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1 Departamento Científico de Reumatologia (2019-2021) • Sociedade Brasileira de Pediatria Artrite idiopática juvenil subtipo sistêmico complicações. É considerada um subtipo distinto das outras categorias em relação à fisiopatolo- gia, assemelhando-se às doenças autoinflamató- rias, com níveis séricos muito elevados de IL1b, IL6, IL18 e IFN-g, principais responsáveis pela inflamação sistêmica. Os genes relacionados a citocinas e quimiocinas (PTPN22, TRAF1, STAT4 e CD25) são importantes para o controle de ati- vação de células T e as mutações do MUNC13-4 e de perforina associam-se ao desenvolvimento da síndrome de ativação macrofágica (SAM), a principal complicação na AIJ sistêmica.3 Departamento Científico de Reumatologia (gestão 2019-2021) Presidente: Clovis Artur Almeida da Silva Secretária: Maria Odete Esteves Hilário Conselho Científico: Adriana Rodrigues Fonseca, Cláudia Saad-Magalhães, Flavio Roberto Sztajnbok, Margarida de Fátima Fernandes Carvalho, Paulo Roberto Stocco Romanelli Colaboradores da Comissão de Reumatologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Reumatologia: André de Souza Cavalcanti, Claudio Arnaldo Len, Marco Felipe Castro, Maria Teresa Terreri, Marta Cristine Felix Rodrigues, Nádia Emi Aikawa, Teresa Cristina Martins Vicente Robazzi O que é a artrite idiopática juvenil subtipo sistêmico? A artrite idiopática juvenil (AIJ) é definida como artrite crônica (duração maior que 6 se- manas) que se inicia antes dos 16 anos de idade, excluindo-se outras formas de artrite crônica de causa conhecida.1,2 O subtipo sistêmico da AIJ é a categoria mais frequentemente associada a febre e inflamação de múltiplos órgãos e siste- mas, resultando em curso mais grave e risco de Documento Científico D e p a r t a m e n t o C i e n t í f i c o d e R e u m a t o l o g i a ( g e s t ã o 2 0 1 9 - 2 0 2 1 ) Nº 40, 31 de Janeiro de 2023 Artrite idiopática juvenil subtipo sistêmico 2 Qual é a incidência e predomínio de sexo entre os pacientes com AIJ sistêmica? A AIJ é a mais frequente entre as doenças reumáticas autoimunes pediátricas, com inci- dência variando de 1,6 a 23 por 100.000 e pre- valência de 3,8 a 400 por 100.000 crianças e adolescentes. A AIJ sistêmica corresponde entre 5% e 15% dos pacientes com AIJ, iniciando-se frequentemente antes dos 10 anos de idade e sem predomínio de sexo.1,4 Quais são as principais manifestações clínicas da AIJ sistêmica? A AIJ sistêmica é caracterizada por febre co- tidiana por pelo menos 2 semanas, de padrão in- termitente, com um a dois picos diários acima de 39°C, principalmente ao final da tarde ou noite, com toxemia durante o período febril e melhora rápida nos períodos afebris. Uma erupção ma- cular ou maculopapular evanescente, em tron- co e extremidades proximais, também conheci- da como exantema reumatoide, é característica desta forma da doença, coincide com a febre e pode também ser desencadeada por estímulos como banhos quentes ou exacerbações com o surgimento de dermografismo pelo ato de coçar a pele (fenômeno de Köebner). Outras manifestações extra-articulares da AIJ sistêmica incluem sinais constitucionais como anorexia, perda de peso e fadiga. Serosi- te é comum, especialmente pericardite, mani- festando-se por taquicardia, atrito pericárdico, taquipneia, dor torácica e dispneia. Complica- ções como o tamponamento pericárdico, peri- cardite constritiva, miocardite e endocardite são bastante raros. A pleurite assintomática pode ocorrer isoladamente ou associada à pericardite. Mais raramente, pode ocorrer acometimento do parênquima pulmonar, com manifestação inicial de baqueteamento digital. Nesses casos, é im- portante a investigação com tomografia compu- tadorizada de tórax. Adenomegalia generalizada e hepatoesplenomegalia ocorrem em 50% a 75% dos pacientes, especialmente nos primei- ros anos de doença. Hepatomegalia maciça pode sugerir amiloidose secundária, uma complicação da inflamação sistêmica persistente e não con- trolada.1,2,5 A artrite pode estar ausente nas fases iniciais da AIJ sistêmica e, nesses casos, o diagnóstico não pode ser considerado definitivo.1,2 Cerca de metade dos pacientes desenvolve poliartrite em até 12 meses após o início da febre. Os punhos, joelhos e tornozelos são mais comumente en- volvidos, mas a coluna cervical, quadris, articu- lações temporomandibulares e mãos também podem ser envolvidas.1,2,5 A SAM (Síndrome de Ativação Macrofágica) é a principal complicação da AIJ sistêmica, sendo considerada uma forma secundária de linfohis- tiocitosehemofagocítica associada a doenças reumáticas. A SAM é caracterizada por uma mu- dança no padrão de febre, de intermitente para persistente, exacerbação de adenomegalia e he- patoesplenomegalia e possível evolução para insuficiência hepática aguda, com rebaixamento do nível de consciência, sangramentos e icterí- cia, como manifestações de coagulopatia. As di- retrizes diagnósticas para SAM na AIJ sistêmica foram recentemente publicadas.1,6 Quais são os exames complementares úteis para o diagnóstico da AIJ sistêmica? Os exames laboratoriais na AIJ sistêmica evi- denciam processo inflamatório sistêmico exu- berante, com anemia, normalmente secundária à inflamação crônica (associada a baixo nível sérico de ferro e baixa capacidade de ligação do ferro), leucocitose com predomínio de neutrófi- los e plaquetose e elevação das provas de fase aguda, incluindo velocidade de hemossedimen- 3 Departamento Científico de Reumatologia (2019-2021) • Sociedade Brasileira de Pediatria tação (VHS) e proteína C reativa (PCR). Aumento de ferritina, fibrinogênio e desidrogenase láctica também ocorre com frequência. Na maioria dos casos, o fator reumatoide e os anticorpos anti- -nucleares (ou fator anti-núcleo) são negativos. Derrame pleural e pericárdico podem ser evi- denciados pela radiografia de tórax e ecocardio- grama, respectivamente.1,5 A SAM é caracterizada por sinais de inflama- ção sistêmica, com ferritina sérica muito eleva- da, elevação rápida dos níveis de transaminases, anemia, leucopenia, trombocitopenia, aumento dos níveis de triglicerídeos, hipoalbuminemia e VHS baixa associada a hipofibrinogenemia. Coa- gulopatia está presente, com tempo de protrom- bina e de tromboplastina parcial prolongados, podendo evoluir com coagulopatia e, nas fases mais avançadas, com coagulação intravascular disseminada. O diagnóstico é auxiliado por ní- veis muito elevados de ferritina (frequentemen- te superior a 10.000 mg/L), de receptor solúvel de IL2 (sCD25) e demonstração de macrófagos ativados ou histiócitos com eritrócitos em grânu- los fagocíticos característicos (hemofagocitose) na medula óssea, fígado e/ou baço.1,6 Como é realizado o diagnóstico da AIJ sistêmica? O diagnóstico de AIJ sistêmica pelos crité- rios de classificação da International League of Associations for Rheumatology (ILAR) requer a presença de artrite e febre cotidiana documen- tada de, no mínimo, duas semanas de duração, associada a uma das seguintes manifestações: exantema reumatoide, adenomegalia genera- lizada, hepatomegalia ou esplenomegalia ou serosite.2,5 Segundo a nova proposta de clas- sificação do PRINTO, ainda a ser validada, para AIJ sistêmica, a presença de artrite deixa de ser mandatória. AIJ sistêmica seria definida por fe- bre acompanhada por dois critérios maiores ou um critério maior e dois critérios menores. Os critérios maiores seriam (1) exantema erite- matoso evanescente (não fixo); e (2) artrite. Os critérios menores seriam (1) linfonodomegalia generalizada e/ou hepatomegalia e/ou espleno- megalia; (2) serosite; (3) artralgia com duração de 2 semanas ou mais (na ausência de artrite); e (4) leucocitose (≥ 15.000/mm3) com neutrofilia.7 Quais são os principais diagnósticos diferenciais da AIJ sistêmica? O comprometimento sistêmico pode prece- der as manifestações articulares em semanas a anos, podendo sugerir infecções virais, tais como parvovírus B19, adenovíruse rubéola, ou bacterianas (particularmente endocardite bacte- riana), neoplasias (especialmente as leucemias), doença inflamatória intestinal ou outra doença reumática, incluindo vasculites sistêmicas, lúpus eritematoso sistêmico juvenil e sarcoidose.8 As neoplasias devem ser consideradas, especial- mente na presença de dor óssea ou dor difusa em membros, predominantemente noturna e alterações no hemograma. Leishmaniose é tam- bém um importante diferencial em regiões en- dêmicas. Entre os diagnósticos diferenciais para os quadros monoarticulares, a artrite séptica deve ser considerada em uma criança ou adoles- cente com febre, dor e edema importantes. Em pacientes febris com artrite de padrão migrató- rio, a febre reumática deve ser considerada.2 As doenças auto-inflamatórias, embora raras, de- vem ser lembradas. Qual é o tratamento da AIJ sistêmica? A abordagem terapêutica deve ser multidis- ciplinar, abrangendo terapia não farmacológica com acompanhamento psicossocial, fisioterapia e terapia ocupacional para restaurar a funciona- lidade e mobilidade e eventualmente com uso de órteses para contraturas em flexão, além da terapia farmacológica.5,8,9 Artrite idiopática juvenil subtipo sistêmico 4 A abordagem farmacológica pode ser ini- ciada com um curto período de monoterapia com anti-inflamatórios não esteroides (AINE) que pode ser indicada no manejo inicial, sen- do estas medicações geralmente bem toleradas pela criança.5,8,9 Porém, corticosteroides sistê- micos devem ser iniciados precocemente em pacientes com atividade sistêmica importante e persistente, tal como a febre não responsiva, anemia, miocardite e pericardite.5,8-10 O tratamento com agentes biológicos trou- xe grande progresso para o controle da artrite e das manifestações sistêmicas relacionadas à AIJ sistêmica. Tocilizumabe (anti-IL6) é reco- mendado para pacientes com febre e elevação persistente por mais de 6 meses das provas inflamatórias, assim como pacientes que ne- cessitem glicocorticoides, Da mesma maneira, a terapia com canaquinumabe (anti-IL1) tem se demonstrado benéfica no controle de sinto- mas sistêmicos e deve ser considerada nessas situações.5,8,9 Porém, ainda não é facilmente disponível na prática diária do reumatologista pediatra no Brasil. De fato, pacientes com ati- vidade sistêmica e nas fases iniciais da doença respondem rápida e efetivamente ao bloqueio de IL6 e de IL1, mas são comumente refratários aos anti-TNF.5,8-10 Contudo, o acesso precoce à terapia biológica pode ser limitado pelo alto custo. Para pacientes com artrite ativa, metotrexa- te pode ser indicado, em conjunto com AINEs ou injeções intra-articulares de corticosteroi- des. Em pacientes com atividade articular re- fratária, deve-se iniciar terapia biológica com anti-TNF (adalimumabe, etanercepte e inflixima- be), anti-IL1 (canaquinumabe), anti-IL6 (tocilizu- mabe) ou inibidor da co-estimulação de linfóci- to T (abatacepte).5,8-10 Entretanto, metotrexate, anti-TNF e as infiltrações intra-articulares de corticosteroides parecem ser menos benéficos na forma sistêmica do que em outros subtipos de AIJ tanto para o componente sistêmico quan- to para o componente articular da doença. Em casos refratários ao tratamento com biológicos, anti-IL1 e anti-IL6, novas moléculas como os inibidores da JAK, anti-IL18 e anti-IFN-g, vem sendo utilizadas, embora ainda não aprovadas e disponíveis no nosso país. O tratamento da SAM inclui pulsoterapia com metilprednisolona (10-30 mg/Kg/dose por 1-3 dias consecutivos) seguido por dose alta de prednisolona ou prednisona (1-2 mg/Kg/dia). Na ausência de resposta rápida, deve-se adicio- nar ciclosporina. Embora a imunoglobulina intra- venosa não seja efetiva no tratamento da artrite, ela pode ser parcialmente benéfica no compo- nente sistêmico e na SAM.5,8,9 Deve-se conside- rar a terapia com etoposide em pacientes em que a doença esteja progredindo rapidamente. Recentemente, a terapia com anti-IL1 e anti-IL6 tem mostrado bons resultados para o controle da SAM em alguns pacientes.5,8-10 O tratamento medicamentoso deve ser acom- panhado de monitorização cautelosa de even- tos adversos, incluindo infecções, neoplasias, doenças desmielinizantes, citopenias, toxici- dade hepática e manifestações autoimunes. Além disso, pacientes em uso de tocilizumabe (anti-IL6) devem ser também monitorados es- pecificamente para elevação de transaminases e colesterol, neutropenia e SAM.5,8-10 Como é a evolução e o prognóstico dos pacientes com AIJ sistêmica? Após os primeiros seis meses de doença, seu curso pode apresentar variações que incluem tanto a diminuição ou ausência dos sintomas sis- têmicos, bem como evolução para comprometi- mento oligo ou poliarticular.2,5 Como na forma do adulto, a doença de Still do adulto, pode ocorrer febre prolongada precedendo a manifestação de artrite, sendo necessário acompanhamento e monitorização até que a artrite se manifeste. As taxas de remissão no subtipo sistêmico da AIJ são muito variáveis (0% a 80%), prova- velmente devido à heterogeneidade desta ca- tegoria. O reconhecimento e tratamento mais 5 Departamento Científico de Reumatologia (2019-2021) • Sociedade Brasileira de Pediatria precoce da doença têm aumentado a proporção de doença inativa e de remissão clínica. Impac- tos no crescimento e desenvolvimento têm sido relacionados com atraso de diagnóstico e trata- mento, sobretudo para pacientes com ativida- de inflamatória não controlada.8 As principais causas de óbito são: SAM, infecções e tampona- mento cardíaco. REFERÊNCIAS 07. Martini A, Ravelli A, Avcin T, et al; Pediatric Rheumatology International Trials Organization (PRINTO). Toward New Classification Criteria for Juvenile Idiopathic Arthritis: First Steps, Pediatric Rheumatology International Trials Organization International Consensus. J Rheumatol. 2019;46:190-7. 08. Miller LC, Sisson BA, Tucker LB, et al. Prolonged fevers of unknown origin in children: patterns of presentation and outcome. J Pediatr. 1996;129:419-23. 09. Consolaro A, Giancane G, Alongi A, et al; Paediatric Rheumatology International Trials Organisation. Phenotypic variability and disparities in treatment and outcomes of childhood arthritis throughout the world: an observational cohort study. 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Artrite idiopática juvenil subtipo sistêmico 6 www.sbp.com.br Diretoria Plena Triênio 2022/2024 www.sbp.com.br Anamaria Cavalcante e Silva (CE) Maria Tereza Fonseca da Costa (RJ) Ana Cristina Ribeiro Zöllner (SP) Rodrigo Aboudib Ferreira Pinto (ES) Claudio Hoineff (RJ) Sidnei Ferreira (RJ) Maria Angelica Barcellos Svaiter (RJ) Donizetti DimerGiambernardino (PR) PROGRAMA DE ATUALIZAÇÃO CONTINUADA À DISTÂNCIA Luciana Rodrigues Silva (BA) Edson Ferreira Liberal (RJ) DIRETORIA DE PUBLICAÇÕES Fábio Ancona Lopez (SP) Editores do Jornal de Pediatria (JPED) COORDENAÇÃO: Renato Soibelmann Procianoy (RS) MEMBROS: Crésio de Aragão Dantas Alves (BA) Paulo Augusto Moreira Camargos (MG) João Guilherme Bezerra Alves (PE) Marco Aurelio Palazzi Safadi (SP) Magda Lahorgue Nunes (RS) Giselia Alves Pontes da Silva (PE) Dirceu Solé (SP) Antonio Jose Ledo Alves da Cunha (RJ) EDITORES REVISTA Residência Pediátrica EDITORES CIENTÍFICOS: Clémax Couto Sant’Anna (RJ) Marilene Augusta Rocha Crispino Santos (RJ) EDITORA ADJUNTA: Márcia Garcia Alves Galvão (RJ) CONSELHO EDITORIAL EXECUTIVO: Sidnei Ferreira (RJ) EDITORES ASSOCIADOS: Danilo Blank (RS) Paulo Roberto Antonacci Carvalho (RJ) Renata Dejtiar Waksman (SP) DIRETORIA DE ENSINO E PESQUISA Angelica Maria Bicudo (SP) COORDENAÇÃO DE PESQUISA Cláudio Leone (SP) COORDENAÇÃO DE GRADUAÇÃO COORDENAÇÃO: Rosana Fiorini Puccini (SP) MEMBROS: Rosana Alves (ES) Suzy Santana Cavalcante (BA) Ana Lucia Ferreira (RJ) Silvia Wanick Sarinho (PE) Ana Cristina Ribeiro Zöllner (SP) COORDENAÇÃO DE RESIDÊNCIA E ESTÁGIOS EM PEDIATRIA COORDENAÇÃO: Ana Cristina Ribeiro Zöllner (SP) MEMBROS: Eduardo Jorge da Fonseca Lima (PE) Paulo de Jesus Hartmann Nader (RS) Victor Horácio da Costa Junior (PR) Silvio da Rocha Carvalho (RJ) Tânia Denise Resener (RS) Delia Maria de Moura Lima Herrmann (AL) Helita Regina F. 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