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Fig. 49.3 - Xenopsylla cheopis - macho: A) sensilium; 6) Órgão copulador (pénis ou edeago); C) pecas bucais (palpos maxilares e maxilas); 0) atena; E) cerdas pós-antenais; F) sutura mesopleural. jejum é explicada pelo fato de a pulga permanecer imóvel (sem gastar energia) junto ao local em que emergiu da pupa, até que passe perto dela um hospedeiro descuidado. Cada refeição da pulga demora cerca de dez minutos, alimentando-se duas a três vezes por dia. A hematofagia é exercida tanto de dia como de noite, e é fundamental para a oviposição das fêmeas. Após o repasto, a pulga expele go- tículas de sangue pelo ânus, muitas vezes misturado com fezes (essas gotículas ressecadas na roupa ou nos pêlos de animais são indicativas da presença desses insetos). Interessante que o sangue ingerido pelas pulgas do hos- pedeiro normal é digerido mais depressa que o dos não- usuais. Os estímulos responsáveis para que as pulgas en- contrem seus hospedeiros são, principalmente, os visuais, os térmicos e os olfatórios. Em geral, a cópula é realizada pouco depois que os in- setos emergem dos pupários, e a Emea é que cavalga o ma- cho. Após a fecundação, a fêmea necessita de repasto sanguíneo para começar a ovipor. As fases evolutivas das pulgas são: ovo, larva I, larva 11, larva 111, pupa e adulto (Figs. 49.4 e 49.5). São, portanto, insetos que têm metamor- fose completa - holometábolos. Ordem Familias Gêneros Espécies Siphonaptera i? irritans X cheopis Pulicidae L Xenopsylla X. brasiliensis Ctenocephalides C. canis C. felis i? bohlsi Rhopalopsyllidae [polygenis i? tripus - Tungidae [Tunga 1 penetram Cada pulga, dependendo da espécie, põe parceladamen- te seis ou mais ovos, perfazendo 500 a 600 em toda a sua vida. Em temperatura de 23-26°C e umidade relativa do ar elevada, a eclosão do ovo ocorre dentro de 1-3 dias. A lar- va I11 tece um casulo em volta de si, após imobilização e es- vaziamento dos intestinos (pré-pupa) para transformar-se em pupa. O período de pupa até a libertação do adulto de- mora cerca de 5- 10 dias em temperatura de 26°C; em tempe- raturas mais baixas (1 O0C), pode chegar a 200 dias. Das oito famílias de pulgas existentes no Brasil, apenas três apresentam espécies de importância médica (Tabela 49.1). ESPÉCIES PRINCIPAIS Alguns caracteres morfológicos e biológicos que permi- tem a diferenciação das espécies de importância médica, são dados a seguir: Pulex irritans: é a pulga que mais frequentemente ata- ca o homem, embora também se alimente de outros hos- pedeiros; é cosmopolita e muito encontradiça em casas ve- lhas e cinemas. Não é boa transmissora da peste bubônica. Sua picada pode causar em pessoas mais sensíveis uma rea- ção dérmica generalizada - pulicose. E muito semelhante As duas espécies seguintes, diferenciando-se delas por: apresentar uma única cerca no occipício (parte pos- terior da cabeça) (Fig. 49.6B); mesopleura não-dividida (Fig. 49.6B); forma da espermateca, nos exemplares Emeas (Fig. 49.7A). XenopsyJla cheopis: é a pulga dos ratos domésticos e comensais. E cosmopolita e a principal espécie transmissora da peste bubônica entre roedores domésticos, podendo de- pois passar destes para os homens. X. cheopis é espécie prevalente sobre X brasiliensis, em todo o Brasil, com ex- ceção do Estado de São Paulo. As duas espécies de Xenopsylla podem ser diferenciadas entre si pela forma das espermatecas (Emeas) (Figs. 49.7B e C) e implantação das cerdas próximas a um órgão característico - "sensilium" - Fig. 49.4 - Ciclo de uma pulga: 1) f h e a grávida faz oviposiçáo no solo; 2) ovo; 3) larva; 4) larva alimenta-se de detritos orgânicos; 5) pupa (adap- tado de Brown, 1964). Capitulo 49 Fig. 49.5 - Ctenocephalides felis felis: ovos e larva de 29 estádio (aumento 133,ZX) (fotos gentilmente cedidas pelo Prof. Mário de Maria). (machos). A X. cheopis apresenta as seguintes caracterís- - ticas que a diferenciam da I? irritans: apresenta duas fileiras divergentes de cerdas no occipicio (parte posterior da cabeça), cujos pontos de inserção formam a figura de um V (Fig. 49.6C); mesopleura dividida por uma sutura (Figs. 49.3F e 49.E); morfologia das espermatecas (fêmeas) (Fig. 49.7). Ctenocephalides felis e Ctenocephalides canis. São as pulgas de carnívoros, e frequentemente podem ser encon- tradas parasitando indiferentemente, cães e gatos. Apresen- tam dois ctenídios evidentes: genal e pronotal. Em certas regiões do Brasil, C. felis é a principal espécie de pulga que parasita cães. Arnbas espécies podem, não raro, picar o ho- mem. Em algumas regiões do mundo, C. felis é também a pulga mais encontrada no interior de certas habitações. A diferenciação entre as duas espécies pode ser feita pelo ctenídio genal: o primeiro dente é bem menor que o segun- do, em fêmeas de C. canis, e um pouco menor que o segun- do, em Emeas de C. felis. Todavia, as diferenças mais no- táveis entre as duas espécies são proporcionadas pela quetotaxia do metepistemo (metapleura) e da tíbia posterior (Fig. 49.8). Das quatro subespécies de C. felis existentes no mundo, apenas uma ocorre no Brasil: C. felis felis. Polygenis spp. São as pulgas de roedores silvestres, mantenedoras da peste silvestre nas Américas. Quase 50% das pulgas existentes no Brasil pertencem ao gênero Polygenis. As espécies mais frequentes na zona de peste endêmica do Brasil, isto é, região Nordeste e parte da Sudes- te, são l? bohlsi e l? tripus. As várias espécies de Polygenis podem ser diagnosticadas pela morfologia das genitálias; Fig. 49.6 - A) Ctenocephalides sp; 6) Pulex irritans (com apenas uma porém, todas apresentam em 'Ornum as seguintes cerda no occipício); C) Xenopsylla cheopis (com cerdas no occipício forman- características que as diferenciam das demais de do um V); e) espessamente da mesopleura; D) macho de Ctenocephalides pulgas ~itadas neste trabalho (sobretudo as desprovidas de sp: a, pênis ou edeago; E) fêmea de Ctenocephalides sp; b, espermateca. ctenídios): Capitulo 49 Associação de Escolas Reunidas - ASSER - Leonel Carimbo três fileiras de cerdas no occipício; duas fileiras de cerdas no abdome; pênis ou edeago bastante característico pelo fato de ser enrolado e exibindo várias voltas (machos); formas das e s p e ~ t e c a s (fêmeas) (Fig. 49.7F). Tunga penetrans. E o "bicho-de-pé", também chamado de "bicho-de-porco" e "bicho-de-cachorro". Apesar de am- bos os sexos serem hematófagos, apenas a fêmea é que pe- netra nos tecidos alimentando-se de líquido tissular e san- gue e se enchendo de ovos, tomando uma forma hipertro- fiada, denominada meosoma. É a menor espécie de pulga co- nhecida (lmm). Tudo indica que essa espécie é originária da América, tendo posteriormente atingido a África. Os hos- pedeiros atacados mais frequentemente são: porco, homem, cão e gato. No homem, prefere penetrar principalmente na sola plantar, calcanhar, cantos dos dedos (dos pés e mãos) e raramente no escroto, ânus e pálpebras. Quando as lesões cutâneas são numerosas, próximas entre si e localizadas na borda do calcanhar, recebem a denominação "favo de mel". Machos e fêmeas permanecem em locais secos, próximos de chiqueiros, montes de esterco e no peridomicílio (jardins, hortas). Em geral, a disseminação desta espécie é feita atra- vés de dois mecanismos principais: 1) ovos, larvas, pupas ou adultos são disseminados com o esterco oriundo de sí- tios e fazendas, comprado com a finalidade de se adubar hortas e jardins; o esterco, ao chegar no domicílio e conten- do as diversas formas da pulga, passa a ser um novo foco da mesma; 2) cães vadios (ou mesmo gatos) parasitados por fêmeas grávidas de T penetrans durante suas andanças podem disseminar ovos da pulga que, se caírem em ambiente propício, darão origem a formas adultas. Após a cópula, a fêmea procura um hospedeiro e pene- tra ativamente no local escolhido. Permanece com a cabeça e o corpo mergulhados nos tecidos, deixando parafora ape- nas a extremidade posterior que contém a abertura genital, o ânus e os estigmas respiratórios (Fig. 49.9). Em alguns dias, começa a aumentar o abdome despropositadamente: é que ele está repleto de ovos (cerca de IOO), eliminando-os como balas de canhão. Ao fim de alguns dias (15, mais ou menos), todos os ovos estão eliminados e a fêmea morre e sai ou é destruída pela reação do hospedeiro. Os ovos no chão úmido e sombreado darão origem as larvas que passam por apenas dois estágios (as demais espécies de pulgas pas- sam por três estágios larvares). As larvas dão origem às pupas e, essas, aos adultos. Cerca de 20 a 30 dias após a oviposição, já surgem os adultos. As fêmeas, ao penetrarem, provocam um prurido inten- so. Depois de grávidas, continua o prurido e, as vezes, dor. Em infestações múltiplas pode dificultar a movimentação do hospedeiro. O maior perigo da tungíase é a veiculação me- cânica de tétano (Clostridium tetani), micoses (Paracocci- dioides brasiliensis), gangrena gasosa (Clostridium perfringens). As lesões iniciais podem servir também como porta de entrada para outros agentes bactenanos. Morfologicamente, machos e Emeas não-hipertrofiadas podem ser diferenciados das demais espécies de pulgas por: apresentarem o conjunto formado pelos três segmen- tos torácicos mais curto que o primeiro segmento ab- dominal (Fig. 49.10B); 1 oop I Fig. 49.8 - Quetotaxia da tíbia posterior das espécies de Ctenocephalides: Fig. 49.7 - Espermatecas das fêmeas de algumas espbcies de pulgas: A) A) Ctenocephalides felis felis: c = uma única cerda dorsal forte, entre os enta- Pulex irritans; 8 ) Xenopsylla cheopis; C ) Xenopsylla brasiliensis; D) lhes mediano e apical; 8 ) Ctenocephalides canis: c = duas cerdas dorsais Ctenocephalides felis felis; E) Ctenocephalides canis; F) Polygenis tripus. forte,s entre os entalhes mediano e apical. (Adaptado de Hopkins 8 Rothschild, 1953; as cerdas da face externa não estão representadas.) 402 Capitulo 49 Fig. 49.9 - Tunga penetrans: A) f6mea penetrando na pele; 5 ) fbmea grá- vida, repleta de ovos. lacínias semlhadas, situadas ântero-inferiormente na cabeça (Fig. 49.10C); fêmeas não-hipertrofíadas apresentam ainda os últi- mos quatro pares de espiráculos abdominais bem de- senvolvidos; fronte com tubérculo pronunciado (Fig. 49.10B e C). Após a desinfecção local com álcool iodado, com uma agulha previamente esterilizada, fazer pequenas dilacerações na pele, circundando a turnoração. E necessário muito cuida- do para não aprofundar a agulha, o que iria provocar dor e romper a pulga. Após incisão completa da pele, retirar o bi- cho&-pé, puxando-o com os dedos polegar e indicador, que funcionam como pinça. Esta não deve ser usada, para não romper o parasito. Depois de retirado, o mesmo é colocado. no fogo ou em álcool @ara destruir os ovos); faz-se a aplicação de bacteriostático oxidante no orifício deixado (mertiolato). Em caso de parasitismo múltiplo, recomenda-se passar pomada mercurial, que matará todas as pulgas; em seguida, as mesmas serão retiradas cuidadosamente. Andar calçado e, ao trabalhar com esterco, usar luvas. Aplicação de malathion e piretróides (K-othrine) em chiquei- ros destrói o principal foco. Em caso da fonte de Tunga ser o esterco (comprado para jardinagem ou amontoado para posterior utilização), recomenda-se pulverizar inseticida (malathion ou piretróide) sobre o mesmo e em sua periferia. Para pessoas que lidam em áreas infestadas, recomenda- se a vacinação antitetânica. CONTROLE a hematofagia sobre outros animais, domésticos ou silves- tres. Conseqüentemente, o combate as pulgas deve ser efe- tuado em três diferentes níveis ou hábitats: sobre os animais domésticos parasitados, no interior das habitações infes- tadas e no ambiente peridomiciliar (quintais, lotes vagos, canis, abrigos de animais, terrenos baldios etc.). Em todos esses ambientes, o controle pode ser efetua- do através de métodos mecânicos (ou naturais) e químicos. MÉTODOS MECÂNICOS Sobre Animais Domésticos (Cães e Gatos) Catação manual do ectoparasito - após inspeção da pelagem e conseqüente reconhecimento de adultos, Fig. 49.10 - Diferenciação morfoldgica entre Pulicidae e Tungidae: A) h l e x irritans: t = tórax; I a = primeiro segmento abdominal; 5 ) Tunga penetrans: t = tdrax; I a = primeiro segmento abdominal; p = tubérculo frontal; C) Tunga penetrans: cabeça com peças bucais apresentando lacínias senilhadas. Na ordem Siphonaptera, nenhuma das espécies é exclu- siva do homem. As que dele se alimentam exercem, também Capitulo 49 ovos e fezes. O prurido incessante, acompanhado ou não de dermatite alérgica, é um meio auxiliar de diagnóstico da pulicose. O exame de fezes também pode evidenciar a infestação, uma vez que, pelo hábi- to de grooming (catação), as pulgas ingeridas por tais animais não são por eles digeridas; lavagem da pelagem - sobretudo quando realizada através de jato forte ou quando se mergulha o animal em recipiente adequado. As lavagens com óleos imo- bilizam as pulgas, retendo-as na pelagem do hos- pedeiro. o que facilita o processo de catação manual, se realizado logo em seguida; escovação ou penteação frequente - as espécies C. felis e C. canis, por apresentarem ctenídios, aderem firmemente A pelagem dos hospedeiros. O processo torna-se mais eficaz quando um pente fino (32 dentes por polegada) for utilizado posteriormente à untura da pelagem. Recomendado para animais de pêlos curtos ou médios. No Interior das Habitações Varreção cuidadosa da casa e posterior incineração da varredura - quando efetuada repetidamente (se pos- sível, diariamente), promove um controle relativo; uso de aspiradores de pó - recolhem não apenas ovos, larvas e pupas, mas, também, fezes de pulgas e outros nutrientes orgânicos necessários A alimentação das larvas; lavagem do piso dos domicílios - mais eficaz se rea- lizada com água quente e xampu que, em se tratando de carpete, limpa melhor as fibras, facilitando a pene- tração de inseticidas, caso algum destes venha a ser empregado posteriormente; lavagem frequente da "cama" do animal - represen- tada por panos, trapos, esteiras e similares que o ani- mal utiliza para dormir ou repousar. No Ambiente Peridomiciliar Varreção frequente do canil e outros abrigos, com pos- terior incineração da varredura; Fig. 49.11 - Tunga penetrans grávida (bicho-de-pé) no dedo; notar os Últi- mos segmentos abdominais exteriorizados que é a porção enegrecida no centro. impedir a veiculação de esterco e matéria orgânica para adubo; manejo da vegetação - através de poda e retirada de ervas e arbustos localizados nas proximidades das ca- sas dos animais ou ao longo de suas trilhas incluídas no percurso de rotina; manejo do solo - através da rotação e revolvimento de terra, de modo a interferir nas condições habituais de temperatura e umidade, essenciais ao desenvolvi- mento das larvas; impedir o contato ou intercâmbio do animal com ou- tros externos ao domicílio: animais vadios de mesma espécie ou itinerantes de outras espécies (roedores sinantrópicos e campestres, marsupiais etc.). Para o combate às pulgas, vários inseticidas, pertencen- tes a diferentes grupos químicos, encontram-se atualmente em uso, por todo o mundo: organoclorados, organofosfora- dos, carbamatos, produtos naturais (piretrina, rotenona) e piretróides sintéticos. Outros produtos, os reguladores de crescimento (IGRs = insect growth regulators) e os inibido- res de desenvolvimento, embora não classificados propria- mente com inseticidas, atuam com a mesma fmalidade. Nem todos os inseticidas e similares estão, todavia, disponíveis no mercado brasileiro, em face das restrições de uso, limita- ções de custo e período de testes experimentais. Organoclorados como o DDT e lindane, embora até re- centemente preconizados pela OMS para o controle de pul- gas, já estão ultrapassados, em virtude do efeitorelativo advindo da resistência adquirida e das restrições atuais de toxicidade. Os organofosforados podem ser utilizados para o con- trole de pulgas, tanto no interior dos domicílios como no ambiente peridomiciliar, destacando-se entre eles o mala- thion, o chlorpyrifos, o diazinon e o propetamphos, este úl- timo com considerável atividade residual e fotoestabilidade, sendo, portanto, o mais recomendado para aplicações extradomiciliares. Quando aplicados diretamente sobre ani- mais domésticos, a operação deve ser cuidadosa, uma vez que atuam como inibidores da enzima acetilcolinesterase. Embora disponíveis comercialmente sob várias formula- ções (talco, xampu, sabão) para tratamento de animais domésticos (coumaphos, metriphonato), o uso mais frequen- te tem sido através de coleiras impregnadas, com o inseti- cida agindo por via sistêmica em caráter preventivo: fenthion, chlorpyrifos, dichlorvos (este último, atualmente proibido nos EUA para uso direto em animais e em caráter restrito para utilização em residências). Na categoria dos carbamatos incluem-se o carbaryl (Neocid), o propoxur e o bendiocarb, os dois últimos determinando efeitos mais tóxicos, embora apresentando uma boa ação residual. Disponíveis no mercado sob a for- ma de p6 ou talco, xampu e sabão, não obstante algumas coleiras antipulgas apresentarem o propoxur como princí- pio ativo. Entre os compostos sulfurados, inclui-se o monossulfeto de tetraetiltiuram, usado sob a forma de sabão ou loção para controle exclusivo de pulgas e outros ectoparasitos em ani- mais infestados. Capitulo 49