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Psicologia Humanista no Brasil

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Psicologia Humanista no Brasil
 
Gomes, W. B., Holanda, A. F., & Gauer, G.(2004).
Museu Virtual da Psicologia no Brasil
Porto Alegre: MuseuPSI
 
 
Psicologia Humanista no Brasil¹
Uma versão modificada deste texto foi publicada com os títulos:
Gomes, W. B., Holanda, A. F., & Gauer, G. (2004). Primórdios da
Psicologia Humanista no Brasil; e História das Abordagens
Humanistas em Psicologia no Brasil. Em Marina Massimi (Org.),
História da Psicologia no Brasil do Século XX (pp. 87-103;
105-129). São Paulo: EPU.
William Barbosa Gomes
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Adriano Furtado Holanda
Universidade de Brasília (UnB)
Gustavo Gauer
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
 
Autores e Endereços
William Barbosa Gomes é professor de epistemologia e história da
psicologia nos cursos de graduação e pós-graduação do Instituto de
Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Seu
envolvimento com as idéias humanistas teve origem nas aulas de
Lúcio Flávio Campos e Maria Auxiliadora Moura, na Universidade
Católica de Pernambuco, onde obteve o título de psicólogo, em
janeiro de 1972. Em São Paulo, estudou Psicoterapia Centrada na
Pessoa com Miguel de la Puente, na Pontifícia Universidade
Católica de Campinas, entre 1975 e 1977. Nos Estados Unidos
obteve o título de mestre com a dissertação The Communicational-
Relational System in Two Forms of Family Group Composition, sob
orientação de Goff Barrett-Lennard, um ex-orientando e importante
colaborador de Carl Rogers na Southern Illinois University -
Carbondale, em 1980. Na mesma universidade, sob orientação dos
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filósofos Emil Spees e Richard Lanigan, obteve o título de doutor,
em 1983, com a tese: Experiential Psychotherapy and Semiotic
Phenomenology: A Methodological Consideration of Eugene
Gendlin's Theory and Application of Focusing. Gomes é bolsista de
Produtividade em Pesquisa do CNPq. Seus interesses incluem temas
relacionados à fenomenologia e à história da psicologia.
Endereço: Instituto de Psicologia - UFRGS. Rua Ramiro Barcelos,
2600, 90035-003 Porto Alegre - RS. E-mail: gomesw@ufrgs.br.
Adriano Furtado Holanda, psicólogo e recém doutor em psicologia,
exercendo no momento atividades de professor substituto na
Universidade de Brasília. Holanda obteve o título de mestre, em
1993, pela Universidade de Brasília, com a dissertação Carl Rogers e
Martin Buber: Abordagem Centrada na Pessoa e Filosofia Dialógica
em Questão, sob orientação de Jorge Ribeiro Ponciano, e com bolsa
do CNPq. A dissertação foi publicada com o mesmo título pela
Lemos Editorial. O título de doutor foi obtido na Pontifícia
Universidade Católica de Campinas, em 2002, com a tese O Resgate
da Fenomenologia de Husserl e a Pesquisa em Psicologia, sob
orientação de Mauro Martins Amatuzzi e com bolsa da CAPES.
Holanda é um ativo colaborador de entidades científicas e
profissionais.
Endereço: SHIS QL / Conjunto 06 / Casa 17 / Lago Sul - 71640.065
Brasília-DF.
E-mail: aholanda@yahoo.com
Gustavo Gauer é psicólogo e mestre pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, estando no momento matriculado no curso de
doutorado em psicologia, na mesma universidade. Gauer trabalha
sob orientação de William B. Gomes deste a graduação, quando foi
bolsista de iniciação científica do CNPq. A dissertação de mestrado,
concluída em 2001, com bolsa do CNPq, foi um estudo
historiográfico sobre a Psicologia na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul: Ensino e Pesquisa Após a Reforma Universitária. Na
tese de doutorado Gauer, que é bolsista da CAPES, está tratando do
tema Memória Autobiográfica: Reflexividade e Coesão na
Expressão da Experiência Consciente. Recentemente, Gauer foi
contemplado com uma bolsa de doutorado sanduíche da CAPES,
para Duke University, EUA.
Endereço: Instituto de Psicologia - UFRGS. Rua Ramiro Barcelos,
2600, 90035-003 Porto Alegre - RS. E-mail:
gustavogauer@hotmail.com
 
A psicologia estabeleceu-se como disciplina independente elegendo
como objeto de estudo a experiência consciente. Para tanto,
substituiu a introspecção especulativa pela introspecção científica,
um método desenvolvido para o estudar o conteúdo da experiência
imediata. A psicologia da consciência, como proposta por Wilhelm
Wundt (1832-1920) e seu discípulo Edward B. Titchener
(1867-1927), não obteve o sucesso esperado, desaparecendo nas
primeiras décadas do século XX. A teoria dos conteúdos da
consciência foi sucedida pelo funcionalismo, que procurou integrar
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técnicas introspectivas com técnicas extrospectivas. No entanto, a
difusão da psicanálise e do behaviorismo deslocou o interesse,
respectivamente, para o inconsciente e para a observação direta do
comportamento. Na perspectiva psicanalítica, a consciência seria
abordada indiretamente através das explorações do inconsciente. Na
perspectiva behaviorista, o estudo da consciência não se mostrava
factível ou relevante para a Psicologia (Gomes, 1983).
Na década de 1930, duas tendências começaram a emergir na
Psicologia internacional. De um lado, a exploração científica da
experiência consciente reaparecia por influência da Psicologia
Gestáltica. Como exemplos podem ser citados: a teoria de
aprendizagem de Clark Hull (1884-1952), que introduzia o conceito
de variável interveniente ou intraorganísmica na seqüência estímulo-
resposta; a teoria cognitiva de campo ou behaviorismo intencional
de Edward C. Tolman (1886-1959), que introduzia o conceito de
mapas cognitivos; e a teoria neurofisiológica de Karl S. Lashley
(1890-1958), para quem a linguagem representava as funções
integrativas do córtex cerebral, alcançando o seu mais alto
desenvolvimento nos processos do pensamento humano. Esses
teóricos são hoje considerados como precursores do movimento
cognitivo, um movimento que ganhou força nas últimas duas
décadas do século XX (Kristensen, Almeida & Gomes, 2001).
De outro lado, o aparecimento dos estudos da personalidade, como
um esforço integrativo diante da dispersão e fragmentação das
pesquisas em processos básicos, recuperou a centralidade da
experiência consciente para a Psicologia. A tendência foi
representada pelos trabalhos de Eduard Spranger (1882-1963) e
William Stern (1871-1938) na Alemanha; e de Gordon Allport
(1897-1967), Abraham Maslow (1908-1970), Rollo May
(1909-1994), Charlotte Bühler (1893-1974), e Carl Rogers
(1902-1987) nos EUA. Esses autores, de diferentes maneiras, mas
com vários pontos convergentes, defendiam uma psicologia
compreensiva capaz de considerar o ser humano em sua
singularidade e totalidade. A repercussão destas idéias nos EUA deu
origem a uma nova orientação no campo psicológico que se tornou
conhecida como Terceira Força ou Psicologia Humanista. Em suma,
os esforços dos experimentalistas na retomada das questões
cognitivas, e dos compreensivistas na retomada das questões
fenomenais e vivenciais trouxeram de volta o lugar da consciência
na pesquisa e na prática psicológica.
Em um estudo histórico sobre as psicologias fenomenológicas,
existenciais e humanistas, Misiak e Sexton (1973) reconheceram a
dificuldade para definir a Psicologia Humanista de modo conclusivo
e satisfatório. Em primeiro lugar, pela ausência de uma teoria
humanista de Psicologia, e em segundo lugar pela própria história do
humanismo. O pensador católico Alceu Amoroso Lima (1893-1983),
ao apresentar o existencialismo para os leitores brasileiros em 1951,
distinguiu três variedades de humanismo: marxista, existencialista, e
personalista. No humanismo marxista, de inspiração hegeliana, o
homem é objeto, produto da evolução da matéria e da história da
sociedade. O humanismo existencialista, de orientação sartreana, é
um protesto contra o marxista: o homem é um projeto, vive sem
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saber de onde vem e para onde vai. Não dependendo de Deus e nem
da sociedade, é soberano e livre, em escolhas e situações (angústia,
náusea, etc.). O humanismo cristão, ou personalista, preferido por
Lima, tomaria o homem como sujeito, ápice da criação de Deus e
centro do universo, e infinito em possibilidades (Lima, 1951). Numa
perspectiva histórica e sem preferências filosóficas ou religiosas, o
termo humanismo pode ser associado a cinco grandes momentos das
idéias psicológicas, podendo ser denominados de humanismo
clássico, humanismo romântico, humanismo individual, humanismo
social, e humanismo crítico.
O humanismo ideal ou clássico foi um movimento ou uma corrente
de pensamento associada ao início da idade moderna e ao fim do
dogmatismo medieval. Caracterizou-se pela defesa da
individualidade, da singularidade, e da expressividade irrestrita. O
humanismo clássico estimulou a busca por liberdade e
independência, despertou a curiosidade por novos conhecimentos, e
sistematizou métodos de pesquisa para a confirmação da verdade.
Ele esteve na gênese das transformações políticas e econômicas que
mudaram a face do mundo europeu. Seu correlato político e social
foi o liberalismo.
O humanismo romântico foi um movimento filosófico, jurídico,
político, econômico e artístico que se caracterizou pela defesa da
expressão plena dos sentimentos, pela afirmação irrestrita da
liberdade, e pela defesa da individualidade. Neste humanismo, o
pensamento humano não era entendido nem como produto da
natureza nem da razão. Era entendido como elaboração livre e
poética da imaginação, movido por determinações irracionais. Para o
humanismo romântico, o primado da intuição e do sentimento está à
frente da razão e da análise. Neste sentido, o irracional atrai mais
que o racional, o imprevisível mais que o previsível, o multiforme
mais que o uniforme, o trágico mais que o cômico, o oculto mais que
o presente, o implícito mais que o explícito, o sublime mais que o
belo, e o interno mais que o externo. Nesta concepção, a
mentalidade era uma injunção de forças históricas. O movimento
alcançou seu auge entre os anos de 1780 e 1830, e seu correlato
político foi a revolução francesa.
O humanismo individual recupera valores como independência,
hedonismo, dissidência, tolerância, permissividade, e
auto-expressão. Esses valores aparecem claramente na teoria de
Maslow (1968), ao defender o valor da pessoa não pela sua
produção mas pelo seu potencial. Emergem ainda na teoria de
Rogers (1961/1970) ao defender a confiança irrestrita na pessoa; e
também na oração da Gestalt (Royce & Mos, 1981), ao recomendar
que cada um cuide de sua vida e não da vida do outro e que cada um
viva para sua expectativa e não para a expectativa do outro. A regra
estava na ação movida pelo "aqui e agora". O humanismo individual
alcançou seu auge na década de 1960, acarretando mudanças sociais
e políticas no sentido da liberdade e da igualdade. Nas escolas, as
mudanças reduziram a autoridade dos professores e incrementaram a
liberdade de expressão e da convivência social. Na psicologia, o
movimento deu grande acolhida a propostas de terapias de grupo
que subvertiam valores tradicionais - a boa educação se deixa em
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casa - e liberavam a expressão e o toque corporal. Na política, o
humanismo individual defendeu a democracia e deu voz às minorias.
Na economia, o humanismo individual, embora implícito nos
movimentos da contra-cultura, é uma conseqüência dos ciclos de
prosperidade capitalista.
O humanismo social caracteriza-se pela revolta contra as injustiças,
as desigualdades, e as diferenças de classes. Apresenta-se na luta
contra a alienação dos processos dominadores das forças
econômicas e históricas, e centraliza sua intervenção na tomada de
consciência dos diferentes modos e possibilidades de inserção e
conquista social. Os correlatos políticos deste humanismo foram as
revoluções populares de inspiração marxista. Na Psicologia, o
movimento se fez presente pela intensa crítica e participação
política, assim como pela proposição de uma psicologia sócio-
histórica. A grande força deste movimento ocorreu na década de
1960 em contraposição ao expansionismo do capitalismo. Na
economia, o humanismo social levou à estagnação dos meios de
produção nos países nos quais chegou ao poder através de atos
revolucionários.
O humanismo crítico é a negação de todos os humanismos e de suas
formulações fantasiosas e utópicas. É uma redefinição da relação do
homem consigo mesmo e do homem com o mundo. Essa nova
relação está presente no conceito do ato de existir em Heidegger, na
busca da pura consciência em Sartre, ou no reconhecimento da
inextrincável relação com o mundo, em Merleau-Ponty. O
humanismo crítico compartilha com os demais humanismos a
exaltação do indivíduo como criador de seus próprios valores e
sentidos, mas tende a se concentrar em aspectos técnicos da filosofia
e do método científico. Neste sentido, oferece uma reformulação
ontológica da natureza ou condição humana, procurando explicar a
possibilidade de qualquer experiência consciente através das
estruturas fundamentais da própria experiência consciente. É,
portanto, uma abordagem fundamentalmente técnica e
metodológica, isto é, um método para pensar.
Um correlato do humanismo crítico foi o movimento estruturalista e
pós-estruturalista, liderado por pensadores franceses.
As diferentes faces do movimento humanista dificultam qualquer
proposição de definição de humanismo e muito mais de psicologia
humanista. Shaffer (1978) resumiu as principais convergências da
psicologia humanista em cinco pontos:
1) tomam como ponto de partida a experiência consciente,
alinhando-se com a fenomenologia e o existencialismo;
2) abordam o ser humano em sua totalidade e integridade;
3) entendem a condição humana como limitada pela imbricação
eu-corpo/outro/mundo, mas nem por isso destituída de liberdade e
autonomia;
4) trabalham com uma metodologia anti-reducionista; e
5) assumem uma ética fundamentada na abertura para a experiência,
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na possibilidade de escolha, e na exeqüibilidade da redefinição do
sentido de vida.
O humanismo não é uma teoria, não é um método, não é uma
filosofia, e nem é uma psicologia. É um movimento implícito na
historicidade das idéias que aflora com maior ou menor intensidade
de tempos em tempos. Enquanto mensagem, alcança uma variedade
de grupos, dos mais diferentes modos, em função de um estado de
opressão individual e social. Enquanto força de mobilização, pode
estar na base da busca individual por mudança de sentido de vida,
ou na mobilização de grandes massas por justiça e reformas sociais.
Os humanismos têm em comum a ênfase no valor da
individualidade. O humanismo individual, mais claramente
identificado com o que se reconhece como psicologia humanista,
tem como meta a promoção de revoluções individuais, isto é, o
rompimento com um estilo de vida e com uma maneira de pensar.
Em contraste, o humanismo social, mais claramente identificado
com uma psicologia sócio-histórica, é anti-individualista e enfatiza a
união de forças em grandes movimentos solidários na promoção de
mudanças sociais. Ambos os humanismos estão comprometidos com
a melhoria da qualidade de vida.
No Brasil, uma introdução histórica ao humanismo, no caso
propriamente identificado como matrizes românticas e
pós-românticas, encontra-se no conhecido livro de Luís Cláudio
Figueiredo (1989) Matrizes do Pensamento Psicológico. O texto de
Figueiredo, pela clareza didática e pela perspicácia epistemológica,
supera de longe similares internacionais. É, sem dúvida, uma boa
maneira de introduzir o tema, em seus aspectos conceituais,
metodológicos e históricos.Teorias associadas ao humanismo, como
fenomenologia e existencialismo, aparecem sob a denominação de
psicologias compreensivas por estarem interessadas no estudo da
expressividade e da comunicação. Tecnicamente, são teorias
preocupadas com os problemas de interpretação.
O presente registro histórico limita-se ao reconhecimento da
presença de tendências humanistas na Psicologia praticada no Brasil.
Enquanto registro é provisório e parcial, posto que a preocupação
com a memória e as ligações históricas de nossas idéias e ações é
ainda uma prática recente. Para este estudo, foi possível localizar
notas avulsas sobre personagens, eventos, publicações e sociedades
identificadas com o humanismo na Psicologia. Neste sentido, o
estudo limita-se ao registro das cinco teorias mais claramente
associadas ao termo psicologia humanista no Brasil: Existencialismo,
Fenomenologia, Abordagem Centrada na Pessoa, Gestalt-terapia e
Logoterapia. As psicologias humanistas tiveram uma importante
participação na difusão de várias modalidades de grupoterapias,
como os grupos de sensibilização e o psicodrama. Registre-se que
essas atividades foram introduzidas no Brasil, na segunda metade
dos anos 1960, por Pierre Weil, que chegou estudar psicodrama com
J. L. Moreno, na Itália (Weil, 1967). No entanto, o foco desta
exposição é o registro da chegada das grandes teorias humanistas no
Brasil, não se detendo em desdobramentos como o trabalho de
grupos, ou aplicações em educação. A ordem da exposição obedece
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ao vetor teórico que serviu de atração para o estudo das teorias
humanistas.
Neste sentido, a primazia cabe à Abordagem Centrada na Pessoa
que parece ter sido a primeira a ser difundida entre psicólogos,
introduzindo o existencialismo e a fenomenologia. Na verdade, o
existencialismo já era estudado no Brasil, desde os anos de 1910,
pelo filósofo Farias Brito; e a fenomenologia desde os anos de 1940,
pelo médico psicólogo Nilton Campos. Por outro lado, houve
psicólogos que chegaram à proposição de uma abordagem
fenomenológica para a psicologia fundamentando-se diretamente em
fontes européias, como foi o caso de Monique Augras (1981). A
seqüência dos tópicos a serem apresentados é a seguinte:
Existencialismo, Fenomenologia, Fenomenologia Existencial,
Abordagem Centrada na Pessoa (ACP), Fenomenologia e
Psicologia, Gestalt-terapia, e Logoterapia.
Existencialismo
No Brasil, a discussão filosófica que rompeu a entrada do século XX
estava em torno de três tendências: espiritualismo, positivismo e
materialistasmo. Neste contexto, um filósofo irá se diferenciar e se
distinguir como o grande divisor de águas da filosofia no Brasil.
Trata-se do cearense Raimundo de Farias Brito (1862-1917). Ele
formou-se em Direito no Recife, onde recebeu a influência de Tobias
Barreto de Menezes (1839-1889). Trabalhou em Fortaleza e Belém,
terminando sua carreira como catedrático de Lógica no Colégio
Pedro II, no Rio de Janeiro. Em alguns trabalhos pioneiros sobre a
história da filosofia no Brasil (Franca, 1929; Machado, 1976;
Rabello, 1941), Farias Brito foi considerado o principal filósofo
brasileiro do início do século XX.
Mas qual era a filosofia de Farias Brito? Aí está a surpresa. Segundo
Guimarães (1979), Farias Brito assentou as bases para a recepção do
pensamento existencialista no Brasil. Em uma análise da obra de
Farias Brito, Penna (1992) identificou influências de Henri Bergson
(1859-1941), Johann Gottlieb Fichte (1762-18140), e da Escola de
Würzburgo, que ficou conhecida por defender, ao contrário de
Wundt, a ocorrência de pensamentos sem imagens. Crítico do
materialismo, do evolucionismo, do mecanicismo, do marxismo e do
positivismo (Machado, 1968), Farias Brito defendia uma espécie de
monismo espiritualista, que o Padre Leonel França (1896-1948)
chamou de "panpsiquismo panteísta" (Franca, 1929), com influência
do filósofo Espinosa (Baruch Spinoza, 1632-1677). Em seu pioneiro
estudo histórico da filosofia no Brasil, França classificou Farias Brito
à parte daquelas que ele identificava como as três tendências
principais do pensamento brasileiro: espiritualismo, positivismo e
materialismo.
A obra de Farias Brito foi por ele mesmo dividida em duas fases
(não necessariamente sucessivas): uma primeira de preocupação
com a "finalidade do mundo" e uma segunda, de interesse pelos
"dados gerais da filosofia do espírito". São exemplos desta última
fase obras como A Base Física do Espírito, de 1912, e O mundo
interior, de 1914, a última obra do autor. No estudo dos dados da
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filosofia do espírito, Farias Brito reserva à psicologia um papel
proeminente na reflexão filosófica. Ele de fato pretendia que a
filosofia fosse fundamentada na psicologia (Rabello, 1941) .
Segundo Farias Brito, a metafísica confunde-se com a psicologia, na
medida em que a realidade em si, objeto da metafísica, resume-se à
vida interior (espírito), enquanto que o mundo exterior (mecânico) é
pura aparência. Mecanismo e consciência são princípios irredutíveis
um ao outro. Assim, a psicologia deve ocupar-se dos fenômenos
subjetivos da consciência, através do método introspectivo (Franca,
1929). Essa introspecção pode ser direta, voltada aos fenômenos
imediatos da consciência, ou indireta, para as manifestações
exteriores da consciência e para os movimentos de outros
indivíduos.
Segundo Machado (1968), a ligação de Farias Brito com o
existencialismo refletir-se-ia na tendência a recorrer às "fontes
subjetivas como base da elaboração filosófica (...), que assumiria
forma extremada no existencialismo francês e na filosofia existencial
alemã" (p.276). O sentido da filosofia de Farias Brito é assim
resumido por Machado:
Em Farias Brito a filosofia se interioriza. Os temas humanos, a
morte, a vida, o mundo moral, as circunstâncias existenciais, o
conhecimento, consciência e mundo e os grandes temas do espírito e
do mundo interior (...) são os temas que propõe Farias Brito (p. 276).
A aproximação de Farias Brito foi por esta preocupação com as
fontes subjetivas da experiência. Penna (1992) aponta ainda outros
indícios de uma aproximação de Farias Brito com a filosofia
existencial, como a preocupação com a problemática da morte.
O período em que Farias Brito atuou precedeu as reformas do ensino
superior do governo Vargas, que criariam as primeiras universidades
brasileiras, nas quais as Faculdades de Filosofia cumpririam um
papel formidável. As Faculdades de Filosofia não apenas
centralizariam a administração universitária, como viriam a ser os
principais centros formadores de profissionais e professores para
inúmeras áreas do conhecimento. Essa influência formadora se
verificaria sobremaneira no campo da psicologia. Mais que isso, as
Faculdades de Filosofia concentrariam, do início dos anos 1930 até a
nova reforma universitária, de 1968, a maior parte do conhecimento
científico e filosófico produzido e veiculado no Brasil. Assim, era de
se esperar que idéias que prosperassem naquelas instituições
exercem grande influência em todas as áreas do conhecimento,
sobretudo no campo das ciências humanas. O existencialismo e a
fenomenologia estão entre esses movimentos que, uma vez
introduzidos nas Faculdades de Filosofia, difundiram-se, alcançando
a psicologia.
O caso do Rio Grande do Sul é um exemplo da importância das
faculdades de filosofia na difusão das idéias existencialistas, e foi
abordado por Ernani Maria Fiori, um dos principais professores da
Faculdade de Filosofia. Por volta dos anos 1950, o existencialismo
influenciou a primeira geração de professores da Faculdade de
Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),
através da obra de Gabriel Marcel (1889-1973), sendo que o próprio
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filósofo francês chegou a visitar Porto Alegre (Fiori, 1987).
Juntamente com Jean-Paul Sartre (1905-1980), Marcel representava
o existencialismo francês. Em contraste com Sartre, Marcel era
considerado um existencialista cristão, embora ele próprio negasse o
rótulo (Ferrater Mora, 1986). Nessa mesma época, a fenomenologia
também exerceria influência, através de Maurice Merleau-Ponty
(1908-1961). Há quem diga que o interesse por Heidegger
prevaleceu no Brasil, pelas dificuldades dos pensadores de
influência católica conviveram com o ateísmo de Sartre (Paim,
1967). Sartre esteve no Rio de Janeiro em 1961, onde proferiu uma
série de conferências. Segundo Fiori (1987), o pensamento de
Martin Heidegger (1889-1976) passou a ser veiculado
principalmente por dois professores pertencentes ao que ele
identifica como uma segunda geração de professores, que foram
alunos da própria Faculdade de Filosofia: Gerd Bornheim e Ernildo
Stein.
Gerd Bornheim (1929-2002) estudou nas universidades de Sorbonne
em Paris, Oxford na Inglaterra, e Freiburg na Alemanha. Foi um dos
divulgadores de Jean-Paul Sartre no Brasil (Bornheim, 1970, 1972),
mas se considerava mais identificado com as teorias de Heidegger,
Hegel (1770-1831) e Marx (1818-1883). Foi professor na UFRGS,
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e na Universidade
Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). O primeiro livro de Ernildo
Stein, publicado em 1966, e intitulado Introdução ao Pensamento de
Martin Heidegger, foi seguido em 1967 pela sua tese de livre-
docência, Compreensão e Finitude: Estrutura e Movimento da
Interrogação Heideggeriana. Desde então, Stein publicou pelo menos
mais cinco livros e numerosos artigos influenciados ou dedicados ao
método fenomenológico e à reflexão sobre o problema da verdade
em Heidegger. Paralelamente, Stein dedicou-se a temáticas próximas
do existencialismo, como no livro Melancolia, de 1976. Ernildo Stein
é ainda tradutor de diversas obras de Heidegger para o português.
Stein lecionou na UFRGS até aposentar-se em 1996, quando iniciou
atividades na PUCRS.
Por fim, cabe deixar esclarecida a diferença dos termos existência e
existencialismo. Foi o filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard
(1813-1855) quem usou pela primeira vez o termo existência no
sentido de subjetividade, assinalando a experiência da interioridade
individual enquanto algo válido e concreto. Heidegger pretendeu ser
antes de tudo o filósofo do ser, tentando resolver o problema
ontológico do ser na ex-sistência, o ser-fora-de-si (o que parece não
ter conseguido), e Jaspers se considerou como um filósofo da
existência. O termo existencialismo identifica filósofos como Gabriel
Marcel, Jean-Paul Sartre, Maurice Merleau-Ponty, Simone de
Beauvoir (1908-1986), Paul Tillich (1886-1965), e Martin Buber
(1878-1965).
Fenomenologia
Assinala-se o início do movimento fenomenológico com a
publicação do livro Investigações Lógicas, de Edmund Husserl
(1859-1938). Nesse livro, Husserl criticava o psicologismo, apontado
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por ele como a substituição da lógica pela empiria psicológica.
Husserl opunha-se à pretensão de uma psicologia positiva e
experimental, baseada em uma epistemologia fisiológica,
apresentar-se como fundamento para a filosofia. Diante da
improcedência do psicologismo, a fenomenologia surgia como um
método descritivo e reflexivo para estudo da experiência consciente.
Tecnicamente, o método enunciava um modo de apresentar a
experiência consciente como uma evidência para a investigação.
Após Husserl, o desenvolvimento da fenomenologia desdobrou-se
em pelo menos quatro ramos distintos (Embree, 1997):
1) fenomenologia realista com ênfase na procura de essências
universais nos mais variados objetos, por exemplo, os estudos de
Max Scheler (1874-1928) sobre ética;
2) fenomenologia constitutiva com a ênfase nos aspectos técnicos do
método, em particular, as questões concernentes à suspensão das
suposições apriorísticas, por exemplo, Aron Gurwitsch (1900-1973),
ao estudar a percepção sem se preocupar com qualquer influência de
estimulação;
3) fenomenologia existencial conforme as diferentes concepções de
Martin Heidegger, Jean-Paul Sartre, e Maurice Merleau-Ponty; e
4) fenomenologia hermenêutica, representada pelos trabalhos sobre
interpretação de Hans-Georg Gadamer (1900-2002) e Paul Ricoeur
(n. 1913). Esses quatro ramos articulam-se, na atualidade, de
diferentes modos, principalmente quando o interesse é a aplicação
do método a ontologias regionais.
Em sua história exaustiva do movimento fenomenológico,
Spiegelberg (1982) reconheceu a impossibilidade de apresentá-lo em
uma definição consensual e unívoca. A fenomenologia tomou
diferentes caminhos para atender necessidades das mais diferentes
áreas de conhecimento. Neste sentido, é sempre uma surpresa
localizar onde estão alojados os estudos e as pesquisas
fenomenológicas em uma universidade. Elas podem estar em
departamentos tão díspares como geografia, matemática, arquitetura,
enfermagem, direito ou teologia. No entanto, é possível dizer que os
pesquisadores fenomenológicos concordam ao menos com um ou
outro dos seguintes pontos (Embree, 1997):
1) que a cognição, enquanto consciência da coisa em si, pode ser
abordada do modo claro e distinto, de acordo com as especificidades
de sua natureza;
2) que a cognição, enquanto consciência da coisa em si, pode se
constituir de objetos naturais, culturais e ideais, e que estes objetos
podem ser evidenciados e conhecidos;
3) que a pesquisa é eminentemente dialogal;
4) que a abordagem central do método é a descrição do fenômeno,
enquanto ato anterior à determinação de causas, propósitos ou
fundamentos;
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5) que a autenticidade da descrição depende da habilidade do
pesquisador em suspender ou colocar entre parênteses seus
preconceitos (este aspecto é polêmico, não sendo aceito por todos).
O movimento fenomenológico opõe-se à aceitação ingênua ou
não-crítica de pensamentos especulativos e de sistemas teóricos
fundamentados em premissas hipotéticas. Ele é também conhecido
por sua oposição ao objetivismo e ao positivismo. Contudo, deve-se
deixar claro que a fenomenologia não se opõe ao desenvolvimento
da ciência natural ou da tecnologia. Ao contrário, ela é na verdade
uma forma sofisticada e refinada para trabalhar com a evidência e
desta forma contribuir para o aperfeiçoamento técnico e ético da
ciência, da filosofia, e da existência.
As idéias fenomenológicas se expandiram rapidamente, apesar das
dificuldades pessoais de Husserl com comunicação e relações
interpessoais. A primeira área de influência da fenomenologia, ainda
nas no início do século XX, foi a psiquiatria, representada nos
trabalhos de Ludwing Binswanger (1881-1966) e mesmo na
fenomenologia independente de Karl Jaspers (1883-1969). A seguir,
a influência da fenomenologia alcançava, na década de 1920, a
educação, a música, a teologia e o simbolismo. Na década de 1930, a
fenomenologia chegava à arquitetura, à literatura, e ao teatro; na
década de 1940, foi a vez da antropologia, do cinema, das pesquisas
de gênero, e da política. Nas décadas de 1950 e 1960, a
fenomenologia dominou o cenário filosófico francês. Na década de
1970, a fenomenologia transformou-se em método empírico de
pesquisa em psicologia com os estudos do grupo da Universidade de
Duquesne, em Pittsburgh, no estado da Pensilvânia - EUA. Nas
últimas décadas do século XX, a fenomenologia passou a ser
estudada na medicina e na enfermagem (Embree, 1997; Spiegelberg,
1982).
O primeiro nome ligado à introdução da fenomenologia no Brasil é
Nilton Campos (1898-1963), que também foi o primeiro profissional
a dedicar-se em tempo integral à psicologia (Cabral, 1964). Médico
voltado à neurologia e à psiquiatria, formado em 1924, Camposcomeçou a trabalhar em 1925 com Waclaw Radecki (1887-1953) no
Laboratório de Psicologia da Colônia de Psicopatas do Engenho de
Dentro. Em 1934, Nilton Campos tornou-se diretor do Instituto de
Psicologia do Serviço de doenças mentais, que daria origem ao
Instituto de Psicologia da Universidade do Brasil. A tese de
doutoramento de Campos, preparada em 1945 e defendida em 1948,
versava sobre O Método Fenomenológico na Psicologia. Uma
análise do trabalho de Campos foi apresentada por Penna (1992),
em sua História da Psicologia no Rio de Janeiro. Penna foi sensível o
bastante para registrar o esforço de Campos ao procurar dar
encaminhamento empírico ao método fenomenológico,
estabelecendo comparações com a instrospecção psicológica.
Campos pressentiu a potencialidade do método fenomenológico para
a pesquisa psicológica, e a proximidade com certos aspectos da
teoria da Gestalt. No entanto, percebeu corretamente que a pesquisa
da Gestalt não utilizava o método fenomenológico e que, para
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colocá-lo a serviço da psicologia, teria que modificá-lo. Essa
modificação, prenunciada por Campos, acabou acontecendo com o
grupo da Universidade de Duquesne, mais intensamente na década
de 1970, como veremos adiante. Campos estava, na verdade, à
frente do seu tempo.
Na psiquiatria, E. Portella Nunes defendeu em 1963, na Faculdade
de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro, tese de
livre-docência intitulada Fundamentos da Psicoterapia. Em sua tese,
Portella Nunes citava Heidegger e Binswanger. No entanto,
publicações usando o termo fenomenologia no título somente
aparecerão na década de 1980. Pelo menos é o que consta na
listagem de publicações, teses e dissertações, preparada por
Forghieri (1993a) para uma edição dos Cadernos da Anpepp,
intitulada Mapeamento da Pesquisa em Psicologia no Brasil. Antes
de passarmos para o movimento das pesquisas fenomenológicas na
década de 1980 no Brasil, é interessante voltar nossa atenção para
as relações entre fenomenologia e existencialismo.
Fenomenologia Existencial
A combinação dos termos existência e fenomenologia está associada
à filosofia de Heidegger, pois foi ele que utilizou a fenomenologia de
Husserl como método para estudar as questões de existência
apontadas por Kierkegaard, tais como ansiedade, angústia, medo, e
morte. Existencialismo e fenomenologia, embora conceitos
diferentes, são integrados quando o assunto é psicoterapia. Como
tem sido dito, o existencialismo é uma filosofia preocupada com as
questões da expressão autêntica da subjetividade. Em contraste, a
fenomenologia é uma filosofia e um método preocupado com as
condições técnicas para a reflexão rigorosa.
Nos EUA, o principal introdutor do pensamento fenomenológico
existencial foi Rollo May (1909-1994), com o livro Existence: A
New Dimension in Psychiatry and Psychology (May, Angel &
Ellenberg, 1958). Trata-se de uma obra de 446 páginas, dividida em
três partes, com textos originais dos organizadores e com textos
traduzidos de psiquiatras europeus com orientação fenomenológico-
existencial. Na primeira parte, May escreveu sobre as origens do
movimento existencial e de suas contribuições para a psicoterapia; e
Ellenberg trouxe uma introdução clínica para a psiquiatria
fenomenológica. Na segunda parte foram incluídas traduções de
textos de Eugène Minkowski (1885-1972) sobre esquizofrenia
depressiva; de Erwin Straus (1891-1975) sobre alucinações; e de
Viktor von Gebsattel (1883-1975) sobre o mundo do compulsivo. Na
terceira parte estavam as traduções dos textos de Binswanger sobre
análise existencial. Em outra publicação, May (1960/1975) contou
com a colaboração de Abraham Maslow (1908-1970), Carl Rogers
(1902-1987), e Gordon Allport (1897-1967) para apresentar a
psicologia existencial.
No Brasil, tanto o existencialismo quanto a fenomenologia
mereceram a atenção do psicólogo e historiador Antonio Gomes
Penna, ao menos em três publicações. Em um artigo sobre psicologia
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existencial, Penna (1985) explicita a distinção entre psicologia
fenomenológica e psicologia existencial, embora assegure a ambas a
adjetivação "humanista". Segundo Penna, a psicologia
fenomenológica analisa a intencionalidade através de descrições
rigorosas e sucessivos processos de redução e variações imaginárias,
enquanto que a existencial aproxima-se da existência concreta
integrando sujeito e objeto no conceito de Dasein. Em outro artigo,
Penna (1986) destaca os avanços de Merleau-Ponty no campo da
fenomenologia da linguagem, em relação à formulação inicial de
Husserl.
Mais recentemente, Penna (2001) lançou um livro de introdução à
psicologia fenomenológica, parte de uma série de textos
introdutórios voltados a cursos de graduação em psicologia.
A convergência entre existencialistas e fenomenólogos, no campo da
psicoterapia, apareceu claramente no livro Phenomenological,
Existential, and Humanistic Psychologies de Misiak e Sexton (1973).
Trata-se do primeiro texto norte-americano a tratar o tema com
critérios de análise teórica e de análise histórica, do ponto de vista
da psicologia. Os autores trataram indistintamente existencialistas e
fenomenólogos, quando o assunto foi psicoterapia Em contraste, as
influências da fenomenologia na psicologia e na psiquiatria foram
examinadas por Spiegelberg (1972) com o objetivo de indicar de que
modo psicoterapeutas se apropriaram ou desenvolveram técnicas
fenomenológicas.
Com efeito, em psicoterapia a convergência entre pensadores
fenomenológicos e existencialistas é acentuada. Valle e King (1978)
na introdução do livro Existencial Alternatives to Psychotherapy
trataram conjuntamente de conceitos existenciais e
fenomenológicos. Valle e Halling (1989) preferiram unir os dois
conceitos no título do livro Existential-Phenomenological
Perspectives in Psychology.
Recentemente, o Journal of Phenomenological Psychology dedicou
um número à história da fenomenologia. O número trazia dois
artigos, um intitulava-se The Early History of Phenomenological
Research in América (Halling & Nill, 1995) e o outro, A Brief
History of Existential-Phenomenological Psychiatry and
Psychotherapy (Cloonan, 1995). Na comparação dos dois títulos se
tem uma síntese clara das relações entre os dois movimentos e do
modo como são tradicionalmente tratados em psicologia. Quando se
referindo à pesquisa, fala-se em método fenomenológico. Quando se
referindo à psicoterapia, fala-se em existencialismo ou em
fenomenologia existencial. A fenomenologia serve de base reflexiva
para a análise da existência (ver Holanda, 1997). Por fim, há ainda
uma tendência à prática de um existencialismo descomprometido
com qualquer esforço de sistemática reflexiva ou pesquisa
psicológica, exemplificada por uma variedade de proposta de
vivências, muito a gosto de certos setores da psicologia no Brasil.
Vários autores brasileiros, identificados com as teorias
psicoterápicas a serem discutidas adiante, circulam entre temas
existenciais e compreensão fenomenológica. Amatuzzi é neste
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sentido uma boa ilustração, como mostra a seqüência de títulos de
seus textos: A Abordagem Fenomenológica no Atendimento
Psicoterápico (Amatuzzi, 1999), Psicoterapia como Hermenêutica
Existencial (Amatuzzi, 1991), e Atitude de Boa Vontade e a
Abordagem Centrada na Pessoa (Amatuzzi, Cury, Graetz, Belatini,
Andrade e Seber, 2002).
Textos sobre psicoterapias fenomenológico-existenciais têm sido
publicados regularmente pelo Jornal Brasileiro de Psiquiatria e pela
revista Informação Psiquiátrica, da UERJ, que circulou nas décadas
de 1980 e 1990. Com esses esclarecimentos, podemos apreciar a
difusão, no Brasil, da psicologia humanista que,enquanto
movimento, colocou em pauta a discussão dos temas existenciais e
do método fenomenológico.
 
Abordagem Centrada na Pessoa
A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP), inicialmente conhecida
como Psicoterapia Centrada no Cliente ou Aconselhamento
Não-Diretivo, tem um papel de destaque na história da psicologia.
Abriu o trabalho psicoterapêutico aos psicólogos, antes uma
atividade exclusivamente médica, e introduziu a pesquisa rigorosa e
quantitativa ao estudo da efetividade psicoterapêutica (Rogers,
1961/1970).
Também incentivou o uso de métodos qualitativos em pesquisa
psicológica (Rogers, 1970/1972). A ACP teve início com o trabalho
de Carl Rogers nos EUA, na década de 1940. A teoria caracteriza-se
pela crença nas potencialidades de desenvolvimento e crescimento
psicológico em condições comunicativo-relacionais realistas,
sensíveis, e compreensivas. Em suas origens, ela recebeu influências
do funcionalismo americano, do gestaltismo, das teorias do self, da
psicanálise, da terapia relacional de Otto Rank, dos psiquiatras
culturalistas, e do existencialismo. De la Puente (1970) distinguiu
três fases na trajetória do pensamento rogeriano: a fase técnica
baseada em regras de atendimento não-diretivo, tais como respostas
reiterativas e reflexos de sentimentos (Rogers, 1942/1973); a fase
das atitudes terapêuticas baseadas na autenticidade, aceitação
calorosa e compreensão empática (Rogers, 1951/1974); e a fase da
investigação do processo terapêutico, ocorrendo neste período a
aproximação do existencialismo (Rogers, 1961/1970). Certamente,
uma quarta fase pode ser acrescida, referindo-se à transformação da
teoria em abordagem, quando o pensamento rogeriano volta-se para
um amplo espectro de questões, incluindo educação (Rogers,
1969/1971), grupos (Rogers, 1970/1972), casamento e alternativas
(Rogers, 1972/1974), e temas mais gerais (Rogers & Rosenberg,
1977).
Uma primeira aproximação da teoria de Rogers com a
fenomenologia poderia se dar através do termo campo fenomenal,
que apareceu no capítulo escrito por Rogers (1959) para a série,
Psychology: A Study of a Science, editada por Sigmund Koch
(1917-1996), em 1959. No entanto, o conceito de campo fenomenal
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utilizado por Rogers devia-se à influência dos autores americanos
Arthur Combs (1912-1999) e Donald Snygg (1904-1967). Para esses
autores, o campo fenomenal era o ambiente percebido, incluindo
neste ambiente o percebedor, enquanto determinante de
comportamento. Sendo assim, o campo fenomenal era a estrutura
básica para a predição e controle do comportamento. Combs foi
aluno de Rogers, introduzindo ao professor as idéias que havia
desenvolvido juntamente com Snygg (Snygg & Combs, 1949). A
aproximação de Rogers da fenomenologia e do existencialismo veio
com a influência de Eugene Gendlin (Gomes, 1983).
O impacto das pesquisas de Rogers na psicologia norte-americana
fez com que suas idéias se espalhassem pela Europa e pela América
Latina. No Brasil, a influência rogeriana se fez sentir já na década de
1940, com o trabalho de Mariana Alvim (1909-2001). Em 1945 ela
conheceu Carl Rogers pessoalmente, em visita a Chicago no intuito
de instruir-se na técnica de entrevista não-diretiva. No ano seguinte,
Alvim esteve no Rio de Janeiro, onde trabalhou com Emílio Mira y
López (1896-1964) no Instituto de Seleção e Orientação Profissional
da Fundação Getúlio Vargas (ISOP) desde a criação do Instituto, até
mudar-se para Brasília em 1960. Dois anos depois, foi convidada
pelo reitor Darcy Ribeiro (1922-1997) para coordenar os serviços de
seleção de pessoal para a Universidade de Brasília. Alvim também
lecionou em Salvador, sendo professora de Maria Constança
Villas-Boas Bowen (1933-1993), que depois veio a ser colaboradora
de Carl Rogers em La Jolla, Califórnia.
Em 1951, a Abordagem recebia no Rio de Janeiro a colaboração de
Ruth Nobre Scheeffer (n. 1923), que havia retornado do seu
mestrado no Teachers College da Universidade de Colúmbia.
Scheeffer teve um papel importante na divulgação do
aconselhamento não-diretivo através dos seus livros
Aconselhamento Psicológico (1964) e Teorias de Aconselhamento
(1976). Nesta década, os alunos do recém-criado Curso de
Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em
seus estágios, já praticavam o aconselhamento psicológico de
orientação rogeriana, introduzido por Pe. Antonious Benko (Féres-
Carneiro & Lo Bianco, 2003).
No Rio Grande do Sul, ainda na década de 1950, a teoria de Carl
Rogers era estudada pelo Irmão Lassalista Henrique Justo . O
interesse de Justo pelo aconselhamento psicológico se deu em razão
da oposição dos psiquiatras gaúchos ao exercício da psicanálise por
psicólogos. Na época, o atendimento psicoterapêutico por psicólogos
era considerado como trabalho de segunda linha. O contato de Justo
com a teoria de Rogers foi através de um livro escrito pelo padre
franciscano Roberto Zavalloni (1956) e traduzido do italiano para o
português pela Editora Vozes. Zavalloni havia sido aluno de Rogers
em Chicago. Justo encantou-se com a possibilidade de trabalhar com
uma psicoterapia desenvolvida por um psicólogo e foi buscar a
formação na Association Médico-Psychologique de Paris, com
André de Peretti, Daniel Hameline, Marie-Joelle Dardelin e outros,
havendo os três primeiros psicoterapeutas estudado com Rogers, nos
Estados Unidos. Justo tornou-se uma das mais importantes
lideranças no desenvolvimento da pesquisa e da prática da ACP no
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Brasil. Ele ainda coordena um curso de especialização em ACP no
Centro Universitário La Salle em Canoas - RS.
Na década de 1960, com a criação dos cursos de graduação em
psicologia, as teorias humanistas ganhavam espaço nos currículos e a
ACP era estudada nos cursos do Rio de Janeiro, de São Paulo, de
Pernambuco e do Rio Grande do Sul. Em Pernambuco, a teoria de
Rogers foi lecionada com competência e elegância por Lúcio Flávio
Campos (1923-1988) e Maria Auxiliadora Moura (1931-1986) , na
Universidade Católica. Campos iniciou sua carreira profissional
como padre jesuíta, com formação em filosofia, com os jesuítas de
São Leopoldo - RS, e em teologia na Fordham University em Nova
York. No Recife, fundou em 1961, na Universidade Católica de
Pernambuco, o primeiro curso de graduação em psicologia no
nordeste Brasileiro, e um dos primeiros cursos do Brasil. Em seguida
foi para St Louis - Missouri, EUA para estudar psicologia na
Washington University, desenvolvendo estudos em psicopatologia,
técnicas projetivas, e aconselhamento psicológico. Retornando ao
Recife, assumiu a coordenação do curso de psicologia, entre 1965 e
1967.
Logo depois, ele renunciou a sua condição de padre jesuíta, vindo a
casar com Diva Campos. O professor Campos introduziu a teoria de
aconselhamento psicológico de Carl Rogers no curso de psicologia
da Universidade Católica e o trabalho com grupos terapêuticos.
Maria Auxiliadora Moura e Maria Ayres formaram-se na primeira
turma, dedicando-se também ao ensino e a prática da ACP. Maria
Auxiliadora foi coordenadora do curso de psicologia da
Universidade Católica. Maria Ayres é hoje uma referência histórica
no desenvolvimento da ACP no Brasil.
Em São Paulo, Oswaldo de Barros Santos (1918-1998) vinha
desenvolvendo trabalho em orientação e seleção de pessoal
interessando-se pelo aconselhamento não-diretivo. Como professor,
lecionou em várias universidades paulistas, de algum modo
difundindo as idéias de Rogers. Ele instituiu em 1969, juntamente
com sua assistente Rachel Rosenberg, o Serviço de Aconselhamento
Psicológico da USP (SAP-USP), uma das primeiras instituições a
integrar oficialmente a Abordagem Centrada na Pessoa como opção
de prática na formação de psicólogos e a oferecer aconselhamento
psicológico no atendimento à população (Rosenberg, 1987a).
Nascida naBélgica, Rachel Lea Rosenberg (1931-1987) fez o
mestrado e o doutorado na USP. Além de trabalhar como assistente
de Oswaldo de Barros Santos no SAP-USP, o qual ela mesma viria a
dirigir, participou da criação do Centro de Desenvolvimento da
Pessoa do Instituto Sedes Sapientiae.
No final da década de 1960 e início da década de 1970, as versões
norte-americanas da psicanálise que circulavam no Brasil eram
criticadas por apresentar uma compreensão determinista e
mecanicista da natureza humana. As interpretações psicanalíticas
eram acusadas de ser muito abrangentes e generalistas. Por outro
lado, o behaviorismo ainda ensaiava sua proposta para tratamento
psicológico, baseado em teorias de aprendizagem. Tal quadro
favorecia o desenvolvimento do pensamento humanista, que recebia
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muita atenção por parte de profissionais e estudantes de psicologia.
No entanto, a presença da ACP no Congresso Interamericano
realizado no Anhembi, na cidade de São Paulo, foi pequena. As
idéias de Rogers apareceram em trabalhos apresentados por
religiosos, com exceção de um workshop sobre aconselhamento
psicológico que, embora fosse parte do Congresso, ocorreu na USP,
sob coordenação de Rachel Rosenberg. Em 1976, um outro grande
evento ocorreu em São Paulo, desta vez sobre Psicologia Clínica,
sendo inexpressiva a apresentação de trabalhos sobre a ACP. Aliás,
neste Congresso, a grande novidade foi a Analise Transacional,
trazidas na época por Odette Lourenção Van Kolck e seu marido
Theodorus Van Kolck.
Em contraste, na mesma década de 1970 a ACP seria intensamente
estudada na academia. Por esta época, Miguel de la Puente
regressava ao Brasil de seu doutorado na Université de Strasbourg,
na França, trazendo em sua bagagem a versão em livro de sua tese
de doutorado, Carl Rogers: De la Psychothérapie a l'Enseignement.
O texto de Puente (1970) era um exame profundo da teoria de
Rogers, apontando pela primeira vez as distintas etapas do
desenvolvimento da teoria (técnicas, atitudes, e experiencing). As
mesmas etapas eram simultaneamente indicadas em um livro sobre
as novas direções da Terapia Centrada no Cliente, publicado nos
EUA (Hart & Tomlinson, 1970). No Brasil, De la Puente tornou-se
professor da Universidade Estadual de Campinas, onde continuou
suas pesquisas sobre a ACP no Programa de Pós-Graduação em
Educação.
Não seria exagero afirmar que a ACP, na década de 1970,
despertava nos seus estudiosos grande entusiasmo pela pesquisa
empírica.
Com efeito, esse foi o grande momento da abordagem na academia
brasileira. Havia uma expectativa de se estar diante de uma grande
escola do pensamento psicológico. Em 1972 foram defendidas duas
importantes teses por duas mulheres que ocuparam posição de
destaque na psicologia humanista. Elas foram Rachel L. Rosenberg
com a tese Um Estudo de Percepção de Condições Psicoterápicas
em Grupos de Aconselhamento Psicológico, e Yolanda Cintrão
Forghieri com a tese Técnicas Psicoterapêuticas e Aconselhamento
Terapêutico Rogeriano. Em seguida, vieram da PUCSP as teses
Análise Lógico-Formal da Teoria de Aprendizagem de Carl Rogers,
defendida por A. A. Mahoney em 1976, e Fundamentos
fenomenológico-existenciais da comunicação professor-aluno na
teoria da educação de Carl Rogers, defendida por Lucila Schwantes
Arouca em 1977. Na PUCRJ, no mesmo ano, era defendida a tese
Raízes Filosóficas do Pensamento de Carl Rogers por Rosa Maria
Niederauer Tavares Cavalcanti. Do Rio Grande do Sul chegava o
livro Carl Rogers, teoria da personalidade, aprendizagem centrada
no aluno do Irmão Henrique Justo (1973). É provável que a
publicação de Justo tenha sido o primeiro livro sobre Rogers escrito
por um autor brasileiro. Na Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, o Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica
criou uma área de concentração em Aconselhamento Psicológico
sob a orientação de Miguel de la Puente. De la Puente lançou, nesta
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década mais dois importantes trabalhos, um sobre a psicologia social
de Rogers (De la Puente, 1973) e outro sobre a educação centrada
no estudante (De la Puente, 1978).
As traduções das obras de Rogers surgiam por esta época. Primeiro
apareceu uma tradução de Tornar-se Pessoa, publicada em Portugal
(Rogers, 1961/1970). Seguiram-se Liberdade para Aprender
(Rogers, 1969/1971), Tornar-se Pessoa, versão brasileira (Rogers,
1961/1973), e Grupos de Encontro (Rogers, 1970/1974). As obras
Psicoterapia e Consulta Psicológica de 1942 e Terapia Centrada no
Paciente de 1951, chegaram ao Brasil primeiro em versão de
Portugal, em 1973 e 1974, respectivamente. Um livro que foi muito
utilizado na segunda metade da década de 1970 foi Psicoterapia e
Relações Humanas de Rogers e Kinget, em dois volumes. O primeiro
voltado aos aspectos teóricos, trazendo uma versão do texto A
Theory of Therapy, Personality and Interpersonal Relationships, as
Developed in the Client'Centered Framework aquele que havia sido
preparado a pedido de Sigmund Koch em 1959. Neste texto foram
definidas as premissas básicas da teoria (Rogers, 1959). O segundo
volume trazia exemplos e estudos de casos clínicos. O livro foi
publicado originalmente em francês em 1965, sendo traduzido para o
português em 1975, neste interim foi muito usada a versão em
espanhol. Desta forma, o texto mais importante,enquanto teorização
sistemática, do pensamento rogeriano chegou ao Brasil traduzido de
uma versão francesa. Na verdade, o rogerianismo era muito
estudado na França, na década de 1960.
Em meados de 1970, Eduardo Bandeira visitou Carl Rogers no
Center for Studies of the Person, em La Jolla, Califórnia - EUA e de
volta ao Brasil trouxe material informativo e ilustrativo da prática
terapêutica da ACP. Com esse material, Bandeira percorreu o país,
dando início à preparação da visita de Rogers, que ocorreu nos
meses de janeiro e fevereiro de 1977, nas cidades do Recife, São
Paulo e Rio de Janeiro. O ponto culminante da visita foi a realização
de um evento vivencial na Aldeia de Arcozelo, na serra fluminense.
Intitulado de Primeiro Encontro Centrado na Pessoa, o evento
ocorreu entre os dias 4 e 18 de fevereiro. Estavam inscritos 200
participantes das mais diferentes profissões: advogados, engenheiros,
enfermeiros, médicos, psicólogos, administradores, educadores,
atores, diretores de cinema, jornalistas, e estudantes. O evento
despertou grande atenção do público e da mídia. O Encontro viveu a
não-diretividade em sua forma radical. Não havia nem programa
nem pauta, e a comunidade foi planejando e realizando as
atividades, debatendo exaustivamente cada questão. Rogers veio ao
Brasil acompanhado de membros de sua equipe. Foram eles John
Wood, Maureen Miller, e o casal Maria e Jack Bowen. Maria
Bowen, uma baiana, ex-aluna de Mariana Alvim, trabalhava com
Rogers em La Jolla; John Wood casou-se depois com uma brasileira
e permaneceu no Brasil, residindo em uma fazenda no interior de
São Paulo; Maureen Miller trazia para o encontro as novidades da
Gestalt Therapy, e ainda retornaria diversas vezes ao Brasil. A forte
ênfase vivencial do Encontro propagou-se nos Encontros seguintes.
Rogers voltou ao Brasil em 1978 para um evento semelhante,
retornando ainda em 1985 para um encontro com estudiosos da
ACP.
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A ênfase vivencial também dominou as atividades dos inúmeros
centros de estudos que foram criados em várias cidades do Brasil.
Após o primeiro Encontro de Arcozelo, Rachel Rosenberg tornou-se
efetivamente a principal representante do rogerianismo no Brasil,
sendo co-autora com Rogers no livro A Pessoa como Centro (Rogers
& Rosenberg, 1977). Neste período, Rosenberg procurou manter a
articulação entre ACP e pesquisa.Um exemplo marcante foi o
evento intitulado "Vivência Acadêmica: O enfoque centrado na
pessoa" realizado na USP, em maio de 1986. O evento contou com a
participação, entre outros, de Oswaldo de Barros Santos (USP),
Oswaldo Frota-Pessoa (USP), Mauro Amatuzzi (USP), Henriette T.
Penha Morato (USP), Jaime Roy Doxsey (Universidade Federal do
Espírito Santo), John Wood (Psicólogo americano residente em São
Paulo), Virgínia Moreira Leitão (Universidade Estadual do Ceará),
Vera Engler Cury (Pontifícia Universidade Católica de Campinas -
Puccamp), e William Barbosa Gomes (Universidade Federal do Rio
Grande do Sul - UFRGS). Os trabalhos apresentados foram
publicados em uma edição chamada Cadernos USP 2 (Rosenberg,
1987b). O evento organizado por Rosenberg foi sobre a vivência,
mas não uma vivência no sentido terapêutico e sim uma vivência
acadêmica com trabalhos previamente preparados e formalmente
apresentados. De resto, Rosenberg escolheu comentaristas para cada
exposição apresentada, tendo em vista a mobilização do debate
crítico. Uma boa síntese do pensamento da ACP na década de 1980
encontra-se no livro, Aconselhamento Psicológico, organizado por
Rosenberg (1987a) tratando dos seguintes assuntos: nota histórica
sobre o Serviço de Aconselhamento Psicológico do Instituto de
Psicologia da USP (R. Rosenberg), diferenças entre aconselhamento,
orientação e psicoterapia (M. L. Schmidt), aspectos teóricos da ACP
(H. Morato), relação terapêutica (M. P. Jordão), formação do
conselheiro (I. de Camargo), pesquisa (R. Rosenberg) e, uma
novidade, plantão psicológico (M. Mahfoud). Os colaboradores de
Rosenberg estavam, de alguma forma, vinculados ao Serviço de
Aconselhamento da USP. Também na década de 1980, a comunidade
rogeriana latino-americana articulou-se para a organização de
eventos profissionais, a partir do I Fórum Internacional, ocorrido em
Oaxtepec, México, em 1983.
Na perspectiva da nova geração (Tassinari & Portela, 1995), houve
um declínio nas atividades da ACP após as mortes de Rogers e de
Rosenberg em 1987, reativando-se na década de 1990. Com efeito,
os autores fizeram um levantamento das publicações na ACP no
Brasil e destacaram a liderança de Virgínia Moreira (ver Moreira,
1993), atualmente professora da Universidade de Fortaleza, e de
Mauro Martins Amatuzzi, professor do Programa de Pós-Graduação
da Puccamp. Outra informação interessante de Tassinari e Portela
(1995) é a comparação do número de dissertações (mestrado) e teses
(doutorado) entre 1970 a 1994. Na década de 1970 foram seis
dissertações e três teses; na década de 1980 foram sete dissertações
e seis teses; e nos quatro primeiros anos da década de 1990 foram
concluídas duas dissertações e quatro teses. Neste período foram
organizados centros de estudos e de formação em várias cidades
brasileiras, e os encontros profissionais ocorreram com certa
regularidade.
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A ACP influenciou muito o trabalho pedagógico, exercendo forte
crítica às avaliações externas dos alunos através de provas. Nessa
proposta, o professor seria um facilitador pedagógico diante das
demandas dos estudantes. A técnica de aprendizagem de inspiração
rogeriana foi revista em um número especial do periódico Education,
organizado por Cassel, ainda nos idos de 1974. As implicações do
método foram analisadas em seus aspectos positivos, quais fossem
promover maior compromisso do estudante e levá-lo a decidir sobre
suas prioridades e interesses; e nos aspectos negativos, como o
perigo de dispersão e da falta geral de controle ou de autocontrole, o
risco da demanda ser maior do que as possibilidades do facilitador, e
a dificuldade da conciliação de diferentes interesses e tempos
individuais de aprendizagem. Pesquisas sobre a aprendizagem
centrada no estudante têm sido realizadas por Justo (1988). Quanto
aos grupos, um autor que representa essa prática na ACP é Afonso
H. Lisboa da Fonseca, tendo publicado o livro Grupo, Fugacidade,
Ritmo e Forma. O autor vem desenvolvendo intensa atividade na
realização de vivências e encontro de grupos, no nordeste brasileiro.
Na década de 1990, o pensamento rogeriano foi representado por
duas publicações importantes. A primeira, foi uma obra coletiva de
John K. Wood, M. L. Assumpção, M. A. Tassinari, M. Japur, M.
Serra, e R. W. Rosenthal (1994) tratando de aspectos gerais e
contemporâneos da ACP. A segunda, foi também uma obra coletiva
dedicada ao plantão psicológico (Mahfoud, 1999). Na primeira
publicação, a ACP é definida como um jeito de ser, isto é, uma
relação positiva e confiante diante da vida, uma preocupação
construtiva e autocrítica com a eficácia e realização dos objetivos
individuais, grupais e comunitários (solidariedade), e uma
expressividade individual caracterizada pela autonomia,
flexibilidade, tolerância e crítica. Mahfoud e colaboradores retornam
ao tema do "Plantão Psicológico" que apareceu pela primeira em
1987, na última obra organizada por Rachel Rosenberg. O plantão
psicológico é uma forma inovadora de aconselhamento psicológico
em instituições, oferecido em período de tempo previamente
determinado e ininterrupto. A grande originalidade do plantão é
colocar o atendimento disponível para pessoas que estão
atravessando momentos difíceis ou que simplesmente querem
conversar com um terapeuta. O acesso ao terapeuta é simples e fácil,
ao alcance de qualquer membro da instituição onde está sendo
oferecido. No início do século XXI, Henrique Justo (2002) apareceu
com mais uma obra, intitulada Abordagem Centrada na Pessoa:
Consensos e Dissensos. É uma análise aberta, séria e crítica da teoria
e prática da ACP nos últimos 50 anos.
Fenomenologia e Psicologia
As relações entre fenomenologia e psicologia ganharam impulso nos
EUA na década de 1970, sob a liderança de Amedeo Giorgi, na
Duquesne University. O livro que marcou a aplicação da
fenomenologia enquanto método para a pesquisa empírica
psicológica foi Psicologia como Ciência Humana: Uma Abordagem
Fenomenológica, publicado por Giorgi em 1970. Neste livro, Giorgi
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criticou radicalmente o uso do modelo de ciência natural em
psicologia, e mostrou a viabilidade de uma pesquisa empírica
psicológica numa perspectiva de ciências humanas
O trabalho de Giorgi foi, contudo, precedido pela pesquisa de dois
outros psicólogos, ambos relacionados a Carl Rogers. Um deles foi
Adrian L. van Kaan (1959) que defendeu a tese A Experiência de
Ser Realmente Compreendido. Ele foi o fundador de um programa
de psicologia dedicado à fenomenologia em Duquesne, que veio a se
tornar o centro de referência para a formação em pesquisa
fenomenológica. O outro foi Eugene Gendlin (1962), que com a tese
Experiencing and the Creation of Meaning modificaria os rumos da
Psicoterapia Centrada na Pessoa, tornando-a uma abordagem
existencial. O trabalho de Gendlin ganhou força própria e ficou
conhecido como Psicoterapia Experiencial. Segundo Spiegelberg
(1972), Gendlin formulou o modelo de psicoterapia que mais se
aproximou da fenomenologia.
Na década de 1970, Giorgi e seus colegas da Duquesne University
editaram a célebre coleção Duquesne Studies in Phenomenological
Psychology, em três volumes (Giorgi et al, 1971, 1975, 1979), com
diferentes exemplos de pesquisas fenomenológicas em variados
temas. O método fenomenológico serviu, inclusive, para realização
de experimentos em memória (Colaizzi, 1971). As novidades das
aplicações do método fenomenológico de Duquesne chegaram ao
Brasil no final da década de 1970. Primeiro, na tradução do livro de
Giorgi (1970) por sua ex-orientanda Riva S. Schwartzman em 1978.
Schwartzman estudou com Giorgi em Duquesne e atualmente
dedica-se ao trabalho clínico em Belo Horizonte, em uma
abordagem fenomenológico-existencial (Schwartzman, 1986). Outra
obra representativa foi a tradução do livro de ErnestKeen
(1975/1979) Introdução à Psicologia Fenomenológica, pela
psicóloga carioca, Heliana Barros de Conde Rodrigues, professora
da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. É impossível concluir a
leitura do livro de Keen sem tentar exercitar a maneira
fenomenológica de refletir. O texto, muito criativo e de leitura
agradável, continua sendo uma boa introdução à prática da
fenomenologia como método para pensar.
A década de 1980 iniciou com o primoroso O Ser da Compreensão:
Fenomenologia da Situação de Psicodiagnóstico, de Monique Augras
(1981). Augras é uma psicóloga francesa graduada pela Université
Paris IV, em 1958. Transferindo-se para o Brasil, passou a lecionar
no Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP) da
Fundação Getúlio Vargas em 1961. Em 1970, foi convidada a
integrar o corpo docente do Instituto de Psicologia da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUCRJ). Em ambas as
instituições, Augras envolveu-se em atividades de pesquisa e
orientação de trabalhos de conclusão de curso. Em O Ser da
Compreensão Augras está preocupada com o que denominou de
crise da psicologia clínica e do ensino de psicodiagnóstico. O
primeiro capítulo tem o sugestivo título de Por que não a
fenomenologia? (p. 7). Os demais capítulos introduzem temas
clássicos da fenomenologia: a situação, o tempo, o espaço, o outro, a
fala, e a obra, neste último referindo-se à "obra implícita, de um
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fazer contínuo que nada mais é do que o próprio processo de vida"
(p. 88). O livro de Augras teve ampla circulação e aceitação nos
cursos de graduação em psicologia. Note-se que Augras chega à
psicologia fenomenológica por influência européia, baseando-se,
entre outros, em Jaspers, Heidegger, Binswanger, e Minkowski.
O segundo livro que especificou o campo para o estudo da
fenomenologia nos cursos de psicologia foi Fenomenologia e
Psicologia, organizado por Forghieri (1984). Neste livro, filósofos e
psicólogos falam sobre um novo paradigma para a pesquisa e a
clínica psicológica. Também por esta época começa a aparecer os
vários livros que contam com a participação do professor Joel
Martins , um dos nomes mais representativos das relações entre
psicologia e fenomenologia no Brasil. Em 1983, Martins e Bicudo
lançaram os Estudos sobre Existencialismo, Fenomenologia e
Educação, destacando-se a conjunção dos temas existencialismo,
fenomenologia e abordagem centrada na pessoa, sendo este último o
enfoque do capítulo dedicado à educação.
A partir daí, a pesquisa fenomenológica passa a aparecer em
dissertações, teses, artigos e livros. Entre os trabalhos destacam-se:
Cegueira: Do fato para o fenômeno (Meira, 1983); Descrição
fenomenológica da experiência da crise existencial ou angústia
(Tápia, 1984); Obesidade: Um enfoque fenomenológico-existencial
(M. Gomes, 1986); Atendimento a pais no processo de
psicodiagnóstico infantil: Uma abordagem fenomenológica
(Ancona-Lopez 1987); e Percepção de sentimentos de alunos
durante a freqüência à disciplina enfermagem psiquiátrica (Teixeira,
1989). No final da década de 1980, Dichtchekenian organizou a obra
de cunho fenomenológico-existencial intitulada Vida e Morte:
Ensaios Fenomenológicos, reunindo trabalhos do Centro de Estudos
Fenomenológicos de São Paulo, uma organização ligada a Joel
Martins. Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
destacaram os trabalhos de Amatuzzi (1989) sobre o Resgate da Fala
Autêntica e de França (1989), Psicologia Fenomenológica: Uma das
Maneiras de Fazer.
No Rio Grande do Sul, a pesquisa fenomenológica aplicada à
educação e à psicologia teve início com o retorno dos EUA de Vânia
Maria Moreira Rasche e William Barbosa Gomes, nos primeiros
anos da década de 1980, ambos professores da UFRGS. Por
influência de Rasche, Amedeo Giorgi lecionou na UFRGS, por
curtos períodos, em 1985 e 1986, retornando ainda em 1988, quando
também lecionou na PUCSP, como professor visitante (Bicudo,
1990; Gomes, 1998). A influência do método fenomenológico
ocorreu, inicialmente, nos cursos de mestrado e doutorado da
Faculdade de Educação da UFRGS, sob a orientação de Rasche.
Com a criação do Programa do curso de mestrado em Psicologia,
também na UFRGS, Gomes pôde dar continuidade a suas pesquisas
utilizando o método fenomenológico. Foram pesquisas que tiveram
início ainda nos EUA sob a orientação de Richard Lanigan (1972) na
Southern Illinois University - Carbondale. Com a transferência de
Rasche para a Universidade de Michigan, o trabalho com o método
fenomenológico concentrou-se, grandemente, no Programa de
Pós-Graduação em Psicologia. Na década de 1980, Gomes publicou
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regularmente sobre fenomenologia, divulgando o método (Gomes,
1984, 1985, 1987) e realizando pesquisa empírica, entre as quais
destacaram-se os estudos sobre efetividade em Psicoterapia (Gauer,
Souza, Dal Molin & Gomes, 1997; Gomes, 1992; Gomes, Reck &
Ganzo, 1988).
No início da década de 1990, Forghieri (1993a,) realizou um
levantamento da produção científica brasileira em livros, teses,
dissertações, artigos relacionados direta ou indiretamente à
fenomenologia. O levantamento foi solicitado pela Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (Anpepp). Os
estudos encontrados apresentaram dois aspectos em comum: a
descrição da vivência do próprio pesquisador, e a descrição dos
procedimentos fenomenológicos de pesquisa. As principais áreas de
abrangência foram a psicologia da educação e a psicologia clínica,
com pouca presença de temáticas do desenvolvimento humano. Os
problemas investigados comumente diziam respeito a situações
existenciais, como o envelhecimento, a toxicomania, a maternidade
e diferentes doenças físicas e psíquicas. De acordo com Forghieri,
diversos desses trabalhos lidavam com os sensos de sofrimento e
bem-estar, o que confirmava a tendência da conjunção entre método
fenomenológico e temas existenciais. Outra contribuição de
Forghieri (1993b), no mesmo período, foi Psicologia
Fenomenológica, um texto básico e didático, muito usado em cursos
de graduação. As relações entre psicologia e fenomenologia foram
exploradas com clareza, nos aspectos conceituais e aplicados. Os
autores citados por Forghieri como fundamentais ao seu enfoque
fenomenológico da personalidade foram Husserl, Merleau-Ponty,
Heidegger e Buber, com referências complementares a Binswanger,
Sartre, Frankl e Medard Boss (1903-1990).
No final dos anos 1980 e início dos anos 1990, o interesse pelo
método fenomenológico cresceu juntamente com popularização dos
métodos qualitativos de pesquisa. Na verdade, o método
fenomenológico passou a ser estudado em conjunto com outros
métodos qualitativos. Um exemplo, foi a criação, na cidade de São
Paulo, em 1989, da Sociedade de Estudos e Pesquisa Qualitativos
sob a coordenação de Joel Martins, Vitória Helena Cunha Espósito e
Virginia Aparecida Viggiani Bicudo, um grupo com tradição de
pesquisa em fenomenologia.
Do mesmo modo, a expansão da pós-graduação stricto sensu em
psicologia estimulou a organização de grupos de pesquisa que
mantêm uma produção regular em fenomenologia. Como exemplo
podem ser citadas as publicações sob a orientação de Mauro Martins
Amatuzzi na Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(Amauzzi, 1996; Amatuzzi, Solymos, Andó, Bruscagin, Costabile,
1991); de Marília Ancona-Lopez na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (Ancona-Lopez, 1997); de Maria Alves de
Toledo Bruns na Universidade de São Paulo - Ribeirão Preto (Bruns,
2001) e de William Barbosa Gomes na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (Gomes, 1998). Recentemente, Bruns e Holanda
(2001) reuniram textos metodológicos e relatos de pesquisa
empírica, abrindo novas possibilidades para o trabalho com
fenomenologia. A coletânea incluiu estudos sobre Brentano
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(1838-1917), Husserl, e Heidegger, e relatos de métodos recentes de
inspiração fenomenológica, como a versão do sentido proposta por
Amatuzzi ou a combinação com a semiótica proposta por Lanigan.
Por último, cabe lembrar que o trabalho metodológico e empírico
com critérios fenomenológicos é discreto e disperso entre
universidades ou entre departamentos de diferentes disciplinas.
 
Gestalt-Terapia
Gestalt-Terapia foi definida por James S. Simkin para o clássico livro
de Corsini (1979), Current Psychotherapies, como uma intervenção
psicológica não interpretativa, a-histórica, e existencial. O trabalho
do terapeuta concentra-se em orientar a atenção daquele que está
em atendimento para o "aqui e agora", na relação interpessoal
frente-a-frente sem recorrer a análises transferenciais ou contra-
transferenciais. O foco do tratamento concentra-se na atualidade do
processo terapêutico e na decisão existencial da escolha, enquanto
compromisso e responsabilidade pessoal.
A Gestalt-Terapia foi fundada pelo neuropsiquiatra Friedrich (Fritz)
Salomon Perls (1893-1970) e exposta, pela primeira vez, no livro
Gestalt Therapy publicado em 1951 em colaboração com Ralph
Hefferline e Paul Goodman, traduzido para o português em 1997
(Perls, Hefferline & Goodman, 1997). O livro traz o aporte teórico
da abordagem, acrescido de exercícios práticos descritos e
comentados. Após o falecimento de Perls, sua esposa e colaboradora
Laura Posner Perls (1905-1990) foi reconhecida como
co-fundadora, assumindo a liderança do movimento. O uso do termo
Gestalt é resultado da admiração de Perls pelos fundadores da
Psicologia Gestalt que ele conheceu, ainda na juventude, na
Universidade de Frankfurt - Alemanha. Na formulação de suas
idéias sobre a terapia, Perls foi influenciado por sua esposa Laura
Perls, pela teoria organísmica de Kurt Goldstein (1878-1965), pelos
estudos sobre holismo e evolução do proeminente político
sul-africanao Jan Christiaan Smuts (1870-1950), pelas idéias em
energia vital de Wilhelm Reich (1897-1957), pelas preocupações
com a constituição do sentido do crítico literário britânico I(vor)
A(mostrong) Richards (1893-1979), e pela teoria semântica do
polonês Alfred Korzybski (1879-1950). As proposições de Perls
foram bem recebidas pelo movimento humanista dos anos 1960,
encontrando boa acolhida junto aos movimentos de contracultura e
aos movimentos libertários que viam o crescimento individual
vinculado à perspectiva de independência pessoal e construção de
um mundo melhor (Kogan, 1976).
A Gestalt-Terapia (Frazão, 1995) é conhecida no Brasil desde a
década de 1960, por influência da teoria de Rogers, do Psicodrama,
e da pedagogia de Summerhill (Inglaterra). Há registros de
terapeutas que já estavam trabalhando no referencial da Gestalt-
Terapia em Curitiba e no Rio de Janeiro na década de 1960. A
difusão do pensamento da Gestalt no Brasil intensificou-se no início
dos anos 1970, através de grupos de estudo, com destaque para o
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grupo de Thérèse Tellegen, Jean Clark Juliano, Walter da Rosa
Ribeiro e Tessy Hantzschel. Costuma-se destacar (Frazão, 1995;
Prestelo, 2001) que um dos pontos de atração ao gestaltismo nos
idos de 1970 foi a compatibilidade ideológica com a resistência ao
regime militar. Além disso, a abordagem reservava espaço para a
criatividade e para a afirmação de estilos pessoais, ensejando a
expressão verbal e não-verbal. Do ponto de vista terapêutico, a
Gestalt-Terapia apresentava-se como um método eficaz, com
resultados terapêuticos em curto prazo. Aliados ao intenso trabalho
com grupos, esses fatores colaboraram para que essa abordagem
fosse vista como uma alternativa de intervenção de alta viabilidade,
quando comparada com o modelo tradicional da psicoterapia
individual de longo prazo.
O primeiro trabalho em Gestalt-Terapia escrito no Brasil foi o artigo
Elementos de Psicoterapia Guestáltica (ipsis verbis) de Térèse
Tellegen, publicado em 1972, no Boletim de Psicologia de São
Paulo. Téllègen, holandesa de nascimento, conheceu a Gestalt-
Terapia em Londres, fazendo formação no Gestalt Training Center
em San Diego, CA - EUA, com Erving e Miriam Polters. Ela foi
autora também da primeira dissertação de mestrado, defendida na
USP em 1982, e intitulada Reflexões sobre o Trabalho com Grupos
na Abordagem Gestáltica em Psicoterapia e Educação; e foi autora
do primeiro livro escrito e editado no Brasil, Gestalt e Grupos: Uma
Perspectiva Sistêmica, publicado em 1984 (Holanda & Karwowski,
2003). Naquele livro, Tellegen (1984) retrata o seu próprio percurso
com a psicologia da Gestalt e o trabalho com grupos, trata do
desenvolvimento histórico da Gestalt-Terapia e de suas influências, e
apresenta reflexões conceituais sobre a visão de grupos como
sistemas e o trabalho do terapeuta nos grupos. O livro conclui com o
relato de uma experiência de grupo.
O primeiro programa de formação em Gestalt-Terapia foi oferecido
em Brasília em 1977, por Walter Ribeiro. Neste mesmo ano
começaram a aparecer as primeiras traduções dos livros de Perls,
Isto é Gestalt e Gestalt-Terapia Explicada. Dois anos depois foi
traduzido Escarafunchando Fritz. Com o crescimento do número de
interessados, começaram a ser organizados, na década de 1980, os
encontros de Gestalt terapeutas, sendo o primeiro no Rio de Janeio,
em 1986. Em 1985 foi publicado o livro Gestalt-Terapia: Refazendo
um Caminho, por Jorge Ponciano Ribeiro, da Universidade de
Brasília. A obra de Ribeiro constitui-se em referência obrigatória
para os terapeutas da abordagem gestáltica no Brasil. Em 1988
apareceu a tradução de outro livro de Perls A Abordagem Gestáltica
Testemunha Ocular da Terapia. Na década de 1990 os eventos
passaram a ser denominados de Encontro Nacional de Gestalt-
terapia, e culminanaram, recentemente, com a criação da
Associação Brasileira de Gestalt-Terapia e Abordagem Gestalt
(Holanda & Karwowski, 2003).
Alguns autores (Frazão, 1995; Holanda & Karwowski, 2003)
reconheceram que, no Brasil, a proposta da Gestalt-Terapia
encontrou dificuldades para superar o preconceito segundo o qual se
trata de uma atuação a-teórica, baseada na aplicação indiscriminada
de técnicas. Aparentemente, esse estigma prevaleceu durante vários
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anos em função de um dos primeiros livros dedicados à Gestalt-
Terapia lançados no Brasil, "Tornar-se presente", de John Stevens
(1971/1976). Essa obra, embora criticada pelos adeptos da
abordagem por consistir numa mera coleção de técnicas para serem
aplicadas, havia se popularizado como referência em Gestalt-Terapia
no contexto psicológico do país. De fato, o livro de Stevens descreve
algumas séries de exercícios de conscientização para serem
executados individualmente ou em grupos, pares e casais. As
considerações teóricas resumem-se a duas páginas nas quais o autor
descreve três tipos de consciência que perfazem a experiência:
consciência do mundo exterior, do mundo interior e da atividade de
fantasia. O foco no momento presente, como foco de toda a
existência, o faz afirmar que passado e futuro resumem-se à fantasia.
Ciornai (1998), em um artigo sobre a prática e a formação da
Gestalt-Terapia no Brasil, enfatizou o interesse pelo estudo dos
fundamentos epistemológicos da abordagem. Tais fundamentos
encontram-se, segundo a autora, na fenomenologia de Husserl e
Heidegger, no existencialismo, e na filosofia oriental. Outro aspecto
diferencial da abordagem no Brasil é a abertura do espectro
aplicativo para integrar grupos, famílias, e comunidades. Um
exemplo da força do interesse no trabalho de grupo por terapeutas
gestálticos é o livro Gestalt Terapia: O Processo Grupal, publicado
em 1975, por Jorge Ponciano Ribeiro.
Holanda e Karwowski (2003) analisaram

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