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FACULDADE CAPIXABA DE NOVA VENÉCIA CURSO DE BACHAREL EM PSICOLOGIA LÍVIA THOMAZINI BIS TRATANDO TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA NOVA VENÉCIA 2022 LÍVIA THOMAZINI BIS TRATANDO TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA Trabalho apresentado a Faculdade Capixaba de Nova Venécia – MULTIVIX, como requisito para obtenção de nota no Curso de Bacharela em Psicologia. Professor: Pedro Henrique Carvalho NOVA VENÉCIA 2022 Em um nível perceptivo—seja visual, auditivo, olfativo, tátil ou outro— alguns aspectos da analista fazem com que o paciente se lembre de um de seus pais (ou de alguém muito importante de seu passado), tais como o som de sua voz, a cor dos olhos, cabelo ou pele, sua compleição, palmas das mãos suadas ou frias, quando se cumprimentam no início ou no final da sessão, e assim por diante. Mas, enquanto as transferências algumas vezes tornam-se evidentes à analista, na forma de sentimentos que o paciente expressa a ela, de um jeito ou de outro, intencionalmente ou não, elas talvez tornem-se evidentes mais frequentemente de outras maneiras: o paciente, cujas relações com sua mãe eram um tanto azedas, pode permanecer mais caloroso e muito cooperativo durante as sessões, mas não acreditando secretamente na analista de óculos, mesmo jurando a si mesmo que todos os seus melhores insights estarão protegidos contra ela. A situação da família que ela reproduzia na análise, tornou-se muito complexa: seus silêncios prolongados eram uma forma dela se proteger e manter-se fiel ao pai, de reviver seu estado assustado e ainda excitado enquanto ficava em silêncio, como quando seu pai a tocou, mantendo o segredo da mãe/analista que resultava uma vitória desconcertante sobre ela na demanda por atenção de seu pai, de poupar sua mãe do choque duplo pela traição do pai e pela cumplicidade da filha e, indubitavelmente, de realizar outras coisas também. Tais dificuldades de tratamento geralmente surgem: (1) do fato de que não é fácil articular o que nunca antes tenha sido articulado, (2) da repetição de uma situação anterior, que pode ser muito complexa e difícil para elucidar, ou (3) de algo que a analista está ou não fazendo, por exemplo, se recusando a ajudar o paciente a articular o que nunca tinha articulado antes (na verdade, permitindo que os dois, paciente e analista, evitem a difícil tarefa) ou não se empenhando em descobrir se a condição. (Um dos meus pacientes me contou que quando tinha sete anos apaixonou-se por uma garota que conheceu no primeiro dia de acampamento de verão, que se parecia exatamente como sua irmã.) De fato, apaixonar-se e a experiência de estar apaixonado deve-se muito à transferência: quanto mais intensamente alguém está amando, mais parece ser um “caso de identidade equivocada,” como aquela encontrada na transferência que está sendo tratada, parecendo que uma “falsa conexão” (Freud & Breuer, 1893–1895/1955). Se ela acredita na existência da “identificação projetiva,” poderá ver (como veremos depois neste capítulo) o aborrecimento do paciente com ela, como citei acima, por seus constantes atrasos, como sendo parcialmente da responsabilidade do paciente: pode estar propensa a pensar que ele estava “projetando nela” suas crenças, de que todos colocam seus desejos acima dos dele, ou tiram vantagem dele, e acabou fazendo com que ela cumprisse suas expectativas! Isso nos leva a um ponto importante da técnica psicanalítica: a tentativa de dissipar ou “liquidar” a transferência do paciente está fadada ao fracasso, porque a recusa da analista—por exemplo, “Possivelmente não saberei qual é o problema, é você que tem o conhecimento aqui”— é ouvida pelo paciente como vindo da pessoa que ele projeta que seja: uma pessoa muito bem informada (se não fosse, ele se pergunta, por que seria analista?) A tentativa de mitigar um dos mais pesados aspectos da transferência, comentando ou interpretando-a a partir da própria transferência (isto é, quando alguém é objeto da transferência do paciente em oposição a uma terceira pessoa, como um amigo, colega ou médico) acabará falhando pela mesma razão. O truque, na visão deles, é convidar o ego observador, considerado “racional”, a ficar fora da transferência (a qual é presumivelmente envolvida pelo ego experienciador) em determinado metaespaço, um espaço fora da transferência onde analista e paciente podem se encontrar como egos observadores “aceitáveis” e concordarem com o que está acontecendo entre os egos irracional, imoderado e experimental, que são capturados na 16 transferência/contratransferência. Pode parecer que eu esteja sendo irônico aqui, mas diversos outros autores usaram esses mesmos termos, como se “racional”, “irracional”, “aceitável,” e 17 “imoderado” fossem categorias simples, úteis, que pudessem ser associadas, sem problemas, a um ou outro agente psíquico, e como se— mesmo que pudesse ser feito um acordo do que está acontecendo entre aceitável, “desinteressado,” egos observadores fazendo um “intervalo” na estufa da relação transferencial—alguma coisa mudasse quando retornassem para a estufa (além de incentivar o paciente a suprimir toda e qualquer reação transferencial no futuro). Gill indicou que nas transcrições de sessões inteiras que ele fornece no volume 2 de seu trabalho, pode-se ver “com que regularidade a análise da transferência tem suas próprias repercussões na transferência—muitas vezes repercussões que resultam no decreto dos mesmos padrões de interações a que se referem as interpretações.” (Gill & Hoffman, 1982) Assim fica mais difícil que essas interpretações sejam experimentadas e rejeitadas “como vindas do Outro transferencial.” Apesar de todas essas considerações teóricas sobre a interpretação da transferência e um segundo volume de transcrições de sessões, que pretendem mostrar ao leitor como detectar e interpretar a transferência, Gill forneceu pouca ou nenhuma evidência de que a interpretação da transferência leva a uma mudança duradoura nos pacientes por ele citados. Não prestaram atenção à especificidade do uso da linguagem de seus pacientes (o Paciente E usou a palavra homossexual para se referir a um ato sexual específico, enquanto seu analista o usou como quis, como se fosse ele que determinasse o significado das palavras) e permitiram que formulações ambíguas proferidas pelos pacientes passassem despercebidas, como se 20 fossem perfeitamente compreensíveis. Especialmente quando a transferência de amor não aparece exatamente no início da análise (amor intenso que surge exatamente no início da análise pode sugerir um diagnóstico de psicose, não neurose), e sim mais tarde, o que geralmente ocorre é que, face à virtual impossibilidade de falar sobre algo, de colocar em palavras alguma experiência traumática, o paciente desviou sua atenção para algum aspecto da própria analista. A transferência surge consistentemente em tais momentos que poderíamos, de fato, provavelmente presumir que uma transferência em particular é um produto da resistência (entendida como real resistência para a simbolização e como a relutância do paciente em falar alto certas coisas para a analista, por medo de sua reação, que seja uma crítica, censura moral, perda da estima aos olhos da analista, ou qualquer outra coisa) mais do que presumir que a transferência em si tornou- se resistência. Se essa repetição tivesse sido verdadeiramente frustrada—se eu, por exemplo, contestasse sistematicamente o sentimento do paciente de que eu estaria irritado, eufórico ou cético, quando ele sentiu que eu estava (assim ele teria uma visão sobre mim mais “baseada na realidade”, por exemplo, e não me confundiria com outras figuras)—a análise poderia ter perdido uma das principais fontes deinformação sobre o passado do paciente. Depois de um período tumultuado, de certa forma, em que o paciente fez uma fraca tentativa de encerrar a análise, ocorreu-me que ele estaria repetindo algo que aconteceu em sua infância: em um ponto de suas brincadeiras sexuais com sua irmã mais nova (que sua mãe certa vez os surpreendeu, mas entendeu como “perfeitamente natural”— esse foi um dos episódios pelos quais ele sentia que deveria ser punido), ele tinha aparecido com a ideia, aparentemente sua, de que seu pênis ereto “talvez tenha entrado lá [na vagina da irmã].” Aparentemente ele nunca tinha visto sua vagina antes do dia que se propôs a colocar seu pênis lá, e ele caracterizou sua vagina como parecendo “uma grande ferida vermelha”. Ela respondeu à sua provocação gritando “não!” e nunca mais quis “brincar de médico.” Ele se identificou fortemente com ela (mesmo tendo um ponto erótico muito sensível em seu corpo, de um dos lados de seus órgãos genitais, que ele mesmo descreveu como um tipo de imagem especular em seu corpo, do clitóris da irmã) e eu postulei que ele estava repetindo alguns aspectos dessa cena com os papéis invertidos: estava se comportando na análise comigo, como ela tinha se comportado com ele—brincaria comigo até certo ponto e então se fecharia. Estávamos aptos a ir além desse momento de inatividade na análise, retornando para o que propus ser a fonte da repetição, não por uma sugestão minha a ele, de que essa situação difícil em que nos encontrávamos na análise (eu curioso, ele se afastando) era parecida com sua antiga situação com a irmã, uma comparação especulativa, na melhor das hipóteses teria simplesmente dado na mesma, do que lhe dar um bocado de conhecimento sobre algo que estivesse acontecendo na análise, e não teria mudado nada no que diz respeito ao recalque que estava provocando a repetição em primeiro lugar. Assim como a analista deve aceitar as projeções do paciente, agradáveis ou não, desde que possam oferecer acesso a certos aspectos do que foi reprimido, também deve aceitar seu “acting out.” “Acting out” é um conceito genuinamente psicanalítico, o qual, nas últimas décadas, passou a significar nada mais do que “acting badly” (atuar mal) ou “acting inappropriately” (atuar inadequadamente) na linguagem psicológica comum (veja Capítulo 9 sobre este último termo), mas Freud o introduziu para referir às ações que o paciente empreende fora do consultório, para expressar algo de forma deslocada, que ele não foi capaz de expressar no consultório, não necessariamente por culpa sua ou da analista. A medida que o paciente, que apresentei há pouco, faltou em uma ou mais sessões na semana, devemos dizer que ele estava atuando algo que não conseguia se lembrar: o doloroso tratamento silencioso que sua irmã deu a ele e seu desejo de, quem sabe, forçá-la (Alguns analistas contemporâneos referem- se a esses longos silêncios durante as sessões, como “acting in,” uma vez que seria a expressão do material reprimido nas sessões, que tomou forma do 31 ato de permanecer em silêncio). E mais, o acting out serve como um tipo de corretivo ao analista: exatamente como as crianças que envolvem atividades destrutivas ou autodestrutivas fora de casa, quando sentem que os pais não os escutam, os pacientes algumas vezes se envolvem em atividades autodestrutivas fora do consultório, quando sentem que seus analistas recusam-se a ouvir algo que estão tentando transmitir, ou estão recusando levar a sério algo que os pacientes tentam dizer. Se a analista tem pontuado a fala do paciente e procurado fazer as interpretações, e suas pontuações e interpretações não têm tido efeito, apenas enfurecido o paciente, mesmo que ela as tenha introduzido gradualmente e até um ponto em que o paciente pareceu estar pronto para ouvi-las, ela deveria, primeiro e antes de tudo, considerar a possibilidade de não ter feito um bom diagnóstico do paciente: talvez ele seja psicótico, não neurótico, e ela precisa se reorientar totalmente no tratamento. supervisionei casos em que muitas coisas que não seriam tomadas como persecutórias pelo neurótico—tais como pontuação, interpretação, encerramento abrupto da sessão, tomar notas, e mesmo pedir para gravar ou filmar as sessões (algo que é sempre sugerido pelo supervisor do terapeuta, em certos programas de treinamento, sem levar em conta o nível de paranoia do paciente) —levaram a terríveis reações negativas por parte do paciente psicótico e algumas vezes até ao encerramento da terapia. Se a transferência do paciente começou ligeiramente positiva e devagar foi ficando inflexivelmente negativa, e se as tentativas da analista em ligar essa negatividade às figuras do passado do paciente e reconceituar o caso (com a ajuda do supervisor) foram infrutíferas, a analista precisa considerar a possibilidade de ter se tornado tão intimamente associada, na mente do paciente. Assim como é difícil reconhecer e mudar as coordenadas e determinantes simbólicos (isto é, o inconsciente) dos próprios sintomas e padrões repetitivos, sem a ajuda da analista—é por isso que a autoanálise é impossível (aqueles que pensam que é possível estão se iludindo, assim como em relação ao que seja uma análise e ao que ela pode realizar)—é quase impossível dar um passo atrás em um caso, pessoal e conceitualmente, e formulá-lo a partir de um ponto de vista completamente novo sem a ajuda de outra pessoa: um supervisor. Muitos dos meus pacientes de graduação ficam surpresos ao ver seus colegas de estágio sendo capazes de fornecer tantos novos ângulos em um caso, e fazer conexões no material simbólico que eles próprios não tinham percebido, e ficam propensos a pensar que seus colegas estudantes são muito mais perspicazes do que eles—até a situação virar completamente e eles se verem no papel de supervisor, surpreendendo os colegas com seus próprios e perspicazes 35 poderes. Em alguns exemplos, tem ficado claro, com o material relatado a mim pelos supervisionandos, que eles têm seguido somente uma linha do discurso dos pacientes (a única que eles sentem-se aptos a compreender, ou a que mais agrada às suas fantasias, por alguma razão pessoal ou teórica) apesar do fato de que outras linhas são claramente visíveis e poderiam propor perspectivas muito diferentes no caso. Caso a analista se perceba sentindo regularmente o que acontece na análise, no registro imaginário de luta, sedução, rivalidade e agressão, sem auto- observação (a repetição da voz de seu supervisor em sua mente—e aquela voz é, nada mais do que ela imagina que o supervisor estaria falando, mas não é o que realmente diria se conhecesse os fatos relativos ao caso) isso irá atenuar e a analista precisará voltar para sua análise pessoal. Uma vez que a analista tenha articulado em palavras (isto é, através do simbólico) tudo que ela gostaria de contar aos outros sobre o caso, incluindo sua própria posição na análise e suas dificuldades anteriores e atuais, e tenha relatado o caso de forma coerente e compreensível para os demais, deveria voltar e procurar por qualquer coisa que ela tenha deixado de fora do relato, voluntária ou involuntariamente. Percebemos de repente que o que foi escrito—quer seja com nossas próprias palavras, ou a transcrição das palavras do paciente—pode ser entendido de mais de uma maneira, e o simples fato de colocar as coisas no papel ou na tela do computador frequentemente nos possibilita fazer conexões que de outra forma não teríamos feito (por exemplo, os nomes de duas pessoas importantes no passado do paciente são idênticos, ou que o nome exótico de uma religião praticada pelo paciente é escrito exatamente como o seu sobrenome). Ao invés de serem encorajados a perceber que estão erroneamente se situando como alvo da raiva do paciente, e que devem tentar situar-se diferentemente na análise, eles preferemacreditar que estão experimentando “identificação projetiva,” um estado de sentimento em que a analista supostamente experimenta aquilo que o paciente pode estar experimentando, mas que não quer (ele projetou “nela”), ou sente que o paciente recusa-se a sentir, sendo aquele sentimento supostamente cindido por ele. Mecanismo de defesa do paciente [identificação projetiva] frequentemente alcança seus objetivos—em nosso caso, fazer a analista se sentir culpada—e não somente implica (como foi dito algumas vezes) que “o paciente espere se sentir culpado,” ou que “a analista deveria ficar triste e deprimida.” A identificação da analista com o objeto com o qual o paciente a identifica é, repito, o processo contratransferencial normal. Sandler (1987) sustentou que o estágio 3 no desenvolvimento do conceito de identificação projetiva veio com Wilfred Bion, que, do ponto de vista de Sandler, tem uma vantagem sobre Racker: mais do que ver a analista atuando no papel da identificação, concordante ou complementar—sugere que a subjetividade da analista está de alguma forma envolvida—Bion (1962) descreveu a analista como um objeto de várias espécies (oposto a um sujeito), como um “container” dentro do qual o paciente simplesmente coloca o que quiser, a analista não aceita e nem rejeita algumas ou todas as projeções do paciente (Ogden, 1982) O efeito dessa reconceitualização é tirar a analista dessa igualação, de certa forma, sugerindo que a analista não pode, de forma alguma, ser culpada ou, ao contrário, ser responsabilizada pelo que está sentindo e experimentando: seus “sentimentos contratransferenciais” na verdade não são totalmente contratransferenciais, uma vez que correspondem diretamente e de uma forma intuitiva à transferência do 44 paciente. Não obstante, existem partes do mundo moderno em que a taxa de mortalidade infantil é extremamente alta— por exemplo, hoje, metade das crianças morre por volta dos cinco anos no Haiti (Arnst, 2006)—e não era incomum nem no século XVIII na Inglaterra, as mulheres perderem a maioria de seus filhos antes que alcançassem os sete anos (os pais de John Law, considerado o inventor do papel moeda, perdeu 10 dos seus 14 filhos com doenças infantis). Os Ocidentais modernos sem dúvida ficariam chocados com a forma como os não-Ocidentais falam (e as pessoas de séculos anteriores escreveriam) sobre a perda de suas crianças, que somam uma em cada cinco no primeiro ano de vida, em alguns países ainda hoje, em que, nas palavras de Thomas Hobbes, a vida continua “desagradável, brutal e curta.” Todavia, suas atitudes não são sinal de sentimentos, mas refletem sem dúvida uma realidade severa, austera e por vezes o sentimento de que é desejo de Deus. Desistindo do uso do discurso para conhecer alguma coisa da história da paciente, como último recurso, Ogden vasculhou minuciosamente seus próprios medos e ruminações durante as sessões (o que, admitiu, poderia ser diferente de seus medos e ruminações durante as sessões com outros pacientes) para tentar encontrar alguma interpretação sobre o que acontecia naquela análise, interpretação esta que surpreendesse o leitor, baseado no pouco que foi dito sobre a paciente. Em vez de conhecer os pensamentos e sentimentos da analista, como algo causado pelo paciente, ou por alguma criação da análise (o chamado terceiro analítico), eu sugeriria que Ogden tenha adoecido com sua própria técnica e estava doente suficientemente para prestar atenção à situação da paciente na análise, de um jeito que amarrasse à sua história (ela se ressentiu de seu analista, sem dúvida, por entender que ele era um homem que, como seu pai, parecia ter pouco ou nenhum interesse por ela, ao menos em parte, porque ele não pediu que ela falasse aquilo que ela sabia muito bem que precisaria falar). Não seria improvável levantar a hipótese que suas terapeutas femininas quisessem que ele as associasse com uma figura feminina positiva em sua vida e de uma forma ou de outra, dirigiram sua atenção primeiramente ao pai—com quem sentiram que não seriam facilmente confundidas nas projeções do paciente —autorizando-as a ficar, em um nível mais alto, fora da linha de tiro (Curiosamente, em poucas semanas de trabalho comigo, sua dificuldade de conseguir e manter a ereção com sua namorada diminuiu consideravelmente). Para discussão da transferência negativa, veja Miller (2005), que traz alguns comentários que Lacan fez sobre transferência negativa e oferece as seguintes ideias/reflexões: (1) à medida que os pacientes sempre entram na análise sentindo que não sabem nada, que se sentem vazios ou privados em diversos aspectos, ficam irritados com seus analistas, que são julgados conhecedores de tudo ou figuras ideais (o que o paciente deseja ser é confrontado com a pessoa do analista; Lacan propôs que, no melhor dos casos, o supervisionando pode aprender a se situar na posição simbólica em que o supervisor é automaticamente colocado, mesmo quando o supervisionando está no consultório com o paciente: Se o supervisionando fosse colocado pelo supervisor em uma posição subjetiva diferente daquela subentendida pelo ameaçador termo controle (vantajosamente substituído, mas só na língua inglesa, por “supervision”), o melhor proveito que extrairia desse exercício seria o de aprender a colocar-se na posição de subjetividade complementar na qual a situação automaticamente coloca o supervisor (p. 90) usou o típico sinal para mulher (um círculo com uma cruz na parte de baixo) “porque a abstração representa o container” e o sinal típico para homem (um círculo com uma flecha saindo na parte de cima) “para o contido.” Em outras palavras, Bion acreditava na possibilidade de um relacionamento direto entre container e contido, entre a analista e o que é projetado nela, que é parecido com um tipo de relação direta, sem intermediação entre sexos (na verdade, algum tipo de “harmonia preestabelecida”). Não acredito que exista tal coisa como “observação objetiva” no domínio psicológico, na medida em que todos vemos a “realidade” pelas lentes de nossas próprias fantasias, e não acredito que seja possível para a analista, na prática, distinguir totalmente entre amor e ódio pelo paciente, em razão das próprias suscetibilidades da analista. Embora eu geralmente pense que dividimos o mundo em dentro e fora de forma muito rígida ao dizer que algo “está todo dentro da nossa mente” ou que “o mundo externo está nos dizendo algo,” costumo pensar que os teóricos que aceitam a noção de identificação projetiva também usam os termos fora e dentro de forma bastante rígida quando falam sobre as crianças que perpetuamente introjetam e projetam objetos, como se os objetos de que estão falando estejam de fato situados em algum lugar que seja claramente definido como eu e não eu. Os analistas que acreditam em identificação projetiva teriam, então, que admitir que a identificação projetiva ocorre somente no trabalho com psicóticos— embora a questão que se coloca é, por que os próprios analistas estariam sujeitos ao transitivismo, só porque seus pacientes psicóticos estão—ou que o transitivismo continua mais ou menos irrestrito ao longo de nossas vidas de uma forma que nunca se torna mediado pela linguagem e costumes. Pode-se ir longe ao dizer que, considerando que encontramos conceitos como “ego autônomo” nos aspectos predominantemente obsessivos da teorização psicanalítica, e conceitos como “o desejo do homem é o desejo do outro” nos aspectos que predominam na histeria da teorização psicanalítica, os conceitos como “identificação projetiva” derivam dos aspectos predominantemente psicóticos da teorização psicanalítica. Note que Lacan (1976–1977, Dezembro 14, 1976), fez o próprio diagnóstico publicamente (talvez com ironia, pelo menos até certo ponto), dizendo, “No final da análise, sou um perfeito histérico,isto é, alguém sem sintomas, exceto de vez em quando.” Por incrível que pareça, o que me impressiona numa das obras mais entediantes da teoria obsessiva na literatura psicanalítica, Analysis of Transference de Gill (1982), é que dá ênfase à importância do papel do analista na situação analítica.
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