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livro 2 1 - Teoria MDA

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GAME DESIGN
Rafael Arrivabene
Teoria MDA
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
  Descrever o conceito de dinâmica e estética na teoria MDA.
  Diferenciar as perspectivas do designer e do jogador no processo.
  Propor aplicações da teoria MDA ao desenvolvimento de jogos.
Introdução
Dependendo da maneira pela qual um jogo é considerado, certas per-
cepções serão facilitadas às custas de outras. Alguns modelos de análise 
de jogos se baseiam em teorias da linguística ou da literatura, enquanto 
outros são inspirados em análises de mídia, vindos da dramaturgia, do 
cinema e da televisão, ou mesmo das ciências da computação e enge-
nharia de software. No entanto, só recentemente a área da ludologia e dos 
estudos em game design começou a produzir suas próprias ferramentas 
teóricas de análise.
Neste capítulo, você será apresentado a um dos modelos de análise 
de jogos mais conhecidos no meio acadêmico. Além disso, conhecerá 
as novidades que ele traz para o debate sobre o fenômeno dos jogos e 
também suas vantagens para a produção de análises no ramo.
Mecânica, dinâmica e estética
O modelo de análise MDA foi proposto pelo game designer Marc LeBlanc, 
inicialmente como base para uma série de workshops ministrados na Game 
Developers Conference (GDC) de 2001 a 2004. Com a colaboração da game 
designer Robin Hunicke e do cientista da computação Robert Zubek, o mo-
delo foi publicado em artigo acadêmico de 2004 (HUNICKE; LEBLANC; 
ZUBEK, 2004). 
A sigla que dá nome ao modelo é a abreviação de mechanics, dynamics, 
aesthetics (mecânica, dinâmica, estética), que, na percepção dos autores, 
seriam três pontos de vista, ou lentes, pelos quais se pode observar os jogos. 
No nome, são similares aos quatro elementos da tétrade elementar de Schell 
(2011), que consistem em narrativa, estética, tecnologia e mecânica, mas 
possuem diferenças consideráveis, que serão tratadas nesta seção.
A intenção dos autores com o modelo era aproximar áreas como game 
design, programação de jogos, crítica de jogos e pesquisa acadêmica sobre 
jogos, ao fornecer um vocabulário e um modo de pensar que fizesse sentido 
e pudesse ser utilizado por todos. Isso ajudaria em diferentes momentos, 
como ao analisar a qualidade final de um produto para poder refinar sua 
implementação, mas também ao analisar uma implementação para refinar o 
produto final (HUNICKE; LEBLANC; ZUBEK, 2004).
Para tanto, LeBlanc (2004, documento on-line) faz uma observação inte-
ressante. Todos os jogos são “[...] jogos de computação”, e toda atividade de 
criação de jogos é, em sua essência, uma forma de programação, sejam eles 
digitais ou não, já que a atividade de computação também é originalmente 
analógica. A diferença é que nos programas voltados para a produtividade, o 
usuário apresenta seus objetivos para serem alcançados com a ajuda do apli-
cativo, enquanto nos programas voltados para o entretenimento, o aplicativo 
apresenta objetivos para serem alcançados pelo usuário.
Mesmo excluindo a necessidade da eletrônica, ao aproximarmos os dois 
conceitos, pensando jogos como programas, podemos observar uma estrutura 
projetual semelhante entre eles. Programas são construídos a partir de códigos. 
Ao serem executados, os códigos geram processos que, por sua vez, deverão 
atender aos requerimentos projetuais, ou seja, levar ao resultado desejado que, 
em última análise, motivou a criação do programa. Transpondo essa lógica 
para os jogos, podemos encará-los como programas cujo resultado desejado 
é a diversão. São programas construídos a partir de regras que, ao serem 
executadas, geram os sistemas dinâmicos do gameplay e da própria partida, 
que deve levar à diversão dos participantes. Esses três momentos são, então, 
rebatizados segundo um vocabulário típico da área de game design: mecânica, 
dinâmica e estética.
Mecânica refere-se ao nível de observação das regras e conceitos que defi-
nem o jogo como um sistema formal. A teoria MDA não descreve as tecnologias 
em que os jogos se baseiam, que são o que possibilita as mecânicas; de certa 
forma, porém, em alguns exemplos os autores mostram que consideram as 
tecnologias inclusas neste item. Assim como na tétrade elementar de Schell 
(2011), as mecânicas são conjuntos de regras bem-definidas que caracterizam 
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e fazem com que o jogo aconteça. São os blocos fundamentais do jogo, que 
sustentam boa parte da experiência. Elas devem, portanto, ser planejadas 
visando gerar processos que atinjam a diversão esperada.
Já a dinâmica engloba os comportamentos emergentes que surgem a partir 
da execução das regras. Esta é uma questão cuja importância a tétrade elementar 
têm dificuldade de explicitar. Estes comportamentos estariam incluídos dentro 
do elemento mecânica, mas ao pensarmos nesse termo somos inclinados a 
considerar mais os comportamentos que são reflexos diretos das regras, não 
naqueles indiretos, que evoluem e aparecem com o tempo. Essa relação entre 
mecânicas e dinâmicas será esmiuçada mais adiante.
Por sua vez, a estética é entendida aqui como o resultado emocional dese-
jado. Ela compreende o tipo de reações que o jogo provoca, mas também o tipo 
de investimento emocional que os jogadores fazem. Assim, considerando que 
a diversão provavelmente sempre será desejável, é preciso especificar melhor 
esse conceito em tipos de diversão. O próprio LeBlanc (2004) sugere uma 
lista aberta de oito tipos de diversão: sensação, fantasia, narrativa, desafio, 
companheirismo, descoberta, expressão e submissão. Esses e outros tipos de 
diversão podem ser provocados por um mesmo jogo. Você certamente deve 
lembrar de algum jogo que desperta tanto fantasia quanto companheirismo e 
descoberta, por exemplo. Essas combinações são então chamadas de “modelos 
estéticos”, e funcionam como um tipo de guia para o projeto de um jogo. São 
seus requisitos projetuais.
É importante notar que, assim como a tétrade elementar não cobre bem 
o aspecto dinâmico dos jogos, o significado de estética na teoria MDA não 
abrange satisfatoriamente o papel da narrativa, do áudio, dos gráficos e dos 
toques. Esses elementos são abordados apenas como “conteúdo” do jogo 
(HUNICKE; LEBLANC; ZUBEK, 2004). Não que sejam considerados desim-
portantes; pelo contrário, a MDA propõe justamente que os modelos estéticos 
orientem a atividade de game design. O problema é que a complexidade desses 
componentes estético-narrativos não fica evidente nos modelos estéticos 
baseados em diversão que são propostos pelos autores.
Ainda assim, a teoria MDA serve como uma ferramenta de análise útil 
para questões bastante relevantes ao game design, em especial a questão da 
emergência. Emergência neste caso significa a propriedade que determinados 
sistemas possuem de ter sua complexidade rapidamente incrementada a partir 
de conjuntos de objetos e regras relativamente simples (SALEN; ZIMMER-
MAN, 2012).
3Teoria MDA
Um exemplo de emergência pode ser encontrado no jogo-da-velha, um dos jogos 
mais simples que existem. Seu conjunto de objetos, atributos e ações é bem restrito, 
mas permite uma grande gama de possibilidades, ou estados de jogo. Vamos analisá-lo.
Cada jogador possui apenas uma ação com duas partes: escolher uma casa vazia e 
então marcá-la com seu símbolo. O número de casas é pequeno, apenas nove, e vai 
diminuindo. A condição de encerramento, que traça o objetivo, também é simples: 
o jogo termina assim que um símbolo for colocado de modo a completar uma linha 
ortogonal ou diagonal com outros dois símbolos iguais, dando a vitória para esse 
jogador. Caso as casas se esgotem antes disso, o jogo encerra com um empate. Mas 
apesar dessa simplicidade estrutural, o jogo pode se desenrolar em cerca de 255 mil 
maneiras diferentes!
A “lente da emergência” de Jesse Schell (2011) sugere que, para garantir as proprie-
dades emergentes no jogo, devemos considerar cinco atributos:
1. quantos verbos os jogadores têm;
2. sobre quantos objetos cada verbopode agir;
3. por quantas maneiras os objetivos podem ser alcançados;
4. quantos objetos os jogadores controlam;
5. como efeitos colaterais das ações modificam essas relações, especialmente as 
restrições existentes.
Segundo a teoria geral dos sistemas (BERTALANFFY, 2008), um sistema 
é uma construção mental que recorta a realidade a partir de uma visão de 
mundo que identifica separações entre seus componentes. Assim, um sistema 
é algo identificado por um observador como pertencente, mas separado, de 
um ambiente que o envolve por algum tipo de fronteira. Os sistemas podem 
ser fechados ou abertos para esse ambiente, realizando trocas de informações 
com ele (ALVES, 2012). Os sistemas podem ser dinâmicos, sendo então 
caracterizados como um conjunto de processos executados por seus órgãos 
ou subsistemas internos. Quando tais sistemas possuem algum subsistema 
controlador, que regula o comportamento dos demais, eles são chamados de 
sistemas cibernéticos (WIENER, 1954).
Jogos são exemplos de sistemas que possuem mecanismos de autorregulação 
e retroalimentação, o famoso feedback (HUNICKE; LEBLANC; ZUBEK, 
2004; SALEN; ZIMMERMAN, 2012). Os sistemas internos do jogo, como 
sistema de pontos, economia, inteligência artificial e outros, operam com 
informações e parâmetros repassados por outros destes sistemas.
Teoria MDA4
Isso fica bem visível nos jogos de tabuleiro do designer Matt Leacock. 
Conhecido por seus jogos cooperativos, o designer cria sistemas de relações 
entre os objetos de seus jogos que aumentam a dificuldade conforme o jogo 
avança. No jogo Forbidden Island, por exemplo, três ou quatro jogadores 
devem explorar uma ilha que afunda, em busca de recuperar quatro relíquias. 
As mecânicas do jogo compreendem um tabuleiro dinâmico, feito de ladrilhos, 
que representam locais da ilha. Eles possuem três estados: flutuando (o estado 
original e positivo), afundando (um estado intermediário, que os jogadores 
podem reverter) e afundado (fora do tabuleiro, irreversível). A posição dos 
ladrilhos é sorteada no começo do jogo. Em seguida, os estados de alguns 
deles são alterados para afundando por uma outra mecânica, que envolve um 
baralho com cartas referentes aos mesmos locais. Ao final de cada rodada, 
novas cartas desse tipo são sorteadas, alterando o estado dos locais para pior. 
Um ladrilho que já estivesse no estado afundando passaria para o estado 
afundado e sairia do tabuleiro, sem poder ser recuperado pelos jogadores, 
dificultando sua movimentação.
A engenhosidade de Leacock, no entanto, está em uma terceira mecânica, 
que determina o “nível da água”. Essa mecânica consiste em um marcador 
que determina quantas cartas de locais serão sorteadas no baralho, além de 
um evento-surpresa que faz com que o nível suba. Quando esse evento surge, 
acontece um novo sorteio dentre as cartas que já haviam sido sorteadas, fa-
zendo com que necessariamente alguns lugares sejam sorteados novamente, 
aumentando suas chances de afundarem em definitivo. À primeira vista, 
esse pode parecer um caso de feedback positivo, como veremos a seguir. Na 
verdade, porém, ele possui um contrabalanceamento natural. Como as cartas 
de aumento de nível da água são públicas e sempre que uma dessas cartas é 
sorteada ela também é descartada, há duas dinâmicas emergentes: se as cartas 
forem sorteadas logo no começo, o jogo ficará difícil, mas relativamente seguro 
mais para o final, pois não haverá surpresas; se, por outro lado, elas não saírem 
até a metade do jogo, jogadores experientes já podem prever que elas sairão 
todas muito próximas, aumentando a tensão, mas forçando-os a agir depressa.
Isso é um exemplo de dinâmica, pois envolve comportamentos do sis-
tema que surgem a partir da interação dos jogadores com as mecânicas e uns 
com os outros, ao longo da partida, ou mesmo ao longo de várias partidas. 
São os processos do sistema do jogo interagindo com outro sistema que são 
os jogadores e suas mentes, configurando o jogo como um sistema maior 
(SALEN; ZIMMERMAN, 2012). Uma tecnologia como cartas, por exemplo, 
permite que elas sejam empilhadas com uma de suas faces escondidas, o 
5Teoria MDA
que, por sua vez, permite mecânicas de embaralhar e sortear. Porém, ao 
contrário de um dado, que é um gerador de números aleatório, o sorteio de 
cartas geralmente segue uma outra razão de probabilidade, pois cada carta 
que sai altera a probabilidade das restantes serem sorteadas em seguida. Essa 
mecânica induz dinâmicas de apostas e blefe, por exemplo. Já as mecânicas 
de jogos de tiro em times geralmente envolvem spawn points, que são locais 
pré-determinados onde os jogadores reaparecem após serem abatidos. Essa 
mecânica induz a dinâmica de camping, que é a estratégia de se posicionar 
perto dos spawn points adversários para abater os jogadores assim que eles 
reaparecem, enquanto estão desprevenidos.
Essa percepção de causalidade é central para a teoria MDA. É com base 
nessas relações de causa e efeito que os autores sugerem como jogos poderiam 
ser pensados e melhorados.
Perspectivas na relação MDA
A relação causal entre mecânica, dinâmica e estética é proposta como linear, 
mas sua percepção pode seguir duas rotas diferentes. Uma é a perspectiva do 
jogador e a outra é a perspectiva do game designer. 
A perspectiva do game designer, já acostumado a planejar e criar sistemas 
e consciente dessas inter-relações e seus efeitos, costuma partir das mecânicas, 
que geram dinâmicas que produzem algum efeito estético, conforme mostra 
a Figura 1. Mas como essa perspectiva coloca a mecânica como a origem de 
tudo neste primeiro momento, é comum que game designers sejam levados a 
criar jogos com base em features (HUNICKE; LEBLANC; ZUBEK, 2004).
Figura 1. Perspectiva do game designer sobre o MDA.
Fonte: Adaptada de LeBlanc (2004).
Teoria MDA6
Ou seja, ao serem criados, alguns jogos acabam dando uma importância 
demasiada a certa funcionalidade mecânica, talvez por ser uma novidade ou 
uma tendência percebida no trabalho de outros desenvolvedores. A teoria MDA 
sugere que esse não seria um bom caminho, e que, para evitá-lo, desenvolve-
dores devem ter sempre em mente a perspectiva do jogador.
Segundo a teoria, os jogadores percebem a mesma relação de causa e efeito 
entre as camadas do jogo, mas no sentido oposto ao dos game designers, con-
forme mostra a Figura 2. Isso quer dizer que, antes de mais nada, os jogadores 
são afetados esteticamente, aos experimentarem os tipos de diversão propor-
cionados pelo jogo. Em um segundo momento, identificam essa diversão como 
proveniente das dinâmicas, conforme se acostumam com os procedimentos do 
jogo. Seria apenas em um terceiro momento (independentemente de quanto 
tempo cada momento tome, podendo ser questão de minutos) que os jogadores 
se dariam conta do papel das mecânicas subjacentes na criação das dinâmicas, 
e somente então começariam a desenvolver estratégias. Neste momento, eles 
estão aprendendo o jogo em sua complexidade estrutural.
Figura 2. Perspectiva do jogador sobre o MDA.
Fonte: Adaptada de LeBlanc (2004).
Pensando nisso, Hunicke, LeBlanc e Zubek (2004) propõem que o game 
designer faça suas criações pensando primeiramente na estética que quer 
causar. Ela deve servir como um norteador para as decisões tomadas nos 
demais níveis. Assim, não adiantaria focar em mecânicas ou dinâmicas, que 
não produzem o resultado estético esperado.
Para deixar claro, um modelo estético como os autores o descrevem seria 
uma combinação de tipos de diversão e emoções que os jogadores sentem ao 
jogarem o jogo. Mas isso ainda é bastante vago. Nos oito tipos de diversão 
propostos por LeBlanc (2004), há o item “companheirismo”, que é descrito 
como o jogo servindo como um social framework, uma plataforma para in-
7Teoria MDA
terações sociais. Porém, nos exemplos do próprio autor, aparecem modelos 
estéticos compostos por “competição”, que não é um de seus oito tipos de 
diversão, embora possa ser enquadrado dentro de companheirismo, como 
percebeposteriormente Schell (2011). Isso mostra que os modelos estéticos 
precisam ser bem definidos, melhor do que a própria teoria MDA original 
define, para poderem ser utilizados da melhor forma.
Uma vez definida essa estética desejada, os designers poderão traçar 
objetivos e perceber falhas na experiência de cada jogo. Se um jogo deveria 
promover autoexpressão, por exemplo, mas os jogadores não sentem isso, já se 
tem um objetivo claro para mudanças. Sabe-se, neste caso, que as dinâmicas 
do jogo deveriam encorajar os usuários a deixarem suas marcas individuais 
nele, mas por alguma razão isso não está acontecendo. Pensando nesse modelo 
dinâmico desejado, os criadores podem apontar de onde advém o problema. 
Por fim, ficaria também mais fácil de entender quais das mecânicas e seus 
parâmetros estariam atrapalhando essa emergência. Talvez, neste exemplo, 
falte algum sistema de customizações como forma de recompensa, que permita 
uma dinâmica de bragging, em que os jogadores podem se gabar de suas 
conquistas ostentando peças exclusivas.
Sendo assim, para tirar melhor proveito da teoria MDA, é preciso entender 
bem os fatores motivadores dos jogadores e criar situações que tirem proveito 
disso. Existem muitos fatores de diversão que não serão explicados neste 
capítulo, mas você pode se basear em alguns dos tipos de desafios descritos 
pela game designer Tracy Fullerton (FULLERTON; SWAIN; HOFFMAN, 
2008), listados a seguir:
  alcançar e superar objetivos;
  competir contra oponentes;
  expandir os limites pessoais;
  exercitar habilidades árduas;
  completar ou manter coleções;
  construir, descontruir ou destruir coisas;
  fazer escolhas interessantes.
Ao selecionar alguns tipos de diversão e desafios dessa lista, você poderá 
definir um modelo estético capaz de caracterizar o resultado ideal do seu 
jogo. Concentrando-se nessa experiência do jogador, e entendendo como 
as dinâmicas do jogo a promovem, é mais fácil para os game designers se 
decidirem pelas mecânicas de seus jogos.
Teoria MDA8
O modelo MDA na prática
Como você pode perceber, essa é uma teoria que encara a experiência do jogo 
como construída em três níveis, oferecendo um modelo de análise de jogos já 
existentes. Mas os autores também sugerem que tal modelo pode ser utilizado 
no desenvolvimento de novos jogos. Então vamos entender um pouco melhor 
como fazer isso.
Seguindo a orientação explicada anteriormente, o primeiro passo seria 
pensar em qual estética, qual sensação você deseja causar. Isso é similar à 
“lente da experiência essencial” de Schell (2011), segundo a qual as decisões 
dos game designers devem ser norteadas por uma emoção ou sensação principal 
que desejem causar com o jogo que estão desenvolvendo.
Assim, segundo a lente da experiência essencial, você pode pensar, por 
exemplo, em desenvolver um jogo cuja experiência essencial seja causar gar-
galhadas, ou empatia, ou coisas mais específicas como o sentimento conhecido 
como Wanderlust ou Fernweh, que são palavras alemãs que significam “anseio 
por viajar”, ou desejo de conhecer lugares longínquos. Tomemos esta última 
sensação como exemplo.
Podemos elaborar uma experiência mais rica e única pensando nos modelos 
estéticos baseados em diversão propostos pelos autores do MDA. Poderíamos 
associar essa experiência de desejo de viajar unicamente com a diversão da 
“descoberta”, mas, para ir além do óbvio, também vamos adicionar a diversão do 
“companheirismo”. Seria possível colocar qualquer outra, pois elas não irão se 
anular; simplesmente criarão experiências diferentes, mais ou menos comuns.
Para finalizar nosso objetivo estético, vamos adicionar um ou dois dos tipos 
de desafios propostos por Fullerton, Swain e Hoffman (2008), pois isso nos 
dará uma ideia inicial do core gameplay loop, o ciclo de ações e procedimentos 
mais comuns que o jogo pode ter. Talvez “expandir os limites pessoais” e 
“completar coleções” sejam boas adições. Poderíamos então sintetizar nosso 
modelo estético no seguinte conceito inicial: “Um jogo de descoberta e com-
panheirismo, em que os jogadores colecionam algum tipo de coisa, e devem 
ser capazes de expandir seus limites pessoais, provocando um desejo profundo 
de partir em uma viagem”.
Parece interessante, não? Clássicos como o aclamado jogo Journey ou o 
livro O Hobbit parecem ter uma premissa parecida. O protagonista precisa 
viajar, conhecer novos lugares e expandir seus horizontes, e leva a audiência 
nessa jornada. Ambos também possuem algo de companheirismo, que em O 
Hobbit se dá pelas amizades cultivadas na jornada, a começar pelos anões, 
9Teoria MDA
mas que em Journey é feita de forma brilhante, ao permitir uma cooperação 
multijogador on-line bastante restrita e sutil, que exige dos jogadores um 
esforço de entender a linguagem não verbal de companheiros reunidos ao 
acaso, que talvez só os acompanhem por breves momentos.
Este é um exemplo de uma possível dinâmica para o nosso jogo ilustrativo. 
Para planejar a dinâmica, é preciso entender que tipos de situações fazem 
tais sensações acontecerem. De preferência, devemos buscar entendê-las 
profundamente, para captar o que há de essencial nelas. Repare como Journey 
constrói a sensação de companheirismo. A princípio, você poderia pensar que 
companheirismo diz respeito a ter amigos, e que amigos são pessoas que você 
conhece de longa data, e, por isso, talvez optasse por simular essa caracte-
rística dedicando horas equipe de roteiro para criar NPCs (personagens não 
jogáveis) cativantes, que sirvam como amigos dos protagonistas. Ou talvez 
cogitasse criar um jogo necessariamente multijogador, para que os jogadores 
pudessem convidar seus amigos de verdade. Talvez nessa última opção você 
ainda pensasse em abrir chats e outras vias de comunicação para reforçar a 
interação entre eles.
Journey faz o contrário de tudo isso, mas com um resultado mais eficaz 
e tocante. Ele captura a essência da amizade ao fazer com que duas pessoas, 
que ainda não se conhecem, dividam ao acaso momentos importantes. Elas 
têm, no momento em que se cruzam, um objetivo em comum e podem ou 
não se ajudar. Uma acaba marcando a história que a outra está vivendo. A 
impossibilidade de saber mais sobre a outra pessoa ou de contar mais sobre 
si coloca ambos em certo pé de igualdade, evitando bloqueios ou receio de 
contato. Tomemos isso como inspiração.
No nosso exemplo, deveríamos procurar situações que causam a sensação 
de expandir os limites pessoais, além de buscarmos entender como elas geram 
esse efeito. Exemplos disso seriam situações em que você descobre que pode 
fazer mais do que achava que podia antes, ou em que você se arrisca a fazer 
coisas que não tinha feito ainda, ou que não tinha coragem. Devemos ainda 
pensar no que consiste a diversão de colecionar algo: é a raridade dos itens a 
serem colecionados? É sua variedade? A possibilidade de trocá-los ou exibi-
-los? A diversão da descoberta parece passar naturalmente por todas essas 
opções, mas faltaria ainda entender quais situações geram esse desejo de 
viajar, e como ele pode ser mais forte. Talvez fazendo o jogador simplesmente 
vivenciar uma viagem? Ou tornando a viagem mais rara e gerando bastante 
expectativa em cima dela? A escolha de algumas dessas opções ajudaria a 
compor um modelo de dinâmicas que completaria o conceito do jogo: “Um 
jogo de descoberta e companheirismo, em que jogadores que se conectam 
Teoria MDA10
ao acaso e esparsamente, trocam itens raros de suas coleções, adquiridos 
em suas viagens. Para consegui-los, eles devem se aventurar em expedições 
sazonais para lugares tão diferentes que os farão repensar os limites de seus 
conhecimentos”.
Agora essa descrição já dá uma ideia mais clara das decisões tomadas e 
dos processos internos da partida. Há mais de um jogador, mas só em algumas 
partes, há interação e troca de itens entre eles, há momentos de viajem, mas 
também momentos de antecipação e preparação, já que elas são sazonais, e 
há uma expansão progressiva deconhecimento. Talvez o core gameplay loop 
desse jogo consistisse em definir um local para expedição, juntar informações 
sobre ele, viajar até lá, procurar itens colecionáveis, adquirir novas informa-
ções e retornar para planejar novas expedições, com base nas informações 
que descobriu.
A terceira e última parte da primeira demão do modelo (pois é ideal que 
essas definições sejam constantemente revistas e atualizadas durante o projeto) 
seria, então, encontrar mecânicas que possam criar as dinâmicas desejadas. 
Como, por exemplo, fazer o elemento multijogador dar certo? Em Journey, não 
existem mecânicas de combate, o que facilita a aproximação cooperativa dos 
jogadores. Talvez isso também seja ideal aqui, a fim de possibilitar as trocas, 
mas não o roubo de itens. Quais seriam as mecânicas ideais para a preparação 
da viagem? Encontrar mapas e fotos dos lugares ou ler textos e diálogos sobre 
eles? Super Mario Odyssey apresenta seus mapas como folhetos turísticos, 
que trazem descrições verbais e fotos de alguns dos pontos de interesse. Quais 
seriam as mecânicas da exploração? Primeira ou terceira pessoa? Point and 
click ou movimento livre? E o que é ainda mais desafiador: como transmitir, 
através de mecânicas, a sensação de que os limites estão sendo expandidos?
Jogos de investigação, assim como os romances do mesmo tipo, apresentam 
em seu início uma situação aparentemente insolúvel. Conforme avançam, vão 
apresentando ao público informações desencontradas que permitem montar o 
quebra-cabeça. Entretanto, para que isso pareça ser uma superação pessoal, 
talvez seja importante reforçar uma sensação de limite intrínseco. Os jogos de 
programação ou resolução de problemas da Zachtronics, como o Ininifactory, 
fazem isso muito bem. Os primeiros desafios parecem bastante difíceis, pois 
você ainda não conhece bem as inter-relações e as possibilidades do sistema, 
que vão sendo apresentadas aos poucos. Porém, se depois de conhecer bem 
as mecânicas do jogo você voltar a tentar alguns dos primeiros desafios, verá 
que agora consegue resolvê-los de maneira muito mais eficiente.
Definir as mecânicas que produzem as dinâmicas, que, por sua vez, pro-
duzem a estética, sempre será uma das tarefas mais difíceis, e provavelmente 
11Teoria MDA
você não acertará de primeira. Por isso, é preciso estar atento e disposto a 
voltar a trás e recalibrar parâmetros ou redefinir completamente algumas 
mecânicas escolhidas. E, nesse sentido, vimos aqui como o modelo MDA 
ajuda a diagnosticar esses problemas.
ALVES, J. B. M. Teoria geral de sistemas: em busca da interdisciplinaridade. Florianópolis: 
Instituto Stela, 2012.
BERTALANFFY, L. V. Teoria geral de sistemas: fundamentos, desenvolvimento e aplicações. 
Petropolis: Editora Vozes, 2008.
FULLERTON, T.; SWAIN, C.; HOFFMAN, S. Game design workshop: a playcentric approach 
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HUNICKE, R.; LEBLANC, M.; ZUBEK, R. MDA: a formal approach to game design and 
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SALEN, K.; ZIMMERMAN, E. Regras do jogo: fundamentos do design de jogos. São Paulo: 
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SCHELL, J. A arte de game design: o livro original. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.
WIENER, N. Cibernética e sociedade: o uso humano de seres humanos. 4. ed. São Paulo: 
Cultrix, 1954.
Teoria MDA12

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