS MACONHA Droga ilícita mais utilizada no mundo. Vulnerabilidade e efeito agudo - Podem ser observados sintomas psicóticos e episódios agudos de ansiedade semelhantes aos ataques de pânicos. E a maconha pode neutralizar os efeitos da medicação ansiolítica. Porém em contrapartida, os usuários a mais tempo da maconha, normalmente relatam que ela está associada a redução da ansiedade, causando uma sensação de relaxamento. MACONHA Em um estudo com pessoas que usaram maconha regularmente durante pelo menos 10 anos, 21% dos indivíduos apresentavam níveis elevados de ansiedade (Reilly et al ., 1998). Outro estudo com jovens neozelandeses de 18 anos: Foi relatado que aqueles que consumiram maconha dez vezes ou mais entre as idades de 15 e 16 anos tinham uma prevalência mais elevada de perturbações de ansiedade (31%). (Fergusson e Horwood, 1997). A Pesquisa Nacional de Comorbidades (NCS) sugeriu que a probabilidade de diagnosticar ansiedade ou transtorno de humor foi aproximadamente duplicado em indivíduos com dependência de cannabis. ESTUDOS MACONHA Geralmente a procura de tratamento por usuários de maconha é feita por conta dos sintomas ansiosos. A intoxicação por maconha pode levar a pessoa a ter comportamentos agressivos, pelo comprometimento da percepção da realidade associada à ansiedade e à ideação paranoide. O tratamento dos sintomas psicóticos pela maconha segue os mesmos princípios básicos do tratamento desses sintomas em usuários de cocaína, geralmente é usado os benzodiazepínicos. E também em um estudo, pacientes com transtornos de ansiedade demonstraram redução dos sintomas após 28 dias de tratamento com nabilona. TRATAMENTO MACONHA ABSTINÊNCIA A ansiedade também aparece na abstinência de maconha, iniciando normalmente entre o segundo e o sexto dia e dura de 4 a 14 dias. *No entanto, a existência de uma síndrome de abstinência de cannabis não é universalmente aceita e ainda não está incluída no DSM-IV. POSSÍVEIS EXPLICAÇÕES PARA A ASSOCIAÇÃO DA ANSIEDADE COM O USO DA CANNABIS O THC pode provocar sintomas de ansiedade através de seus efeitos sobre a serotonina, noradrenalina. 1 A ansiedade pode se dar pelo comprometimento do funcionamento cognitivo e à turvação da consciência. 2 O mecanismo de ação não pode ser bem definido. Seus efeitos são depressores sobre o SNC. Os sintomas de intoxicação envolvem euforia e desinibição. E podem ter sintomas como tinidos, zumbidos, ataxia, risos imotivados e fala pastosa. A depressão central pode-se dar por confusão mental, desorientação e alucinações. Tem risco de convulsões, coma e morte. Os solventes têm ação direta sobre o miocárdio, podendo provocar arritmia cardíaca, portanto é importante a monitorização cardíaca. Ainda não há um consenso sobre a tolerância dessas substâncias e abstinências. MACONHASOLVENTES ABSTINÊNCIAS ÁLCOOL Síndrome de Abstinência do Álcool (SAA) - condição que ocorre após a interrupção ou redução do consumo de álcool. Sintomas começam de 4 a 12 horas após a abstinência, pico no segundo dia, durando de 4 a 5 dias. Sintomas: tremores, desconforto gastrointestinal, ansiedade, irritabilidade, aumento da pressão arterial, taquicardia e hiperatividade autonômica. Convulsões, alucinações e delirium são menos comuns. Tratamento: reduzir a irritabilidade do sistema nervoso central e restaurar a homeostase fisiológica Uso de medicamentos como clordiazepóxido, diazepam ou lorazepam para acalmar. Administração de vitaminas essenciais. Possível uso de medicamentos que controlam o ritmo cardíaco e a pressão sanguínea, mas que podem mascarar a gravidade dos sintomas. Após a estabilização, a medicação é retirada gradualmente Cerca de 3% dos pacientes graves podem desenvolver Delirium Tremens (DT) após 72 horas. O DT é caracterizado por alteração do nível de consciência, oscilações de humor e convulsões em 10-15% dos casos. Os pacientes podem ser encaminhados para internação hospitalar ou seguimento ambulatorial após alta. O Centro de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS-AD) é recomendado para seguimento de casos com uso nocivo e dependência de álcool. COCAÍNA E ANFETAMINAS Após a cessação é comum o aparecimento de fissura (desejo intenso e irresistível de usar cocaína) e anedonia (incapacidade de sentir prazer em atividades que normalmente seriam satisfatórias, durante a abstinência) A descrição de um quadro bem definido de abstinência e sua duração ainda não é consenso. Os tratamentos farmacológicos raramente trazem benefícios para o manejo dos sintomas de abstinência. A primeira fase, denominada “crash”, tem duração de horas a cinco dias e se caracteriza por fissura intensa no início, irritabilidade e agitação, evoluindo para hipersonolência, depressão, anedonia e exaustão, acompanhados de uma redução na fissura. Abstinência é a segunda fase, que se inicia com a reemergência da fissura e sintomas depressivos e ansiosos, podendo durar até dez semanas. A terceira fase é quando há uma redução gradativa da fissura e tendência a normalização do humor, sono e ansiedade. 1 22 3 BENZODIAZEPÍNICOS Abstinêcnia por interrupção abrupta do uso de doses elevadas prolongado Pode haver sintomas de abstinência em pacientes com doses consideradas terapÊuticas A retirada da medicação deve ser feita de forma progressiva e planjeda SINTOMAS Os sintomas podem aparece de 1 a 11 dias depois da retirada da medicação. Sintomas: ansiedade, insônia, cefaleia, anorexia, nauseas, vomitos, tremores, hipotensão postural, fraqueza TRATAMENTOS Administração de fenobarbital (30mg), equivalendo a 10mg de diazepam, 30mg de clordiazepóxido, 1mg de lorazepam e 1mg de alprazolam. A partir da estabilização, recomenda-se a redução progressiva e diária de 10% da dose inicial. O uso de dose convertida do benzodiazepínico para o diazepam, com redução progressiva de 10% diariamente também está indicado MACONHA Evidências de abstinência em usuários pesados e crônicos Sintomas: irritabilidade, mudança no apetite, perda de peso e desconforto físico. Tratamento: ainda não há muitos estudos e um tratamento farmacológico específico recomendado. O uso de maconha pode precipitar episódios iniciais psicóticos em pacientes com vulnerabilidade OPIOIDES O tratamento da síndrome de abstinência de opioides visa ajudar os pacientes na transição da dependência para o tratamento de longa duração. Uso de escalas padronizadas para avaliar a gravidade dos sintomas de abstinência é útil para o manejo dos casos Sintomas como o aumento da pressão arterial, da frequencia cardiaca, suor, calafrio, dores no corpo, diarreia, rinorreia, lacrimejamento podem ser levados em consideração para o tratamento com METADONA Feito com monitoramento continuado do estado clinico e do uso da medicaçaõ não há recomendação para a manutenção da substituição pela metadona fora do ambiente hospitalar. Auxilia na fissura do usuário pelos opióides A CLONIDINA é uma segunda opção em casos específicos como abuso prévio de metadona Não existe consenso sobre a eficáciaclínica da clonidina no tratamento da síndrome de abstinência de opióides MACONHA A procura de setores de emergência por usuários de álcool e drogas pode ser uma oportunidade para a sensibilização do paciente quanto ao uso de substâncias, comportamentos de risco e consequências médicas e psicossociais do uso de substâncias psicoativas Estratégias de intervenção podem ser oferecidas em sessões individuais de 5 a 15 minutos, com o objetivo de motivar o paciente para o tratamento. Segundo Cunninghan et al., ainda são necessárias maiores evidências relacionadas ao tempo de duração, à execução e à intensidade das intervenções. INTERVENÇÃO BREVE A carência de serviços especializados na área de álcool e drogas e a ausência de profissionais especializados nesta área nos PSG podem comprometer a aplicação de práticas adequadas e deve ser objeto de preocupação dos profissionais de saúde pública na organização dos serviços de emergência. As altas prevalências dos TUS na população e a frequente necessidade das pessoas acometidas por estes transtornos de recorrerem aos serviços de emergência justificam tal prioridade.
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