Buscar

e-book_TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA

Prévia do material em texto

Coordenação 
Karla Meura 
Rosângela Maria Herzer dos Santos 
Fernanda Osorio 
Organização 
Karla Meura 
Janaina Cordeiro 
Evelin Ferreira 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2ª.ed. 
 
Porto Alegre, 2021 
 
 
Copyright © 2021 by Ordem dos Advogados do Brasil 
Todos os direitos reservados 
 
Coordenação 
Karla Meura 
Rosângela Maria Herzer dos Santos 
Fernanda Osorio 
 
Organização 
Karla Meura 
Janaina Cordeiro 
Evelin Ferreira 
 
 
Capa: 
Victor Baldez Silva 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Jovita Cristina Garcia dos Santos – Bibliotecária CRB 10/1.517 
 
 
 
A revisão de Língua Portuguesa e a digitação, bem como os conceitos emitidos em trabalhos 
assinados, são de responsabilidade dos seus autores. 
 
Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Rio Grande do Sul 
Rua Washington Luiz, 1110 –Centro Histórico 
 CEP 90010-460 - Porto Alegre/RS 
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - CONSELHO FEDERAL 
T248 
Trajetórias da Advocacia Negra / Meura, Karla; Silva; Cordeiro, 
Janaina et.al (Orgs.). 2.ed. Porto Alegre: OAB/RS, 2021. 60.p. 
il. 
ISBN online: 978-65-88371-18-3 
1. Histórias Negras. 2. Advocacia Negra. 3. Biografia. I. Karla 
Meura. II. Título 
CDU 929 
 
 
 
 
DIRETORIA/GESTÃO 2019/2021 
 
Presidente: Felipe Santa Cruz 
Vice-Presidente: Luiz Viana Queiroz 
Secretário-Geral: José Alberto Simonetti 
Secretário-Geral Adjunto: Ary Raghiant Neto 
 Diretor Tesoureiro: José Augusto Araújo de Noronha 
 
ESCOLA NACIONAL DE ADVOCACIA – ENA 
 
Diretor-Geral: Ronnie Preuss Duarte 
 
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL 
 
Presidente: Ricardo Ferreira Breier 
Vice-Presidente: Jorge Luiz Dias Fara 
Secretária-Geral: Regina Adylles Endler Guimarães 
Secretária-Geral Adjunta: Fabiana Azevedo da Cunha Barth 
Tesoureiro: André Luís Sonntag 
 
ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA 
 
Diretora-Geral: Rosângela Maria Herzer dos Santos 
Vice-Diretor: Darci Guimarães Ribeiro 
Diretora Administrativa-Financeira: Graziela Cardoso Vanin 
Diretora de Cursos Permanentes: Fernanda Corrêa Osório, Maria Cláudia Felten 
Diretor de Cursos Especiais: Ricardo Hermany 
Diretor de Cursos Não Presenciais: Eduardo Lemos Barbosa 
Diretora de Atividades Culturais: Cristiane da Costa Nery 
Diretor da Revista Eletrônica da ESA: Alexandre Torres Petry 
 
CONSELHO PEDAGÓGICO 
 
Alexandre Lima Wunderlich 
Paulo Antonio Caliendo Velloso da Silveira 
Jaqueline Mielke Silva 
Vera Maria Jacob de Fradera 
 
 
 
 
 
CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS 
 
Presidente: Pedro Zanette Alfonsin 
Vice-Presidente: Mariana Melara Reis 
Secretária-Geral: Neusa Maria Rolim Bastos 
Secretária-Geral Adjunta: Claridê Chitolina Taffarel 
Tesoureiro: Gustavo Juchem 
 
TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA 
 
Presidente: Cesar Souza 
Vice-Presidente: Gabriel Lopes Moreira 
 
CORREGEDORIA 
 
Corregedora: Maria Helena Camargo Dornelles 
Corregedores Adjuntos 
 Maria Ercília Hostyn Gralha, 
Josana Rosolen Rivoli, 
Regina Pereira Soares 
 
OABPrev 
 
Presidente: Jorge Luiz Dias Fara 
Diretora Administrativa: Claudia Regina de Souza Bueno 
Diretor Financeiro: Ricardo Ehrensperger Ramos 
Diretor de Benefícios: Luiz Augusto Gonçalves de Gonçalves 
 
COOABCred-RS 
 
Presidente: Jorge Fernando Estevão Maciel 
Vice-Presidente: Márcia Isabel Heinen 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
 
 
SUMÁRIO 
 
PREFÁCIO........................................................................................................................................ 7 
APRESENTAÇÃO ............................................................................................................................ 8 
Adriana Ferreira Rodrigues ............................................................................................................. 9 
Aline da Rosa Ajardo ...................................................................................................................... 12 
Ana Paula Moraes ........................................................................................................................... 14 
Caroline Albuquerque ..................................................................................................................... 16 
Caroline Ribas Sérgio ..................................................................................................................... 18 
Cristiane Eveline Ferreira da Silva ................................................................................................ 21 
Diogo Rosa Souza ............................................................................................................................ 23 
Evelin França - Eliane Clalmes Magalhães .................................................................................. 25 
Erli Terezinha dos Santos ............................................................................................................... 28 
Heleno Gary Rodrigues ................................................................................................................... 31 
Karen Suélen Pereira da Silva ........................................................................................................ 32 
Leonardo Santos Franco................................................................................................................. 34 
Letícia Marques Padilha ................................................................................................................. 36 
Letícia da Rosa dos Santos .............................................................................................................. 38 
Liane da Silva Oliveira .................................................................................................................... 41 
Luiz Carlos Marques Jr. ................................................................................................................. 43 
Mateus da Silva Rosa Pereira ......................................................................................................... 45 
Paulo dos Santos Maria .................................................................................................................. 47 
Rudinei Horst .................................................................................................................................. 50 
Silvia Cerqueira ............................................................................................................................... 52 
Tatiana Metzdorf Viana .................................................................................................................. 56 
Tatiane da Rosa Pinheiro Sampaio ................................................................................................ 59 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
7 
 
PREFÁCIO 
 
É com muita felicidade que recebi a incumbência de redigir o Prefácio da segunda edição do 
Livro Trajetórias da Advocacia Negra. 
Eu tive a honra de participar da Primeira Edição, e meu testemunho a respeito da Obra é que 
ela reflete toda uma construção da vida profissional de mulheres e homens negros. E de 
como esta construção forja profissionais dedicados, que na maioria das vezes necessitam de 
muita determinação para enfrentar as dificuldades de um mercado de trabalho, que não lhes 
permite em igualdade de condições, com outros profissionais com formação semelhante. 
Tal fato é resultado da longa tradição escravagista existente no DNA da Nação Brasileira e 
que ainda hoje lutamos para modificar. Apesar disso, nós podemos contar com o apoio de 
nossos antepassados, e familiares, que nos inspiram, levantam nossa autoestima, para que 
possamos chegar onde eles não chegaram, e nossas vitórias são resultado direto das lutas que 
eles lutaram no passado, ou lutam até hoje. 
As histórias que conheceremos através do Livro retratam o quanto determinação,força de 
vontade, e muita abnegação, podem nos levar a uma formação profissional, e que através 
dela possamos buscar os meios, para podermos nos tornar cidadãos de fato e de direito neste 
país. 
Vamos celebrar as Trajetórias Profissionais de nossos colegas! 
Vamos fazer isso através da leitura desta Obra! 
 
Artêmio Prado da Silva 
Vice-Presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB/RS. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
8 
 
APRESENTAÇÃO 
 
É com muita alegria que nós integrantes da Diretoria e Membros da Comissão da Igualdade 
Racial da OABRS apresentamos a segunda edição do livro Trajetórias da Advocacia Negra. 
Não existem palavras para expressar a imensa satisfação que temos ao construir 
coletivamente um a nova edição deste livro colacionando histórias de vida de colegas negros 
e negras. 
São relatos, histórias de luta, de colegas advogados e advogadas de como conseguiram 
alcançar o tão sonhado diploma de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais. De como o 
caminho apresentou obstáculos, barreiras, que foram ultrapassadas com muita luta, garra e 
persistência. E mais que isso, conquistaram o tão sonhado diploma com esforço, dedicação, 
abdicações e renúncias, mas o mais importante neste percurso, nunca caminharam sozinhos. 
Sabemos que a luta do povo preto para ocupar os espaços a que temos direito, porque são 
nossos também, é árdua, na maioria das vezes dolorosa, mas sempre com um propósito certo: 
representatividade. Queremos ver muitos outros pretos como nós ocupando espaços de 
decisão, visto que não temos dúvida do nosso potencial. 
E esta nova edição traz algumas dessas histórias de advogados negros e advogadas negras 
que em muitos pontos convergem entre si, visto que em várias delas há uma mulher negra 
ou mulheres negras que representam o alicerce da família. E em todas as histórias é marcante 
o respeito e admiração a nossa ancestralidade. 
A segunda edição do livro Trajetórias da Advocacia Negra é repleta de significados para a 
Comissão da Igualdade Racial da OABRS. Visto que recentemente conseguimos que esta 
comissão se tornasse permanente dentro do sistema OABRS, e teremos uma grande 
representatividade da advocacia negra gaúcha no conselho desta Seccional na próxima 
gestão (2022-2025). Ganham a OAB, a comunidade negra e toda a sociedade com esses 
avanços. 
Que venham muitas outras histórias de trajetórias de advogados negros e advogadas negras 
que compõem o quadro do sistema OAB. Que sejamos muitos dentro desse sistema. Que ao 
olharmos para os lados nos sintamos representados. 
Que venham novos tempos! 
 Letícia Marques Padilha 
Secretária Geral Adjunta da Comissão da Igualdade Racial da OAB/RS 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
9 
 
 
 
Adriana Ferreira Rodrigues 
 
PRETA, POBRE, COM MAIS DE 45 ANOS, ADVOGADA, ESTA SOU EU, 
COM MUITO ORGULHO 
 
Adriana Ferreira Rodrigues, nasci em 19 de setembro de 1972, filha de Valdomiro 
Venceslau Rodrigues e Luiza Paula Ferreira Rodrigues, a caçula de 3 irmãos, natural de 
Porto Alegre. 
Como a maioria de nossos colegas pretos e pretas, sou oriunda de família simples, de 
parcos recursos, que atualmente depois de muitos caminhos percorrer consegui a minha 
formação de ensino superior. Tenho a felicidade de pertencer aos 7,12% de negros e pardos 
que se matriculam em instituições de ensino superior e apenas 3% que chegam a concluir o 
curso (dados do IBGE 2018). 
Meu primeiro sonho de profissão foi a de Engenharia Civil, que me fez concorrer a 
uma vaga no disputado vestibular da UFRGS, não obtendo sucesso. Quando despertou em 
mim o interesse pelo curso de Direito, prestei o vestibular na Universidade Pública e 
novamente não tive êxito, e no mesmo ano fui aprovada na Pontifícia Universidade Católica 
e na Universidade Luterana do Brasil, onde ingressei, pois, questões financeiras, pois a 
mensalidade era um pouco mais acessível, e meus pais, que eram funcionários públicos, 
teriam um pouco mais de condições de pagar. Meus irmãos também estavam nesta luta pela 
a conquista do diploma, mas infelizmente foram abandonando o sonho, assim como eu que 
tive que deixar de lado também. 
Muitos anos se passaram, acompanhava de longe alguns colegas se formando, 
qualificando-se e eu ficando apenas com o sonho de minha formatura. 
Neste período, direcionei minha vida profissional para a área da saúde, e qualifiquei 
e trabalhei por 20 anos em dois grandes hospitais de Porto Alegre, porém, sempre mantive 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
10 
 
meu sonho de ser advogada em meus pensamentos. Houveram muitas tentativas para que eu 
pudesse concluir meu curso de Direito, foram quatro tentativas, que tiveram que ser 
abandonadas, por motivos financeiros, familiares, profissionais. 
Nunca tive muita certeza se conseguiria a minha graduação, mas sempre mantive o 
sonho acalentado no coração. 
Neste espaço de tempo, me casei, tive meu filho, minha casa, fui feliz, e sempre 
atenta ao progresso ou não de nosso povo preto. 
Já no início de minha “luta” para ingressar na Universidade pública, já percebi a 
dificuldade que enfrentaria, pois já no curso preparatório do vestibular que frequentei lá na 
década de 90, me dei conta eu já fazia parte de uma parcela ínfima pertencente naquele lugar, 
e como disse os obstáculos vieram, pois eu uma candidata oriunda de escola pública, sem 
ter familiares como referência com nível superior senti o golpe percebeu contrariedade de 
pertencer a UFRGS em um curso de “elite”, como, Engenharia (que foi meu primeira opção) 
ou no Direito, que foi a minha escolha de vida. 
Quando veio o ano de 2015, minha vida deu uma nova guinada, com a ajuda de meus 
pais, esposo e filho, retornei aos bancos universitário, desta vez ingressando para a PUC-RS, 
pois meu último trabalho na área da saúde, foi no Hospital São Lucas da PUC, onde o 
funcionário tem o benefício de um desconto de 40% nas mensalidades. A alegria de retomar 
o meu sonho tomou conta de meu coração e vibrei muito com este retorno, estudei muito. 
Porém, devido a uma crise financeira no Hospital, tiveram que fazer algumas demissões, e 
claro que a preta frequentado uma universidade, em um curso de elite, chamou a atenção, 
não agradando as pessoas, fui desligada, mesmo informando que necessitava do desconto 
para continuar meus estudos, os pedidos foram em vão e o desligamento veio antes do que 
eu projetava. 
Mas como a nossa palavra é a RESISTÊNCIA, quinze dias depois que fui demitida, 
fui selecionada para um estágio na Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, que desperto 
em mim uma nova perspectiva, e que me apontou novamente o baixo número de funcionário 
de carreira pretos e pretas, o que notei também no estágio da Justiça do Estado do Rio Grande 
do Sul. Sempre me chamou a atenção o pequeno n´mero de Juízes e Promotores pretos e 
pretas e o grande percentual de pretos e pretas que são julgados e acusados, o que me faz 
concluir que nada é por acaso, nem mesmo esta desproporcionalidade. Precisamos “invadir” 
o sistema judiciário, é urgente ter mais Juízes, Promotores e Defensores Públicos pretos e 
pretas. A mudança deve ocorrer rapidamente. 
Finalmente, no dia 04 de janeiro de 2020, colei grau, vesti a garbosa toga e coloquei 
as mãos no meu tão sonhado diploma de Direito. O caminho até a conclusão teve altos e 
baixos, mas me orgulho do meu grau 10 no Trabalho de Conclusão de Curso e a aprovação 
na OAB logo depois da formatura. 
Atualmente tenho alguns novos objetivos, entre eles concluir minhas Pós- 
Graduações em Direito Civil e Processo Civil e a outra em Direito das Mulheres. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
11 
 
Concluo deixando uma mensagem de esperança, de perseverança, de resistência. 
Devemos que superar as nossas dificuldades e ter a consciência de que nua é tarde para 
retomar os sonhos, nossa caminhada ainda é grande e temos que deixar o incentivo para as 
próximasgerações 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
12 
 
 
 
 
Aline da Rosa Ajardo 
 
Advogada. OAB/RS 121.131. Subseção Estrela/RS 
 
No ano de 2013, conclui o ensino médio no Colégio Estadual Jacob Arnt, situado na 
minha cidade natal e atual, Bom Retiro do Sul/RS. No mesmo ano, prestei o ENEM e o 
Vestibular na Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES, na cidade de Lajeado. 
Com a aprovação, sem saber como pagaria os estudos, comecei a buscar o 
financiamento estudantil e consegui 100% de financiamento através do FIES. Em fevereiro 
de 2014 iniciei os estudos na instituição. 
Durante a faculdade, trabalhei por três anos como Monitora Educacional do 
Programa Mais Educação em duas escolas da minha cidade. Ganhava em torno de R$300,00 
reais mensais. Meus pais pagavam o transporte e demais gastos com os estudos. 
Após o fim do programa, tive um curto período de estágio remunerado no Ministério 
Público, onde sofri muito com o racismo por parte de uma servidora. Recebi uma ligação 
telefônica, onde me chamavam para, durante uma semana, aprender com a outra estagiária, 
o trabalho que deveria ser realizado. Na semana em questão, fui dispensada, sob alegação de 
que eu estava fazendo muitas perguntas. 
Eu não poderia questionar! Esse foi o trunfo usado contra mim e contra eles eu não 
possuía armas. O resultado foi o meu desligamento em dois meses, com a justificativa de 
que eu não atendia quando solicitada. 
Procurei a universidade para que tomassem providencias, porém nada foi feito. 
Inclusive, após a minha reclamação, outros alunos procuraram a coordenação do curso para 
falar sobre o mesmo assunto. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
13 
 
Esse foi um dos piores episódios de racismo que sofre durante a minha vida e que até 
hoje me embarga a voz e me dói ao falar. Mas isso, não tirou de mim a vontade de seguir em 
frente. 
Iniciei um outro estágio remunerado em uma Delegacia Especializada no 
Atendimento a Mulher da cidade de Lajeado/RS, onde fui bem tratada pelos colegas e 
superiores. Lá vivi experiencias únicas que agregaram muito ao meu crescimento pessoal e 
ao conhecimento jurídico. 
Nesse período, fui acolhida por uma professora do curso, Dra. Thaís Carnieletto 
Muller, nome que faço questão de citar nesse relato. Nunca me cobrou um centavo pela 
estadia em sua casa, que aliás, fazia questão de dizer que era minha também. 
Depois de um período, retornei para minha cidade, onde passei a estagiar na 
Delegacia de Polícia local, onde vivi um período também maravilhoso da minha vida. Em 
2018, passei a atuar em um órgão da administração pública. 
Em 23 de março de 2019, colei grau no Teatro da Universidade do Vale do Taquari 
– Univates, uma turma de em torno de 60 alunos, com apenas duas alunas negras. 
Durante meu período na Administração Pública, adquiri muito conhecimento e tive 
oportunidade de aprender com um grande mentor, Dr. Luis Alberto Silva, ilustre membro da 
CIR/OABRS e grande persona na luta antirracista. Através dele, que eu entrei para a 
Comissão e me aquilombei na luta antirracista. 
Além do conhecimento adquirido, vivi novamente as consequências do racismo 
institucional, mas desta vez, muito mais forte e acompanhada dos meus colegas de comissão, 
não me deixei abater pela situação vivida. 
Me exonerei da função e me dedico exclusivamente a advocacia e maternidade, o 
que vale ressaltar aqui, pois ser mãe e advogada em tempo integral é de longe desafiador. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
14 
 
 
 
Ana Paula Moraes 
 
OAB/RS 110.155 
 
Natural de Porto Alegre, advogada, graduada em Direito pela Uniritter, 2017/2, Pós 
Graduada com especialização em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela 
FEMARGS, 2021/1. 
Tenho a lembrança de aos 06 (seis) anos de idade ao ser perguntada o que eu queria 
ser quando crescesse, responder com convicção que seria advogada. A inocência de uma 
criança não possuía ideia da dificuldade que seria para uma mulher negra e pobre conseguir 
ser uma operadora do direito. 
O tempo passou e o sonho de criança ficou distante, ao completar o ensino médio 
não consegui aprovação na universidade federal e não possuía condições financeiras de 
estudar em uma instituição particular. 
Segui a vida trabalhando, depois veio à maternidade e o sonho de ser advogada ficou 
esquecido. 
No ano de 2011 realizei as provas do ENEM e para minha surpresa com a média 
alcançada consegui uma bolsa integral pelo PROUNI para cursar Direito na Uniritter. 
Os cinco anos da graduação foram de superação, por muitas vezes tive vontade de 
desistir, complicado conviver em uma sala de aula onde a única pessoa negra é você, terrível 
a sensação de achar que você está em um local que não é seu. Mas todas as vezes que pensei 
em desistir, lembrava que seria a primeira pessoa da minha família a concluir um curso 
superior e persisti em busca da realização do meu sonho de infância. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
15 
 
Sou formada há 03 anos, atuou de forma autônoma com ênfase na advocacia 
trabalhista, há mais ou menos um ano iniciei as atividades no escritório próprio juntamente 
com uma colega de faculdade. 
O começo sempre é complicado, principalmente para nós negros as dificuldades são 
sempre maiores, pois na maioria das vezes não temos familiares que já exerçam a profissão, 
não temos apadrinhamentos. 
No meu caso realizei estágio somente nos dois últimos anos do curso e muitas 
dúvidas e dificuldades são sanadas no dia a dia. 
Atualmente sou bolsista no Instituto de Acesso a Justiça (IAJ), instituto que possui 
um projeto que fornece bolsas de estudos para negros, pardos e indígenas em cursos 
preparatórios para carreiras jurídicas como magistratura, promotoria, defensoria. Este 
projeto maravilhoso já me proporcionou cursar o preparatório para magistratura do trabalho 
da FEMARGS, pois possuo a pretensão de me tornar juíza do trabalho. 
Fundamental o trabalho do IAJ na efetivação de uma ação afirmativa tão necessária, 
pois precisamos cada vez mais ocupar espaços de poder e mostrar nossa competência e 
capacidade para exercer qualquer função. 
Exerço minha profissão com muita honra e felicidade e espero que para as novas 
gerações as dificuldades em busca de uma formação acadêmica sejam menores. 
Tenho um orgulho enorme de ser mulher, negra e advogada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
16 
 
 
 
Caroline Albuquerque 
 
Me chamo Caroline Albuquerque, filha caçula da Maria Helena e irmã do Diego, 
nascida e criada em Porto Alegre. 
Minha história se mistura com a de tantos outros brasileiros, trabalhadores 
incansáveis e obstinados a encontrarem um caminho melhor, mais justo e mais igualitário. 
Aprendi a admirar a advocacia desde muito pequena, minha mãe se formou em 
Direito no final da década de 1970, depois de muito esforço. Temos uma origem 
extremamente humilde e isso, sabemos, dificulta o caminho de quem deseja progredir. 
Ainda criança a defensora já estava na minha personalidade, sempre tive um traço de 
justiça muito forte. Mas não foi tão simples assim para que eu entendesse o meu caminho, 
demorei um tempo para perceber que aquele perfil lutador já demonstrava o que viria pela 
frente. 
Mesmo com toda dificuldade, eu que fui criada por uma mulher fortíssima, acabei 
compreendendo que minha trajetória seria única e que não seria necessário que minha vida 
se desenvolvesse como a dos outros. 
Hoje posso dizer que a profissional que ingressou na graduação lá em 2010 nem de 
longe é a mesma. Me graduei em 2017 pela Uniritter, já aprovada no exame da OAB. Um 
orgulho imenso que levo comigo, pois sempre fui muito dedicada ao curso. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
17 
 
Apesar de advogar desde 2017, minha experiência é bem anterior. Ingressei na 
carreira jurídica em 2008. Essas experiênciasconstruíram a profissional que sou hoje e 
ajudaram a formar a advogada empática que me tornei. 
Com as experiências, outros horizontes e algumas pessoas especiais que cruzaram o 
meu caminho, passei a entender meu lugar no mundo e assim a ser uma entusiasta da luta 
pela igualdade. Em 2020 concluí a especialização em Direitos Difusos e Coletivos pela FMP, 
o que me propiciou mergulhar de vez no universo antidiscriminatório. 
A representatividade como mulher, não branca e humilde dentro da advocacia é o 
que me impulsiona, mas também é meu maior desafio. Com diria Angela Davis: “Eu não 
estou mais aceitando as coisas que eu não posso mudar. Eu estou mudando as coisas que 
não posso aceitar. ” 
As normas de opressão são construídas histórica e culturalmente nas relações sociais 
assimétricas e hoje não cabe mais a nenhuma mulher absorver o papel subalterno, em 
qualquer campo de sua vida. Sem perceber, acabei virando uma agente mobilizadora nas 
minhas próprias relações, virando uma referência principalmente para mulheres que 
chegavam ao meu caminho. 
Para coroar essa trajetória, em um período completamente desafiador para todos, 
recebi em 2021 - com orgulho - o convite para ingressar na Comissão da Igualdade Racial 
da OAB/RS e fui acolhedoramente recebida por todos. 
A primeira ação como membro da comissão acabou ocorrendo logo após meu 
ingresso, e acredito ser este só o começo. Tenho muita fé de que juntos podemos transformar 
os desafios que chegam e só assim, juntos, podemos vencer. 
Sigo tentando pautar minha trajetória profissional e pessoal para tornar-me um 
instrumento que objetiva a busca da justiça e da mudança de pensamento, para inspirar e 
seguir um caminho de aprendizado e crescimento para melhorar a qualidade de vida de outras 
pessoas além de contribuir para construir um outro perfil para a sociedade brasileira. 
É na ação que a gente se encontra. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
18 
 
 
 
 
 
Caroline Ribas Sérgio 
 
Meu nome é Caroline Ribas Sérgio, sou advogada, mulher e negra. Tenho 32 anos 
de idade, sou natural de Porto Alegre e hoje, a convite da Comissão de Igualdade Racial da 
OAB/RS estou compartilhando um pouco da minha história e desafios na advocacia. 
Minha história dentro do Direito, se iniciou em 2007, quando fui contemplada por 
meio do Programa Universidade para Todos -PROUNI, com uma bolsa integral para cursar 
Direito na PUCRS. Sempre estudei durante toda minha vida em escolas públicas e me 
considero até hoje uma aluna dedicada, pois gosto de estudar e desde pequena fui ensinada 
pela minha família que o crescimento pessoal e profissional é na base de muito estudo e 
dedicação. Não tenho uma família que financeiramente foi privilegiada, sendo que sempre 
meus pais, tiveram que conquistar tudo que tem hoje com base em muito trabalho. A minha 
história não foi diferente, como já dito, fui contemplada com uma bolsa integral para cursar 
Direito em 2007, sendo que se não fosse dessa forma, talvez hoje não seria advogada. Digo 
talvez, pois na época, com 17 anos de idade minha família sofria uma das piores crises 
financeiras, não tendo condições alguma de custear uma universidade privada ou um curso 
preparatório. Lembro que estudei muito em casa com livros antigos para o ENEM e dessa 
forma, obtive nota suficiente para ser beneficiada com a bolsa integral. 
Dentro da faculdade, lembro exatamente do dia que “pisei” dentro desse mundo 
novo, onde pude perceber de forma mais clara toda a diferença de classe social e racial. Por 
muitas vezes me senti “um peixe fora d’água”, ao participar de conversas com colegas de 
suas últimas viagens ao redor do mundo, bolsas de grife, carros de última geração 
presenteados pelos pais, apartamento ganho seu nenhum esforço, além de outras 
desigualdades gritantes comparadas ao meu mundo naquele momento. Ao longo do curso de 
Direito, tive a oportunidade de ir percebendo ainda mais, a escassez de pessoas negras dentro 
da Universidade. Haviam turmas de mais de 40 alunos, onde somente eu era a única aluna 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
19 
 
negra. E isso se repetiu do primeiro ao último semestre da faculdade. Porém, isso nunca me 
fez desistir ou me sentir “menor” dentro da Universidade, me fazendo me dedicar mais ainda, 
conquistas boas notas, gabaritar o trabalho de conclusão com louvor e me formar com 22 
anos de idade. O dia da formatura, considero o grande ápice da felicidade até hoje. Todo este 
filme de superação e desafios passava pela minha cabeça, mas com um sentimento lindo de 
“gratidão, eu venci! ”. 
Após a formatura então, fiz a prova da Ordem e passei logo de início, conquistando 
a minha tão sonhada vermelhinha. Na ocasião, trabalhava em um escritório de advocacia e 
assim fiquei durante 06 anos, até ter meu próprio escritório. Lembro que ao longo do curso, 
tive certeza que queria ser advogada. Nunca tive sonho de fazer concurso, nada disso. Meu 
sonho era ter meu próprio escritório e ser advogada. Contudo, não tinha experiência e nem 
condições financeiras de na época, “bancar” este sonho. Isso se tornou possível, após 
adquirir experiência nos escritórios que trabalhei, os quais somados a maturidade e 
planejamento financeiro, me fizeram concretizar meu sonho em fevereiro de 2018, onde tive 
a oportunidade de abrir meu escritório de advocacia em um lugar que considero dos meus 
sonhos aqui em Porto Alegre. 
Atualmente, tenho 03 pós-graduações, sendo duas na área de Direito de Família e 
Sucessões e a primeira, concluída em 2015 em Direito Processual Civil. Além disso, sempre 
gostei muito de escrever, o que me oportunizou ter mais de 12 artigos jurídicos escritos e 
publicados em revistas especializadas. No ano de 2019, fui convidada então a ingressar na 
área da Docência, me tornando professora em cursos de atualização do Direito, o qual se 
estendeu para um novo convite no presente ano, me tornando professora de Direitos 
Humanos em uma nova empresa. 
Em relação as dificuldades e preconceitos, estas permanecem existindo e acho difícil 
que um dia acabem. Nós negras e negros, percebemos o olhar e muitas vezes o 
descontentamento de pessoas que não suportam ver um negro em uma posição de sucesso 
ou melhor do que uma pessoa branca. É algo forte a ser dito, mas é a realidade. Vivo isso na 
pele cotidianamente e só quem sofre percebe pelo olhar, uma palavra dita, um comentário 
infeliz, um elogio disfarçado de crítica que querem nos fazer desistir e nos reduzir na 
sociedade. 
Infelizmente, ainda percebemos não só na advocacia, mas nas grandes empresas e 
bancas de advogados, a escassez de pessoas negras ocupando posições consideradas de 
sucesso. Tive a oportunidade de trabalhar em grandes bancas aqui da capital, onde não 
haviam chefes ou negros nas áreas de Coordenação. Coincidência? Até pode ser, mas na 
minha opinião é algo inerente ao preconceito da nossa sociedade. E isso vem diminuindo a 
base de muita luta, mas não o suficiente para alcançarmos a tão sonhada igualdade. 
Porém assim como teu o lado negativo, há o lado positivo, onde vejo que muitas 
pessoas se espelham na minha trajetória, se orgulham e se inspiram para seguirem seus 
caminhos, seja no Direito ou na vida. E isso que me motiva a ser uma pessoa melhor, a não 
desistir dos meus sonhos, a sempre batalhar e ser uma guerreira para alcançar tudo que 
almejo. Tudo alcançado com base na honestidade, ética e amor pelo que eu faço. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
20 
 
Eu espero que cada vez mais a minha voz e a minha imagem, sirvam como exemplo 
para motivar mais mulheres negras e a nossa raça a batalhar, buscar pela justiça, buscar pela 
conquista dos nossos espaços e que este mundo seja cada vez mais igualitário para as 
próximas gerações que estão por vir. 
Agradeço a quem realizou a esta leitura e deixo um grande abraço a todos e todas 
que fazem parte da minha história, a qual só tenho a me orgulharcada vez mais. 
Com carinho, Caroline Ribas Sérgio. 
Porto Alegre, 24 de outubro de 2021. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
21 
 
 
 
Cristiane Eveline Ferreira da Silva 
OAB/RS 88.235 
Arícia Santos (Mediação) 
 
Sou a Cristiane, mulher preta, advogada, pai, mãe, filha, avó. Jamais pensei que 
algum dia pudesse ser advogada, quando pequena pensava em ser professora. 
Minha mãe era empregada doméstica, até que, quando eu fiz 11 anos, ela passou num 
concurso da prefeitura, para trabalhar de copeira, e, depois de mais alguns anos foi para o 
DMAE, onde ficou até se aposentar. Não teve infância, veio de Uruguaiana trazida pela 
minha avó para trabalhar de babá. 
Completei meu ensino médio e logo engravidei da minha filha mais velha, Marina, 
e dois anos depois veio a Roberta, e a perspectiva de estudar cada vez mais longe. Três 
anos depois, me separei, e voltei a morar na casa dos meus pais, com as gurias, que me 
ajudaram a cuidar delas, enquanto eu trabalhava e estudava. 
Na época eu trabalhava num restaurante na cidade de Cachoeirinha, e fazia um “free 
lance” num escritório em que eu havia trabalhado quando tinha 16 anos, Costa Pereira 
Advogados, da Dra. Fáride Belkis Costa Pereira. Eu fazia relatório de processos, porque 
digitava rápido, e conseguia fazer um bom relatório, mesmo não entendendo a matéria. 
Certo dia ela me questionou do porquê eu não estudava, e ele me aconselhou a voltar aos 
estudos, e fazer direito, pois eu teria um leque de possibilidades. 
Mas, como eu disse, jamais pensei que pudesse fazer isso. 
Em 2003, passei no vestibular da Unirriter, para direito, e fazia poucas cadeiras, já 
que não tinha condições financeiras. Fui, aos trancos e barracos, fazendo duas, três cadeiras 
por semestre, até que fiquei desempregada, não mais conseguindo manter os estudos. 
Em 2005 consegui emprego em uma, período em que minha colega de trabalho na 
época, Olga, me falou que o IPA estava oferecendo bolsa de estudos, em parceria com o 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
22 
 
CECUNE – Centro Ecumênico de Cultura Negra – e então participei do processo seletivo, 
e fui aprovada. 
Com isso, começou a minha paixão e dedicação pelo direito, consegui aproveitar 
todas as disciplinas cursadas na outra faculdade, fazia todas as disciplinas possíveis e 
procurava sempre adiantar as cadeiras, e, em janeiro de 2010 eu me formei, e no, mesmo 
ano, em setembro nasceu meu filho Caio, fruto do meu segundo relacionamento. 
Neste período em trabalhava em uma outra imobiliária, na qual atuo até hoje, tendo 
passado por diversos setores, até ser advogada. Fiz especialização em Direito Imobiliário e 
Processo Civil. 
Hoje olho para trás e vejo que mudei o rumo da minha família. Minha mãe, se formou 
em Serviço Social, aos 54 anos, e minha filha mais velha cursa Enfermagem. A mais nova, 
Direito. E o caçula, quer fazer direito também. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
23 
 
 
 
Diogo Rosa Souza 
 
Minha trajetória na Advocacia 
 
Último filho dos cinco que meu Pai teve e, também, último filho dos dois de minha 
Mãe, ou seja, o caçula de um casal negro. Ela Professora de Biologia na Rede Estadual de 
Educação. Ele Fiscal Florestal do Ibama. 
Por conta deste histórico nunca houve outra opção que não fosse buscar o sucesso 
através da Educação e fora justamente o gosto pelo estudo e pela leitura que me levou a 
escolher o Direito como objetivo de estudo e ramo de trabalho. E mesmo tendo minha mãe 
a experiência de formação universitária, nunca houve facilidade no curso da Faculdade de 
Direito. Sempre o único aluno negro ou apenas com mais um irmão em sala de aula, tendo a 
escola pública como origem houveram dificuldades em diversas matérias, em especial, no 
início do curso universitário onde fragilidades do ensino médio se mostravam evidentes. 
Ainda assim, o gosto pela leitura e estudo me forçaram a vencer esses e outros 
obstáculos, mas fora quando a metade do curso de graduação chegou, com todos os colegas 
fazendo estágios em escritórios – muitos em escritórios de pais, tios e avôs – enfrentei muita 
dificuldade para conseguir meu primeiro estágio. Entrevistas foram muitas, mas para um 
jovem negro com cabelo dreadlooks num ramo como o Direito era natural as barreiras, os 
olhares e as repostas ao final de todas as entrevistas e conversas sobre vagas de estágio em 
escritórios jurídicos sempre terminado com o comum e habitual “entraremos em contato”. 
Sem desanimar tive minhas experiências profissionais em escritórios, cartórios 
públicos, repartições públicas até com experiências como voluntario junto a Defensoria 
Pública e ao final, ainda consegui ser bolsista de iniciação cientifica, oportunidade que 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
24 
 
culminou em minha pesquisa de monografia de conclusão de curso e posteriormente na 
minha primeira especialização após formado. 
Logo após a formatura, já ciente das dificuldades do mercado de trabalho para 
pessoas negras me obriguei a cortar meu cabelo após dez anos de uso com tranças no estilo 
dreadlooks, afinal, havia a necessidade de trabalhar e pagar as contas e o financiamento 
estudantil que me permitiu concluir meu curso dentro do prazo de cinco anos. Mesmo com 
cabelo cortado, terno e gravata alinhados conseguir a colocação no mercado ou mesmo um 
emprego em escritório tem sido uma batalha árdua. Contudo, meu desejo por me aprimorar 
me obrigou a buscar especialização e a partir daí a montar meu próprio escritório em parceria 
com outros colegas. 
O que não fez cessar as dúvidas, olhares e questionamentos ao ingressar de fóruns, 
tribunais, penitenciárias e demais órgãos públicos: “És advogado? ” 
Os questionamentos foram tantos que até retomei meu penteado de estudante, afinal, 
não parece fazer diferença se estou de tranças, black power ou dreadlooks sempre preciso 
me autoafirmar e deixar claro, seja por meio de minhas ações, postura, vestimentas ou, 
mesmo por meio de minhas petições de que sou um Homem Negro e Advogado. Daí a razão 
de ingressar na Comissão Especial de Igualdade Racial, para que o caminho de outros jovens 
negros não seja tão árduo, tão difícil como o meu e de tantos outros colegas foram. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
25 
 
 
 
Evelin França (Mediadora) 
Eliane Clalmes Magalhães (Convidada) 
 
A faculdade é um espaço de formação para diversos profissionais do direito, inclusive 
advogados. É na graduação que nos sãos apresentados os alicerces para exercer a advocacia. 
Naquele lugar conhecemos futuros, advogados e outros profissionais do direito, ou seja, 
aquele espaço pode ser considerado um berço. Grande parte das experiências na 
universidade são revividas durante a vida profissional. Dificuldades em ter experiências em 
estágios, bem remunerados, são substituídas por obstáculos para se colocar no mercado de 
trabalho como advogada. A cor da pele e a classe econômica são fatores que influenciam na 
trajetória do advogado, desde o berço de suas aprendizagens. É necessário combater o 
preconceito para que práticas de crueldades em razão da cor da pele sejam repudiadas em 
todas as fases da vida profissional daqueles que defendem os direitos das pessoas. 
A dificuldade de relacionamento com professores em razão da classe econômica ou 
da cor da pele influenciam no desempenho do acadêmico de direito e consequentemente na 
vida profissional de qualquer possível futuro advogado (a) preto (a). Na Universidade do 
vale do Rio do Sinos eu era uma acadêmica duplamente desfavorecida. É inegável que a cor 
retinta de minha pele foi um fator determinante para que eu não fosse selecionada em 
diversas oportunidades de estágios, durante a faculdade. Fato que me conduzia a ter que 
trabalhar no comércio varejista, deixando de vivenciar diversas experiênciasfundamentais 
para meu amplo desenvolvimento na faculdade, afetando diretamente o início de minha 
trajetória como advogada. 
 Ao longo dos anos, a falta de prática em estágios reduziu as minhas possíveis 
conexões e integrações com as redes de pessoas do meio social jurídico. Durante o período 
que frequentava o curso de direito me enxergava como uma pessoa privilegiada por ter a 
oportunidade de estudar. Talvez esse pensamento positivo e opção de deixar de ver todos os 
crimes que contra mim foram praticados, tenha sido a forma de me proteger e me fazer 
prosseguir. Naquela época, eu deixava de focar em tudo que não era positivo. Os comentários 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
26 
 
maldosos dos colegas e professores, assim como os olhares de espanto e desprezo que me 
isolavam. Foram diversos cumprimentos que se quer eram correspondidos. Diversos 
trabalhos em grupo em que eu não era inserida por meus colegas e os professores nenhuma 
atitude adotavam. Em alguns momentos fui empurrada e até humilhada na frente daqueles 
que comigo estudavam, mas meu desejo de me tornar uma bacharela em direito era maior 
que a dor que me faziam sentir. Acreditava que a prática cruel de preconceito em razão da 
cor de minha pele e classe econômica não deveria ocorrer em um espaço de formação de 
futuros advogados, juízes, defensores, promotores, delegados, entre outros muitos 
profissionais do direito. 
A ingenuidade foi minha aliada, juntamente com a vontade de me tornar uma 
bacharela em direito, pois muitas condutas maldosas eu não percebia. Eu preferia naquele 
momento acreditar que as crueldades eram para meu bem. Meu único plano sempre foi me 
concluir o meu objetivo, apesar de não ter desenvolvido prévias estratégias para enfrentar 
aquele ambiente universitário sutilmente, cruel e hostil. Eu não tinha conhecimento sobre 
os códigos culturais e a dimensão sobre a importância do engajamento com professores e 
funcionários. Não sabia como o relacionamento com os professores poderia influenciar nas 
oportunidades acadêmicas e profissionais, até mesmo como advogada. 
Professores, alunos, funcionários e algumas exceções de pessoas negras ou com uma 
baixa renda, frequentam os mesmos ambientes. A proximidade entre pessoas de classe mais 
alta ou influentes por sua vez, gera um relacionamento de forma estratégica entre pessoas 
influentes da universidade ou do meio jurídico, fato que lhes proporciona apoio e conexões 
importantes durante a graduação. E após a conclusão do curso, sobretudo por meio de 
estágios e cartas de recomendações, muitos se colocavam e ainda se inserem no mercado de 
trabalho. 
 No meu caso tive dificuldade de trabalhar em escritórios, após me tornar advogada. 
Então decidi de maneira autônoma identificar aqueles acadêmicos de direito que tinham 
dificuldades na graduação e oferecer meus serviços de apoio e consultoria. E a partir daquele 
momento passei auxiliar acadêmicos de direito a elaborarem suas pesquisas. Eu trabalhava 
e ainda trabalho como se fosse uma espécie de mentora ou coach daqueles que estão 
precisando de apoio para elaborar pesquisas acadêmicas ou trabalhos de conclusão de curso 
de direito ou preparar artigos ou ultrapassar qualquer outra dificuldade no curso de direito. 
Após me tornar uma bacharela, iniciei minha especialização em Direito Penal e 
Processo Penal no extinto IDC (Instituto de Desenvolvimento Cultural). Naquele espaço de 
aprendizagem não era nada diferente do que eu havia vivido na faculdade. Eu estava mais 
preparada para me defender, mas mesmo assim na apresentação do trabalho de conclusão do 
curso, a cor de minha pele virou a pauta dos professores. Minha pesquisa não tratava sobre 
a questão das cotas de negro no serviço público ou faculdade, mas muito tempo foi destinado 
para discutir sobre a (in) efetividade da inclusão racial nas faculdades. Os avaliadores do 
meu trabalho concluíram que os negros jamais se desenvolveriam como os não pretos na 
graduação, porque a convivência social é muito importante para aprendizagem e os pretos 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
27 
 
são excluídos. Fiquei chocada, mas ressalto que o tema do meu trabalho não era a questão 
racial. 
Atualmente, existem leis para defender os animais irracionais, nesse sentido é 
inadmissível que em pleno século XXI, advogados sejam vítimas de racismo. O preconceito 
racial é um pilar maldito que é regado como uma planta, desde a faculdade. E a sociedade 
simula que não enxerga as condutas absurdas praticadas contra as minorias, desde a 
graduação. Nas delegacias e fóruns a prática sútil de preconceito continua acontecendo, mas 
é preciso colocar nossas mãos pretas nas canetas para extirpar essas práticas criminosas. 
Advogados negros não são cães que apanham calados! Há pessoas diferentes e 
precisam de advogados com perfis diversos. É incoerente ressaltar os obstáculos econômicos 
de alguns advogados pretos para associar a falta conhecimento e futuramente lhes acusar de 
incompetentes, devido a cultura preconceituosa de acreditar que advogados pretos não são 
inteligentes. Se é crime maltratar os animais é logico que também seja crime, se manter 
inerte perante a prática de condutas que desestruturam a vida profissional daqueles que se 
propõem a defender as pessoas. Não é segredo que a ditadura do racismo está presente em 
nossa sociedade, então é necessária a fiscalização para que de fato advogadas negras, como 
eu, estejam inseridas, até mesmo em cargos com poder de decisão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
28 
 
 
 
Erli Terezinha dos Santos 
 
Natural de Santo Antônio da Patrulha, em 1969 estabeleci residência em Novo 
Hamburgo, onde até a presente data tenho a sede do escritório profissional e onde realizei a 
maioria de minhas atividades profissionais. 
Quando desembarcou em Novo Hamburgo em 1969, vinda de Santo Antonio da 
Patrulha, Erli era uma jovem recém formada no curso de professora. Era uma anônima no 
meio da multidão. Deixou para trás sua terra natural e a família e veio em busca da realização 
de um sonho. Um sonho que acalentava desde menina. Ela queria ser advogada e projetava 
seu futuro atuando no direito empresarial. A história de Erli guarda semelhança com a de 
muita gente. Gente que luta com garra e determinação, enfrenta dificuldades financeiras, 
mas não abandona seus sonhos. Erli fez de seus sonhos uma realidade e agora se lança para 
novos desafios. Sempre com disposição, ética e seriedade, princípios que norteiam sua vida 
toda. 
A vida, porém, nem sempre lhe sorriu. De origem humilde, nascida na Vila Palmeira 
teve uma infância pobre. Ainda menina, trabalhou como doméstica, foi babá e trabalhou na 
lavoura, ajudando a família que vivia de agricultura. Para garantir os estuda da menina pobre, 
seus pais já falecidos colocaram-na no colégio interno, primeiramente em Taquari e após 
outros internatos até se formar. 
Amor, atenção, carinho, fé em Deus e a confiança na capacidade de liderança da filha 
não faltaram ao pai Juvenal João dos Santos, agricultor e construtor, e a mãe Antonia 
Machado dos Santos, doceira e parteira. Foram eles, seus pais, os professores e os amigos 
que incentivaram e apoiaram Erli na busca pelos seus ideais. 
A escolha por Novo Hamburgo, cidade que a acolheu e que Erli ama como se fosse 
filha dela, esteve alicerçada não apenas no sonho, mas também num projeto que ela começa 
a escrever assim que soube que a Prefeitura do Município abriria inscrições para um 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
29 
 
concurso na rede municipal de ensino. Foi aprovada e contratada como professora e, depois, 
fez o vestibular na Unisinos, ingressando no curso de Direito. 
Formada em direito pela Unisinos em 1974, busquei aperfeiçoar minha formação 
acadêmica através da pós-graduação em Educação e Metodologia do Ensino Superior 
(Feevale); especializaçãoem Direito Tributário (IBET), Empresas Binacionais Brasil-
Argentina (Universidade Del Salvador Argentina), Regulamentação de Comércio 
Internacional para Importação e Exportação (Unisinos); GBA/Global Business 
Administration - foco em Gestão Empresarial e Estratégias de Negócios Internacionais; 
cursos de extensão universitária nas áreas cível, penal e societária, Driot Civil- Procedure 
Civile (Sorbonne-Paris). 
Nas atividades relacionadas na área social e educacional destaco: passagem pela 
Secretaria de Educação de Novo Hamburgo, como assessora técnica e jurídica; presidente 
do Conselho Municipal de Educação de NH de 1994 a 1999; membro fundador da 
Associação Bem-Estar do Menor (ASBEM); professora universitária da Feevale de 1977 a 
1987; criadora e coordenadora executiva do Programa de Advocacia Empresarial num 
Ambiente Global (PAEG), na Unisinos; assessora técnica e presidente da Fundação Gaúcha 
do Trabalho e Ação Social-FGTAS do Estado do Rio Grande do SUL - 2008/2010, bem 
como, palestrante em diversos assuntos, nas áreas sociais, educacionais e jurídicas. 
No direito, nestes últimos 25 anos, na coordenação do escritório E. Santos 
Advogados Associados minha atuação é totalmente voltada para a consultoria e assessoria 
jurídica empresarial, atendendo empresas de todos os portes, especialmente na região do 
Vale dos Sinos, tendo, recentemente, estendido a atuação para o Estado de Santa Catarina, 
com escritório em Itapema. Na E. Santos Advogados Associados agreguei a minha 
experiência a de jovens profissionais com alto nível de qualificação jurídica e técnica, 
compondo uma equipe multidisciplinar de advogados, consultores e auditores, fazendo com 
que E. Santos esteja entre os escritórios de boa avaliação da região. Assessorando empresas 
na prevenção de contingências, fazemos parte do planejamento estratégico da empresa, bem 
como, se busca as soluções jurídicas cabíveis às demandas existentes, com isto, procura-se 
dar ao empresário condições dele concentrar suas energias com foco na gestão do seu 
negócio. 
O reconhecimento pela atuação da advocacia, principalmente na área empresarial, 
resultou em prêmios e distinções concedidas no decorrer da trajetória profissional, dentre as 
quais: Título Mulher de Ouro do RS - 1991/92 - Porto Alegre; Personalidade Feminina da 
Região Sul - Destaque em Direito - 1995/Florianópolis/SC; Mérito Empresarial do RS – 
2004 – Concedido pelo Programa Destaque Gaúcho; Prêmio Top Of Mind Brazil – 2006 e 
2007 – Concedido pelo INBRAP – Instituto Brasileiro de Pesquisa de Opinião Pública; 
Medalha Mérito Rio-grandense – homenagem do Governo do Estado do RS - 2010. 
As dificuldades iniciais não impediram a construção de uma carreira profissional de 
sucesso, tornando-se uma advogada voltada para as áreas empresariais e de gestão 
corporativa, complementando sua formação com estudos no Brasil e no exterior. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
30 
 
Ela nunca fez da adversidade um drama e nem da pobreza um frado pesado demais. 
Tudo isso lhe servia de estimulo para lutar por dias melhores. Construiu sua carreira com 
muita confiança e determinação e fez de sua vida um tributa a liberdade e ao trabalho. Erli é 
uma protagonista da história de sucesso. 
Advocacia, especialmente para mim, considero e a exerço como sendo ”UM 
VERDADEIRO SACERDÓCIO”. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
31 
 
 
 
Heleno Gary Rodrigues 
 
Heleno Gary Rodrigues sou eu. Oriundo de uma família de atletas, onde os pais 
sempre primaram pela educação dos filhos interligando com o esporte. Assim, junto aos 
meus três irmãos ingressamos na SOGIPA – Sociedade de Ginástica de Porto Alegre. No 
clube ingressei no atletismo; diferente de meus irmãos mais novos que escolheram o 
basquete chegando a jogar fora do estado e representando a seleção gaúcha da modalidade e 
de minha irmã que ingressou no voleibol onde ainda hoje representa a seleção brasileira se 
consagrou em 2012 campeã olímpica e vice-campeã olímpica em 2021. 
No meu primeiro ano de participação esportiva foi beneficiado com um bolsa de 
estudos no colégio metodista Americano, onde me formei no ensino fundamental e médio. 
Posteriormente, recebendo nova bolsa de estudo, agora no ensino superior me formei na 
Faculdade São Judas Tadeu no ano de 2012 em Ciências Jurídicas e Sociais. 
Já nas pistas de atletismo me consagrei campeão brasileiro e por duas vezes 
medalhistas em campeonatos sul-americanos. Encerrei minhas atividades esportivas no ano 
de 2012 quando ao me formar iniciei minhas atividades laborais. 
Assim, no mesmo ano de formatura fui convidado a fundar o escritório 
Tofani&Garay, onde atualmente atuo na área de advocacia empresarial e do trabalho, tendo 
especialização em direito desportivo pela Escola Superior da Magistratura – AJURIS e Pós 
Graduação em Direito Público. 
Hoje. Em paralelo com os afazeres do escritório ainda possuo uma empresa de Ensino 
de Esportes praticados na areia, Futevôlei e Vôlei de praia. 
Junto a Ordem dos Advogados do Rio Grande do Sul, sou membro da Comissão da 
Verdade Sobre a Escravidão Negra do Estado do Rio Grande do Sul da OAB/RS – Desde a 
sua fundação em 02 de abril 2015. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
32 
 
 
 
Karen Suélen Pereira da Silva 
 
Minha Trajetória de Orgulho 
Karen Suélen Pereira da Silva, mulher negra, antirracista, advogada previdenciarista 
e familiarista, pós-graduada em Direito da Seguridade Social. 
Sou neta de Marilene e Natália, filha de José Maria e Jacqueline, mãe da Luísa e da 
Jadeh e esposa do Mateus. Faço esta menção, pois são minha rede de apoio e inspiração, 
pessoas impares e plurais que refletem muito do que sou e do que entrego na minha vida 
pessoal e profissional. 
Sou a filha mais velha, de um casal jovem que vive uma história de amor e união há 
37 anos. Pelo lado materno tenho a referência da minha avó Marilene (in memoriam), mulher 
forte precisou criar educar três filhas solo, e viveu m prol da família até o fim da sua vida. 
Minha avó paterna casou-se jovem, assumindo dois enteados, tendo mais quatro filhos, 
perdido uma quando tinha um ano e vivendo um casamento machista, culminando no 
divórcio depois de 30 anos de casamento. 
Assim, já na minha trajetória tenho presente a questão racial, do patriarcado, do 
machismo, o que já entranham na minha personalidade por si só. 
Meus pais não possuem ensino superior, tendo meu pai estudado até a quarta série 
do ensino fundamental, já minha mãe concluiu o ensino médio. 
Eu sou a primeira neta a me formar em uma Universidade. 
Nunca repeti o ano escolar, concluindo o ensino médio com 16 anos. Após, fui 
trabalhar, mas continuava fazendo curso pré-vestibular, sendo aprovada para bolsa integral 
do Programa do Governo Federal PROUNI para o curso de Direito em 2006, aos 19 anos. 
Aos 22 anos descobri a gravidez do meu primeiro amor Luísa, fato o qual mudou 
toda minha realidade, pois além de mergulhar no mundo real da maternidade, sou mãe solo. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
33 
 
Entretanto, ela foi a minha primeira mola na vida, queria ser a melhor, lhe ofertar o “mundo” 
e suprir todas suas ausências. 
Com o amadurecimento percebi e entendi que não era o que ela precisava, e aprendo 
todos os dias mais um pouco com minhas meninas. 
Entretanto, foi o apoio incondicional dos meus pais o fator determinante para a 
conclusão do curso de Direito, bem como da aprovação 4 anos depois na OAB. 
Eles são o início, meio e fim! 
Após, trabalhei por cinco anos como advogados em um escritório de advocacia. Ao 
saber da chegada do meu segundo amor, Jadeh, decidi e percebi que era hora de fazer a 
minha advocacia, pelo menos tentar. 
No ano de 2020, passei a advogar de forma autônoma, intimista, muito em virtude da 
pandemia, aproveitando o tempo para me reciclar e posicionar a minha advocacia, 
descobrindo oque me faz feliz nela e como posso ser útil verdadeiramente. 
Assim, no ano de 2021 decidi coisas grandes, me casei, abri com uma colega meu 
escritório e estou aqui contando minha trajetória neste projeto lindo da nossa Comissão da 
Igualdade Racial da Seccional OAB/RS. 
Expresso ainda, minha gratidão ao meu esposo e amigo Mateus, o qual me apoia e 
ajuda incondicionalmente para que possa realizar meus projetos. 
Enfim, deixo a você a seguinte mensagem: tenhamos na vida doses de sensatez, 
loucura e ousadia, não sejamos submissos a crenças limitantes, lutemos pelo que cremos, 
sejamos leais com nossa ancestralidade e nunca esqueçamos de sermos gratos a Deus e quem 
nos estendeu a mão, sempre. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
34 
 
 
Leonardo Santos Franco 
 
Advogado, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, Presidente da 
CIROABRS Subseção Montenegro. 
 
Minha trajetória dentro do mundo do Direito, música e luta antirracista se misturam 
ao longo dos meus 32 anos. 
Embora com várias indecisões ao longo da Faculdade, minha caminhada no Direito 
começou desde muito novo, mais precisamente quando eu tinha em torno de cinco anos de 
idade, quando defendi minha irmã mais nova no casamento da minha dinda em que queriam 
barrá-la por algum motivo formal. Da mesma forma, nos tempos de escola, quando era eu 
quem defendia a turma quando nos metíamos em confusão. Enfim, um defensor de causas 
juvenis. 
Na escola foi onde tive os primeiros contatos com a música e quando decidi que 
queria aprender a tocar violão para montar uma banda. Aos 14 anos fiz aula de violão e teoria 
musical, algo que expandiu meus horizontes e se tornou a minha paixão. 
Também na adolescência, embora o meio em que eu vivia era majoritariamente 
branco, foi onde a luta antirracista começou a despertar em mim, seja argumentando com 
amigos que tinham posturas racistas, seja assistindo filmes e músicas que abordassem o 
tema. 
Saindo da escola cursei Direito pela Unisinos, e foi aí que aprendi a gostar e 
compreender todas as nuances do universo jurídico. Meu avô já era advogado, então eu tinha 
a quem puxar, porém, não foi amor à primeira vista, pois quando entrei na Faculdade eu 
ainda não sabia bem o que queria fazer, então escolhi aquilo que me circundou a vida inteira, 
que foi o Direito. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
35 
 
Lembro que não foi nada fácil para meus pais conseguirem pagar o curso de Direito, 
visto que, além de mim, havia meu irmão cursando Comércio Exterior, e posteriormente 
minha irmã cursando Nutrição. Então, toda educação que tive, dentro e fora de casa, devo a 
eles. A bem da verdade devo tudo a eles, pois tudo que tinha eram eles que me davam. 
Durante a faculdade comecei estagiando em um escritório de advocacia em 
Montenegro/RS, depois na Receita Estadual, vindo então, em 2011, a estagiar no escritório 
em que hoje sou sócio. 
Em julho/2013 fui aprovado no Exame da Ordem e em janeiro/2014 me formei no 
curso de Direito na Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, e desde então atuo 
como advogado na Ferreira & Franco Sociedade de Advogados. Em julho/2018 concluí 
minha pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho pelo IMED. 
Foi através da advocacia que pude me deparar mais de perto com as desigualdades 
sociais, com o desespero das pessoas que contribuíram por uma vida inteira e que no 
momento em que necessitam o amparo do governo, este não olha para elas. 
Foi através da advocacia que me deparei com atitudes racistas de colegas, o que me 
fez abrir os olhos, renovando toda a luta antirracista que havia despertado em mim quando 
mais jovem. E, a partir daí, foi quando decidi, através de uma conversa com o Presidente da 
CUFA de Montenegro, criar a Comissão Especial de Igualdade Racial da OABRS Subseção 
Montenegro, e me tornar Presidente da CIROABRS Subseção Montenegro. 
Através do envolvimento com a CIR, a advocacia e o Direito começaram a ter um 
novo sentido para mim, pois pude aliar a luta antirracista com a profissão que escolhi seguir. 
Desde então idealizei, junto com a Presidente da CIROABRS, Karla Meura, o projeto 
CIR Cultural, fui mediador da mesa que tratou acerca das Cotas Raciais no Sistema OAB no 
3º Seminário Internacional pela Igualdade Racial e estou engajado na criação do Conselho 
dos Direitos dos Povos Negros na Prefeitura de Montenegro, RS. 
Enfim, sou grato a tudo e todos que estão comigo nessa caminhada, ficando apenas 
com o coração apertado pelo fato do meu pai não estar vendo fisicamente as minhas 
conquistas, no entanto, tendo a certeza de que ele sempre estará olhando por mim. 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
36 
 
 
 
 
 
 
 
 
Letícia Marques Padilha 
 
Meu nome é Letícia Marques Padilha, sou advogada negra, mestra em Direito pela 
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, secretária geral adjunta 
da Comissão da Igualdade Racial OABRS, membra da Comissão da Verdade Sobre a 
Escravidão Negra OABRS, membra da Comissão da Igualdade Racial da Associação 
Brasileira de Advogados, integrante do Movimento Negro Unificado e do Cômite Estadual 
Contra a Tortura/RS. 
Importante expor o meu currículo para que compreendam o meu lugar de fala. Visto 
que eu, Letícia, sou filha de um militar da reserva do Exército Brasileiro, Luiz Carlos R. 
Padilha, e de uma professora de matemática, Heloisa Helena M. Padilha, neta de uma mulher 
negra doméstica e de uma mulher branca do lar, e de dois homens, um branco e outro negro, 
ambos militares do Exército Brasileiro. 
Minha vida certamente é bem diferente da grande maioria da população negra, visto 
que meu pai, homem negro, muito cedo percebeu que através do estudo poderia ter uma vida 
melhor. Filho de uma mãe analfabeta e de um pai que viajava muito a trabalho. Mas que 
apesar da mãe ser analfabeta ela tinha consciência de que através do estudo seria a forma de 
uma haveria a oportunidade de uma vida melhor, então sempre incentivou os filhos nos 
estudos. Assim meu pai traçou desde cedo o caminho que desejava seguir, ainda criança 
decidiu fazer o concurso de admissão do Colégio Militar de Porto Alegre/RS, foi aprovado 
e decidiu seguir a carreira militar como oficial do Exército. O caminho não foi fácil, mas 
seguiu rumo à Academia Militar das Agulhas Negras (Resende/RJ) e de lá saiu aspirante no 
ano de 1977. Em 1978 casou-se com minha mãe e, em 1980 eu nasci, e posteriormente em 
1982 nasceu minha irmã Liziane. 
Meus pais concluíram o ensino superior após terem constituído família, meu pai 
formou-se em Direito e minha mãe em Matemática. Recordo-me que meus pais estudavam 
durante à noite, eu e minha irmã tínhamos entre 9 e 7 anos de idade, morávamos na cidade 
do Rio de Janeiro, longe da família (residia no Rio Grande do Sul), ficávamos as noites de 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
37 
 
segunda a sexta-feira sozinhas em casa para que nossos pais pudessem estudar e concluir a 
faculdade. E assim, meus pais conseguiram alcançar o tão sonhado diploma na universidade. 
Repiso que minha trajetória foi muito diferente da maioria das pessoas negras, visto 
que nunca tive que preocupar-me se haveria comida na mesa, se haveria uma casa quentinha, 
se eu teria uma escola etc. Meu pai sempre dizia que a minha preocupação e da minha irmã 
deveria ser apenas com os estudos, e assim cresci, preocupando-me somente em estudar. 
Estudei em escolas particulares e no colégio militar, local em que me formei no primeiro e 
segundo graus. Aos 19 anos ingressei na universidade e com 25 anos me graduei-me na 
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. 
Tive oportunidade de conhecer e morar em outros estados do Brasil e países. Tudo 
isso como consequência dos esforços e das conquistas dos meus pais, mas não gosto de falar 
no mérito pessoal deles, até porque não me sinto bem utilizando a palavra meritocracia. 
Precisamosfalar é da realidade da maioria da população negra brasileira, é com esses 
indivíduos que temos que nos preocupar, visto que são as maiores vítimas da violência diária 
decorrentes do racismo. Não que o racismo não ocupe todos os lugares, pois ele existe 
independe da classe social, mas são as pessoas negras menos favorecidas social e 
economicamente que são as grandes vítimas de violência somente pela cor de sua pele. A 
cor da pele chega antes do que qualquer coisa. 
Eu Letícia, na maioria das vezes era a única negra ocupando os espaços, inclusive 
meu primeiro trabalho como profissional depois de formada em Direito foi trabalhar como 
assessora de desembargador no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Iniciei ocupado o 
cargo de secretária e logo em seguida fui promovida à assessora de desembargador. 
Incomodava-me o fato de ser uma das únicas negras a trabalhar num prédio que contava com 
145 (cento e quarenta e cinco) desembargadores, e cada uma tinha 1 (um) secretário e 2 
(dois) ou 3 (três) assessores. Todavia, eu não conseguia expressar o que me deixava 
desconfortável. 
 Com o passar dos anos e com a maturidade percebi efetivamente o que me 
incomodava: o racismo, a história de sofrimento, de violência da população negra, da minha 
gente, do meu povo. Então comecei a estudar fervorosamente a causa negra. Notei que tanto 
no colégio, como na universidade essa pauta foi esquecida, negada. E depois de uma boa 
caminhada nas questões raciais percebi o quanto nos foi tirado, ocultado e negado. E hoje, 
sigo meus estudos acerca do racismo e das práticas antirracistas, lutando diariamente e 
incansavelmente pela causa negra. Dentro da OABRS pude me descobrir como advogada 
negra e questionadora das pautas raciais. Desejo igualdade de oportunidades para 
comunidade negra na sociedade brasileira. Desejo um mundo mais igual para todos 
independente da cor da pele. Desejo deixar o caminho mais leve, menos árduo para os que 
vierem depois de mim, assim como meus ancestrais fizeram. 
Enfim, essa foi a minha trajetória, essa é a minha história que divido com vocês e 
com o sonho de ainda ver o Estado brasileiro se retratar publicamente, como forma de 
reparação, pelo período escravista que perdurou por aproximadamente 400 (quatrocentos) 
anos, e que até hoje vivemos os resquícios daquele período. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
38 
 
 
Letícia da Rosa dos Santos 
 
Minha trajetória 
Me chamo Letícia da Rosa dos Santos, tenho 36 anos, sou a filha mais velha da D. 
Elete Terezinha Dorneles da Rosa, mulher negra, que desde pequena começou como 
doméstica e após trabalhar nas mais diversas atividades, nas quais, muitas vezes, por ser uma 
mulher negra, não havia diferenciação no manuseio com cargas e trabalhos braçais. Desde 
cedo aprendi que ser mulher não significa ser frágil, muito pelo contrário: sem nós mulheres 
não existe futuro, não existe progresso. Por que me atrevo a dizer isso? Porque minha mãe 
(embora eu tenha pai vivo e me relacione com ele até hoje) foi responsável por tudo que me 
tornei e me ensinou a não depender de ninguém, principalmente, financeiramente. 
Cresci em Guaíba, uma cidade vizinha de Porto Alegre/RS, no bairro Santa Rita, que 
faz divisa com um outro bairro chamado Cohab. Cresci com a falsa ilusão que a Santa Rita 
sempre era melhor e via as pessoas se ofenderem quando diziam que era tudo uma coisa só. 
Nunca entendia o porquê daquilo. 
Cursei todo o ensino fundamental na mesma escola, numa escola pública municipal, 
no mesmo bairro, e me recordo que na 5ª série uma professora de matemática resolveu fazer 
algo diferente e questionou a todos o que queriam ser quando crescessem. Para mim, o 
Direito sempre foi meu objetivo, acho que sequer sabia ler direito, mas ele já estava lá, 
intrínseco. Me lembro bem desse dia na aula, pois não me recordo de ter sido questionada 
por ninguém mais além daquela professora, tanto o é que os próprios coleguinhas surpresos 
com o meu sonho atrevido deram risada. Lembro disto até hoje e agradeço a ela 
imensamente, pois não fosse ela, poderia não ter passado de um pensamento vago. 
O ensino médio também foi cursado em escola pública e, por falta de informação, 
experiência ou mais interesse da minha parte, somente na metade do curso é que tomei 
conhecimento da necessidade de cursar o vestibular para poder conseguir uma vaga no 
ensino superior. Pense no meu desespero?! Embora minha bagagem no ensino fundamental 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
39 
 
até pudesse ser boa, o ensino médio deixou muito a desejar e, na adolescência, sem alguém 
que nos estimule, perdemos excelentes oportunidades e eu, por sequer saber deixei de me 
dedicar como deveria, de olho no meu objetivo. Contudo, eu tinha um sonho: arremanguei 
as mangas, enfrentei meus monstros, virei noites, finais de semana e não passei de primeira, 
nem na segunda. 
Na minha família cresci sem estímulo ao debate racial, muito pelo contrário, cresci 
aprendendo a cultivar, dentro da própria família piadas e comentários racistas, além de ser 
“adestrada” a não ocupar certos lugares, pois “ali não era para vocês: pobres e pretos” (ouvi 
isso de um parente!). 
Cansei, desisti e fui fazer um curso técnico, na expectativa de com isso ter condições 
de pagar a faculdade algum dia. Fiz uma prova pleiteando uma vaga para secretariado na 
antiga Escola Técnica da UFRGS e, para minha sorte fui uma das primeiras colocadas. 
Bingo! 
Os meses seguintes, dentro da escola técnica serviram na verdade como uma revisão 
e, autoafirmação, pois ao longo do ensino médio fui desestimulada, desenganada a dar 
continuidade nos meus sonhos, mas dentro do novo curso, encontrei professores formidáveis 
que souberam me motivar e voltar a acreditar que eu sabia bem mais do que imaginava, tanto 
é que foi graças a essas mestras e mestres que muito contribuíram, ainda que sem saber, para 
que eu pudesse com tranquilidade seguir meus estudos para o Enem. Foi bem difícil, 
cansativo, como sempre. No dia da prova não queria ir, mas minha mãe insistiu. Acabei 
fazendo a prova, muito mais para não desapontá-la. Semanas depois saiu o resultado: 
Consegui uma boa colocação e consegui uma bolsa integral. Ainda cética quanto as 
consequências, encaminhei os documentos, dando continuidade no processo, apresentando 
os documentos. Sempre incrédula que aquilo estava de fato acontecendo, até que começaram 
as aulas. 
Pensei que as coisas mudariam, seriam mais fáceis: quem dera! Iniciei, em março de 
2007, meus estudos na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Cursava a 
graduação à tarde, fazia um estágio pela manhã e ainda dando continuidade ao curso técnico 
à noite, chegava em casa sempre muito tarde e saia muito cedo. Em seguida, concluído o 
curso técnico, pude trocar o turno da faculdade para à noite e, assim, pleitear estágios na área 
jurídica. Logo surgiram oportunidades. Em 2012 recebi meu diploma e, em 2014, após me 
tornei advogada. 
Pouca coisa mudou, mas com o tempo, pescando uma experiência daqui outra dali e, 
por sempre ter sido uma mente inquieta, me percebi sozinha, conseguiria dar andamento nos 
meus planos, nos meus sonhos. Claro que precisava de ajuda de outros, mas não precisava 
criar raízes dentro de um escritório, onde na maioria das vezes, por querer ser simpática e 
servir o café ao cliente, era destratada ou até mesmo testada quanto as minhas 
competências/conhecimento, sem falar que, por não ser negra de pele escura, para a 
branquitude eu negra jamais serei e, diante disso, os coleguinhas aproveitam a brecha para 
lançar mãos das suas piadas infames. Trabalhar com fone nos ouvidos passou a não ser mais 
uma opção, mas o único caminho para não criar atritos. 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
40 
 
O caminho nunca foi fácil e sei que ainda assim, por eu não ter a pele retinta usufrui 
de excelentes oportunidades em bons escritórios, muito embora, até meados de 2016nesses 
espaços sempre havia alguma coisa no ar que me incomodava, mas por conhecer muito 
superficialmente a pauta racial muita coisa passava despercebida ou com tom de “tudo bem, 
eu sei que você não fez por mau”. 
Em 2017, tomei conhecimento dos grupos de estudos promovido pela ESA/OAB e, 
por curiosidade, me inscrevi, participei uma vez de um grupo, mas não gostei, não me senti 
pertencente àquele espaço. 
Em 2018, vi uma oportunidade num grupo de estudos de questões raciais promovido 
pela ESA, me inscrevi e comecei a participar. Embora boa parte dos demais colegas do grupo 
demonstrarem já um grande percurso na pauta racial, vi uma oportunidade de ali aprender, 
entender, enfim, melhorar meus argumentos. Pela primeira vez me senti pertencente a um 
espaço dentro da OAB e, desde então, procuro agregar valor ao mesmo que tem contribuído 
de uma forma inimaginável na minha trajetória profissional e, por conseguinte, pessoal. Por 
consequência, acabei ingressando também na Comissão de Igualdade Racial na qual passei, 
ainda que minimamente, a contribuir na divulgação de questões raciais dentro de outras 
esferas que participo. 
Foi participando dessas coletividades que tomei conhecimento das diversas facetas 
do racismo, dentre elas, o racismo ligado à propriedade, que me perturba muito, pois eu 
cresci vivenciando essa realidade, com a pobreza e a precariedade de serviços essenciais e 
nunca entendia o porquê daquilo tudo. 
Desde então procuro sempre que posso trazer alguma contribuição, na verdade mais 
demonstrando uma inquietude minha, resolvendo alguma ânsia que sei que outros também 
padecem como eu. 
Agradeço a essa coletividade por hoje não mais me perceber sozinha na minha 
trajetória. Pude me rebelar, no melhor sentido possível e, graças a essa rede de apoio que 
descobri (em constante construção), há pouco mais de um ano decidi não mais ser ponte para 
sonhos de outros, mas dar início de fato aos meus. Tem dado certo. 
Alguns tropeços ainda surgem, mas, graças aí meu atrevimento e a minha inquietude, 
essa coletividade na qual me sinto inserida, recuar não é mais uma opção, a não ser que seja 
para pegar impulso e ir adiante. 
Sou grata aos que me abriram caminhos até chegar aqui e espero poder contribuir à 
altura para os próximos. A caminhada não é fácil, mas hoje podemos e devemos estar em 
todos os espaços, quer alguns gostem, ou não. 
Obrigada à OAB que através desta Comissão da Igualdade Racial vem oportunizando 
os debates sempre tão oportunos e tornando-nos visíveis e pertencentes não somente à esta 
Comissão, mas dentro da instituição OAB, dentro da advocacia. Seguimos! 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
41 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Liane da Silva Oliveira 
Brasileira, Advogada, natural de Porto Alegre, filha de pais negros 
 
Nasci em Porto Alegre, e, em meados do ano 1982, minha família e eu fomos instalar 
residência no município de Alvorada. Foi neste município que cresci e vivi boa parte de 
minha infância. Na minha adolescência, estudei no Colégio São Judas Tadeu, em Porto 
Alegre, época em que pude dividir com colegas de classe, os sonhos e anseios a respeito do 
ingresso em Faculdade. 
Nessa época, não havia pessoa graduada em Direito na minha família. Porém, foi 
pensando nos futuros prestígios que uma carreira jurídica poderia proporcionar, bem como 
nos desafios e estímulos que acompanhariam no decorrer do Curso da Graduação, optei pelo 
curso de Direito. 
Prestei concurso vestibular na UNISINOS, ULBRA Canoas e PUCRS. Tive 
aprovação em ambas as Universidades. Escolhi a Universidade UNISINOS que tem uma 
boa conceituação na Faculdade de Direito. Ao entrar para a faculdade, toda expectativa que 
havia sido gerada durante o processo de ingresso, da escolha do curso ao concurso vestibular, 
foi consolidada em cada disciplina cursada. O sentimento era de amor à primeira vista; de 
haver dado o passo certo; feito a escolha perfeita que combinou exatamente ao meu perfil de 
adorar leituras, de vencer obstáculos, de conhecer os meus direitos e os meus deveres. 
Dediquei-me inteiramente ao curso, buscando sempre as melhores colocações em 
notas, concluindo-o no 2º semestre do ano 2008. 
No ano 2009, para alcançar habilitação para prestar advocacia, realizei o Exame da 
OAB, tendo minha aprovação em julho daquele ano, e o recebimento de carteira em outubro 
do mesmo ano. 
Nesta época já trabalhava como funcionária pública do município de Alvorada. E, 
com o recebimento da carteira de habilitação para a advocacia, foi difícil conciliar as 
atividades. Por determinado período fiz alguns trabalhos jurídicos (processos) para amigos, 
familiares e certas indicações. E, em 2010, tive grande oportunidade de trabalhar no 
escritório de advocacia de uma colega que era, também, procuradora do município. Atuando 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
42 
 
na área trabalhista, permaneci prestando serviço no escritório por três anos, período em que 
adquiri grande experiência na área do Direito do Trabalho. 
Em 2013, fui convidada para exercer Assessoria Jurídica na Secretaria Municipal de 
Educação. Oportunidade em que pude me qualificar quanto a direitos e deveres no 
funcionalismo público, bem como na área de educação e do ECA. 
No ano de 2015, me tornei mãe, licenciando-me do trabalho tanto na Prefeitura 
Municipal, quanto na advocacia. Após o retorno da licença maternidade, fui convidada a 
gerenciar o Conselho Tutelar do Município, oportunidade em que pude me qualificar, bem 
como ganhar grande experiência nos Direitos da Criança e do Adolescente. 
No ano de 2016, dei o pontapé inicial com a abertura de escritório de advocacia, no 
município de Porto Alegre, composto por três advogadas negras. Neste escritório, fizemos 
trabalhos de assessoria jurídica comunitária em diversas Agremiações e Escolas de Samba 
de Porto Alegre e região metropolitana, atendendo gratuitamente suas comunidades. 
No ano de 2018, foi o ano de aceitar um novo desafio, qual seja, de dar início a um 
empreendimento próprio, vindo a instalar-me profissionalmente no município de Alvorada, 
cidade que dispõe de grande demanda jurídica. Desde então, venho desempenhando a 
advocacia no município, atuando nas áreas trabalhista, cível, família, previdenciário, 
comercial e bancário. 
Por fim, neste ano 2021, dei início a uma pós graduação em direito tributário, matéria 
que também fará parte do meu campo de atuação. 
Após esse breve resumo de minha trajetória, tenho que o curso de Direito oferece, 
entre outras vantagens, o prestígio de ter um vasto conhecimento daquilo que é direito e/ou 
dever. Ainda, é um curso que oportuniza seguir diversas carreiras. E, por que escolher a 
advocacia? Exercer a advocacia é cumprir com uma função que é essencial à Justiça. E 
acrescento que tem uma grande função social, pois ser advogado é, além de defender o 
direito de seu cliente, orientá-lo, dirimir qualquer dúvida, mediar conflito. Ser advogada 
requer sim muita coragem, e, esta profissão que escolhi seguir por plena identificação 
pessoal. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
43 
 
 
Luiz Carlos Marques Jr. 
 
Natural de Santa Cruz do Sul/RS, comecei minha trajetória profissional, ainda que 
não ligada ao Direito, basicamente trabalhando na indústria metalúrgica/fumageira, setor que 
é a principal economia da cidade. Vim de uma família humilde, como a grande parte da 
população brasileira, então, desde cedo percebi que o estudo seria a grande motivação para 
realizar sonhos e talvez a única saída na busca de uma vida digna e honrada. 
Sempre tive aversão às injustiças, principalmente sociais, e é nesse contexto que o 
Direito entrou na minha vida. Uma forma de ajudar as pessoas e um apoio fundamental para 
auxiliar os menos favorecidos, que ainda hoje tem dificuldades imensas, tanto no acesso, 
quanto na garantia na busca de justiça e de direitos. 
Assim, com muita luta, consegui

Continue navegando