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Transtorno afetivo bipolar

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Transtorno afetivo bipolar: depressão maior
Usuária do serviço de saúde mental interrompe o tratamento para depressão.
Histórico
Antecedentes pessoais
Usuária com diagnóstico de Transtorno Afetivo Bipolar há cinco anos. Realizava tratamento no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), e há um ano, devido a sua evolução, passou a ser acompanhada na modalidade não-intensiva. Após um período, optou por não frequentar mais o serviço, pois sentia-se “curada”, e portanto, não necessitava mais do uso de medicações, como os estabilizadores do humor e antidepressivos. Começou a apresentar isolamento social, sentimentos de desesperança, perda de interesse e de prazer por atividades cotidianas, redução do apetite e choro constante. É fumante, há 10 anos, fazendo uso de 2duas carteiras de cigarros/dia.
História social
Reside com o marido e os três filhos em um bairro de classe baixa na periferia da cidade. A família depende do salário mínimo do seu esposo, o qual trabalha como servente de pedreiro de uma construtora, com carteira assinada. Foi solicitado pelo agente comunitário de saúde (ACS), em reunião de equipe, a visita domiciliar do enfermeiro para que a paciente fosse sensibilizada a retomar seu tratamento, pois encontrava-se em péssimas condições de vida, e os seus familiares não sabiam o que fazer.
Medicações em uso
Captopril 25 mg: 2 comprimidos ao dia
Hidroclorotiazida 25 mg: 1 comprimido ao dia
MEDICAÇÕES EM USO IRREGULAR:
Amitriptilina 25 mg: 2 comprimidos ao dia
Bupropiona 75 mg: 3 comprimidos ao dia
Carbonato de Lítio 300 mg: 3 comprimidos ao dia
Antecedentes familiares
Sua mãe sofre de Transtorno Depressivo e seu pai apresentava Hipertensão Arterial Sistêmica e cardiopatia, sendo que faleceu há cinco anos devido a um Infarto Agudo do Miocárdio.
Exame Físico
Peso: 75 kg;
Altura: 1,65 cm;
IMC: 27,57 Kg/m²
Pressão Arterial: 136/88 mmHg;
Frequência Respiratória: 20 mpm;
Frequência Cardíaca: 90 bpm;
Ausculta pulmonar: murmúrios vesiculares presentes, sem ruídos adventícios;
Ausculta cardíaca: normofonética, ritmo regular;
Pele: Hipocorada, aparenta idade superior a idade cronológica;
Membros inferiores: tremores em extremidades.
Exame do estado mental
ATENÇÃO: Tenacidade: hipotenaz;
Vigilância: normovigil;
SENSOPERCEPÇÃO: sem alterações;
MEMÓRIA: sem alterações;
ORIENTAÇÃO: orientada autopsiquicamente e alopsiquicamente
CONSCIÊNCIA: sonolência;
PENSAMENTO: Produção: lógico; Curso: fio associativo preservado (o fio associativo consiste na associação entre uma ideia e outra); Conteúdo: ideação suicida;
LINGUAGEM: bradilalia
INTELIGÊNCIA: sem alterações;
AFETO: depressão;
CONDUTA: inapetência, hipersonia
Saiba mais
O Transtorno Afetivo Bipolar caracteriza-se por ser uma doença crônica, recorrente que compromete o bem-estar da pessoa afetada e de sua família no curso da vida. É marcado por alternâncias no estado do humor (episódios maníacos e episódios depressivos), de energia e de habilidade da pessoa para o desempenho diário (KAPLAN; SADOCK, 2007).
Representa relevância para a família e para os sistemas de saúde, com altos índices de incapacidade. Nesse sentido, a previsão para o ano 2020 é a de que este transtorno ocupe a segunda causa de incapacidade em países desenvolvidos e a primeira em países em desenvolvimento (FLECK et al., 2003).
A seguir a caracterização do episódio depressivo, segundo Fukuda, Arantes e Stefanelli (2008):
A: Critérios gerais
- O episódio deve ter duração de pelo menos duas semanas;
- O episódio não deve estar relacionado ao uso de substâncias psicoativas.
B: Critérios principais (2 ou mais destes sintomas devem estar presentes)
- Humor depressivo, tristeza profunda;
- Inibição ou ausência da capacidade de sentir prazer ou alegria;
- Redução da energia e fatigabilidade aumentada (hipoatividade e fadiga).
C: Sintomas adicionais para episódios depressivos
- Perda de confiança, da autoestima e da esperança (ideias pessimistas em relação ao futuro);
- Sentimentos irracionais de autoreprovação ou culpa excessiva e inapropriada, com sentimento de inutilidade;
- Pensamentos recorrentes de morte ou manifestação de ideia e comportamento suicida;
- Queixas ou evidências da diminuição da capacidade de pensar e de concentrar-se;
- Lentificação ou, às vezes, agitação psicomotora;
- Qualquer tipo de perturbação do sono (insônia ou hipersonia);
- Alteração do apetite (diminuição ou aumento), com correspondente alteração do peso.
D: Pode haver a presença ou ausência da chamada síndrome somática (características melancólicas, neurovegetativas ou físicas)
- Marcante perda de interesse e prazer em atividades que são geralmente prazerosas;
- Falta de reações emocionais a eventos ou atividades que são normalmente prazerosas;
- Levantar-se de manhã 2 ou mais horas antes do habitual (insônia terminal);
- Depressão pior pela manhã;
- Evidência objetiva de retardo ou agitação psicomotora observado ou relatado;
- Marcante perda de apetite;
- Perda de peso (aproximadamente 5% em um mês);
- Marcante perda do libido.
Pelo fato da UBS estar inserida no contexto de vida do usuário, esta torna-se um dispositivo estratégico para o seu acompanhamento. No âmbito da atenção básica, este pode ser atendido juntamente com seu familiar, em sua rede social.
A UBS apresenta um papel fundamental para as ações de saúde mental no contexto da atenção básica, pois oferta atendimento e acompanhamento dos usuários de saúde mental em seu território de vida, contemplando sua individualidade. É papel dos profissionais da UBS promoverem a referência ao CAPS, facilitando o acesso do usuário ao mesmo tempo em que há responsabilização por este. Acredita-se que a interlocução dos profissionais da UBS com os do CAPS tornam o tratamento do usuário mais resolutivo e integral.
As ações em saúde mental, no contexto da Reforma Psiquiátrica, preconizam o cuidado em liberdade, e assim a promoção da inserção social dos indivíduos com transtorno psíquico. Portanto, é essencial que se promova e fortaleça o convívio social da usuária, para que ela seja empoderada e fortalecidas a sua cidadania e autonomia.
O Carbonato de Lítio constitui-se em um estabilizador do humor. Seu uso é indicado para tratamento do Transtorno Bipolar do Humor, ciclotimia, depressão maior, transtorno esquizoafetivo, agressividade e impulsividade. Por ser excretado quase que totalmente pelos rins, a indicação é que o usuário deverá ingerir água em abundância (no mínimo 1 litro ao dia), evitando café, chá, erva-mate e bebidas alcoólicas, que aumentam a diurese (CORDIOLI, 2002). A Amitriptilina é um antidepressivo tricíclico. Se por algum motivo houver a necessidade de uma interrupção abrupta, deve-se lembrar que é possível, embora rara, uma síndrome de retirada (irritabilidade, desconforto gástrico, insônia, ansiedade, inquietação). Por isso, se for possível, a retirada deve ser feita ao longo de 2 ou 3 dias, conforme orientação médica (CORDIOLI, 2002).
Embora os hospitais psiquiátricos ainda façam parte da realidade de diversos municípios brasileiros, desde a década de 70 iniciou o movimento de desconstrução do modelo hospitalocêntrico, que culminou na lei 10.216 considerada a lei da Reforma Psiquiátrica, a qual dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtorno mental e redireciona o modelo assistencial em saúde mental (BRASIL, 2001).
Além de reverter o hospitalocentrismo, a reforma psiquiátrica propõe a implantação de rede extra-hospitalar e atenção multiprofissional; proibição da construção de novos hospitais psiquiátricos ou a ampliação dos existentes e desativação progressiva dos leitos existentes; inserir leitos e unidades psiquiátricas em hospitais gerais; integrar a saúde mental a outros programas de saúde, movimentos sociais e instituições (FRAGA; SOUZA; BRAGA, 2006).
Saiba mais
De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2003), as ações de saúde mental na atenção básica devem obedecer ao modelo de redes de cuidado, de base territorial e atuação transversal com outras políticas específicas e que busquem o estabelecimento de vínculose acolhimento. Essas ações devem estar fundamentadas nos princípios do SUS e nos princípios da Reforma Psiquiátrica. Podemos sintetizar como princípios fundamentais desta articulação entre saúde mental e atenção básica:
- noção de território;
- organização da atenção à saúde mental em rede;
- intersetorialidade;
- reabilitação psicossocial;
- multiprofissionalidade/interdisciplinaridade;
- desinstitucionalização;
- promoção da cidadania dos usuários;
- construção da autonomia possível de usuários e familiares.
Na Figura 1, a seguir, será exposto o modelo de rede de atenção em saúde mental destacado pelo Ministério da Saúde. Percebe-se que esta rede contempla não somente os serviços de saúde, mas também instituições sociais que fazem parte do território de vida dos usuários.
Figura 1. Rede de atenção à saúde mental.
No atual contexto da assistência psiquiátrica, a família como espaço privilegiado para a prática do cuidado, precisa ser inserida de forma efetiva nas discussões do novo paradigma de assistência em saúde mental, vista como uma facilitadora no processo de reinserção social do indivíduo com transtorno mental. Mais do que uma aliada na efetivação do modelo psicossocial emergente, ela deve ser encarada como foco de intervenção, para que seus anseios sejam acolhidos e sua sobrecarga minimizada (BORBA; SCHWARTZ; KANTORSKI, 2008).
Saiba mais
Torna-se importante inserir as famílias em grupos de familiares nos serviços comunitários de saúde mental, e prestar esclarecimentos sobre o comportamento, a sintomatologia e o tratamento da enfermidade, sobre o uso dos psicofármacos e os efeitos colaterais dos mesmos, realizar visitas domiciliares para conhecer a realidade da família e fazer com que esta não se sinta sozinha (BORBA; SCHWARTZ; KANTORSKI, 2008).
Os vínculos entre família e usuário de saúde mental necessitam ser alicerçados numa relação sincera e de respeito, onde a singularidade e individualidade de todos sejam preservadas, de forma que os primeiros não se sintam sobrecarregados, e os usuários possam efetivamente resgatar sua cidadania e autonomia em uma relação terapêutica (BORBA; SCHWARTZ; KANTORSKI, 2008). O Projeto Terapêutico Singular, desenvolvido pela equipe de assistência, com a participação do usuário e sua família, tem como objetivo ajudar o indivíduo a reestabelecer relações afetivas e sociais, reconquistar direitos e buscar autonomia material-afetiva-social (OLIVEIRA, 2010; ZERBETTO, 2005).
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