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analise do discurso-25

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ir pra escola sob a promessa de que o saber que lá vamos adquirir nos servirá pelo resto da vida e que 
sem ele estaremos “perdidos”, incapazes de “sobreviver” na “civilização”, ou que não conseguiremos obter 
a “cidadania” e seremos como cegos por falta da “luz” dos números, das letras e dos “conhecimentos 
gerais”, e que sem isso não haveria aulas, temos que levar em consideração que este evento discursivo é 
tornado possível em um contexto ideológico. 
Outra dimensão contextual pouco óbvia, mas nem por isso menos importante, é a dimensão 
interdiscursiva. Uma aula é um discurso que se relaciona com outros discursos. Não apenas porque uma 
aula dada por um professor pressupõe uma orientação para um público ouvinte concreto, que são os 
alunos; mas também porque é preciso sempre pensar que uma aula nunca é um evento isolado: a ela se 
seguiu uma aula e a ela se seguirão outras. Pode-se pensar na aula como um exemplar de uma linhagem 
histórica de eventos discursivos semelhantes que vieram se transformando no tempo até se aproximar do 
modelo atual. Por outro lado, o que se chama aula é uma enunciação derivada de outras, talvez de um 
antigo modelo de diálogo familiar, onde um único interlocutor de um grupo tinha o poder de fala e de 
distribuição da fala, seja para permiti-la, seja para exigi-la. Podemos pensar ainda que o que o professor 
fala em sala de aula se apoia e adquire legitimidade a partir de um outro discurso, o discurso científico. É 
ele que, na nossa sociedade, produz enunciados com poder de crença suficiente para dar suporte ao 
discurso pedagógico, que o comenta e o retextualiza para disseminá-lo na instituição escolar se nutrindo 
de seu prestígio e o reforçando. 
PARADA OBRIGATÓRIA
Por fim, nessa questão do contexto interdiscursivo, vale à pena mencionar o fato de que é comum 
o professor em sua aula trazer a manifestação de outros discursos. Por exemplo, se trata de uma aula 
de literatura, certamente irão ser convocados textos literários o mais diversos, bem como textos de 
críticos literários e de biógrafos.
Merece destaque também, pelo pouco que tem sido levado em conta na história da própria Análise do 
Discurso, o que podemos chamar de contexto posicional ou posicionamento. Conforme Maingueneau e 
Charaudeau (2004),
O posicionamento corresponde à posição que um locutor ocupa em um campo de discussão, 
os valores que ele defende (consciente ou inconscientemente) e que caracterizam 
reciprocamente sua identidade social e ideológica. Esses valores podem ser organizados em 
sistemas de pensamento (doutrinas) ou podem ser simplesmente organizados em normas de 
comportamento social que são mais ou menos conscientemente adotadas pelos sujeitos 
sociais e que os caracterizam identitariamente. Pode-se falar, portanto, em posicionamento 
também para o discurso político, midiático, escolar... (p. 392)
Também a teoria literária já há muito tempo trabalha com a ideia de posicionamento. Mas trata-se de 
um conceito que pode, assim como os de gênero e ethos (cf. mais adiante), ser expandido para o conjunto 
da discursividade. Embora os posicionamentos sejam mais claramente observáveis em discursos 
estritamente institucionais como a Literatura, a Ciência e a Religião, também nos discursos não 
institucionais como a Mídia e a Pedagogia eles existem. Para prosseguir no caso anteriormente tratado, o 
da sala de aula, perceba-se que há diferentes posicionamentos em relação a que tipo de aula um 
professor deve dar. Há aqueles que pensam que uma aula deve ser não diretiva, com grande liberdade na 
relação entre os alunos e entre professor e alunos. Mas há também aqueles que julgam que uma tradição 
pedagógica deve ser mantida: o professor deve impor sua “moral” diante dos alunos, que devem se 
comportar de acordo com regras rigorosas. Cada um desses posicionamentos deve implicar até mesmo 
um ordenamento dos móveis da sala de aula e a posição física dos alunos de modos diferenciados.
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