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Brasília-DF. A Compreensão dAs ImAgens nA psICologIA AnAlítICA Elaboração Cassia Relva Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 5 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 6 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 8 UNIDADE I A IMAGEM NA PSICOLOGIA ................................................................................................................ 11 CAPÍTULO 1 A HISTÓRIA DA IMAGEM COMO OBJETO DE ESTUDO PSICOLÓGICO ...................................... 12 UNIDADE II A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL ................................................................................................... 19 CAPÍTULO 1 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL..................................................................... 19 CAPÍTULO 2 NISE DA SILVEIRA .................................................................................................................... 27 CAPÍTULO 3 OUTROS AUTORES .................................................................................................................. 41 UNIDADE III A IMAGEM NA PSICOLOGIA ANALÍTICA ................................................................................................ 48 CAPÍTULO 1 A IMAGEM EM CARL GUSTAV JUNG ........................................................................................ 50 CAPÍTULO 2 A IMAGEM EM JAMES HILLMAN .............................................................................................. 59 CAPÍTULO 3 A IMAGEM EM CARLOS BYINGTON ......................................................................................... 64 UNIDADE IV A IMAGEM COMO RECURSO TERAPÊUTICO ......................................................................................... 71 CAPÍTULO 1 OS SONHOS .......................................................................................................................... 73 CAPÍTULO 2 A IMAGINAÇÃO ATIVA ............................................................................................................ 78 CAPÍTULO 3 MANDALAS E JOGO DE AREIA................................................................................................ 83 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 94 5 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 7 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 8 Introdução O presente material apresentará a história da imagem como objeto de estudo da psicologia. O aluno vai conhecer um pouco das percepções de algumas teorias psicológicas sobre a imagem e as transformações ocorridas sobe a sua concepção e prática terapêutica. A imagem é um recurso importante no uso terapêutico, mas ainda pouco investigado e utilizado pelos profissionais de psicologia, muitos profissionais, independente de sua abordagem psicológica, relatam dificuldades para lidar com esse recurso nas práticas de intervenção. Em Psicologia Analítica, a imagem é um recurso muito utilizado e valorizado, porém ainda enfrenta a escassez de bibliografia como teses e dissertações sobre a temática pelo viés Junguiano sobre o mesmo recurso. Assim, procurou-se definir e apresentar os elementos de cada recurso terapêutico que utiliza a imagem sob a ótica do pensamento Junguiano. Espera-se com isso melhorar a percepção do aluno sobre o recurso, com o objetivo de estimular sua busca por aprimoramento. O material está dividido em quatro unidades. Na primeira, apresenta-se a história da imagem como objeto de estudo psicológico. Na segunda, apresenta-se a história da introdução do pensamento Junguiano no Brasil e seus principais responsáveis bem como sua contribuição ao desenvolvimento do pensamento Junguiano. Na terceira unidade, são apresentados a percepção de alguns autores sobre a imagem na Psicologia Analítica, incluindo o autor brasileiro Carlos Byngton. Por fim, na quarta unidade são apresentadas as principais técnicas de uso da imagem como recurso terapêutico: interpretação de sonhos, imaginação ativa, amplificação e mandalas, sandplay na Psicologia Analítica. Objetivos » Apresentar e permitir a reflexão da imagem como objeto de estudo psicológico. 9 » Divulgar a história da psicologia Analítica no Brasil e seus principais autores. » Discutir os métodos de aproximação e interpretação das imagens em Psicologia Analítica. » Esclarecer como as diversas correntes da Psicologia Junguiana se utilizam da imagem como recurso terapêutico. 10 11 UNIDADE IA IMAGEM NA PSICOLOGIA A investigação sobre as imagens psíquicas, sua origem e natureza ocorrem desde o início da ciência psicológica. Algumas abordagens seguem dando mais ênfase a esse fenômeno em detrimento de outras escolas psicológicas é o caso da Psicologia Analítica ou Junguiana. Emboraseja a imagem um instrumento relevante para o processo terapêutico, esse recurso possui pouco espaço tanto nas teorias psicológicas como seu uso, treinamento e intervenção durante a formação nos cursos de graduação em Psicologia. Em geral, não há pouca reflexão imagética para criação de habilidades como criar, relacionar, amplificar, buscando sua interação e interpretação das imagens, tendo em vista que o foco nos cursos de Psicologia é a formação teórica, generalista e tecnicista. Desta forma, vários objetos de estudo da psique como a imagem, os sonhos e outras linguagens seguem restritos em alguns campos e teorias, pois a formação limita-se a utilizar técnicas e relacionar seus resultados a uma abordagem. No contexto clínico, essa circunstância resulta na incapacidade dos profissionais em avançar nos objetivos terapêuticos diante de sua falta de aproximação e treinamento com esse recurso. Segundo Pope & Singer (1978), a Psicologia tem dificuldade para reconhecer, descrever ou estudar este objeto constituinte da memória, dos sentidos, das fantasias, do pensamento racional que estrutura a consciência de cada momento ao longo da vida. 12 CAPÍTULO 1 A história da imagem como objeto de estudo psicológico As teorias sobre imaginação e imagens mentais instigaram a história da Psicologia e Filosofia – John Looke, David Hume, Gottfried Wilhelm Leibniz. Numa interpretação mais remota da Filosofia, a origem do conteúdo mental é caraterizado como ideia (imagem). Buscou-se ainda fundamentar a parte intelectual, a imaginação e as leis de associação e de imagens mentais como um princípio da inteligência. Neste contexto, a palavra imagem servia para se referir a uma representação mental, elaborada na ausência de estimulação sensorial correspondente, mas, entretanto, era a representação consciente de objetos ou situações que passaram pelos sentidos anteriormente em outras circunstâncias. A imagem como objeto de estudo em Psicologia pode ser dividida em duas grandes categorias: a primeira, quando estudada a partir da nossa percepção visual, ou seja, como construímos as imagens em nosso cérebro quando estamos expostos a elas, essa foi a contribuição da escola da Gestalt, primeiro com a psicologia da forma e depois, a partir de seus estudos e postulados à criação de uma abordagem psicológica, a Gestalt-terapia. A segunda é a própria produção das imagens psíquicas como recurso terapêutico e sua relação com a psique, neste caso, a psicologia analítica desenvolveu grande aporte teórico e metodológico para investigação e interpretação desse processo. A escola da Gestalt iniciou uma discussão sobre a percepção na Alemanha e na Áustria no início do século XX. Era uma reação à ideia de compreender a experiência por meio de uma análise dos elementos separadamente dos outros e que a própria experiência seria a soma deles. Em 1912, Max Wertheimer publicou junto com Wolfgang Kohlere Kurt Koffka um experimento onde exploraram os aspectos da percepção. A descoberta central desse experimento foi verificar a percepção do movimento aparente das imagens, cuja aplicação mais próxima é o cinema, que são um conjunto de fotografias em movimento. Sua investigação foi explicar como a percepção construía um movimento advindo de uma série de estímulos móveis? O experimento levou ao seguinte resultado: o movimento aparente não foi em função de estímulos isolados, mas das caraterísticas dos estímulos e sua organização neural. A própria palavra “Gestalt” não tem uma tradução clara para a língua portuguesa, sua aproximação gira em torno das palavras forma, configuração ou jeito de como o 13 A IMAGEM NA PSICOLOGIA │ UNIDADE I nosso cérebro vê, processa e interpreta as imagens. Muitos artistas se utilizaram desses estudos para explorar nossa relação com as imagens. A teoria da Gestalt construiu sete leis ou sete postulados que se apresentam na nossa relação com as imagens: semelhança, proximidade, continuidade, pregnância, fechamento, segregação e unificação. A semelhança diz respeito à capacidade de nosso cérebro organizar figuras semelhantes como se estivessem juntas ou próximas, formando blocos. Figura 1. Fonte: http://psicologiavirtualucsal.blogspot.com/2012/11/a-gestalt.html. O agrupamento por semelhança à esquerda ocorre pela cor, enquanto a figura da direita manifesta-se pela forma. A Lei da proximidade refere-se à capacidade de nosso cérebro entender como um grupo só aquilo que está mais próximo, ou seja, partes mais próximas umas das outras, em um mesmo local, tendem a ser vistas como um grupo. Um exemplo são as teclas de um piano, que apesar de serem separadas são visualizadas como grupos de dois e três teclas em sequências. Figura 2. Fonte: http://www.descomplicandoamusica.com/classificacao-e-extensao-vocal/. A Lei da Continuidade diz que, embora uma imagem não esteja completa, nosso cérebro tende a realizar sua completude e a continuar como se ela existisse. Dois elementos alinhados são vistos como sendo relacionados. 14 UNIDADE I │ A IMAGEM NA PSICOLOGIA Figura 3. Fonte: https://www.significados.com.br/gestalt/. A pregnância refere-se à simplicidade, o cérebro tem a tendência de simplificar o que está sendo visto, depois que ele simplifica, começa a percepção dos detalhes. É uma lei muito utilizada para realizar leituras de obras de arte. Primeiro, percebe o todo e depois os detalhes. Os logotipos de grandes empresas seguem este princípio, porque precisam ser interpretados pelo cérebro de maneira clara e rápida. Figura 4. Fonte: https://www.significados.com.br/gestalt/. O fechamento ou o princípio da clausura diz respeito à capacidade cerebral de fechar a imagem, os elementos que são agrupados são completados, isto é, nosso cérebro tende a ver um objeto completo. Objetos agrupados juntos são vistos como inteiros, além disso, nosso cérebro tende a completar contornos e linhas. Figura 5. Fonte: http://mydailyoffice.blogspot.com/2014/09/. A segregação é a capacidade de separar, identificar, evidenciar ou destacar unidades num todo. É uma imagem formada por várias figuras em uma só. O cérebro, em geral, presta atenção em uma, depois na outra. 15 A IMAGEM NA PSICOLOGIA │ UNIDADE I Figura 6. Fonte: https://www.medicinecomplementari.eu/dr-ssa-tiziana-galante-articoli/58-la-psicoterapia-gestaltica-gestalt-therapy. Por fim, a Lei de unificação, o cérebro compreende uma imagem abstrata a partir de seu preenchimento. Figura 7. Fonte:http://mundodasmarcas.blogspot.com.br/2006/05/johnnie-walker-keep-walking.html. Os fundamentos sobre a percepção geraram uma série de estudos na área da aprendizagem, resultando na Psicologia Social de Kurt Lewin e uma teoria da personalidade, gerada por Fritz Perls, responsável pela ampliação da teoria da Gestalt para uma abordagem psicoterápica, a Gestalt-terapia. O fenômeno psíquico apresenta-se também a partir do fluxo de imagens. Na psicanálise, por exemplo, defende que para além das representações de imagens oriundas da percepção consciente, as imagens mentais possuem uma característica dinâmica, que mesmo sem a vontade consciente, surgem para provocar um impulso de realização de algo imaginário ou ideal. A Psicanálise tem sua origem no método das associações por imagens pela hipnose, em seguida se torna um método da associação verbal. É possível que Freud estivesse de alguma forma desconfiado da imaginação pura, e devido a sua grande ênfase na racionalidade, tendeu a ver a imagem visual ou auditiva que caracterizava os sonhos e fantasias, 16 UNIDADE I │ A IMAGEM NA PSICOLOGIA como um fenômeno regressivo que necessitava por último ser traduzido em formulações verbais. Entretanto, estava claro para Freud que só era possível atingir o inconsciente através de manifestações concretas de imagens, como representadas em sonhos ou na análise das fantasias de transferência (POPE e SINGER, 1978, p.14). Com relação à imagem, a Psicanálise relaciona-se ainda com afantasia da imagem do analista, ligada ao suposto saber do paciente e oriunda de uma ciência do final do século XIX, que se caracterizava pela racionalidade e neutralidade que cabia ao cientista interpretar e desvendar os mistérios da natureza, essa postura negava as produções humanas de base instintivas e irracionais, ou seja, essa percepção tinha como resultado despotencializar essas características ao trazê-las à luz da consciência. As reformulações dos paradigmas e posturas frente aos fenômenos a partir do século XX, conduziram a ciência a uma postura que, ao invés de querer controlar, categorizar, manipular a natureza, a percebeu como recurso e parceira. No lugar de apenas interpretar ou decodificar, percebe-se o fenômeno e sua própria linguagem sem fazer paralelismo com outras referências ou ciências. Esta postura, inclusive, vai impactar a maneira como se realiza a psicoterapia. Por exemplo, a escola inglesa de psicanálise começa a dar ênfase nos processos não verbais do trabalho psicoterapêutico com Winnicott, ele desenvolve várias técnicas com crianças e adolescentes para intervenção com o uso de imagens. Outras abordagens, como a psicoterapia reichiana e a Gestalt-terapia, vão trabalhar as imagens produzidas dos registros corporais. A linguagem verbal será mais um recurso de aproximação com a experiência em si. Alguns autores da Gestal-terapia vão discutir a expressão da imagem em linguagem artística. A arte vista por esta abordagem tem o objetivo de aproximar as pessoas da experiência criativa e que por meio dela os conflitos psíquicos podem ser mais percebidos e reorganizados. Na Psicologia Humanista, Nathalie Rogers, filha do criador da abordagem, Carl Rogers, recorre à arte como possibilidade expressiva com a pintura, o desenho, modelagem, teatro e desenho, acredita que estas podem realizar a conexão criativa de conteúdos, ao contrário de interpretar, elas seriam pontes para facilitar a verbalização. Nas novas abordagens de base cognitiva-comportamental, as técnicas construídas são fundamentadas na habilidade imaginativa humana. No poder de transformação das representações por meio das imagens a partir da visualização. Entretanto, no campo científico, até a década de 1970, a Psicologia dedicou pouco espaço de investigação das imagens como objeto terapêutico. Atualmente, as abordagens psicoterapêuticas fazem uso mais ou menos frequentes das imagens. 17 A IMAGEM NA PSICOLOGIA │ UNIDADE I Para McMahon e Skeikh (1984), a relação delas com o uso das imagens as organizaram em quatro categorias: 1. As imagens como estímulos para métodos de condicionamento, ligados às teorias comportamentais. 2. Abordagens que utilizam a produção das imagens como instrumento para investigar as questões emocionais ou distorções da percepção. 3. Abordagens que usam as imagens como recursos de pesquisa na área de saúde física ou mental, mas não realizam formulação de teorias ou interpretações. 4. Abordagens que usam técnicas de produção das imagens - imaginação ativa, jogo de areia – sandplay - e fazem interpretações de prognósticos, é o caso da Psicologia Analítica. Pode-se afirmar que hoje todas as abordagens terapêuticas fazem uso de forma mais ou menos consciente da imagem como recurso da prática clínica. Embora utilizada em frequência menor, as imagens como recurso terapêutico vêm alcançando sua valorização nas diferentes abordagens bem como atingindo mudanças de interpretação sobre seus conteúdos, que outrora eram vistos como patológicos ou regressivos, reduzindo o recurso das imagens e hoje passam por uma postura de dar a elas maneira não interpretativa e de amplificação. Ao invés de traduzir os conteúdos das imagens, busca-se uma conexão com a vivência e as emoções produzidas a partir de sua criação. Para a Psicologia Analítica, a imagem não é apenas resultado da percepção, uma atividade da memória ou da transferência de energia psíquica, mas uma linguagem da psique, uma habilidade inerente e autogeradora em si mesma. A imagem é a linguagem da expressão natural da psique, base de todos os processos psíquicos. Nesse sentido, ela tem coerência e validade em si mesma, sem necessidade de ser traduzida ou transposta para outros sistemas ou linguagens. Ela é a matéria-prima da psique, que pode ser trabalhada, cultivada, ativada, contemplada, mas não reduzida a explicações ou a conceitos. (SANT’ANNA, 2001, pg 21). Na Psicologia Analítica, a imagem é compreendida como questão fenomenológica e psicodinâmica, uma função compensatória da psique, entre suas polaridades, é o consciente e o inconsciente, e não pode ser reduzido nem a um nem a outro. Para Samuels (1989), a imagem como objeto de investigação da psique na Psicologia Analítica ou Junguiana passa por diversas discussões e destaca três eixos teórico-práticos 18 UNIDADE I │ A IMAGEM NA PSICOLOGIA dessa abordagem como maneira de observação – clássico, desenvolvimentista e arquetípica. A Psicologia Analítica clássica concentra seus estudos na observação das imagens oníricas e sua relação com os complexos utilizando a técnica da imaginação ativa. Seu foco é no fim e não nas causas que geram as imagens, mas no potencial que elas possuem no processo, buscando imagens semelhantes nas mitologias, nas religiões e nos símbolos de modo a realizar comparações esclarecedoras. Já os estudos da linha desenvolvimentista abordam as imagens sobre a ótica do indivíduo. As imagens são vistas como um movimento compensatório que se realiza de maneira diferente de acordo com as etapas do desenvolvimento do ego a partir dos padrões arquetípicos. Essa perspectiva propõe um modelo de desenvolvimento da consciência que parte do estágio de indiferenciação (self), passando pela etapa de simbolização imagética para o estágio de diferenciação. Na abordagem arquetípica, o foco não é uma atitude reflexiva sobre as imagens e a tentativa de uma organização lógica de suas vivências, o objetivo é contribuir e potencializar o acesso às imagens em busca da integralidade da consciência e inconsciência. O caráter arquetípico que se dá está relacionado à ideia de que qualquer imagem é capaz de evocar significados e pode se tornar arquetípica quando trabalhada no sujeito. Entretanto, independente da maneira como se aproximam das imagens, há convergência entre as correntes da Psicologia Analítica no que diz respeito a não interpretação das imagens em detrimento do fluxo imagético e da constituição paradoxal da psique. A prática clínica, devido sua complexidade, exige de seus profissionais a busca por novos modelos de intervenção que sejam capazes não apenas de teorizar sobre o psiquismo, mas estarem mais próximos dos resultados oriundos das atividades psíquicas, as imagens são um deles. Nas diferentes abordagens citadas, evidenciamos um gradual reconhecimento do valor criativo, adaptativo e terapêutico da produção das imagens psíquicas. 19 UNIDADE IIA PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL O gesto tem um valor enorme. O olhar tem uma importância muito grande, mas o psiquiatra firme os pés na palavra e quer traduzir tudo em palavras. Ninguém está pretendendo desmerecer a palavra, mas há muitas outras maneiras de comunicação. Então nós nos preocupamos em fazer a leitura das imagens, desenhadas ou pintadas pelos doentes. E verificamos que elas muitas vezes são mais fortes, mais intensas, mais carregadas de emoção que a linguagem racional (Nise da Silveira, psiquiatra brasileira, 1905-1999) Nesta unidade, vamos apresentar um breve panorama sobre a história da Psicologia Analítica no Brasil, as contribuições da Psicologia Junguiana brasileira, com o foco na produção dos psiquiatras Nise da Silveira, Carlos Byington, Walter Broechat, além dos trabalhos desenvolvimentos no Brasil pelos psicólogos Gustavo Barcelos e Waldemar Magaldi. CAPÍTULO 1 História da Psicologia Analítica no Brasil A história da Psiquiatria e da Psicologia no Brasil é repleta de inúmeros trabalhos,porém os primórdios da Psicologia Analítica no Brasil, segundo Motta (2010), é um campo com escassas investigações realizadas tanto por psicólogos Junguianos quanto pelos historiadores da Psicologia. As Raízes da Psicologia Analítica no país foram contempladas dentro de um projeto de resgate intitulado “Histórias da Psicologia no Brasil”, produzido pelo Conselho Federal de Psicologia. Há poucas referências da Abordagem Junguiana como escola de pensamento psicológico no país, tanto na formação do psicólogo como também na produção científica. Desta forma, a Psicologia Analítica foi introduzida no Brasil pela Psiquiatria, formação de origem de seu fundador, Carl Gustav Jung. Para compreender a inserção e desenvolvimento da Psicologia Junguiana no país serão necessários esclarecer a história da Psiquiatria e seus desdobramentos. 20 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL A assistência “psis’ no Brasil A assistência psiquiátrica no Brasil seguiu os moldes europeus. O aumento da população e seus problemas eram vistos como fenômeno de saúde. Assim, categorias sociais como mendigos, prostitutas e loucos eram institucionalizados. Em 1852, foi inaugurado o Hospício Dom Pedro II, com o objetivo de atender todo o território imperial, entretanto, sua capacidade se mostrou insuficiente com pouco mais de um ano de funcionamento. No início do século XX, o país contava com cerca de 20 instituições psiquiátricas distribuídas em diversas cidades, porém não conseguiu absorver a demanda de ex-escravos, que ficaram em situação de vulnerabilidade, após a abolição da escravatura, em 1888, tampouco a quantidade de imigrantes que chegaram ao país para substituir a mão de obra escrava. Com a chegada da República, em 1889, a proposta do Hospício D. Pedro II foi modificada e passou de assistencial para higienista, onde foram inseridos critérios científicos para o acompanhamento dos internos. Na primeira década do século XX, em São Paulo, o Hospício de Juquery tinha como prática a descrição e classificação de quadros, interpretados pelas teorias organicistas da época sobre os transtornos mentais. As práticas empregadas neste período instauram as colônias agrícolas como recurso terapêutico aos internos, influência das pesquisas do médico francês, Philippe Pinel, após várias observações feitas por ele em instituições europeias. Em 1910, surge, no Rio de Janeiro, a Colônia Agrícola de Engenho de Dentro e seu diretor, Gustavo Riedel cria a Liga Brasileira de Higiene Mental, em 1923. Ridel inaugura também o laboratório de Psicologia na Colônia de Engenho de Dentro, lugar pioneiro dos estudos psicoterapêuticos no Brasil, para além das influências da Psiquiatria. Em 1932, o laboratório tornou-se o Instituto de Psicologia do Ministério da Educação e Saúde Pública, incorporado à Universidade do Brasil, em 1937. Na década de 30 do século passado, é fundada a Escola Paulista de Medicina (1933) e o Instituto de Psiquiatria da Universidade do Brasil (1938). Nos trabalhos de Arthur Ramos de Araújo, médico psiquiatra, psicólogo social, folclorista e antropólogo brasileiro, produzido em 1926, já constavam referências aos conceitos junguianos. Na década de 1930, a Colônia de Engenho de Dentro criou um ambulatório como recurso para acompanhar algum desenvolvimento para assistência aos doentes mentais. Nos anos seguintes, as terapias biológicas ganharam mais ênfase com o coma insulínico e métodos com eletricidade e convulsivantes. 21 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II O Centro Psiquiátrico D. Pedro II em Engenho de Dentro foi um importante espaço de pesquisa e estudos dos fenômenos da mente. Nele, conviveram durante décadas ideias conflitantes entre si, trazendo para o país o que existia de mais atual e inovador nos tratamentos da área. A Terapia Ocupacional foi introduzida em meados da década de 1940, na Colônia de Engenho de Dentro. Em maio de 1946 a psiquiatra Nise da Silveira abre a primeira oficina de costura na Seção de Terapêutica Ocupacional (STO). Em setembro do mesmo ano, é inaugurado o ateliê de desenho e pintura. Em 1947, é realizada a primeira exposição com 245 pinturas no Ministério da Educação. Em 1949, uma segunda exposição é realizada com o título: Nove artistas de Engenho de Dentro no Museu de Arte de Moderna de São Paulo, no ano seguinte, as pinturas dessa exposição participam do 1º Congresso Mundial de Psiquiatria em Paris. No livro Imagens do inconsciente (2015), Nise da Silveira mostra o trabalho realizado com as imagens feitas pelos pacientes do Ateliê de Pintura, que passou de um dos setores da Seção da Terapêutica Ocupacional a Museu de Imagens do Inconsciente, em 1952. Em 1954, Nise da Silveira escreve uma carta ao psiquiatra suíço Carl Gustav Jung com algumas fotografias de mandalas brasileiras, sua correspondência com Jung foi respondida pela secretária e colaboradora Aniela Jaffé, em 15 de dezembro de 1954. O psiquiatra suíço solicita dados sobre as imagens recebidas do Brasil. Inúmeras referências colocam este fato como marco inicial da Psicologia Analítica no Brasil. Em 1957, Nise da Silveira viaja a Zurique como bolsista do CNPQ e vai estudar no Instituto C. G. J. É recebida por Carl Gustav Jung, em sua casa, a residência de Küsnacht, em 14 de junho de 1957. Jung recomenda a Nise da Silveira o estudo de mitologia para compreender a produção de seus pacientes. Em setembro do mesmo ano, o II Congresso de Psiquiatria em Zurique é realizado e Nise da Silveira apresenta a exposição “esquizofrenia em imagens”. Ela também inicia sua análise com outra importante analista junguiana, Marie Louise von Franz. A psiquiatra brasileira volta a Zurique em 1958, 1961, 1962 e 1964. Em 1965, surge o primeiro número da Revista Quartérnio, editada pelo Grupo de Estudos C. G. Jung. No mesmo ano, Psicologia e Religião de Carl Gustav Jung é o primeiro livro traduzido para o português. Kirsch (2000) afirma também ser Nise da Silveira a responsável pelo primeiro livro sobre Jung no Brasil, publicado pela editora José Álvaro, com o título Jung, vida e obra, em 1968. Neste ano, também é criado o Grupo de Estudos do Museu de Imagens do Inconsciente. 22 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL Outro marco relevante para a compreensão da Psicologia Analítica no Brasil ocorre em São Paulo. No início dos anos de 1960, o ex-presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, professor Darcy Uchoa assume a psiquiatria da Escola Paulista de Medicina, que leva à introdução da visão psicodinâmica e ênfase na psicanálise. Além disso, os estudantes da área começaram um percurso de aproximação com autores dissidentes da teoria freudiana, dentre eles, estava Carl Gustav Jung. Nesta época, a PUC-SP começa a se constitui com sua diversidade de linhas e abordagens em psicologia em seu curso de graduação. Em 1971, o médico ginecologista húngaro Pethó Sándor é contratado para o corpo docente do curso de psicologia. Sándor é estudioso da Psicologia Analítica e a PUC-SP se consolida como lugar onde a psicologia analítica se desenvolve no país. Sándor lidera o grupo de estudos e coordena os debates de obras de Carl Gustav Jung ainda não traduzidas para o português na época. Pethó Sándor é o criador do método da calatonia, com bases em conceitos junguianos, aceitos e utilizados por alguns analistas junguianos. Em 1981, Sandór se vincula ao Instituto Sedes Sapientiae e é responsável pela fundamentação do curso de especialização em Psicologia Analítica na instituição. Sua vertente ligada ao corpo levou à construção de um curso de Psicoterapia de orientação junguiana coligada a técnicas corporais, que publica desde 2001 a revista Jung e Corpo. Em São Paulo, também se encontrava o psicólogo belga Léon Bonaventure. radicado no Brasil desde 1968, ele havia feito sua formação e análise no Instituto Carl Gustav Jung de Zurique. Seu primeiro contato com o Brasil ocorre em 1967 para visitar a psiquiatraNise da Silveira, onde contribui também com um artigo na Revista do Grupo de Estudos C. G. Jung, fundado e coordenado por Nise da Silveira, grupo que se reunia de maneira informal desde 1954 e obtém sua formalização em 1969. Bonaventure começa a receber médicos psiquiatras paulistas para análise junguiana, que também se reuniam para estudar a obra de Jung. Leon Bonaventure convidou analistas junguianos estrangeiros para visitar o país como presidente da Sociedade Internacional de Psicologia Analítica, Adolph Guggenbhul - Graig. O grupo realizou palestras, seminários e supervisões. Os estudiosos do Brasil da obra junguiana receberam a sugestão de fundar uma associação no país. A ideia foi aprovada no VII Congresso Internacional de Psicologia Analítica realizado na Itália, em 1977. O Brasil comemora o centenário de nascimento de Carl Gustav Jung em 1975 no Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. Nise da Silveira se aposenta compulsoriamente. Neste ano, ainda é firmado o contrato para a tradução completa das obras de Carl Gustav Jung. 23 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II A Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica (SBPA) é fundada no dia 13 de março de 1978, foi a primeira instituição junguiana na América Latina a se tornar membro da International Association for Analytical Psychology (IAAP). A SBPA oferece desde 1979 cursos de formação de analistas junguianos por meio de seus Institutos de Formação em São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo o psiquiatra Glauco Uston, em depoimento no primeiro número da revista Cadernos Junguianos (2005) alega que por divergências ideológicas, antes mesmo da fundação da SBPA, Leon Bonaventure se desliga do grupo articulador assim como outros analistas junguianos após pertencerem à SBPA. Em 1991, foi criada a Associação Junguiana do Brasil (AJB), devido às divergências com a SBPA. A IAAP, apesar de ser contra a associação de duas entidades da mesma área, filia a IAAP em 1995, durante o Congresso Internacional em Zurique. Para ser reconhecida exige que sua primeira formação seja composta por no mínimo dez analistas e sob a supervisão do presidente e vice-presidente da IAAP respectivamente na época: VerenaKast e Luigi Zoja. A ABJ promove o pensamento e a prática da Psicologia Analítica por meio de veículo como os Cadernos Junguianos e seus departamentos: Psicologia Analítica e Alma Brasileira; Psicologia Analítica e Espiritualidade; Psicologia Analítica e Literatura; Psicoterapia Infantil e Adolescente; Arte e Psicologia Analítica; Psicologia Analítica e Família; Epistemologia e Pesquisa; Psique, Corpo e Psicologia Analítica; Psicologia Analítica e Imaginação Ativa e Psicologia Arquetípica. A AJB possui oito Institutos Junguianos no país para os cursos de especialização e formação de analistas: Instituto Junguiano de São Paulo (IJSP), Instituto Junguiano do Rio de Janeiro (IJRJ), Instituto C. G. Jung de Minas Gerais (BH), Instituto de Psicologia Analítica de Campinas, Instituto Junguiano do Paraná (Curitiba), Instituto Junguiano do Rio Grande do Sul (Porto Alegre), Instituto de Psicologia Analítica da Bahia (Salvador) e Instituto Junguiano de Brasília. O movimento Junguiano no Brasil também cria novos espaços para a formação da teoria e Prática Analítica. Em 1988, o Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa (IJEP) é idealizado por Waldemar Magaldi Filho, psicólogo e Ercilia Simone Magaldi, filósofa, pedagoga, especialista em Psicologia Junguiana. Em parceira com a Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo (Facis), iniciam suas aulas em São Paulo e em outras capitais como Rio de Janeiro e Brasília, oferecendo várias especializações como Psicologia Junguiana, Psicossomática Junguiana, Arterapia e Expressões Criativas e Dependências Abusos e Compulsões. Em 1998, ocorre o I Congresso Latino americano de Psicologia Analítica no Uruguai, que ocorre de três em três anos. Em 2018, chegamos ao VIII Congresso latianoamericano 24 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL de Psicologia Junguiana, na Colômbia com o tema identidades latinoamericanas: luzes e sombra. No Brasil, a Associação Junguiana do Brasil vem promovendo os Congressos Brasileiros de Psicologia Analítica em território nacional. Em 2003, a PUC-SP lança o Núcleo de Estudos Junguianos (NEJ) do Programa de Pós-graduados em Psicologia Clínica da PUC-SP, oferecendo o primeiro curso de pós-graduação stricto sensu em Psicologia Analítica no Brasil. Um dos estudos produzidos pelo NEJ foi a dissertação Áurea Araújo, em 2016. Descrevendo a Prática Clínica Junguiana no Brasil: Quem somos, o que pensamos e o que fazemos nós, afinal. Sua pesquisa investigou qual o perfil dos psicoterapeutas Junguianos a partir de um questionário de múltipla escolha por e-mail sobre seu perfil pessoal e profissional de abordagem Junguiana com diferentes tipos de formação e atuação no Brasil. A amostra teve 282 questionários respondidos. Como resultado, indicou que a maioria é do sexo feminino, atuam na região sudeste e são formados a mais de 30 anos. Grande parte possui especialização e alguns com doutorado. Atuam predominante em consultórios com adultos que estão em crise pessoal e realizam também atendimentos virtuais. Os psicoterapeutas Junguianos pesquisados em sua maioria estão ligados a grupos de estudos e consideram importante a produção científica para a área. Nas redes sociais também encontramos ampla divulgação da obra Junguiana em sites de psicologia e medicina como também de outros profissionais. Destacamos o projeto Jung na Prática, fundado pelo artista plástico e especialista em Psicologia Junguiana e Arteterapia pelo IJEP, Lino Bertrand e outros colaboradores. Sua contribuição à obra de Jung está na divulgação de Congressos Online com entrevistas feitas com pesquisadores e profissionais de Psicologia Analítica no Brasil, além da formação de uma comunidade internacional de estudos em Psicologia Junguiana virtual. Enquanto a SBPA e AJB restringem suas formações e especializações a médicos e psicólogos de formação, o IJEP defende o espaço para a formação de terapeutas Junguianos não restritos à psiquiatra e à psicologia, ampliando o acesso da obra e da prática Junguiana a outros profissionais de formações diferentes como profissionais de artes, sociologia, antropologia, biologia, filosofia, pedagogia entre outros. Para exercer este trabalho não se requeria necessariamente que fosse médico, nem psicólogo com formação universitária, pois o conhecimento de si se adquire em primeiro lugar na experiência da vida, confrontando-se com a própria dialética interior de cada um e na relação com os outros. Normalmente um analista experimentado é 25 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II aquele que adquiriu uma verdadeira ciência da alma através da relação com seu próprio mundo interior. É lá que ele conhece na vida e na verdade o que é alma. Com esta perspectiva se explica porque o Dr. Fierz formou muitos psicoterapeutas, não só médicos e psicólogos, mas também outros profissionais de formação universitária como, por exemplo, pastores de diversas igrejas. O que ele exigia não eram diplomas, pois o hábito não faz o monge, mas cultura, dedicação e certas predisposições naturais que chamaríamos de dons inatos, qualidades humanas, inclusive éticas e, sobretudo, um sentido da alma, do símbolo e da individuação”. (BONAVENTURE in FIERZ, 1996) É importante ressaltar que a análise leiga no Brasil tanto de base psicanalítica quanto de psicologia Junguiana possui uma profunda discussão e visões divergentes. Muitos consideram que a profissionalização e restrição de determinados saberes a grupo profissionais específicos, delegando a ele a chancela de nomear ou não o sujeito como psicanalista ou analista influencia e restringe uma prática que deve ser uma conquista subjetiva fundada num tripé: estudo, análise e supervisão. Sabe-se que a psicanálise, a título de exemplo, é oferecida como teoriae abordagem dentro dos cursos de graduação em psicologia e psiquiatria, mas para os psicanalistas, a psicanálise não é psicologia e, portanto, não é uma abordagem da ciência psicológica e sim uma metapsicologia com teoria, métodos e técnicas próprias, pois seu objeto de estudo é o inconsciente. Entretanto, seu conhecimento pode ser utilizado tanto por psicólogos quanto por outras áreas e não é restrito à Psicologia. Porém, a profissão de psicanalista não é regulamentada no país, ou seja, não possui um Conselho Profissional de Psicanalistas. Um Conselho profissional é uma autarquia que tem como atribuições a fiscalização, orientação e normatização de profissionais de uma determinada área e que presta serviço de proteção e acolhimento à sociedade para casos de condutas ilegais de seus inscritos. Neste sentido, pessoas que se sentirem lesadas por algum serviço prestado podem realizar uma representação contra aquele profissional em seu conselho profissional, como o conselho de medicina ou psicologia. Analistas Junguianos, por exemplo, sem formação em medicina ou psicologia devem, embora não seja obrigatório, se filiar em algum instituto ou associação Junguiana que estimule a troca e o aperfeiçoamento contínuo, além de ter um registro profissional de terapeuta. O Conselho Federal de Psicologia regulamenta a atuação do psicólogo na psicoterapia, conforme Resolução CFP-010/2000. Entretanto, de acordo com a legislação brasileira, a psicoterapia não é uma atividade privativa de psicólogos, podendo ser praticada por outros profissionais, desde que não utilizem o título de psicólogo. 26 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL A profissão de Psicólogo está regulamentada pela Lei 4.119/1962, que dispõe sobre os cursos de formação em Psicologia e regulamenta a profissão de Psicólogo. Cabe a ele o exercício da profissão de Psicólogo como também o ensino da Psicologia. A referida lei restringe como função privativa do Psicólogo a utilização de métodos e técnicas psicológicas com os seguintes objetivos: diagnóstico psicológico; orientação e seleção profissional; orientação psicopedagógica; solução de problemas de ajustamento. Desta forma, é importante orientar que algumas técnicas e métodos que tenham como base a ciência psicológica só podem ser utilizados por psicólogos. A discussão da psicoterapia como prática não restritiva a psiquiatrias e a psicólogos tem gerado um cenário acirrado entre psicoterapeutas – psiquiatras, psicólogos e analistas - psicanalistas e analistas Junguianos e outros terapeutas sem formação nessas áreas. Consideramos importante ampliar e qualificar esse debate com algumas informações. A Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), do Ministério do Trabalho, é uma publicação que norteia os campos de atuações no Brasil. Ela reconhece, nomeia e descreve as características das ocupações no mercado de trabalho. Está estruturada por famílias e cada uma constitui um grupo de ocupações semelhantes. Sua última versão é de 2002. A CBO descreve as profissões de psicanalistas, analistas, terapeutas e psicoterapeutas. (Portaria nº 397/TEM de 09/10/2002, sob o nº 2515.50). Embora tanto a análise de base psicanalítica quanto de base analítica não seja restrita aos profissionais da medicina e psicologia no país, a psicoterapia é um campo de atuação multidisciplinar que engloba inúmeros profissionais de diversas áreas e formações. Desta forma, mais do que a discussão sobre reserva de mercado deve-se pensar nos resultados e consequências de uma prática sem compromisso com a ética e com os postulados adequados. Tendo em vista a discussão que este assunto tem gerado, o debate precisa ser estimulado ainda nas formações para que se possa pensar em soluções. Uma delas poderia ser a criação de um Conselho Federal de Psicoterapeutas, que reunisse todos os profissionais que trabalham com psicoterapia - psicanalistas, analistas Junguianos, psicólogos, psiquiatras e terapeutas, para orientar, fiscalizar, normatizar e proteger a sociedade e a própria área de atuação de profissionais que fazem uso inadequado, tendo como critério uma gestão multidisciplinar para a promoção de resoluções e orientações adequadas aos profissionais de acordo com sua formação e linha de atuação. 27 CAPÍTULO 2 Nise da Silveira Figura 8. Fonte: https://www.historiadealagoas.com.br/nise-da-silveira.html. Conhecer a história da Psicologia Analítica no Brasil pressupõe passar pela história pessoal e o contexto coletivo de seus pioneiros. Um dos mais importantes é Nise da Silveira, não apenas pela introdução da obra de Carl Gustav Jung no pensamento da saúde mental brasileira, mas pelas mudanças que potencializou no atendimento de pessoas com o sofrimento psíquico grave. Compreender o “Zeitgeist”, isto é, o espírito dos tempos em que estava inserida e sob o qual introduziu e combateu os paradigmas dominantes à luz da Psicologia Analítica se torna necessário para conhecer sua inovação. A psiquiatra alagoana Nise da Silveira viveu em uma época de acirrado debate científico médico sobre as origens das doenças mentais, polarizado entre psique e matéria. Esse cenário no Brasil, no entanto, favoreceu para que a obra Junguiana no país chegasse a partir de sua atuação e pensamento contrário ao modelo organicista. Ela é considerada, junto com PethöSandor e Léon Bonaventure, os pioneiros da Psicologia Analítica no Brasil. Nise da Silveira foi o nome dado por seus pais, Faustino Magalhães da Silveira e Maria Lydia, a sua primeira e única filha, nascida em 15 de fevereiro de 1905, em homenagem à musa Nise do poeta inconfidencista Cláudio Manoel da Costa. Seu pai era professor de matemática e jornalista. Como jornalista trabalhava num jornal de oposição ao governo, o Jornal de Alagoas. Sua mãe era uma exímia pianista, conhecida como Dona Nazinha. 28 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL Sua casa costumava receber artistas e intelectuais para saraus. O trabalho manual de seus pais com a tipografia no jornal e o piano de sua mãe chamava a atenção da pequena Nise. A leitura foi estimulada desde cedo na biblioteca da própria casa, gostava de Machado de Assis, cuja obra cita em seus escritos bem como na adolescência gostava de ler filosofia. Nise teve influência também da cultura francesa durante sua formação primária, ao estudar em um colégio dirigido por freiras francesas. O ofício de professor de seu pai trazia a sua casa estudantes para prestarem exames para a Faculdade de Medicina, esse fato, para alguns biógrafos, influenciou seu interesse pela medicina, embora ficasse tonta ao ver sangue. Em 1920, aos quinze anos, finaliza sua formação no Colégio Santíssimo Sacramento e vai para Salvador realizar os exames com outros colegas alagoanos, entre eles, Arthur Ramos. Nise ainda não tinha idade suficiente para prestar os exames para o curso de medicina, a saída encontrada foi alterar sua idade para os 16 anos. Ambos aprovados, ingressam em 1921 no curso de Medicina. Há poucas informações disponíveis sobre este período da vida de Nise da Silveira, ela era a mais nova no curso e a única mulher matriculada entre 157 alunos. No livro a Trinca do Curvello, a autora Elvia Bezerra relata fatos da vida de Nise (1995). Conta que um de seus professores a testou nos primeiros dias de aula ao oferecer à única mulher presente uma serpente para que segurasse. Neste período em Salvador, ela passou a morar com seu primo, Mário Magalhães de Silveira, colega do curso de medicina, que se tornou um importante sanitarista. Apesar do ambiente hostil que Nise enfrentou na faculdade, algumas experiências dessa época são vistas como importantes em sua formação. Uma delas são as visitas realizadas aos pacientes no setor de clínica médica do Hospital Santa Isabel, coordenado pelo professor Prado Valadares, em oposição à educação praticada de olhar o ser humano de forma fragmentada a partir de seus órgãos. Outro fato que teria influenciado sua escolhapara longe da clínica médica foi sua aversão à sangue. Durante a faculdade de medicina, Nise da Silveira não teve contato com a obra de Carl Gustav Jung, porém seu colega e conterrâneo, Arthur Ramos, realizou seu doutorado com a tese Primitivo e Loucura com grande enfoque na obra de Freud e Jung. Para alguns estudiosos, devido à proximidade entre Arthur Ramos e Nise de Silveira, é possível que Nise tenha conhecido as ideias de Carl Gustav Jung ainda na faculdade de medicina. Outro dado importante de sua biografia foi o trabalho de conclusão do curso de medicina, que trazia uma perspectiva social para a prática médica. Seu “Ensaio sobre a criminalidade da mulher do Brasil” defendia que há fatores sociais preponderantes na 29 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II determinação de um crime como os aspectos econômicos e educacionais. Segundo Nise (1992), existe uma mistura entre criminosos com doentes mentais e que a medicina deve contribuir para construção de alternativas sociais. As teorias tradicionais de criminologia predominante da época explicavam a participação da mulher neste contexto não como uma questão social, mas como uma deficiência em sua natureza, normatizada como dócil e pacífica. As mulheres teriam menos “tendências” criminosas que os homens? Existe diferença nas motivações e na forma como os atos criminosos são praticados por mulheres e por homens? Essas perguntas foram respondidas de forma distinta ao longo da história. O estudo de Nise da Silveira sobre as mulheres é pioneiro em muitos aspectos. No século XIX, o Estado precisava justificar o controle e contradições sociais que aumentavam em vários países da Europa. A necessidade de criar uma política contra a criminalidade, a partir dos estudos sobre o crime e com base científica, exigiu a mudança de paradigma, que foi estruturada no método experimental. Por meio de observações do criminoso e de seu meio foram criadas teorias sobre a construção do perfil criminoso. Uma das teorias mais conhecidas da época veio de Cesare Lombroso, psiquiatra, higienista, criminologista, antropólogo italiano. Ao considerar que a espécie humana teve processos de evolução distintos, ele cria categorias de grupos inferiores e superiores. Os seres humanos advindos de grupos inferiores tinham características selvagens e essa herança tinha como resultado condutas criminosas. O pesquisador italiano investigou grupos de homens e mulheres que estavam cumprindo penas, sem levar em consideração o preconceito e a falta de mobilidade social de alguns grupos vistos como indesejáveis. Formulou a tese da hereditariedade criminal ao perceber que a maior parte dos presos era descendente de pessoas de grupos indesejáveis, como prostitutas e criminosos. Seus estudos contribuíram para a manutenção do preconceito racial devido ao uso de avaliação de sua ciência. Com sua postura de classificar criminosos, Lombroso aproximou o direito da medicina e defendia que cabia ao médico e não à justiça o tratamento e cura destas pessoas. Em muitos casos, no entanto, afirmava ser incurável o “doente’ e a solução deveria ser a separação permanente deste da convivência social. Como eram considerados doentes e não poderiam ser responsabilizados por seus atos, a pena começa a ser vista não como forma de coerção, mas uma tentativa de tratar e curar o “criminoso”. (FARIA, 2010) Essa nova “ciência” teve o papel de comprovar a suposta inferioridade feminina, além de delimitar os comportamentos aceitos dentro da chamada “normalidade”, ou seja, comportamentos que não fossem 30 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL contrários às normas sociais e aos papéis esperados para as mulheres.” (FARIA, 2010, p. 161). Lombroso pesquisou também o universo feminino. Em sua obra The Female Offender, de 1895, ele classificou mulheres criminosas como natas, criminosas ocasionais, ofensoras histéricas, criminosas de paixão, suicidas, mulheres criminosas lunáticas, epilépticas e moralmente insanas. Para ser considerada uma mulher criminosa era necessário ter alguma característica física e, entre outras, ter clitóris e grandes e pequenos lábios em tamanho grande, que eram associados à pratica da masturbação e do lesbianismo. O “desvio sexual” era fator indicador de criminalidade. Os métodos de Lombroso foram questionados por sua fragilidade com relação à metodologia científica utilizada. Além disso, ele reconheceu que há exceções ao resultado de sua pesquisa e não estabeleceu uma relação plausível entre características antropométricas com a previsão de condutas delituosas. Fez ainda considerações em sua tese ao longo dos anos, quando incluiu elementos como clima, condições sociais e aspectos das cidades. (FARIA, 2008). Os estudos de Lombroso influenciaram várias pesquisas, algumas delas tendo como foco as diferenças entre homens e mulheres, que as colocavam como categoria inferior. Um exemplo é o estudo realizado por Lívio de Castro, em 1887, no Brasil, intitulado A Mulher e a Sociogenia, onde afirma que a mulher possui menos cérebro do que o homem. Segundo o método classificatório da Escola Positivista, as mulheres faziam parte do grupo “cientificamente” inferior, o que fez com que não fossem vistas como grande ameaça social, ou pelo menos, podiam ser contidas com maior facilidade do que os homens (FARIA, 2010). Esse reducionismo biológico e psicológico perpetuado pela criminologia positivista converge com o modelo de sociedade patriarcal, visto que ambos têm colocado as mulheres em posição de fragilidade e dependência, isto é, são atribuídas ao sexo feminino características que fazem parte de um estereótipo de sujeitos menos capazes (LIMA, 2007). Os comportamentos das mulheres de “bem” foram delimitados dentro de uma norma, de maneira que elas deveriam agir de acordo com as normas sociais ou com os papéis esperados (FARIA, 2010). A mulher honesta apresentaria um estereótipo pautado na maternidade, fidelidade, recato e virgindade, com uma sexualidade condizente com a sua idade e estado civil, ou seja, ela seria o oposto da prostituta (SILVA, 1983). Por conseguinte, é justamente a figura da prostituta a primeira figura feminina de destaque nos discursos criminológicos (ZAFFARONI, 2005). É importante ressaltar que as categorias construídas para identificar homens e mulheres criminosos 31 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II tinham enfoques diferenciados. Enquanto a masculina associava a criminalidade às características físicas menos atraentes, as mulheres criminosas estavam relacionadas aos tipos atraentes. A beleza e a sedução eram consideradas atributos da mulher criminosa e associadas à periculosidade. Com eles, as mulheres teriam maior aptidão para enganar pessoas. Para Lombroso (1980), era mais difícil identificar uma mulher criminosa do que um homem criminoso, pois ela possuía características tidas como normais. As mulheres criminosas encontravam-se, em grande número, entre as prostitutas, temidas pela sociedade e bastante estudadas pela ciência do período. A prostituta ligava-se à ideia de uma mulher dominada pelos vícios, pelas paixões, com preguiça e resistência à mudança, não sendo a prisão capaz de reeducar. Segundo Lombroso (2001), a prostituta não era vista apenas como imoral e degenerada, sua conduta sexual a levava a outros delitos. Lombroso (1980) chegou ainda a estabelecer características entre mulheres e prostitutas. Elas representavam uma ameaça aos padrões rígidos de feminino estabelecidos nos papéis de esposa e mãe. As prostitutas possuíam uma forma diferenciada de conviver com a sexualidade e se não fossem censuradas, reprimidas e eliminadas, seu padrão de comportamento poderia ser seguido por outras mulheres. O controle era voltado para este grupo de mulheres e a sua criminalidade era atribuída previamente pelo social e não pelas leis penais. A prostituição encontra-se historicamente relacionada a uma ideia de desonestidade e ameaçaà família. (VENERA, 2003). Na prostituta estava o equivalente ao homem criminoso por possuir comportamentos mais ameaçadores e perigosos do que outros crimes considerados femininos como o aborto e o infanticídio (ZAFFARONI, 2005). Outro padrão de mulher associado à criminalidade eram aquelas de características físicas e comportamentos tidos como masculinos. Eram consideradas como perigosas por sua semelhança com os homens e por terem rompido com o padrão de comportamento feminino esperado. (FARIA, 2008). A criminosa masculinizada é calcada pelo discurso criminológico positivista como detentora de uma periculosidade nata, uma anormalidade sem possibilidade de tratamento, tanto quanto a figura da prostituta. Ao romper com o estereótipo de feminilidade, a figura da criminosa masculinizada se tornou o oposto da frágil donzela (VENERA, 2003). Portanto, o feminino criminoso é considerado duplamente desviante, pois não só transgride a lei, como também os papéis de gênero convencionais (CUNHA, 1994; HEIDENSOHN, 1985). O pioneirismo de Nise da Silveira em sua tese está exatamente em desvincular a biologia e a hereditariedade das questões sociais e da educação. 32 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL A titulação de Nise da Silveira era uma grande expectativa de seu pai, que foi a Salvador assistir sua defesa. Nise se forma no dia 2 de dezembro de 1926. Volta para Maceió no dia 6 de janeiro de 1927 e perde seu pai um mês depois, no dia 10 de fevereiro. Após o falecimento do marido, a mãe de Nise volta a morar com o pai e sua irmã mais nova e vende todos os objetos da família, a situação incomoda a jovem médica, que muda-se para o Rio de Janeiro e vai morar em uma pensão no bairro do Catete. Sua aversão a sangue dificultava a busca por emprego, pois as ofertas de trabalho eram nas casas de saúde. Com dificuldades financeiras, Nise da Silveira muda-se para um bairro mais barato, em Santa Tereza, na Rua do Curvelo e vai morar com seu primo e companheiro, Mário de Magalhães, tornando-se vizinha do poeta pernambucano Manuel Bandeira. No mesmo bairro também morava Otávio Brandão, membro do Partido Comunista Brasileiro e sua esposa, Laura Brandão, a quem Nise da Silveira se vinculou. Figura 9. Faculdade de Medicina da Bahia, 1921-1926. Fonte: http://www.ccms.saude.gov.br/nisedasilveira/uma-psiquiatra-rebelde.php. Apesar de sua relação com o comunista Otávio Correa Lima, para os biógrafos de Nise da Silveira, sua aproximação com o pensamento de esquerda ocorreu por intermédio de um amigo da faculdade, o cearense Hyder Correa Lima, que a convidou para assistir uma aula de direito com o professor Castro Rebelo. Neste período começou a ler Karl Marx, começou a frequentar como também se filiou Partido Comunista Brasileiro, mas permaneceu por pouco tempo. Nise da Silveira participou ainda da União Feminina do Brasil (UFB), que tinha o objetivo de defender os interesses femininos e as condições precárias das mulheres. 33 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II Em 1928, encontra um estágio na Clínica Neurológica de Antônio Austragésilo. Neste momento revela seu interesse pela psiquiatria como também realiza pesquisas para elaborar teses como trabalho para seu sustento. Em 1933, ela se inscreve num concurso para psiquiatria na Assistência a Psicopatas e Profilaxia. Muda-se para o Hospício Pedro II, na Praia Vermelha, no bairro da Urca, para se preparar para os exames. Nise foi aprovada no concurso e ficou lotada como médica psiquiatra no próprio hospital. O movimento liderado por Luís Carlos Prestes contra o governo de Getúlio Vargas ocorre em 1935. A Intentona Comunista leva a várias prisões. Nise da Silveira foi presa dentro do Hospital após ter sido denunciada por uma enfermeira que tinha acesso ao seu quarto para limpeza e encontrou livros de viés marxista. Após ser presa, Nise da Silveira vai para o Pavilhão dos Primários, local destinado às prisioneiras políticas. Nise divide a cela com a militância feminina de esquerda como Olga Benário Prestes, Maria Werneck e Elisa Berger. Nessa época, conheceu também o escritor alagoano preso, Graciliano Ramos. Nise da Silveira não sofre tortura, mas relata ter ficado marcada pela violência que testemunhou de seus companheiros de prisão. Além disso, fazia várias anotações sobre inúmeros assuntos que eram supervisionados pelos agentes. A experiência na prisão despertou em Nise da Silveira a compreensão de como atividades alternativas e criativas para lidar com situações de sofrimento são recursos necessário. A relação de abuso e arbitrariedade proporcionou a jovem médica a oportunidade de perceber semelhanças entre a prisão e o hospício. Em 1937, o ministro da Justiça liberta os prisioneiros políticos sem condenação ou processo, é o caso de Nise. No fim do mesmo ano, Getúlio Vargas instaura o Estado Novo, com a extinção dos partidos e do Parlamento, e prisões são realizadas. Nise da Silveira decide sair do Rio de Janeiro e segue com o primo para o Salvador, porém recebe a notícia de que deve se apresentar novamente na capital da época. Ela decide não voltar e aceita ficar em um esconderijo da família de um de seus companheiros de prisão, Francisco Mangabeira Filho. Neste período ainda esteve em Pernambuco, Alagoas e Manaus, onde encontrou seu companheiro, Mário de Magalhães, que ocupava o cargo de delegado de saúde. Apesar de sua ligação com o Partido Comunista Brasileiro, ele foi poupado pelo governo, visto o respeito que conquistou como sanitarista. O hospital psiquiátrico de Engenho de Dentro Nise da Silveira e seu companheiro voltam ao Rio de Janeiro e ela é readmitida no serviço público em 1944. Sua lotação agora é no Hospital Pedro II, do antigo Centro Psiquiátrico Nacional, no bairro de Engenho de Dentro. Em 1937, Getúlio Vargas havia 34 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL criado a Universidade do Brasil, que incorporou o Instituto de Psicologia surgido em 1932 no laboratório de Psicologia da Colônia de Psicopatas no Engenho de Dentro, o local, como já mencionado, era um grande centro de pesquisa e produção científica das áreas de psicologia e psiquiatria. Novos procedimentos ligados à psiquiatria biológica surgido durante o contexto da II Guerra Mundial chegaram ao local. Gullar (1996) relata que Nise experimentou alguns dos recursos da psiquiatria utilizada na época, como o choque de insulina, mas se tornou opositora dos métodos tradicionais da época. Durante esses anos todos que passei afastada, entrou em voga uma série de tratamento e medicamentos novos que antes não se usavam. Aquele miserável daquele português, Egas Muniz, que ganhou o prêmio Nobel, tinha inventado a Lobotomia. Outras novidades eram o eletrochoque, o choque de insulina e o cardiazol. Fui trabalhar numa enfermaria com um médico inteligente, mas que estava adaptado àquelas inovações. Então me disse: - A senhora vai aprender as novas técnicas de tratamento. Vamos começar pelo eletrochoque. Paramos diante da cama de um doente que estava ali para tomar eletrochoque. O psiquiatra apertou o botão e o homem entrou em convulsão. Ele então mandou que levasse aquele paciente para a enfermaria e que trouxessem outro. Quando o novo paciente ficou pronto para a aplicação do choque, o médico me disse:- Aperta o botão. E eu respondi: Não aperto. (SILVEIRA apud MELLO, 2014, p. 89) Seu comportamento opositor aos tratamentos a faz pedir vaga em outro tipo de serviço, o que a levou ao Setor de Terapêutica Ocupacional. Ele havia sido implantado pelo médico Fábio Sodré, que recebeu muitas críticas da Sociedade de Psiquiatria e Neurologia e Medicina Legal da época. Nise da Silveira começa seu trabalho na TO com atividades de costura e bordado. Nise recebeu apoio do diretor do Hospital, colocando verba destinada aos internos que prestavam serviços no hospital. Foram montadas outras oficinas e o ateliê de pintura, em 1946. A produção dos pacientes cresce ecomo resultado é montada uma exposição no Ministério da Educação, em 1947. A visita de um crítico de arte ao ateliê leva o diretor do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Léon Degand, ao lugar. Uma nova exposição é montada sob curadoria de Degand e inaugurada em 1949. O catálogo da exposição tem a apresentação de Nise da Silveira que comenta as pinturas usando inúmeros teóricos: Bleuler, Freud e Carl Gustav Jung. As obras produzidas por pacientes do Juquery e Colônia Juliano Moreira foram levadas ao 1º Congresso Mundial de Psiquiatria, realizado em Paris, em 1950. Nise da Silveira, 35 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II porém, sempre se posicionou como estudiosa da psique, embora tivesse incluído em suas leituras da produção artística, textos de outras áreas. As influências de Nise da Silveira são Machado de Assis, o filósofo holandês Baruch de Spinoza, Antonin Artaud, ator, roteirista, poeta, crítico, ensaísta, artista plástico, comediante francês, foi um artista multifacetado cuja obra e influência marcaram sua geração, Artaud teve inúmeras internações em sanatórios, com tratamentos à base de eletrochoque. Ele acreditava que o teatro pudesse mudar a psique das pessoas. Morreu num sanatório aos 52 anos. Outro autor de importância na obra e trabalho de Nise de Silveira foi Carl Gustav Jung. No Brasil, não havia livros de língua portuguesa de sua obra, apenas tratados com diversos temas em língua francesa. Em 1943, foi publicado em inglês Psicologia e Alquimia. O mais importante acontecimento ocorrido nas minhas buscas de curiosa dos dinamismos da psique foi o encontro com a psicologia junguiana. Jung oferecia novos instrumentos de trabalho, chaves, rotas para distantes circum-navegações. Delírios, alucinações, gestos, estranhíssimas imagens pintadas ou modeladas por esquizofrênicos, tornavam-se menos herméticas se estudadas segundo seu método de investigação. E também não faltava o calor humano de ordinário ausente nos tratados de psiquiatria. (SILVEIRA, 2015, p.11). Carl Gustav Jung teve uma formação e experiência clínica em hospital psiquiátrico. Durante nove anos, no hospital de Burgholzli, procurou investigar e compreender seus pacientes. Ele percebeu que a linguagem utilizada por esquizofrênicos havia uma relação estreita com temas mitológicos, resultando em sua formulação do conceito de inconsciente coletivo. No livro Psicologia e Alquimia, Jung analisa sonhos estudados de maneira cronológica que tem como tema a mandala. Essas imagens apareciam nas pinturas produzidas pelos pacientes da Secção de Terapia Ocupacional. A produção ainda não havia sido interpretada por Nise da Silveira, pois apesar de recorrente a temática, não estava claro seu significado. A visão da psiquiatria da época era a defesa de que a cisão interna de diferentes funções psíquicas, característica em pacientes esquizofrênicos, iriam se refletir em suas produções. Em muitas produções, de fato, havia a cisão, a fragmentação, mas a criação de imagens circulares, algumas com estruturas complexas e harmoniosas apareciam no ateliê. Nise a princípio não acreditava que fossem mandalas, aos poucos ela fotografa e escreve uma carta a C.G. Jung. Após o contato com o método Junguiano de análise de sonhos 36 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL descrito em sua obra, ela passa a usá-lo não para interpretar sonhos, mas nas imagens produzidas no ateliê. Aos poucos as atividades da Seção de Terapia Ocupacional amplia-se e chega a ter 17 núcleos de atividades, que foram divididos em quatro grupos: trabalho: marcenaria, sapataria, encadernação, cestaria, costura, jardinagem; expressivas: pintura, modelagem, gravura, música, dança, mímica, teatro; recreativas: jogos, festas, cinema, rádio, televisão, esportes, passeios e culturais: escola, biblioteca. A STO ganhou um espaço considerável frente às críticas do paradigma dominante da época, a psiquiatria biológica teve que abrir espaço para as produções das oficinas e do ateliê que não parou de ampliar sua produção, até que em maio de 1952 ele se torna o Museu de Imagens do Inconsciente. A psiquiatra defendia que seu trabalho era de pesquisadora como também criticava a mercantilização das obras, pois o estudo delas só tinham relevância em sua completude, não como partes de uma série de pinturas. Nise envia a carta para Jung em novembro de 1954. Professor C.G.Jung Mestre, No Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro existe, ao lado de outros setores de terapia ocupacional, um ateliê onde os doentes desenham e pintam com a mais completa liberdade. Nenhuma sugestão lhes é dada, nenhum modelo é proposto. Eis que surgem imagens primordiais em suas pinturas, apresentando uma demonstração empírica e convincente da psicologia analítica. Com minhas mais respeitosas homenagens, eu vos envio algumas fotografias de pinturas que me parecem mandalas – ( ou formas aproximadas). Elas foram pintadas espontaneamente pelos esquizofrênicos. Está descartada qualquer possibilidade de influência cultural. Eu mal poderia expressar, mestre, o quanto o estudo de seus livros tem trazido luz ao meu trabalho como psiquiatra, além de muito me ajudar pessoalmente. Creia-me sua mais humilde discípula. Nise da Silveira (MELLO, 2015, pg 145) As produções enviadas por Nise da Silveira a Zurique reforçava a teoria de C. G. Jung e despertou o interesse do psiquiatra suíço pelo trabalho da médica brasileira. A resposta de Jung chega em dezembro de 1954, redigida por sua colaboradora: 37 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II Cara Senhora, O professor Jung pede-me para agradecer-lhe pelo envio das interessantes fotografias de mandalas desenhadas por esquizofrênicos. O professor Jung faz diversas perguntas, que reproduzo a seguir: o que significam esses desenhos para os doentes, do ponto de vista de seus sentimentos? O que eles quiseram exprimir por meio dessas mandalas? Será que esses desenhos tiveram alguma influência sobre eles? Ele ainda observou que os desenhos têm uma regularidade notável rara para a produção de esquizofrênicos, o que demonstra a forte tendência do inconsciente para formar uma compensação à situação de caos do consciente. Ele também notou que o número 4 ou 8 ou 32 prevalece. Eu, por minha parte, acho que as cores dão ainda mais força expressiva aos desenhos. Eu, agradeceria muito se nós pudéssemos guardar as fotos, caso não sejam necessárias. Talvez a senhora possa responder às perguntas do Prof Jung, o que lhe será de grande interesse. Queira receber a expressão de nossa alta consideração Ass: Aniela Jaffé P.S. Para a compreensão psicológica seria também interessante saber alguns dados biográficos dos pintores, (MELLO, 2015, p. 146-147) A partir dessa correspondência, inicia-se uma série de cartas trocadas entre Nise da Silveira e C. G Jung, com envio de novas fotografias e a doação delas ao Instituto C. G. Jung. Interessado nos trabalhos do Museu do Inconsciente, Jung convida Nise da Silveira a frequentar o Instituto C.G Jung e a participar do II Congresso Internacional de Psiquiatria, em Zurique, no ano de 1957. Ela apresentou a conferência “Experiência de arte espontânea com esquizofrênicos num serviço de terapia ocupacional”. No manuscrito preparado para esse evento, encontram-se suas considerações humanistas sobre a condição dos pacientes em sofrimento psíquico grave. Parece certo que foi no domínio das artes plásticas que primeiro se tornou possível o contato entre homens que pareciam completamente diferentes e separados. É que as imagens fascinam, mesmo quando vem de muito longe. E elas decerto não nos atingiram se não nos despertassem ressonâncias, se não o fizessem vibrar cordas afinas naqueles que as contemplam. É por meio das imagens que nos serão revelados os fundamentos estruturais comuns à alma de todos os homens, mesmo a daqueles que nós chamamos loucos. Se fossemos 38 UNIDADE II │ A PSICOLOGIAANALÍTICA NO BRASIL capazes de tornar consciência deste fato verdadeiramente, em vez de certos tratamentos absurdos lhes daríamos um pouco de solidariedade, de coração. (MELLO, 2015,p.167) Nise da Silveira organizou em cinco salas a exposição “A Esquizofrenia em Imagens”, que Jung fez questão de inaugurar. Essa exposição, disse o professor Jung, levanta um problema: se o primeiro plano das pinturas apresenta as características habituais do estilo esquizofrênico, os planos posteriores estão pintados com harmonia de formas e de cores muito rara na pintura de tais doentes. Por que aconteceria isso? Ouvi emocionada a resposta que o professor Jung deu à sua própria pergunta. O outro motivo, disse ele, deve estar na atmosfera reinante no serviço onde os doentes pintam. Decerto são aí tratados humanamente por pessoas que mantêm com eles real contato, pois a harmoniosa beleza dos planos de fundo, que contrasta com os planos dissociados, possivelmente reflete o inconsciente daqueles que se devotam aos doentes e não os temem. (MELLO, 2015, p.165) Figura 10. Fonte: http://www.ccms.saude.gov.br/nisedasilveira/encontro-com-jung.php. As considerações de Jung sobre o trabalho humanizado refletido nas obras revelam o caráter pioneiro de Nise da Silveira. Antes de sua ida a Zurique, em 1956, havia fundado a Casa das Palmeiras, uma proposta de trabalho inovadora com pacientes graves. O fenômeno de reinternações tinha chamado sua atenção. Ela cria um setor entre o hospital, a família e o meio social como alternativa de assistência. 39 A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL │ UNIDADE II O modelo criado por ela rompia com as instituições tradicionais. O doente não perdia o contato com a família, os médicos e equipe não usavam uniformes nem identificações. O resultado foi a permanência de pacientes que viviam um ciclo de reinternações. Várias atividades foram implantadas: cinema, jornal, contos de fada, música, colagem, teatro, baile, arranjo floral, xilogravura, cinema, passeio, tapeçaria, salão de beleza, passeios. As decisões eram tomadas em reuniões coletivas com pacientes, médicos, psicólogos, monitores. Em 1955, antes de seu encontro com Jung, Nise cria o Grupo de Estudos da Psicologia de C.G. Jung. Os encontros eram realizados na Casa das Palmeiras e a partir de 1962 continuaram em sua residência. Nise da Silveira visitou Jung duas vezes e o encontrou em outras atividades entre congressos e exposições. Ela esteve ainda em Zurique em 1961 e 1964. A orientação de Jung a Nise sobre o estudo da mitologia como base para seu trabalho resultou em uma metodologia mais consistente. O Grupo de Estudos criou a revista Quaternário, em homenagem à estrutura da psique. Em 1969, o grupo ganha registro oficial. Na década de 1960, Nise cria uma série de palestra entre estudantes de medicina e psicologia e outros interessados no Museu do Inconsciente, essa iniciativa gera um Grupo de Estudos do Museu, o objetivo era estudar a psicose e sua relação com a expressão plástica. Nise da Silveira, após sua aposentadoria em 1975, continuou com as atividades no Museu, na Casa das Palmeiras, em sua residência. Neste ano é realizada a exposição Imagens do Inconsciente no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e em diversas capitais, em comemoração ao centenário de nascimento de C. G. Jung. Em 1980, é publicado o livro do Museu Imagens do Inconsciente, o museu participa da XVI Bienal de São Paulo na modalidade de Arte Incomum. Em 1981, ocorre a transferência do museu para sua atual sede, local mais apropriado para as produções como também para outras atividades. O museu participa da XVI Bienal de São Paulo na modalidade de Arte Incomum. O cineasta Leon Hirszman realiza, entre 1983 a 1986, a trilogia Imagens do Inconsciente, documentário que narra a história clínica de três pacientes que frequentam o ateliê. Entre 1981 a 1996 ela realiza ainda 15 documentários de conteúdos científicos, como compilação de sua pesquisa. Um dos livros lançados no período é o Mundo das Imagens, em 1992, pela Academia Brasileira de Letras. O Brasil é representado na Feira de Frankfurt, mais antiga do mundo, em 1994, com a Exposição Imagens do Inconsciente do Brasil. Em 1998, lança o livro Gatos; a emoção de lidar. 40 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL Nise da Silveira faleceu em 30 de outubro de 1999, aos 94 anos. Em 2002, o Museu das Imagens do Inconsciente comemora 50 anos de sua fundação com uma exposição retrospectiva. No ano seguinte, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) aprovou o tombamento das principais coleções do museu, que conta com mais de 1500 produções. O centenário de Nise da Silveira, em 2005, inicia com uma série de lançamentos e exposições pelo país e no mundo. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos lança um selo comemorativo. Nos anos seguintes são lançados novos livros sobre a obra de Nise da Silveira. Recebeu em vida inúmeros prêmios e homenagens. E deixou um legado inspirado em seu trabalho. Várias instituições foram fundadas a partir dele, entre elas Museu Bispo do Rosário (RJ), Instituto de Pesquisas em Terapia Ocupacional Nise da Silveira (RJ), Association Nise da Silveira Images de L’Inconsciet (França), Museu Attivo dele Forme Inconsapevoli (Itália), Centro de Estudos Imagens do Inconsciente da Universidade do Porto (Portugal). A importância de sua obra para o desenvolvimento da Psiquiatria, da Psicologia e da saúde mental brasileira implica ainda maior socialização de suas pesquisas nos cursos de graduação de Medicina - Psiquiatria e Psicologia no país, cujas formações ainda não contemplam seu relevante trabalho. 41 CAPÍTULO 3 Outros autores Carlos Byington Figura 11. Fonte: https://filmow.com/carlos-byington-a224299/. O paulista Carlos Amadeu Botello Byington nasceu em 1933, mas cresceu no Rio de Janeiro. Graduado em Medicina, com especialização em Psiquiatria e Psicanálise. Realizou sua formação no Instituto Carl Gustav Jung, em Zurique, sendo membro da Sociedade Internacional de Psicologia Analítica. Fundou, com outros profissionais, a Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica em 1978 como também a Sociedade Moitará, sobre estudos de símbolos da cultura brasileira, instituição que foi incorporada à SBPA. Como educador, realizou vários cursos, palestras e grupos de estudos Junguianos no Uruguai, Chile, Venezuela, Argentina e Equador. Recebeu título de Notório Saber em Psicologia Analítica pela PUC – SP e de Professor Ad Honorem da Universidad Católica del Uruguai. Leciona na SBPA, no Instituto Sedes Sapientiae e no curso de pós-graduação em Psiquiatria na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. A partir de sua interpretação e ampliação do conceito de arquétipo, criou a Psicologia Simbólica Junguiana e a Pedagogia Simbólica Junguiana, uma contribuição importante do país tanto para a teoria Junguiana quanto para a Psicologia Analítica no mundo. É autor dos livros Psicologia Simbólica Junguiana – A Viagem de Humanização dos Cosmos em busca da Iluminação; Psicopatologia Simbólica Junguiana – Um estudo do Mal e da Ameaça de Autodestruição da Nossa Espécie; A Construção Amorosa do Saber – Fundamento e Finalidade da Pedagogia Simbólica Junguiana; Inveja Criativa – Resgate de uma Força Transformadora da Civilização. 42 UNIDADE II │ A PSICOLOGIA ANALÍTICA NO BRASIL Gustavo Barcellos Figura 12. Fonte: https://jameshillmansymposium.com/team/gustavo-barcellos/. Gustavo Barcellos nasceu em São Paulo, em 1960. Formou-se em Psicologia pela PUC- SP. Durante a década de 80 do século XX, estudou nos Estados Unidos, onde concluiu seu mestrado em Psicologia Clínica e estudou no C.G. Foundation, em Nova York. Gustavo Barcelos conheceu James Hillman, Junguiano e importante pesquisador, criador da psicologia arquetípica, Barcelos foi o responsável pela tradução para o português da obra de Hillman, como Re-vendo a Psicologia, Psicologia Alquímica e Paranoia, Anima e
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