Buscar

Toxoplasmose: Agente Causal e Ciclo Biológico

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 17 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 17 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 17 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

"' o ·-""' 'ta o 
~ ..., 
o 
""' a.. 
""' o e. 
"' ta 
"'C ·-N 
:J 
"'C o 
""' a.. 
"' ta 
ui 
e 
cu o o 
Toxoplasmose 
Sergio G. Coutinho e Tânia Regina Constant Vergara 
...,. Introdução 
O Toxoplasma gondii, agente causal da toxoplasmose, é um 
protozoário parasito intracelular do filo Apicomplexa, ordem 
Eucoccidia, capaz de infectar tanto mamíferos como aves, 
inclusive o homem. Quando transmitido congenitamente pode 
trazer graves danos, principalmente neurológicos, ao embrião 
ou ao feto, e também oculares, neste último. Se adquirido após 
o nascimento origina, na grande maioria das vezes, infecção 
inaparente ou de curso benigno em indivíduos imunocompe­
tentes. Pode tornar-se um importante problema nos imuno­
comprometidos, em virtude das graves lesões que pode causar 
principalmente no sistema nervoso central (SNC). Tem larga 
distribuição geográfica, ocorrendo tanto em países desenvol­
vidos como em desenvolvimento, constituindo um importante 
problema médico e veterinário. 
O parasito foi descrito por Nicolle e Manceau, em 1909, ao 
encontrarem um roedor ( Ctenodactylus gondii) infectado, e, 
quase simultaneamente, por Splendore, no Brasil, a partir de 
coelhos mantidos em laboratório. Daí em diante várias outras 
descrições ocorreram, com isolamentos a partir de tecidos 
de diferentes animais, criando-se novas espécies dentro do 
gênero Toxoplasma. Posteriormente, verificou-se que todas 
elas referiam-se a uma única espécie, o Toxoplasma gondii. 
Casos da doença humana passaram a ser descritos: Janku, 
em 1923, observou lesões oculares em um paciente, e Wolf e 
Cowen, em 1937, relataram casos de crianças em que, prova­
velmente, a transmissão congênita havia ocorrido. No Brasil, 
importantes contribuições ao conhecimento foram realizadas, 
principalmente por Torres, em 1927, quando fez as primeiras 
descrições anatomopatológicas da doença, e por Delascio, em 
1956, com detalhadas informações sobre a forma congênita. 
Com o desenvolvimento do teste sorológico do corante por 
Sabin e Feldman, em 1948, foi possível associar as várias apre­
sentações clínicas da doença à etiologia por T. gondii. 
...,. O ciclo biológico 
O ciclo biológico do parasito apresenta uma fase sexuada, game­
togônica, descrita há relativamente pouco tempo (Frenkel et al., 
1970; Hutchinson et al., 1971; além de outros), que ocorre exclu­
sivamente nas células epiteliais do intestino do gato e de outros 
felinos, principalmente os mais jovens. Após uma série de divisões 
múltiplas assexuadas (esquizogonia) inicia-se o ciclo sexuado, 
levando à formação de microgametas que fertilizam os macro­
gametas originando oocistos, sendo estes liberados no lúmen do 
intestino e assim eliminados nas fezes do felino infectado. 
Os oocistos (10 X 12 m) têm forma arredondada, sendo 
encontrados aos milhares, ainda imaturos (Figura 70. lA), nas 
fezes de gatos, durante a fase aguda da infecção, que dura em 
geral de 1a3 semanas. Após cerca de 4 dias no solo tornam-se 
maduros, por um processo chamado esporogonia, passando a 
conter dois esporocistos, cada um deles com quatro esporozoí­
tos (Figura 70.lB). Oocistos maduros são infectantes quando 
ingeridos tanto pelo próprio gato como por outros animais, 
inclusive o homem. Constituem importante forma de transmis­
são da toxoplasmose, principalmente para animais herbívoros, 
roedores, aves e grupos humanos vegetarianos, ao ingerirem 
alimentos provenientes de solo contaminado com fezes de gato. 
Animais carnívoros e onívoros também podem se infectar oral­
mente por oocistos, por meio de água contaminada ou alimen­
tos em contato com o solo, em locais onde circulam gatos. 
Os oocistos ingeridos liberam esporozoítas, que penetram 
nas células da mucosa intestinal, passando a seguir para um 
outro estágio, o de taquizoítas. Inicia-se assim o ciclo assexu­
ado do parasito, levando a uma infecção sistêmica, em que 
ocorre o parasitismo em vários tecidos do hospedeiro. 
Os taquizoítas (2 a 4 X 5 a 8 m) têm forma alongada em 
crescente ou ovalada. Multiplicam-se por um tipo particular 
de divisão binária (endodiogenia), em vacúolos citoplasmáti­
cos de todos os tipos de células do hospedeiro, exceto as hemá­
cias. Quando um indivíduo é infectado pela primeira vez, 
não tendo ainda imunidade adquirida por infecção anterior, 
o parasito não encontra resistência específica do hospedeiro, 
podendo ter uma fase de multiplicação rápida em suas célu­
las, terminando por destruí-las. A seguir penetra em outras 
• 1 • 
, 
~\ 
. - .. --- ~ t 
~~ 1 
a 
Figura 70.1 Toxoplasma gondii. A. Oocisto não esporulado recente­
mente eliminado em fezes de gato. B. Oocisto contendo dois esporo­
cistos, cada um com quatro esporozoítas, 4 dias após ter sido eliminado 
em fezes de gato. C. Cisto não corado em cérebro de camundongo. 
células, expandindo o parasitismo por via hematogênica, ori­
ginando a chamada fase aguda da infecção pelo T. gondii. Esta 
fase aguda ocorre, na maioria das vezes, de forma inaparente 
no hospedeiro humano imunocompetente, originando a toxo­
plasmose infecção. Menos frequentemente, pode originar a 
toxoplasmose doença, com sintomatologia em geral benigna. 
Vários tecidos podem estar infectados, incluindo muscular 
estriado e cardíaco, linfático, SNC, ocular e placentário. 
Com o surgimento da resposta imune adaptativa do hospe­
deiro, 2 a 3 semanas após a primoinfecção, a fase de multiplica­
ção rápida do parasito vai se extinguindo e, consequentemente, 
a fase aguda da infecção. O parasito passa a se multiplicar mais 
lentamente, passando para outro estágio, o bradizoíta. 
Os bradizoítas têm morfologia similar à dos taquizoítas, 
diferindo quanto às moléculas estágio-específicas em sua 
membrana, enzimas e proteínas de choque térmico. Outra 
diferença fundamental é a resistência dos bradizoítas à diges­
tão por ácido-pepsina (Lyon et al., 2002). Na célula parasi­
tada, eles se dividem lentamente em vacúolos citoplasmáticos, 
levando à perda completa da estrutura da célula do hospedeiro, 
originando cistos de paredes nítidas, contendo milhares de 
bradizoítas. O aparecimento dos cistos está relacionado com o 
estabelecimento de uma resposta imune efetiva, mas que não 
age sobre os bradizoítas no interior dos cistos (Figura 68.lC). 
Os cistos (20 a 200 m) têm longevidade mal determinada, 
podendo eventualmente se romper, liberando bradizoítas, 
que nos indivíduos imunocompetentes são imediatamente 
destruídos pela resposta imune adaptativa, impedindo nova 
disseminação do parasito. Acredita-se, entretanto, que os cis­
tos possam se reestruturar sob a pressão da resposta imune, 
representando formas parasitárias dinâmicas, que mantêm o 
indivíduo, provavelmente para sempre, parasitado após a pri­
moinfecção, mas protegido contra reinfecções ou reagudiza­
ções, em virtude da resposta imune adaptativa que a presença 
dos cistos continua estimulando. Este período é chamado fase 
latente ou crônica da toxoplasmose, uma vez que os indivíduos 
estão inteiramente saudáveis, mas tendo cistos contendo para­
sitos viáveis em vários tecidos, principalmente no muscular 
estriado e cardíaco e no SNC. Assim sendo, após a primoin­
fecção seguida da fase latente, o indivíduo imunocompetente 
estará protegido contra reagudizações ou novas infecções. 
Nos indivíduos imunocomprometidos a eventual ruptura de 
um cisto libera bradizoítas que, livres de uma resposta imune 
competente, podem se transformar novamente em taquizoítas, 
gerando reagudização do processo. 
Os cistos representam uma importante forma de transmis­
são do parasito para animais carnívoros e onívoros, inclusive 
o homem, quando eles se alimentam de carne de animal que 
já tivesse sido infectado anteriormente, estando, portanto, na 
fase latente da infecção, albergando cistos do parasito em seus 
tecidos. Estas formas, quando ingeridas, liberam bradizoítas 
no lúmen intestinal, que resistem às enzimas digestivas. Após 
penetrarem na mucosa, originam taquizoítas intracelulares 
e infecção aguda disseminada noshospedeiros não imunes 
(Barragan e Sibley, 2002). 
Por outro lado, gatos e outros felinos, quando se infec­
tam pela primeira vez, seja por oocistos presentes no solo, 
seja por cistos contidos na carne ingerida, são capazes de 
desenvolver, concomitantemente, tanto o ciclo sexuado ter­
minando pela eliminação de oocistos nas fezes como o ciclo 
assexuado, levando a uma fase aguda e posteriormente à fase 
latente, com formação de cistos nos tecidos. Estes animais são 
os únicos que podem desenvolver tanto o ciclo sexuado como 
Capítulo 70 1 Toxoplasmose 869 
o assexuado do parasito. Todos os outros animais hospedeiros 
somente desenvolvem o ciclo assexuado, seja quando infec­
tados por oocistos provenientes das fezes de gatos, seja por 
cistos mediante carnivorismo. O T. gondii representa um raro 
exemplo de parasito cujo ciclo assexuado pode continuar por 
carnivorismo, independentemente do ciclo sexuado. 
Se os oocistos e cistos estão associados à transmissão da 
toxoplasmose após o nascimento, os taquizoítas são os res­
ponsáveis pelos casos de transmissão congênita. Este fato pode 
ocorrer quando a gestante, em qualquer fase da gravidez, ou 
mesmo algumas semanas antes do seu início, adquire a parasi­
tose pela primeira vez, apresentando infecção aguda. Taquizoí­
tas, presentes inclusive no sangue, podem originar transmissão 
intrauterina, levando a maiores ou menores danos ao embrião 
ou ao feto (Figura 70.2). 
Em termos de ultraestrutura do parasito, tanto taquizoí­
tas como bradizoítas e esporozoítos apresentam um complexo 
apical típico do filo Apicomplexa, constituído por conoide, 
róptrias e micronemas, importantes no mecanismo de pene­
tração do parasito nas células do hospedeiro (Figura 70.3). 
• Cepas de T. gondii 
Análises isoenzimáticas e genéticas de inúmeros isolados do 
parasito verificaram a existência de pelo menos três linhagens 
clonais, denominadas 1, II e Ili, que diferem quanto ao genótipo 
SAG2, assim como quanto a virulência e locais de ocorrência 
(Dardé et al., 1992; Sibley e Boothroyd, 1992; Howe e Sibley, 
1995; Howe et al., 1997). Todas as três cepas têm ampla distri­
buição geográfica e podem infectar diferentes espécies animais, 
inclusive o homem. Enquanto na América do Norte e Europa 
a linhagem clonal Tipo II é altamente predominante, no Brasil 
tal linhagem não tem sido em geral identificada, sendo mais 
comuns as dos Tipos 1 e III. Grande parte das cepas aqui isoladas 
é do Tipo 1 ou tem genótipos mistos (I/111), a patogenicidade é 
em geral elevada em humanos e têm sido identificadas em casos 
graves de toxoplasmose ocular (Vallochi et al., 2005). 
No Brasil, o estudo de 25 isolados de T. gondii, a partir de 
galinhas assintomáticas provenientes de áreas rurais em torno 
da cidade de São Paulo, mostrou predominância da linhagem 1, 
mas também da III em menor frequência (Dubey et al., 2002b). 
...,. Epidemiologia 
A toxoplasmose em sua forma latente (crônica) tem ampla 
distribuição mundial, como tem sido demonstrado por vários 
inquéritos sorológicos entre populações humanas e de outros 
animais. As menores prevalências têm sido encontradas em 
regiões muito frias ou muito áridas, onde a baixa densidade de 
felinos, aliada à menor sobrevida dos oocistos no solo, diminui 
os índices de parasitismo de herbívoros, roedores e pássaros, e, 
consequentemente, dos carnívoros que deles se alimentam. 
Inquérito sorológico entre animais mostrou 26,3% de gatos 
com anticorpos para T. gondii em São Paulo (Silva et al., 2002), 
índice este similar aos encontrados em regiões dos EUA (Dubey 
et al., 2002c). Gatos têm grande importância na epidemiologia da 
toxoplasmose, principalmente os mais jovens, porque, quando 
infectados pela primeira vez, eliminam milhões de oocistos, 
que persistem viáveis no solo por cerca de 1 ano ou mais, na 
dependência das condições de umidade e temperatura (Frenkel 
et al., 1975). Oocistos têm sido inclusive isolados do solo, em 
áreas de ocorrência da doença (Ruiz et al., 1973; Coutinho et al., 
870 Parte 2 1 Parte Específica 
Hospedeiros intermediários albergando 
cistos de T gondíí nos tecidos (bradizoftas), 
multiplicação assexuada 
Cisto nos 
tecidos 
(fase latente) 
Hospedeiros definitivos: gatos e outros felinos 
Oocisto: 
muttiplicação 
sexuada no 
intestino 
J 
Cisto: 
multiplicação 
assexuada 
em tecidos f (fase latente) 
Fezes de gato à 
Oocisto 
® . . . 
contato com o solo - via oral 
~'t:;:;{;I Oocisto esporulado após 4 a 6 dias 
em solo contaminado por fezes de gato 
contato com 
o solo • via oral 
.· . 
o . • 
transmissão tr11nsplacentária 
(congénita) duran te a fase 
aguda da infecção - t11q11izort a.<1 
•• . . o • 
" 
Cisto nos 
tecidos 
(fase latente) 
Figura 70.2 Principais formas de transmissão do Toxoplasma gondii. Oocistos são eliminados em fezes de gatos e outros felinos, sendo infec­
tantes para numerosas espécies de animais, inclusive o homem e o próprio gato. Cistos presentes nos tecidos são infectantes para animais 
carnívoros, incluindo o gato e também o homem. O gato é o hospedeiro definitivo por albergar a fase sexuada do ciclo, na mucosa de seu 
intestino, mas também é suscetível à fase assexuada, tendo cistos em seus tecidos. Transmissão transplacentária pode ocorrer durante a fase 
aguda da infecção por intermédio de taquizoítas. 
Aparelho de 
Golgi 
Conoide 
Grânulos _.-1,M 
densos 
Núcleo --
\ 
\ 
\ M't • d. _,..,.,..-- 1ocon na 
/ 
Figura 70.3 Esquema mostrando a u ltraestrutura do taquizoít a de 
Toxop/asma gondii. O complexo a pica i é importante na penetração 
na célula do hospedeiro. 
1982). Entre cães, a proporção de soropositivos encontrada por 
Coutinho et al. (1968) foi de 79% no Rio de Janeiro e por Salata 
et al. (1985) de 64% em Botucatu. Por outro lado, animais cuja 
carne é habitualmente consumida pelo homem também são 
importantes na epidemiologia da toxoplasmose, pois ao se con­
taminarem com oocistos presentes no solo, passam a apresentar 
cistos em seus tecidos. A carne consumida pelo homem, princi­
palmente se houver preferência por mal cozida ou crua, repre­
senta importante fonte de infecção. No Brasil, como em outros 
países, porcentagens variáveis de animais soropositivos para T. 
gondii são encontradas em rebanhos de bovinos, suínos, ovinos 
e caprinos, assim como em criações de galinhas. Como exem­
plo, Minardi et al. (2003) encontraram 14,5% de caprinos soro­
positivos em São Paulo. Nos EUA, a soroprevalência de infecção 
pelo T. gondii em suínos, cuja carne é vendida nos mercados das 
cidades, é muito baixa, chegando a 0,58%, enquanto em peque­
nas fazendas as prevalências podem atingir 93% (Dubey et al., 
2002a). A proximidade de gatos e o tipo de alimentação devem 
explicar estas diferenças. 
Surtos epidêmicos de toxoplasmose têm sido relatados com 
certa frequência em várias regiões do mundo, sempre relacio­
nados com a presença de gatos (Teutsch et al., 1979; Stagno 
et al., 1980) ou ingestão de carne mal cozida (Kean et al., 
1969), ou provavelmente à combinação de ambos os fatores 
(Magaldi et al., 1967; Coutinho et al., 1982). Surtos associa­
dos à água para beber em algumas municipalidades também 
têm sido relatados (Bowie et al., 1997). No Brasil, áreas de 
alta endemicidade têm sido descritas, uma delas na região de 
Erechim no Rio Grande do Sul, onde o manuseio da carne 
crua para a confecção de linguiça e similares tem sido respon­
sabilizado pela elevada prevalência da doença, incluindo casos 
de retinocoroidites (Glasner et al., 1992). A presença de gatos e 
roedores em cerca de 90% das propriedades de criação de suí­
nos nesta região (Araújo et al., 2000) parece ter importância 
nos elevados índices da doença. Outra área de maior ende­
micidade encontra-se no norte do estado de Rio de Janeiro, 
onde a água oferecida à população, provavelmente poluída por 
fezes de gato, vem sendo incriminada como fonte de infecção 
(Bahia-Oliveira, 2003). 
Populações humanas em centros urbanos de países desen­
volvidos, ou em desenvolvimento,apresentam índices de infec­
ção que variam entre 20 e 80% entre adultos. Walton (1971) 
estima que a prevalência na América Latina de indivíduos com 
anticorpos para T. gondii situa-se entre 50 e 70%. Nos EUA a 
prevalência de soropositivos é em geral mais baixa, enquanto na 
França as taxas são similares às encontradas na América Latina, 
provavelmente pelo hábito dos franceses de consumir carne crua 
ou mal cozida. Inquéritos sorológicos, realizados nas cidades de 
Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro, demonstraram pro­
porções de soropositivos para T. gondii de 50,3, 54,8 e 78,7% 
respectivamente (Araujo, 1970; Camargo et al., 1976; Coutinho 
et al., 1981). Estes índices de infecção estão relacionados tanto à 
ingestão de carne crua ou mal passada, já que os cistos resistem 
a temperaturas de cocção de até 60ºC, ao congelamento (para a 
conservação dos alimentos), como à presença de gatos conta­
minando domicílios e logradouros públicos com suas fezes. Em 
áreas com características rurais tais índices podem ser mais ele­
vados, havendo relatos que associam a transmissão da infecção à 
maior presença de gatos nestas áreas, sem descartar a importân­
cia da ingestão de carne mal cozida (Frenkel e Ruiz, 1981; Souza 
et al., 1987). Inquéritos entre tribos indígenas no Brasil mostram 
elevadas prevalências da infecção pelo T. gondii (Baruzzi, 1970; 
Amendoeira et al., 2003), evidenciando a ocorrência do parasito 
Capítulo 70 1 Toxoplasmose 871 
entre animais no ambiente silvestre, com a provável importante 
participação de felinos selvagens, eliminando oocistos. 
Em crianças, as proporções de soropositivos para T. gondii 
crescem com a idade, atingindo os patamares dos adultos no final 
da puberdade, sugerindo que elas são precocemente infectadas 
(Frenkel e Ruiz, 1981). Resultados semelhantes foram encon­
trados no Rio de Janeiro, indicando que a primoinfecção pelo T. 
gondii é adquirida com maior frequência na primeira década da 
vida, quando foram demonstrados títulos de anticorpos mais ele­
vados contra antígenos do parasito, sugerindo infecção recente 
(Figura 70.4). Este dado não é surpreendente, uma vez que é 
nesta fase da vida que as crianças passam a ter maior exposição 
ao ambiente externo, alimentando-se com carne e tendo contato 
com terra. Entretanto, é possível que, ao menos entre crianças, 
uma única exposição ao parasito não seja suficiente para o desen­
volvimento de uma imunidade protetora e sustentada para o resto 
da vida (Frenkel e Ruiz, 1980), havendo necessidade de outros 
episódios de exposição, que teriam então um efeito de reforço da 
resposta imune. Nesse sentido, existe relato de crianças imuno­
competentes, em que a resposta imune após a primeira infecção 
não foi aparentemente suficiente para protegê-las contra infecção 
subsequente (Coutinho et al., 1982). Outras possibilidades que 
explicariam a ocorrência de infecções múltiplas estariam relacio­
nadas com a existência de cepas de T. gondii de maior virulência, 
ou formas de contaminação diferentes, por cistos ou oocistos, 
influindo na resposta imune. De qualquer forma, a grande maio­
ria dos adultos, inclusive gestantes, encontra-se protegida contra 
reinfecções, em virtude da imunidade induzida em exposições 
anteriores ao parasito. Desta forma, caso viessem a se contaminar 
novamente não resultaria em doença e muito menos em trans­
missão congênita (Montoya e Liesenfeld, 2004). 
Trabalho recente (Aspinall et al., 2003) evidencia que pacien­
tes de toxoplasmose podem ter sofrido múltiplas infecções, já que 
cerca de um terço de 32 pacientes submetidos à genotipagem para 
SAG2 apresentavam infecção concomitante pelas linhagens 1 e II. 
Os possíveis mecanismos que levariam a estas infecções mistas 
incluem contaminações subsequentes por T. gondii de linhagens 
diferentes, principalmente em indivíduos imunocomprometidos. 
Outra possibilidade seria a ocorrência de mais de uma infecção 
5 10 15 20 
Grupos etários 
Figura 70.4 Anticorpos lgG para Toxoplasma gondii pela imunofluores­
cência indireta no soro de 280 pacientes que procuraram ambulatório 
por diversas causas não relacionadas com a toxoplasmose. Curvas mos­
trando: +, porcentagens de indivíduos soroposit ivos (reagentes) em 
diluições do soro acima de 1 :16; e •, porcentagens de soropositivos 
(reagentes) em diluições iguais ou superiores a 1 :4.096 (níveis elevados), 
de acordo com os grupos etários. 
872 Parte 2 1 Parte Específica 
adquirida em dias próximos, por indivíduos imunocompetentes, 
com parasitos de linhagens diferentes, por meio de oocistos no 
meio ambiente e/ ou cistos em carne mal cozida. Assim sendo, em 
ambientes frequentados por gatos é grande a possibilidade de o 
solo estar contaminado por oocistos de diversas procedências, 
possibilitando ao homem adquirir em sua primoinfecção mais de 
uma linhagem do parasito concomitantemente. Por outro lado, 
animais infectados dessa mesma forma podem albergar cistos de 
procedências diferentes, originando no homem primoinfecções 
mistas, caso sua carne fosse consumida. 
A forma de transmissão congênita pode originar tanto casos 
graves como inaparentes, ocorrendo quando a gestante adquire 
a primoinfecção durante a gestação, ou mesmo poucas sema­
nas antes de engravidar, quando ainda no curso da fase aguda 
da infecção. Nestes casos, taquizoítas atingem a circulação fetal 
após infectarem a placenta por via hematogênica. Entretanto, 
mesmo na vigência da fase aguda durante a gestação pode haver 
ou não transmissão materno-fetal, sendo variável a frequência de 
sua ocorrência, na dependência do período da gravidez em que 
a gestante se contaminou. Conhecer este momento em que está 
havendo parasitemia, em virtude de uma fase aguda quase sem­
pre subclínica na gestante, é fundamental para se avaliar primeiro 
o risco de transmissão ao feto e a seguir o risco de dano fetal 
grave. Os testes sorológicos representam a principal ferramenta 
para se avaliar tais situações. Várias publicações (Hohlfeld et al., 
1994; Dunn et al., 1999) têm demonstrado que o risco de trans­
missão fetal é menor nas primeiras semanas da gravidez, aumen­
tando com a idade gestacional, atingindo o máximo no último 
trimestre, quando pode chegar a cerca de 60%. Inversamente, o 
risco de maior dano fetal ocorre no primeiro e segundo trimes­
tres, levando em geral à morte do embrião ou do feto e aborto 
espontâneo, enquanto a transmissão no terceiro trimestre leva 
frequentemente a formas subclínicas neonatais. Neste último 
caso é menor a possibilidade de sequelas graves. Assim sendo, a 
grande maioria dos casos de recém-natos com toxoplasmose con­
gênita apresenta a forma subclínica, sendo fundamental que seja 
diagnosticada e imediatamente tratada, para que não continue a 
evoluir de maneira inaparente, causando futuramente retinoco­
roidite e retardo no desenvolvimento (Wilson et al., 1980). 
Por outro lado, gestantes na fase latente da infecção, já 
tendo tido a primoinfecção na infância ou muitos meses antes 
de engravidar, não apresentam risco de transmissão materno­
fetal, já que estão imunologicamente protegidas contra a fase 
aguda. A exceção seriam gestantes imunocomprometidas, seja 
pelo HIV ou outras causas. 
As taxas de toxoplasmose congênita nos EUA e na Europa 
variam de 0,1 a 2 nascimentos por 1.000 (Alford et al., 1974; 
Stray-Pedersen, 1980; Lebech et al., 1999). O risco de trans­
missão congênita na França tem sido maior, estimado em 10 
entre 1.000 gestações (Desmonts e Couvreur, 1974), enquanto 
no Rio de Janeiro foram encontrados 4 casos de transmissão 
congênita entre 1.034 nascidos vivos (Coutinho et al., 1983). 
Transmissão pós-natal durante a fase aguda, por aleitamento 
materno, deve ser excepcional. 
~ Ação patogênica e resposta 
imune do hospedeiro 
Fatores relacionados com a virulência do parasito (Su et al., 
2002) e à resistência do hospedeiro (Suzuki, 2002) influenciam 
o curso da infecção. Taquizoítas penetram ativamente ou são 
fagocitados por células do hospedeiro, multiplicando-seem 
vacúolos parasitóforos, onde impedem a fusão de lisossomos, 
conseguindo assim sobreviver e destruir a célula parasitada 
durante a fase aguda. Em poucos dias vai surgindo a resposta 
imune adaptativa do hospedeiro, que em cerca de 2 semanas 
atinge sua maior eficácia, tornando-se duradoura daí em diante. 
A principal resposta imune celular é do tipo Thl, havendo libe­
ração de citocinas, entre elas interferona gama ( Gazzinelli et al., 
1991) e fator de necrose tum oral alfa, capazes de ativar macrófa­
gos para a destruição do parasito, limitando assim a fase aguda 
e as alterações patológicas (Denkers e Gazzinelli, 1998). Células 
dendríticas têm importante papel na resposta imune celular, por 
serem eficazes apresentadoras de antígenos parasitários, além de 
produzirem interleucina-12, importante para induzir à resposta 
Thl e estimular linfócitos T dos subtipos CD4+ e CDS+, especí­
ficos anti-T. gondii (Fischer et al., 2000; Gazzinelli et al., 1992 ). 
Estas células podem ainda apresentar nítida atividade citotóxica 
específica contra células parasitadas, contribuindo para a con­
tenção do parasitismo (Montoya et al., 1996). 
Linfócitos B devem ter um importante papel, já que são capazes 
de prevenir a encefalite toxoplasma em camundongos, mediante 
a produção de anticorpos específicos (Suzuki, 2002). No soro dos 
indivíduos infectados são detectados anticorpos das classes IgM, 
logo nos quatro a seis primeiros dias pós-infecção, surgindo em 
cerca de 2 semanas anticorpos IgG, IgA e IgE. Anticorpos IgA 
produzidos na mucosa intestinal devem ter algum papel na pro­
teção contra novas infecções VO (Chardes et al., 1990). 
Cistos nos tecidos não têm maior importância na patogenia 
da toxoplasmose, já que no caso de se romperem, originarão 
reação inflamatória localizada, e os bradizoítos porventura libe­
rados serão rapidamente destruídos pela resposta imune do 
hospedeiro. Uma exceção seria no caso de o cisto rompido estar 
localizado na retina, onde pequena reação inflamatória pode ter 
repercussão sobre a visão. Outra exceção seria a eventual rup­
tura de um cisto em indivíduo imunocomprometido, acarre­
tando reagudização da toxoplasmose, como já mencionado. 
~Patologia 
A patologia mais conhecida da toxoplasmose pós-natal nos 
indivíduos imunocompetentes é a linfadenopatia, que tem 
sido estudada por meio de material obtido por biopsia gan­
glionar. São encontrados aspectos sugestivos da etiologia por 
T. gondii, como hiperplasia folicular, assim como grumos irre­
gulares de histiócitos infiltrando e ultrapassando as margens 
dos centros germinativos, tornando-as imprecisas (Dorfman 
e Remington, 1973). Granulomas, células gigantes ou focos de 
necrose não são normalmente visualizados. Taquizoítas são 
raramente detectáveis, também não sendo frequente a eviden­
ciação de fragmentos de DNA do parasito pela reação de poli­
merase em cadeia (PCR) em material ganglionar examinado 
(Weiss et al., 1992). Raramente a toxoplasmose aguda pós­
natal pode agravar-se, apresentando quadros de miocardite ou 
polimiosite, entre outros (Montoya et ai., 1997). 
A principal lesão ocular no paciente imunocompetente é a 
retinocoroidite, havendo importante reação inflamatória e focos 
de necrose, seguida de infiltrado granulomatoso na coroide. A 
uveíte posterior, causada pelo T. gondii, pode eventualmente 
estender-se, ocasionando uveíte anterior concomitante. 
A partir de material de necropsia, têm sido estudadas as gra­
ves sequelas da toxoplasmose congênita encontradas no SNC de 
recém-natos, assim como as lesões de fase aguda da toxoplasmose 
Figura 70.5 Cistos em formação no tecido pulmonar em caso de 
toxoplasmose congênita (original da Dra. Aparecida Garcia, Instituto 
Fernandes Figueira - Fiocruz, RJ). 
no SNC, em pacientes imunocomprometidos, principalmente 
em virtude da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). 
No primeiro caso vasculites e lesões necróticas são encontradas 
junto ao aqueduto de Sylvius e ventrículos cerebrais. Taquizoí­
tas ou cistos são visualizados junto às áreas de necrose ou de 
reação inflamatória no tecido cerebral. Hidrocefalia e dilatações 
ventriculares são causadas por obstruções à passagem do liquor 
cefalorraquidiano pelo aqueduto de Sylvius ou pelo forame de 
Monro. Áreas de necrose podem, a seguir, calcificar-se, origi­
nando imagens radiográficas características, embora não patog­
nomônicas de toxoplasmose. 
A encefalite por T. gondii em pacientes com AIDS é carac­
terizada pela presença frequente de abscessos cerebrais, onde 
intenso infiltrado inflamatório contendo taquizoítas em focos 
de necrose circunda uma área central não vascularizada 
(Conley et al., 1981). A encefalite por Toxoplasma com envol­
vimento difuso do tecido cerebral é um frequente achado de 
necropsia em pacientes com AIDS. 
A toxoplasmose pulmonar, como recentemente revisto por 
Pomeroy e Filice (1992), pode apresentar-se como uma pneu­
monite intersticial ou necrosante, podendo ser encontrados 
cistos ou taquizoítas no parênquima (Figura 70.5). Outros 
achados de necropsia em pacientes com AIDS são miocardi­
tes, miosites e gastrenterites, além de envolvimento do fígado, 
pâncreas e outras vísceras. 
~Formas clínicas 
Como já entendido, o termo toxoplamose se refere à doença 
com seus aspectos clínicos e patológicos, enquanto infecção pelo 
T. gondii refere-se à primoinfecção assintomática ou à persis­
tência de cistos do parasito nos tecidos de pessoas sadias. Neste 
último caso é denominanda infecção crônica ou latente. 
Na dependência do momento da transmissão, se após o nas­
cimento "toxoplasmose pós-natal", ou ainda em vida intraute­
rina "toxoplasmose congênitâ: a doença apresenta aspectos 
clínicos bem diferentes. 
• Toxoplasmose aguda pós-natal no paciente 
imunocompetente 
No Brasil, a primoinfecção, na maioria das vezes, ocorre 
na primeira década da vida, sendo assintomática nos indiví-
Capítulo 70 1 Toxoplasmose 873 
duos imunocompetentes em 80 a 90% dos casos (Remington, 
1974). Quando a fase aguda da toxoplasmose pós-natal apre­
senta repercussões clínicas, a forma de apresentação mais fre­
quente é a febril, com ou sem linfadenopatias. Nestes casos, 
a febre costuma não ser elevada e o estado geral do paciente 
se mantém conservado, podendo haver sensação de fadiga e 
desânimo. Tem duração de 1 a 2 semanas, às vezes estenden­
do-se um pouco mais. No hemograma aparece linfocitose com 
mononucleares atípicos, assemelhando-se à mononucleose. O 
aparecimento de linfadenopatias ocorre com maior frequência 
nas cadeias cervicais e occipitais, estando os gânglios aumen­
tados de volume, com diâmetro em geral não maior que 3 cm, 
tendo consistência firme, sem tendência à supuração (McCabe 
et al., 1987). O diagnóstico diferencial com linfomas e doença 
de Hodgkin se impõe, sendo a histopatologia, a partir de biop­
sia ganglionar, a PCR e os testes sorológicos para toxoplasmose 
bastante úteis para o esclarecimento. 
A doença é em geral autolimitada, com duração de pou­
cas semanas a 2 meses, estando a cura clínica relacionada com 
uma resposta imune apropriada. Em alguns casos gânglios lin­
fáticos podem permanecer aumentados por 6 a 12 meses. 
A ocorrência de doença grave no adulto imunocompetente 
é rara, mas têm sido relatados casos de febre acompanhada 
de rash cutâneo, queda do estado geral, hepatoesplenomegalia 
discreta, podendo ainda surgir pneumonite, miocardite, ence­
falite, de prognóstico reservado neste último caso. 
Após a cura clínica ou o término de uma fase aguda subclí­
nica (toxoplasmose infecção), inicia-se a fase latente (crônica) 
assintomática, associada a importante imunidade protetora 
contra novas infecções ou reagudizações. As exceções, como 
já referido, seriam a toxoplasmose ocular, que pode surgir 
mesmo em imunocompetentes, e episódios de reagudizações 
em indivíduos imunocomprometidos. 
• Toxoplasmose ocular 
A retinocoroidite é a lesão mais frequente da toxoplasmose 
ocular, sendo que nos EUA e na Europa estima-se quecerca de 
35% das retinocoroidites sejam causadas pelo T. gondii. Portela 
et al. (2004) mostraram que em uma população rural de Minas 
Gerais, 12,5% dos indivíduos infectados pelo T. gondii (sororre­
agentes) desenvolveram lesões oculares, sendo a maioria deles 
com idade superior a 50 anos. No Rio de Janeiro, Neves et al. 
(2009) encontraram 10,8% de retinocoroidite entre 37 pacien­
tes com toxoplasmose aguda adquirida. Resultados semelhantes 
têm sido encontrados em outras regiões, tanto na Europa como 
nos EUA. A transmissão congênita é responsável pela grande 
mai?ria dos casos, embora os primeiros sintomas de compro­
metimento ocular apareçam em geral mais tardiamente. Bosch­
Driessen et al. (2002), em estudo retrospectivo, referem que, na 
Holanda, a idade média da primeira consulta ao oftalmologista 
foi aos 29,5 anos. Acredita-se que cistos do parasito localizados 
na retina e originários de uma infecção congênita possam vir a se 
romper muitos anos depois, na vida adulta, levando a uma rea­
ção inflamatória e dano ocular, sem causar maiores repercussões 
sistêmicas. Outras vezes, uma toxoplasmose ocular quiescente 
pode ser descoberta acidentalmente ou quando uma criança 
nota dificuldade de visão, em virtude de uma lesão macular 
ocorrida no período perinatal. A toxoplasmose aguda pós-natal 
pode também originar retinocoroidite, surgindo na vigência ou 
logo após a ocorrência da fase aguda. No primeiro caso, esta­
ria possivelmente relacionada com a presença de taquizoítas na 
retina e, no segundo, pela ruptura de cistos que foram aí for-
87 4 Parte 2 1 Parte Específica 
mados ao final da fase aguda. Prevalências mais elevadas de 
retinocoroidite têm sido encontradas em determinadas regiões 
geográficas, como é o caso de Erechim (RS), onde cerca de 95% 
da população é sororreagente para T. gondii, devido a condições 
epidemiológicas particulares que favorecem sua maior trans­
missão (Glasner et al., 1992). O genótipo de cepas de T. gondii 
isoladas em São Paulo e em Erechim tem sido altamente atípico, 
em comparação aos clássicos Tipos 1, li, III (Khan et al., 2006). 
Casos de retinocoroidite também têm sido descritos durante 
surtos epidêmicos de toxoplasmose aguda (Masur et al., 1978) 
não relacionados com a transmissão congênita. Pacientes imu­
nocomprometidos pelo HIV ou por outras causas podem apre­
sentar retinocoroidite, por ruptura de cistos preexistentes na 
retina ou na vigência da fase aguda da toxoplasmose. 
O diagnóstico clínico é baseado na presença de lesão reti­
niana focal ativa, branco-amarelada, sugerindo área de necrose, 
com margens pouco distintas, eventualmente associada a áreas 
de cicatrizes de lesões agudas anteriores de aspecto hiperpig­
mentado (Figura 70.6). Uma retinocoroidite primária difere 
dos casos de episódios de recorrência, pela presença, nestes 
últimos, de lesões antigas cicatrizadas, ao lado das lesões ati­
vas. As recorrências levam a lesões progressivas, comprome­
timento da visão e finalmente cegueira, que ocorre quando as 
lesões predominam na mácula e pelo descolamento da retina. 
Comprometimento do nervo óptico (papilite) pode estar pre­
sente. A provável causa das recorrências seria a ruptura de 
cisto produzindo reação inflamatória e necrose, seguida pela 
formação de novo cisto e sua ruptura alguns anos após. Outra 
explicação seria uma hipersensibilidade local, sem que se 
conhecesse o porquê dos episódios repetitivos. 
Sintomas frequentes da retinocoroidite aguda são visão 
turva, fotofobia, escotomas, dor, que regridem com a resolu­
ção da inflamação, permanecendo, entretanto, algum compro­
metimento da visão. 
Dos 154 pacientes de retinocoroidite por Toxoplasma acom­
panhados por Bosch-Driessen et al. (2002), observaram recor­
rências em 60% deles, tendo os episódios variado no intervalo 
de 2 meses a 25 anos. Lesões retinianas centrais ocorreram em 
53% dos casos e lesões periféricas em 40%. Embora o envol­
vimento ocular unilateral seja o mais frequente, lesões bila­
terais, mais agressivas, podem estar presentes principalmente 
em idosos ou imunocomprometidos. A duração, intensidade 
e recorrência das lesões estão relacionadas com fatores do 
hospedeiro e do parasito, cujo genótipo, neste último caso, 
parece ser determinante na intensidade da retinocoroidite 
(Commodaro et al., 2009; Vallochi et al., 2008). 
• Toxoplasmose aguda pós-natal no paciente 
imunocomprometido 
A infecção por T. gondii é amplamente disseminada na 
população, sendo a reativação um evento frequente entre indi­
víduos imunocomprometidos. Ao contrário do curso favo­
rável da infecção entre os imunocompetentes, naqueles cuja 
imunidade está deprimida, a toxoplasmose, em geral, evolui 
de forma grave (Israelski e Remington, 1993). Estão sob ele­
vado risco de desenvolver toxoplasmose os portadores de neo­
plasias hematológicas, em especial os portadores de linfomas, 
transplantados de medula óssea e receptores de transplante 
de órgãos sólidos e portadores de AIDS, com CD4 + inferior 
a 200 células/mm3
• Com exceção dos transplantados cardía­
cos e poucos outros imunocomprometidos soronegativos para 
Figura 70.6 Toxoplasmose ocular. A. Retinocoroidite por provável to­
xoplasmose congênita de surgimento tard io. Paciente de 9 anos com 
perda visual há mais de 30 dias no OD. B. Retinocoroidite exsudativa 
por provável toxoplasmose, tratada com esquema específico e melhora 
da inflamação. Uma das características das recaídas é a proximidade 
de lesões ativas e cicatrizadas, formando lesões coalescentes (genti­
leza do Dr. Eliezer Benchimol, Instituto de Pesquisas Clínicas Evandro 
Chagas - Fiocruz, RJ). 
T. gondii que adquirem a infecção a partir do órgão recebido 
(Luft et al., 1983; 1986), a toxoplasmose nos demais imuno­
comprometidos se deve à reativação. 
A encefalite por T. gondii é a apresentação mais comum da 
toxoplasmose em hospedeiros imunocomprometidos (Israelski 
e Remington, 1993), sendo a causa mais frequente de lesão 
focal do SNC entre os pacientes com AIDS (Luft e Remington, 
1992). O maior risco ocorre quando as células CD4+ no sangue 
estão em número inferior a 50/mm3
• A reativação preferen­
cial da infecção crônica pelo T. gondii no SNC já foi demons­
trada por vários autores (revisto por Ferreira e Borges, 2002). 
Algumas hipóteses já foram formuladas para explicar este fato: 
baixa imunidade local, déficit dos mecanismos que inibem a 
multiplicação do parasito, como anticorpos específicos e inter­
ferona gama, que não atravessam a barreira hematencefálica, e 
maior facilidade de o T. gondii penetrar no cérebro do que em 
outros órgãos (Ambroise-Thomas e Pelloux, 1993; Montoya e 
Remington, 1997). Por ser o SNC o principal foco de reativa-
ção de toxoplasmose entre imunocomprometidos, não tratare­
mos, neste capítulo, de outros órgãos que também podem ser 
atingidos, como coração, pulmão e olhos. 
O início da epidemia da AIDS provocou um aumento na 
incidência de encefalite por T. gondii (Vergara et al., 1986; Luft 
e Remington, 1988). No Brasil, desde a identificação do pri­
meiro caso em 1980 até junho de 2008, já foram diagnosti­
cados, aproximadamente, 506.000 casos da doença. Do total 
de notificações, cerca de 80% estão concentrados nas regiões 
Sudeste e Sul do país (Boletim Epidemiológico DST AIDS, 12, 
2008). A incidência e a mortalidade da toxoplasmose reduzi­
ram bastante após o início do tratamento antirretroviral de 
alta potência - TARV - e de ações profiláticas efetivas. A 
neurotoxoplasmose ocorre em aproximadamente um terço 
dos casos de AIDS, variando o número de casos com a soro­
prevalência da região (Grant et al., 1990). Segundo dados do 
Ministério da Saúde relativos aos anos de 1980 a 2000, de um 
total de 893.691 doenças notificadas no período, 26.897 delas 
(3%) eram casos de neurotoxoplasmose associados à AIDS. 
Em imunocomprometidos, os preditores de risco de ence­
falite por T. gondii incluem status sorológico, grau de imunos­
supressão e quimioprofilaxia (Grant et al., 1990). Em pacientescom AIDS, mais de 95% das encefalites por toxoplasmas são 
relacionadas com a reativação de foco primário, e mais de 90% 
destes pacientes têm o número de linfócitos T CD4 + abaixo de 
200 células/mm3
, estando sob maior risco aqueles com contagem 
de T CD4+ inferior a 100 células/mm3 (Luft e Remington, 1988; 
Porter e Sande, 1992). Em presença de sorologia positiva para 
T. gondii, os pacientes com níveis de linfócitos T CD4 + abaixo 
de 200 células/mm3 e que não fazem quimioprofilaxia com sul­
fametoxazol-trimetoprima têm um risco de, aproximadamente, 
35% de desenvolver toxoplasmose do SNC em 2 anos (Clough 
et al., 1997). Por este motivo, o status sorológico do paciente deve 
fazer parte dos exames iniciais de todos os imunocomprometi­
dos. Os soronegativos deverão ser orientados quanto às medidas 
preventivas para evitar a infecção (ver profilaxia). 
Clinicamente, a toxoplasmose do SNC pode se apresentar 
sob a forma de encefalite, meningoencefalite ou de absces­
sos cerebrais. Não é raro o achado simultâneo de mais de um 
padrão no mesmo paciente (Vergara et al., 1986). Devido à 
variedade de formas de agressão neurológica pelo T. gondii, 
não existem sinais e sintomas específicos da infecção do SNC 
(Vietze et al., 1968; Vergara et al., 1986; Gluckstein, 1992), 
havendo semelhança clínica com outras entidades nosoló­
gicas, como criptococose, tuberculose, linfoma primário do 
SNC, metástases de sarcoma de Kaposi, infecções piogênicas e 
até doença de Chagas do SNC. Os sintomas são, em geral, ines­
pecíficos, como cefaleia, alterações motoras, paralisia facial, 
afasia, alterações do estado mental, com flutuações do nível 
de consciência, distúrbios da função cognitiva, convulsões e 
coma (Pedrol et al., 1990; Luft e Remington, 1992; Montoya, 
2002). A febre pode estar ausente. Sinais de irritação meníngea 
ocorrem em menos de 10% dos casos. Por outro lado, déficits 
neurológicos focais ocorrem em cerca de 80 a 90% dos casos 
(Parmley et al., 1992; Clough et al., 1997), mas seu início pode 
ser precedido por letargia ou confusão mental por dias e até 
semanas (Vergara et al., 1986). Uma vez instalada, a toxoplas­
mose do SNC evolui, em geral, em menos de 2 semanas, e seu 
prognóstico relaciona-se com o grau de comprometimento 
imunológico, sendo mais grave quando o número dos linfó­
citos CD4+ está inferior a 100 células/mm3 (Porter e Sande, 
1992). A não evidência de sinais e sintomas claramente relacio­
nados com o envolvimento do SNC não exclui, por completo, 
Capítulo 70 1 Toxoplasmose 87 S 
a possibilidade de infecção pelo T. gondii. A lesão neurológica 
poderá manter-se em silêncio até por meses, em especial na 
ausência de comprometimento difuso do SNC. 
A chamada síndrome de reconstituição imune (SRI) pode 
ocorrer no início do tratamento antirretroviral (TARV), quando 
a consequente proliferação de células CD4 + pode desencadear 
resposta inflamatória exagerada, levando a uma piora para­
doxal transitória de infecções oportunistas (Dhasmana et al., 
2008). Aproximadamente 1 O a 30% dos pacientes que iniciam 
TARV desenvolvem SRI. Pacientes com neurotoxoplasmose 
podem ter seu quadro clínico exacerbado. 
• Toxoplasmose congênita 
A transmissão intrauterina do T. gondii ocorre quando a 
gestante adquire a infecção aguda em qualquer momento da 
gestação ou mesmo umas poucas semanas antes. Como ela 
transcorre no organismo materno, quase sempre de forma 
subclínica, os testes sorológicos de anticorpos das classes 
IgM e IgG prestam grande ajuda quando sugestivos de infec­
ção recente, permitindo a instituição precoce de terapêutica 
específica da gestante, o que diminui o risco de repercussões 
para o feto. Quando a gestante adquire a infecção aguda no 
primeiro trimestre da gravidez, a transmissão materno-fetal é 
menos frequente em 1 O a 20% dos casos, mas quando ocorre 
pode produzir sérias repercussões como aborto espontâneo, 
natimortos ou sequelas graves da infecção aguda intrauterina. 
Episódios de abortos repetidos não devem estar associados à 
toxoplasmose. A probabilidade de transmissão congênita vai 
aumentando do segundo para o terceiro trimestre de gestação, 
quando pode chegar acerca de 60 a 70%. Entretanto, o trata­
mento da gestante com espiramicina pode reduzir até em 60% 
a possibilidade de transmissão. Gestantes soronegativas para 
T. gondii estão sob risco de adquirir a primoinfecção, devendo 
ter cuidados especiais para evitá-la (veja Profilaxia). 
Os nascidos a termo, mesmo se infectados, são na grande 
maioria das vezes aparentemente normais, embora havendo 
necessidade de serem acompanhados clínica e laboratorial­
mente. Isto porque é grande a probabilidade de virem a apresen­
tar sintomas e sinais clínicos de toxoplasmose congênita ainda 
na primeira ou segunda década de vida, sendo a retinocoroi­
dite a mais frequente ocorrência, levando à perda da visão em 
cerca de um quarto dos casos (Bosch-Driessen, 2002). Outras 
sequelas podem surgir, inclusive neurológicas, como retardo no 
desenvolvimento mental e psicomotor, epilepsia e microcefalia. 
Recentemente, tem-se discutido a possibilidade de a toxo­
plasmose poder estar associada a esquizofrenia e a outros dis­
túrbios relacionados (Brown et al., 2009). 
Em uma minoria de casos os sinais clínicos de toxoplasmose 
congênita no recém-nato são aparentes, às vezes com evidências 
de doença aguda como febre ou hipotermia, hepatoesplenome­
galia, ascite, icterícia, linfadenopatia, trombocitopenia e peté­
quias, rash cutâneo, encefalite, pneumonite, diarreia, anemia. A 
placenta está frequentemente com sua espessura aumentada. O 
diagnóstico diferencial deve ser feito com outras doenças infec­
ciosas comuns a recém-nascidos, como rubéola, citomegaloví­
rus, sífilis, herpes-vírus simples. Recomenda-se sempre pensar 
no diagnóstico de toxoplasmose congênita, no evento de doença 
infecciosa aguda neonatal, uma vez que, se confirmado o diag­
nóstico, a terapêutica específica precoce pode melhorar em 
muito o prognóstico e diminuir a incidência de sequelas poste­
riores. Nascimento de prematuros ou de baixo peso pode ocor­
rer, vindo posteriormente a surgir sequelas da doença. Outras 
876 Parte 2 1 Parte Específica 
Figura 70.7 Toxoplasmose congênita. Macrocefa lia por hidrocefalia 
(gentileza de Dr. Manoel de Carvalho, Instituto Fernandes Figueira -
Fiocruz, RJ). 
vezes o recém-nato já apresenta sequelas de uma infecção aguda 
ocorrida intraútero, como calcificações cerebrais, microcefalia, 
macrocefalia em virtude de hidrocefalia e dilatação dos ven­
trículos (Figura 70.7). O exame radiológico e a ultrassonografia 
ajudam a diagnosticar tais eventos. 
...,. Diagnóstico laboratorial 
Como a infecção pós-natal pelo T. gondii em indivíduos 
imunocompetentes origina, na imensa maioria das vezes, a 
chamada forma latente (crônica) subclínica, o diagnóstico 
laboratorial é pouco utilizado nestes casos. Entretanto, ele 
passa a ter grande valor, quando for necessário avaliar se uma 
fase aguda ocorreu recentemente ou há mais tempo. Três si­
tuações são então mais importantes: 
• Nas gestantes, pois no caso de uma fase aguda recente 
há risco de transmissão materno-fetal, enquanto uma 
infecção antiga assegura uma gravidez destituída de 
risco, já que está protegida contra reinfecções 
• Em recém-natos de mães suspeitas de terem tido a pri­
moinfecção (fase aguda) durante a gestação ou mesmo 
poucas semanas antes de engravidarem, no sentido de con­
firmar ou afastar a ocorrência de transmissão congênita 
• No caso de indivíduos imunocomprometidos, seja pelo 
HIV ou por outras causas, quando existe o risco de re­
agudização por eventual ruptura de cisto preexistente ou 
de reinfecção por queda da imunidade. O diagnóstico 
laboratorial ainda pode ser utilizado nos casos de toxo­
plasmose ocular, sem ter a mesma eficácia. 
O diagnóstico laboratorial se baseia, principalmente, na 
detecção de anticorpos específicos contra o parasito, nas clas­
ses IgG, IgM e IgA de imunoglobulinas e na evidenciação do 
DNA parasitário,pela amplificação de sequências específicas 
de seus ácidos nucleicos pela PCR. Outros métodos de diag­
nóstico de certeza são baseados na demonstração de taquizoí­
tos e/ ou cistos em material biológico. 
Os vários aspectos do diagnóstico laboratorial da toxo­
plasmose foram recentemente revistos por Montoya (2002), 
Bastien (2002) e Remington et al. (2004). 
.,.. Exames sorológicos. O primeiro teste surgido para a detec­
ção de anticorpos contra T. gondii foi a reação de Sabin e 
Feldman (1948) ou teste do corante, mas que hoje é raramente 
utilizada, em virtude do inconveniente de se ter que usar para­
sitos vivos. 
No sentido de determinar o momento da fase aguda, se em 
provável passado recente ou distante, é necessário mais de um 
único teste sorológico. De início a pesquisa de anticorpos espe­
cíficos para T. gondii nas classes IgG e IgM de imunoglobulinas 
dá as primeiras informações. Os métodos mais utilizados para 
a pesquisa de anticorpos IgG são ELISA, imunofluorescência 
indireta (IFA), hemaglutinação indireta e aglutinação direta, 
enquanto para IgM são mais utilizados os de imunocaptura de 
IgM por ELISA, o ensaio immunosorbent IgM (IgM-ISAGA) e 
hemaglutinação reversa. O teste IFA para anticorpos IgM tem 
o inconveniente de possíveis resultados falso-positivos, pela 
presença no soro de anticorpos IgM anti-IgG (fator reuma­
toide) ou falso-negativos, pela competição de anticorpos IgG 
com os IgM, pelos mesmos sítios antigênicos. 
Esses testes permitem evidenciar que os anticorpos IgG sur­
gem no soro geralmente durante a segunda semana pós-primoin­
fecção, atingem níveis máximos no primeiro ou segundo mês, 
declinando daí em diante, mas permanecendo presentes em níveis 
baixos para o resto da vida. Os exames sorológicos de duas amos­
tras coletadas com 2 a 3 semanas de intervalo podem ser úteis na 
diferenciação entre infecção recente ou em passado distante. Em 
infecções recentes, o título de anticorpos da segunda amostra deve 
apresentar elevação significativa em relação à primeira amostra 
ou mesmo soroconversão de negativo para positivo, enquanto em 
infecções antigas os títulos devem permanecer estáveis. 
Anticorpos específicos IgM surgem mais precocemente, 
ainda na primeira semana pós-primoinfecção, atingem o pico 
no final do primeiro mês, desaparecendo em geral seis a doze 
meses após. Desta forma, um caso típico de toxoplasmose aguda 
pós-natal adquirida em passado distante, estando portanto o 
indivíduo na fase latente (crônica), teria anticorpos IgG espe­
cíficos em níveis baixos e IgM específicos ausentes. Em contra­
partida, uma toxoplasmose aguda recente ou atual se apresen­
taria com níveis elevados de anticorpos IgG, além da presença 
de anticorpos IgM. Entretanto, nem sempre a interpretação dos 
dados sorológicos é tão simples, havendo a possibilidade de 
testes de anticorpos IgM duvidosos, já que alguns kits disponí­
veis no mercado têm baixa especificidade, além da ocorrência, 
em alguns casos, de IgM persistentemente positiva por mais 
de 1 ano, quando o indivíduo já estaria em plena fase latente 
(crônica) da infecção. A persistência destes anticorpos IgM na 
fase latente não tem maior significado clínico, confundindo a 
interpretação do teste IgM. Assim, um teste de anticorpos IgM 
positivo deve ser interpretado com muito cuidado, devendo ser 
solicitados outros exames confirmatórios, antes de considerá-lo 
indicativo de fase aguda. O maior valor do teste para anticorpos 
específicos IgM reside no fato de que um teste negativo pratica­
mente afasta a possibilidade de infecção recente. 
Por outro lado, um teste IgM positivo levanta a questão sobre 
uma toxoplasmose recentemente adquirida e, assim, necessita 
de exames confirmatórios (Montoya e Remington, 2008). 
Estas controvérsias em torno do teste para anticorpos IgM, 
quando positivo, devem ser levadas em conta no diagnóstico 
de recém-natos suspeitos de toxoplasmose congênita, embora 
sua presença possa sugerir, a princípio, infecção intrauterina. 
Isto porque tais anticorpos devem ter sido produzidos pelo 
feto, já que não são normalmente transferidos passivamente 
pela mãe, uma vez que não ultrapassam a placenta quando 
íntegra. Entretanto, como em todos os casos de teste anticor­
pos IgM positivo, outros testes confirmatórios de infecção 
recente devem ser utilizados. 
Buscando maior confiabilidade nos testes sorológicos para 
toxoplasmose foi introduzido o teste de avidez de anticorpos 
IgG para T. gondii (Hedman et al., 1989). Este teste vem tendo 
papel importante na discriminação entre infecção aguda 
adquirida recentemente ou há mais tempo, devendo ser utili­
zado ao lado dos testes para anticorpos IgG e IgM. É baseado 
no fato de que anticorpos IgG específicos têm no início baixa 
avidez funcional, quando produzidos logo após as primeiras 
exposições ao respectivo antígeno. A seguir, durante o curso 
da resposta imune ocorre um aumento progressivo, por sema­
nas ou meses, da avidez de IgG, consequência de um processo 
de seleção dos linfócitos B induzido pelos próprios antígenos, 
levando a um aumento da complementaridade entre anti­
corpos IgG e seus respectivos sítios antigênicos. Testes com 
formato ELISA têm sido usados para determinar a avidez de 
anticorpos IgG para T. gondii, em que a ureia ou outro agente 
desnaturante é utilizado para dissociar o complexo antígeno­
anticorpo. O resultado do teste reflete a resistência a tal dis­
sociação ao utilizar amostras tratadas ou não tratadas pela 
ureia. Assim sendo, um teste demonstrando baixa avidez de 
IgG reflete infecção recente ou atual, embora a avidez possa 
permanecer baixa além de 3 meses até 1 ano da primoinfecção 
(Montoya et al., 2002; Montoya e Remington, 2008). Por outro 
lado, uma alta avidez de anticorpos IgG sugere primoinfecção 
há mais tempo, de 4 a 5 meses atrás (Remington et al., 2004). 
O teste de avidez de anticorpos IgG não deve ser interpretado 
isoladamente, mas sim ao lado dos testes para anticorpos IgG 
e IgM, já que pode também apresentar resultados duvidosos, 
nos limites entre alta e baixa avidez. 
A maior limitação do teste de avidez de IgG é não poder ser 
utilizado quando os anticorpos IgG estão ausentes. Entretanto, 
na suspeita de uma fase aguda muito recente na qual anti­
corpos IgG ainda não tivessem surgido, a repetição do teste 
IgG realizado em nova amostra de soro 1 a 2 semanas após 
demonstraria soroconversão do primeiro teste negativo para o 
segundo positivo. O teste de avidez poderia ser realizado nesta 
segunda amostra, evidenciando baixa avidez neste caso. 
A tendência atual é para que os testes de anticorpos IgG, 
IgM e avidez de IgG para o sorodiagnóstico da toxoplasmose 
sejam automatizados, utilizando máquinas que fazem a leitura 
final por quimioluminescência ou imunofluorimetria. 
Testes tipo ELISA ou ISAGA para anticorpos IgA têm sido 
utilizados nos EUA e Europa, e com menor frequência no Brasil, 
como indicativos de fase aguda. Entretanto, de maneira similar 
aos anticorpos IgM, podem persistir no soro por mais de 1 ano, 
acrescentando pouco para o diagnóstico de fase aguda, na infec­
ção pós-natal pelo T. gondii. Entretanto, seu valor aumenta no 
diagnóstico de recém-natos com toxoplasmose congênita, uma 
vez que sua sensibilidade nestes casos é maior do que os testes 
para anticorpos IgM (Stepick-Biek et al., 1990). 
... Métodos com base na demonstração do parasito ou seu DNA. 
A PCR permite um diagnóstico de certeza, já que o DNA do 
parasito é detectado. Tem sido utilizada no diagnóstico pré­
natal da toxoplasmose congênita, por meio do exame do 
líquido amniótico, da toxoplasmose ocular pelo exame do 
humor vítreo ou aquoso e da toxoplasmose em pacientes imu­
nocomprometidos nos casos de envolvimento do SNC ou da 
forma disseminada. As técnicas para a PCR podem variar, não 
havendo um consenso sobre o melhor protocolo (Montoya e 
Remington, 2008). 
Capítulo 70 1 Toxoplasmose 877 
Para evitar contaminações e falsos resultados positivos 
são necessárias sérias precauções,como salas e equipamentos 
separados. Controles negativos e positivos para detectar, res­
pectivamente, contaminação por DNA ou inibição da reação 
devem estar presentes em todos os testes. É importante repetir 
o teste, principalmente quando o resultado for positivo. 
Mais recentemente, foi desenvolvida a PCR em tempo real 
(Costa et al., 2001), em que os estágios de amplificação e detecção 
do produto são realizados em uma única fase, diminuindo bas­
tante o tempo de realização do teste e aumentando sua segurança. 
O exame de cortes histológicos para demonstrar a presença 
de taquizoítos usando técnicas convencionais é sempre difícil, 
mas quando positivo define a existência de fase aguda. Taquizoí­
tos podem ser encontrados em esfregaços de lavado brônquico, 
liquor cefalorraquidiano e outros fluidos, confirmando a etio­
logia pelo T. gondii, da patologia em causa. A demonstração de 
antígenos parasitários por imunoperoxidase em cortes histoló­
gicos de material de biopsia costuma apresentar resultados mais 
favoráveis, tendo a técnica elevada especificidade. Também a 
PCR pode ser útil para demonstrar o DNA do parasito em teci­
dos, inclusive fetal e placentário (Flicker-Hidalgo et al., 2007). 
O isolamento do T. gondii pode ser feito a partir de material 
biológico infectado, por meio de inoculação em camundongos 
ou em cultura de células in vitro. 
• Diagnóstico laboratorial no paciente 
imunocompetente 
Poucos indivíduos, quando infectados pela primeira vez 
pelo T. gondii, apresentam alguma sintomatologia. Caso apre­
sentem, geralmente regride espontaneamente em alguns dias. 
Desta forma, não é frequente a utilização de exames laborato­
riais para o diagnóstico, a não ser nos poucos casos em que a 
forma linfoganglionar se estenda por mais tempo ou nos raros 
casos de doença mais grave, em que pode haver comprometi­
mento do miocárdio ou de outros tecidos. 
Os testes para anticorpos IgG e IgM são os inicialmente 
empregados para a detecção de uma fase aguda recente ou atual, 
que pudesse estar relacionada com o quadro clínico apresentado. 
A presença de anticorpos IgG em níveis baixos e anticorpos IgM 
negativos afasta o diagnóstico de fase aguda, sugerindo forte­
mente uma infecção adquirida em passado distante, não rela­
cionada com o quadro clínico atual. Este é o perfil sorológico da 
maioria da população adulta, que geralmente já teve sua primoin­
fecção na infância. Por outro lado, a presença de anticorpos IgG 
e IgM sugere uma fase aguda recente ou atual, que poderia estar 
associada ao presente quadro clínico. Entretanto, seria necessário 
um exame confirmatório demonstrando baixa avidez de anticor­
pos IgG, para que o diagnóstico ficasse mais seguro. Raramente, 
naqueles casos em que os exames tivessem sido realizados bem 
precocemente, nas duas primeiras semanas pós-infecção, quando 
ainda não tivessem surgido anticorpos IgG, pode acontecer de o 
teste para IgG ainda estar negativo e o teste para IgM já positivo . 
A conduta então seria fazer novos exames, 1 a 2 semanas depois, 
para verificar se houve soroconversão do teste para IgG e se os 
anticorpos IgG, agora presentes, teriam baixa avidez, o que con­
firmaria o diagnóstico de fase aguda. 
O teste de anticorpos IgG ou IgM, se realizado isolada­
mente, não permite o diagnóstico de fase aguda, já que títu­
los de anticorpos IgG podem permanecer elevados por vários 
anos e anticorpos IgM podem permanecer presentes no soro 
por mais de 12 meses. 
878 Parte 2 1 Parte Específica 
Em pacientes imunocompetentes raramente são necessá­
rios outros exames mais invasivos, como o histopatológico em 
material de biopsia. 
• Diagnóstico laboratorial da retinocoroidite 
Os episódios de retinocoroidite surgem em geral em adul­
tos, na fase latente (crônica) da infecção, muitos anos após 
terem se infectado pelo T. gondii, seja de forma congênita, 
seja na infância, resultante de uma infecção pós-natal. Desta 
forma, os exames sorológicos ajudam pouco, uma vez que irão 
apresentar um perfil de infecção em passado distante, similar 
ao da maioria da população adulta, que já se infectou há muito 
tempo e não apresenta lesões oculares. Mesmo na vigência de 
uma retinocoroidite em atividade o teste IgM é negativo e os 
níveis de anticorpos IgG não se alteram, permanecendo baixos 
como é comum na fase latente da infecção. 
Em duas situações os testes sorológicos são de grande uti­
lidade: a) quando a lesão ocular surge logo a seguir ou mesmo 
durante a primoinfecção pós-natal, como tem sido descrito 
em surtos epidêmicos e em regiões de maior endemicidade da 
doença. Nestes casos, as lesões oculares estão associadas à fase 
aguda da toxoplasmose, estando os exames sorológicos com­
patíveis com um perfil de infecção recente, isto é, anticorpos 
IgG elevados, anticorpos IgM presentes e baixa avidez de IgG. 
Bosch-Driessen et al. (2000), em um estudo retrospectivo de 
retinocoroidite por T. gondii, encontraram um perfil soroló­
gico de infecção aguda em 11 % dos casos; b) quando os exa­
mes sorológicos são negativos, inclusive o IgG, significando 
que o paciente nunca foi infectado pelo T. gondii e, portanto, 
a patologia ocular presente não tem relação com o parasito. 
Neste caso, o diagnóstico é de exclusão. 
Na grande maioria das vezes, o diagnóstico de retinocoroi­
dite por T. gondii é feito pelo oftalmologista, de acordo com 
o aspecto morfológico da lesão retiniana. Nos casos de lesões 
pouco sugestivas da etiologia por T. gondii ou de falha tera­
pêutica, pode-se tentar outros métodos diagnósticos, como a 
coleta de humor aquoso para PCR. Como citado por Bastien 
(2002), a sensibilidade do método varia de 15 a 53%. Exame 
do humor vítreo usando PCR em casos atípicos de toxo­
plasmose ocular pode ser de grande ajuda diagnóstica. Mais 
recentemente, a PCR em tempo real tem demonstrado ser 
uma técnica mais rápida e sensível, para uma avaliação quan­
titativa da presença do parasito em fluidos ou tecidos coleta­
dos (Commodaro et al., 2009). Tem sido também tentada a 
demonstração de anticorpos, principalmente IgA, no humor 
aquoso com resultados satisfatórios (Ronday et al., 1999). 
• Diagnóstico laboratorial no paciente 
imunocomprometido 
Nestes pacientes, os exames sorológicos para detecção de 
anticorpos específicos têm pouco valor, a não ser para levan­
tar suspeita de reativação de foco latente de T. gondii em imu­
nocomprometidos que já apresentassem testes com anticor­
pos IgG positivos e sinais de comprometimento neurológico. 
Aumento dos títulos de IgG podem, às vezes, ser encontrados 
nestes casos de reativação. Ao contrário dos imunocompeten­
tes, o aparecimento de IgM específica positiva é inesperado, 
embora possa ocorrer. A ausência de testes sorológicos posi­
tivos não afasta o diagnóstico. Assim, em imunocomprometi­
dos outros métodos diagnósticos são necessários. 
Figura 70.8 Toxoplasmose do sistema nervoso central em paciente 
com AIDS. Ressonância magnética mostrando lesão anelar (genti leza 
do Dr. Marcelo Simão Ferreira, Faculdade de Medicina, Universidade 
Federal de Uberlândia, MG). 
O exame do liquor é normal em 20 a 30% dos casos, sendo 
que a PCR pode ser positiva nos casos de comprometimento do 
SN C (Holliman et al., 1990; Parmley et al., 1992). Recentemente, 
nested PCR tem demonstrado ser sensível e altamente específica 
(Afonso et al., 2009). O diagnóstico definitivo se faz por biopsia 
e identificação do T. gondii, com técnicas como imunoperoxi­
dase em fragmentos de tecido. Os estudos de imagem devem ser 
considerados mesmo na ausência de déficits focais. O diagnós­
tico presuntivo pode ser feito por tomografia computadorizada 
(TC) ou ressonância nuclear magnética (RNM). Em geral, as 
lesões são múltiplas, mas podem ser isoladas (Navia et al., 1986; 
Dina, 1991). O aspecto da imagem na TC parece estar menos 
relacionado com o agente infeccioso do que a reação do hos­
pedeiro ao mesmo. Deste modo, a patologia produzida pelo T. 
gondii pode ter diferentes apresentações, dependendo do grau 
decomprometimento da imunidade do hospedeiro. A imagem 
da TC reflete a interação entre hospedeiro e patógeno, por meio 
do padrão de captação do contraste. Se o paciente, mesmo imu­
nocomprometido, é capaz de conter o processo infeccioso por 
uma reação inflamatória, a tendência é que ocorra a formação 
de abscessos, e a aparência tomográfica desta interação é a típica 
lesão anelar captante (Figura 70.8). A lesão anelar indica que 
a infecção é localizada e que um abscesso está presente (Dina, 
1991). As lesões se localizam, preferencialmente, nos núcleos 
da base. O edema e o efeito de massa são comuns. Exames de 
imagem sugestivos de toxoplasmose do SNC autorizam o início 
de terapêutica empírica e a resposta satisfatória ao tratamento é 
aceita como prova definitiva do diagnóstico. 
Quando os testes sorológicos são negativos para T. gondii 
e os exames de imagem não levantam suspeita suficiente para 
iniciar a prova terapêutica, a punção lombar está indicada e o 
liquor deve ser submetido a exame completo, que inclua técni­
cas de PCR específicas para T. gondii. 
• Diagnóstico laboratorial na gravidez 
A transmissão intrauterina do T. gondii pode ocorrer quando 
a gestante adquire a primoinfecção durante a gestação ou 1 a 
2 semanas antes de engravidar. A maioria da população, entre­
tanto, adquire a primoinfecção na infância, apresentando na 
vida adulta somente anticorpos específicos nas classes IgG de 
imunoglobulinas, indicativos de uma infecção latente e prote­
ção contra reinfecções, não havendo risco de transmissão con­
gênita. A exceção seriam gestantes imunocomprometidas, nas 
quais poderia haver reagudização de uma infecção latente. 
Nestas condições, toda mulher que planeja engravidar ou já 
gestante deve fazer os exames sorológicos para toxoplasmose, 
iniciando pelos testes de anticorpos IgG e IgM. Um teste de IgG 
em baixos níveis e IgM negativo é indicativo de uma gravidez 
destituída de risco. Entretanto, no último trimestre da gravidez, 
um resultado negativo para anticorpos IgM, embora altamente 
sugestivo de infecção antiga (latente), não permite descartar total­
mente uma infecção adquirida no início da gestação, mormente 
se os títulos de IgG estiverem elevados. Isto porque títulos de IgM 
podem às vezes tornar-se negativos em menos de 6 meses. 
Um teste de anticorpos IgM positivo pode significar infec­
ção recente e, portanto, possibilidade de transmissão materno­
fetal. Nestes casos, há necessidade de outros exames confir­
matórios, porque, como já enfatizado anteriormente, existe a 
ocorrência de teste IgM falso-positivo e também permanência 
de anticorpo IgM por mais de 1 ano após a primoinfecção, o 
que poderia levar a um falso diagnóstico de infecção recente 
(Gras et al., 2004). Para confirmação, deve ser utilizado o teste 
de avidez de anticorpos IgG, assim como repetir os testes IgG 
e IgM, cerca de 2 semanas após o primeiro teste. Neste último 
caso, testes de anticorpos IgG e IgM significativamente ascen­
dentes ou principalmente soroconversão de IgG sugerem for­
temente infecção recente, dentro dos últimos 2 a 3 meses ou 
últimas semanas. Se os títulos já estiverem significativamente 
descendentes, também podem estar associados à infecção 
recente, mas em um período mais à frente, quando os níveis 
de anticorpos já estivessem caindo. O teste confirmatório pela 
avidez de anticorpos IgG tem a vantagem de poder ser reali­
zado logo, juntamente com os primeiros testes IgG e IgM, ou 
imediatamente após se tomar conhecimento de um resultado 
IgM positivo, sem necessidade de aguardar 2 semanas. 
De acordo com Remington et al. (2004), o resultado do teste 
de avidez de IgG pode variar segundo o método utilizado, mas 
... 
Capítulo 70 1 Toxoplasmose 879 
encontra sua melhor aplicação no primeiro trimestre da gesta­
ção, ao permitir afastar possível ocorrência de primoinfecção 
nos últimos 4 a 5 meses, no caso de o resultado demonstrar alta 
avidez. Caso o teste de avidez de IgG tivesse demonstrado baixa 
avidez, não se poderia estar seguro de ter sido recente a infecção, 
uma vez que a avidez baixa pode persistir por cerca de 1 ano. A 
conduta neste caso é repetir os testes de IgG e lgM, para detectar 
possível curva ascendente dos títulos, sugerindo infecção recente, 
ou utilizar outros testes sorológicos, como detecção de anticor­
pos específicos IgA. Desta forma, o teste de avidez de anticor­
pos IgG não deve ser considerado como definitivo para definir 
se a infecção pelo T. gondii foi recente ou em passado distante, 
mas sim interpretada no contexto de outros exames (Ashburn 
et al., 1998; Remington et al., 2004). A Tabela 70.1 apresenta uma 
súmula do diagnóstico laboratorial da toxoplasmose. 
Caso após os testes sorológicos persista dúvida, se a infec­
ção foi adquirida durante ou anteriormente à gestação, testes 
adicionais devem ser feitos, como PCR e ultrassonografia. 
• Diagnóstico laboratorial no feto e 
recém-nato 
O diagnóstico de toxoplasmose no feto, durante a gestação, 
permite o tratamento precoce da mãe e do feto, melhorando o 
prognóstico da infecção congênita. Deve ser tentado sempre que 
houver suspeita de infecção aguda materna. A ultrassonografia 
detecta alterações macroscópicas como hidrocefalia ou calcifi­
cações cerebrais, enquanto a PCR, a partir do líquido amniótico, 
é capaz de fazer o diagnóstico mesmo antes de terem surgido 
lesões mais extensas do SNC. A sensibilidade da PCR não tem 
sido tão grande, presente em cerca de 70% dos casos (Bastien, 
2002 ), sendo, entretanto, maior do que a inoculação de líquido 
amniótico em camundongos. Uma das razões para estes fatos 
deve estar relacionada com o geralmente baixo número de 
parasitos encontrados no líquido amniótico. A PCR no líquido 
amniótico tem sido realizada após a 18ª semana de gestação, 
tendo especificidade próxima de 100% (Romand et al., 2001) 
Tabela 70.1 Súmula do diagnóstico laboratorial da toxoplasmose em diferentes situações médicas. 
Indivíduos imunocompetentes 
Fase aguda em passado distante (forma latente-crônica) 
Fase aguda recente 
Retinocoroid ite 
Fase aguda em passado distante 
Raramente durante a fase aguda 
Toxoplasmose e gravidez 
Fase aguda em passado distante 
(sem risco de transmissão ao feto) 
Fase aguda recente 
(risco de transmissão ao feto) 
Toxoplasmose no recém-nato 
(toxoplasmose congênita) 
Paciente imunocomprometido 
Ac = anticorpos específicos para Toxoplasma gondii nas classes de imunoglobulinas. 
Exames laboratoriais 
Ac lgG positivo, avidez de lgG elevada, ac lgM negativo 
(Perfil de fase latente) 
Ac lgG e lgM positivos, avidez de lgG baixa 
(Perfil de fase aguda) 
Sorologia lgG e lgM negativa afasta o diagnóstico de toxoplasmose 
Perfil sorológico de fase latente 
Perfil sorológico de fase aguda 
Perfil sorológico de fase latente 
Perfil sorológico de fase aguda, que necessita de confirmação 
Avidez de lgG elevada afasta fase aguda nos últimos 4 meses 
PCR para T. gondii no líquido amniótico (após a 18ª semana de 
gestação) confirma o diagnóstico 
Ac lgA e lgM posit ivos, Ac lgG iguais na mãe e no filho 
PCR do sangue, urina, liquor 
Sorologia pouco esclarecedora, exceto se Ac lgG ascendente 
PCR do liquor, sangue, para confirmar doença atual 
880 Parte 2 1 Parte Específica 
quando todos os rigorosos cuidados para evitar falso-positivos 
(contaminação) são seguidos. Romand et al. (2004), utilizando 
técnicas mais recentes da PCR quantitativa em tempo real no 
líquido amniótico de gestantes, mostraram sua aplicação no 
prognóstico precoce da toxoplasmose congênita, ao verificarem 
que infecções maternas adquiridas antes da 20ª semana de gravi­
dez, tendo parasitos em número maior do que 100/mf no líquido 
anmiótico, têm maior probabilidade de prognóstico grave. Assim 
sendo, a PCR no líquido amniótico tem sido o método de escolha 
para o diagnóstico laboratorial da toxoplasmose pré-natal, sendo 
de baixo risco para a gestação, mais rápido do que os métodos 
baseados na cultura ou inoculação em camundongo do materialcoletado e com razoável sensibilidade. 
O diagnóstico laboratorial da toxoplasmose em recém­
natos está indicado sempre que houver suspeita de infecção 
intrauterina. O diagnóstico sorológico se baseia na detecção de 
anticorpos específicos produzidos pelo próprio neonato (IgM e 
IgA), ficando assim caracterizada a exposição dele ao parasito. 
Deve-se, preferencialmente coletar sangue do próprio neonato 
e não do cordão, porque este pode conter pequena mistura de 
sangue materno. Anticorpos IgG são legados pela mãe através 
do cordão umbilical, passando com facilidade pela placenta, 
sendo os títulos e a avidez de anticorpos IgG maternos seme­
lhantes aos encontrados no recém-nato, tendo ou não havido 
transmissão intrauterina do T. gondii. 
Na ausência de transmissão, os anticorpos IgG legados 
pela mãe decrescem com o correr dos meses, desaparecendo 
no máximo em 1 ano, o que descarta definitivamente uma 
suposta transmissão congênita. Este é o quadro sorológico de 
todos os nascimentos de mães com infecção latente (crônica) e 
portanto sem risco de transmitir congenitamente. 
Os teste de anticorpos específicos IgA e IgM têm muito 
maior significado, pois representam anticorpos produzidos 
pelo neonato, levando à suspeita de infecção congênita. O 
teste para anticorpos lgA parece ser mais sensível do que o 
teste para IgM em recém-nascidos, havendo relato de falsos 
resultados positivos ou negativos no teste IgM (Stepick-Biek 
et al., 1990). Por segurança, um teste positivo para anticorpos 
lgA deve ser repetido cerca de 1 O dias após, para se certificar 
de que os títulos encontrados não representam contaminação 
com anticorpos lgA maternos (Montoya, 2002). 
Pode-se ainda tentar evidenciar o próprio parasito, pela 
inoculação de material coletado por biopsia ou liquor cefa­
lorrraquidiano em camundongos ou cultura de células, assim 
como utilizar a PCR no material coletado. O exame da placenta 
deve ser feito tanto pela PCR, para detectar DNA do parasito, 
como por cortes histológicos usando imunoperoxidase, para 
evidenciar o Toxoplasma. Em ambos os casos, o exame posi­
tivo representa forte indicativo de transmissão materno-fetal. 
O exame oftalmológico é imprescindível nos casos suspei­
tos, na tentativa de detectar retinocoroidite. Deve-se procu­
rar ainda possíveis sequelas de infecção aguda intrauterina, 
como as pequenas áreas de calcificações no SNC e dilatações 
dos ventrículos cerebrais, utilizando-se ultrassonografia, raios 
X e TC. Exame microscópico da celularidade do liquor cefa­
lorraquidiano e exame bioquímico podem levar à suspeita de 
envolvimento do SNC, sendo ainda úteis no acompanhamento 
da evolução da toxoplasmose no recém-nato. 
...,. Tratamento 
O tratamento em geral administrado é a combinação de 
pirimetamina e sulfadiazina, que agem de maneira sinérgica 
sobre o metabolismo do ácido fólico, atuando sobre as for­
mas proliferativas do T. gondii. As doses recomendadas são 
de 50 a 200 mg por 3 dias, e a seguir, 25 a 100 mg em dose 
única diária de pirimetamina, e 100 mg/kg/dia (máximo de 
6 g/dia) de sulfadiazina, em quatro tomadas, por 3 a 6 sema­
nas (Tavares, 2001; 2009). É recomendável o uso de ácido 
folínico 10 a 15 mg/dia, para reduzir os riscos de citopenia. 
A terapêutica não tem ação sobre os cistos do parasito e nem 
indicação na toxoplasmose latente (crônica). Sulfonamidas 
de longa ação não são recomendadas, por não atingirem altas 
concentrações nos tecidos. 
A infecção aguda pós-natal nos indivíduos imunocompe­
tentes é quase sempre subclínica, e, portanto, não é tratada. 
Quando é feito o diagnóstico, a terapêutica com sulfadiazina e 
pirimetamina deve ser instituída por 2 a 6 semanas, na depen­
dência da regressão dos sinais e sintomas, tanto nos raros 
casos de doença mais grave como nos casos de linfadenopa­
tia, que ocorrem quase sempre em crianças, tendo geralmente 
evolução benigna. Ácido folínico deve também ser adminis­
trado na dose de 10 a 15 mg/dia, já que a pirimetamina pode 
levar à supressão da mielopoese. Embora o quadro clínico seja 
normalmente autolimitado nos pacientes imunocompetentes, 
a terapêutica tem importância por diminuir, possivelmente, a 
ocorrência de lesões oculares futuras. Vários relatos referem 
a patogenicidade de cepas de T. gondii isoladas de pacientes 
no Brasil e outros países fora da Europa, e sua associação com 
lesões oculares (Vallochi et al., 2005; Dardé, 2008). 
Nos pacientes imunocomprometidos, a toxoplasmose do 
SNC é considerada uma das doenças definidoras de AIDS e, por 
isso, serve como indicação para início de tratamento antirretro­
viral. O tratamento em pacientes com AIDS deve ser iniciado 
empiricamente, sempre que houver suspeita elevada de neuro­
toxoplasmose, não devendo ser postergado se houver qualquer 
dificuldade para realização dos exames de imagem. Caso outro 
diagnóstico seja estabelecido suspende-se a terapêutica iniciada. 
O tratamento de escolha é a associação pirimetamina/sulfadia­
zina e ácido folínico nas doses já mencionadas (Ministério da 
Saúde, 2008; Tavares, 2009). No caso de reação de hipersensibili­
dade à sulfadiazina, esta deve ser substituída por clindamicina na 
dose de 2.400 a 4.800 mg/dia, divididas em quatro vezes (Vergara 
et al., 1987; Dannemann et al., 1992). Outros esquemas (Bartlett, 
2003) incluem pirimetamina (50 a 100 mg/dia) associada res­
pectivamente a dapsona (100 mg/dia) ou a azitromicina (1.200 
a 1.500 mgldia) ou a claritromicina (2 g/dia) ou a atovaquone 
(3 g/dia). Em geral, os pacientes com toxoplasmose do SNC res­
pondem ao tratamento em 1 a 2 semanas, caso contrário, outra 
possibilidade diagnóstica deve ser considerada (Clough, 1997). 
A resposta à prova terapêutica, que ocorre poucos dias após o 
início do tratamento, confirma o diagnóstico. 
Na ocorrência da chamada síndrome da reconstituição imune 
(SRI), o uso de altas doses de corticosteroides, a manutenção do 
tratamento específico e a não interrupção da TARV promovem a 
regressão dos sintomas (Venkataramana et al., 2006). 
Após o término do chamado tratamento primário da fase 
aguda, uma terapêutica de manutenção ou profilática contra a 
reagudização da toxoplasmose deve ser iniciada, com doses de 
2 a 4 g/ dia de sulfadiazina e 25 a 50 mg/ dia de pirimetamina, 
3 a 7 vezes/semana. Esta terapia deve ser mantida até que a 
contagem dos linfócitos T CD4 + se estabilize acima de 200/ 
mm3 e a carga viral esteja não detectável por 6 meses, quando 
pode ser interrompida (Mussini et al., 2000; Furrer et al., 2000) 
devendo ser reiniciada se T CD4 + cair abaixo de 200 células/ 
mm3• Estudo realizado por Pedrol et al. (1990) demonstrou 
que o esquema de manutenção feito com sulfadiazina e piri­
metamina, 2 a 3 vezes/ semana, proporciona resultados seme­
lhantes ao uso de doses diárias. 
Para a profilaxia medicamentosa da toxoplasmose em 
pacientes com AIDS, pode-se também utilizar sulfametoxa­
zol (SMX) e trimetoprima (TMT) diariamente, nas mesmas 
doses recomendadas para profilaxia contra P. carinii: 160 mg 
de TMT e 800 mg de SMX (Carr et al., 1992). Para pacientes 
que não possam utilizar SMX-TMT, outras alternativas válidas 
(Tavares, 2001) são: 2 g de sulfadiazina associada a 25 mg de 
pirimetamina/ dia ou 3 vezes/ semana; 50 mg de dapsona/ dia 
associada a 50 mg de pirimetamina uma vez/ semana; clinda­
micina 300 a 600 mg a cada 6 h associada a 25 a 50 mg de 
pirimetamina/ dia; ou ainda claritromicina ou azitromicina 
associada a pirimetamina. Em todos os esquemas terapêuticos 
com pirimetamina deve-se associar ácido folínico. 
Pacientes transplantados soronegativos para T. gondii 
podem adquirir toxoplasmose, no caso de o doador estar na 
fase latente (crônica) da infecção, tendo portanto cistos do 
parasito em seus tecidos, que poderão se romper originando 
fase aguda no paciente transplantado. Neste caso de doador 
com anticorpos IgG positivos para T. gondii e receptor sorone­
gativo, uma profilaxia medicamentosa com SMX-TMT pode 
ser eficiente (Montoya e Liesenfeld, 2004).

Continue navegando