Buscar

Sinestesia e Experiências Sensoriais

Prévia do material em texto

11/5/22, 1:22 AM Musicologia na Mídia – Um blog de ciência da UNICAMP dedicado à pesquisa em música
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/ 1/6
Som e sabor – parte 1
José Fornari – fornari@unicamp.br
30 outubro 2022
 
Do modo que entendo, num sentido brando e até subliminar, todos nós
temos experiências sensoriais sinestésicas (que misturam sensações de
distintos sentidos). Como se sabe, tais experiências são exacerbadas em
estados mentais alterados, por exemplo, sob a influência de
substâncias alucinógenas, como LSD ou DMT, em pacientes com dis-
funções cerebrais, em sonhos intensos ou até mesmo em experiências
místicas, com muitos relatos de sinestetas que ouvem cores ou que veem
sons, ou até mesmo as “alucinações musicais” descritas por Oliver Sacks. 
What hallucination reveals about our minds | Oliver SacksWhat hallucination reveals about our minds | Oliver Sacks
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/2022/10/30/som-e-sabor-parte-1/
https://en.wikipedia.org/wiki/Synesthesia
https://en.wikipedia.org/wiki/Hallucinogen
https://super.abril.com.br/saude/todos-os-sentidos/#:~:text=Sinestetas%20ouvem%20cores%20e%20sentem,americano%20que%20estuda%20a%20sinestesia.
https://blogs.scientificamerican.com/mind-guest-blog/oliver-sacks-shares-tales-of-musical-hallucinations/
https://www.youtube.com/watch?v=SgOTaXhbqPQ
javascript:void(0);
11/5/22, 1:22 AM Musicologia na Mídia – Um blog de ciência da UNICAMP dedicado à pesquisa em música
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/ 2/6
Porém, em menor escala e de modo até subconsciente, frequentemente
temos experiências sensoriais multimodais (envolvendo diversos modos
de percepção), que se apoiam num princípio sinestésico para fomentar o
entendimento quantitativo e a apreciação qualitativa que compõem a nos-
sa noção de realidade, tanto objetiva quanto subjetiva. Para mim, uma
simples prova disso ocorre naturalmente, quando definimos a qualidade
da sensação de um certo sentido com adjetivos de outro, por exemplo, ao
mencionarmos que a voz de alguém é “macia” ou “áspera”, que um dado
som é “brilhante” ou “opaco”, ou que um arquivo de áudio está muito
“seco” ou “molhado” (este normalmente ligado ao nível de reverberação e
outros efeitos sonoros que agregam a sensação de espaço e distância ao
som). De fato, todos os nossos sentidos são estratégias biológicas evoluti-
vas para a coleta dinâmica de dados em tempo real, tanto externos (ex:
imagens, sons, cheiros) quanto internos (ex: fome, dor, sono). Esta intrin-
cada tarefa é realizada pelo sistema nervoso, iniciando pelos neurônios
sensoriais, cada qual especializado na coleta e na transdução de uma for-
ma específica de energia (ex: eletromagnética para visão, mecânica para o
tato, química para o olfato e paladar, acústica para a audição), cada qual
convertida em potenciais de ação que são transmitidas de forma eletro-
química (impulsos elétricos que caminham pelos axônios dos nervos afer-
entes e são mediados por neurotransmissores nas suas sinapses). Toda
essa gama informacional multimodal e dinâmica tem a mesma natureza
(todos são potenciais de ação) e chegam constantemente ao encéfalo onde
são discriminados de acordo com sua natureza sensorial, muitas delas de
modo subconsciente (como a sensação táctil da roupa que você vestindo
agora mas que provavelmente só reparou ao ler esta frase). 
A evolução não criou os sentidos para descreverem precisamente a reali-
dade externa, mas para viabilizar e otimizar a nossa navegação e inter-
ação, de modo a propiciar a nossa sobrevivência e o nosso bem estar.
Quando olhamos as paredes e o teto de uma sala, sabemos que os ângulos
são retos (de 90 graus) mesmo não os vendo desse modo (vemos em seu
lugar ângulos agudos ou obtusos que nos dão a sensação de perspectiva).
Quando escutamos, componentes em frequência relacionados à voz hu-
mana são percebidas mais nitidamente (pois nossa audição evoluiu para
ser mais sensível à fala humana, facilitando assim a comunicação humana
através da voz e da linguagem). Nos acostumamos facilmente com um
https://pt.wikipedia.org/wiki/Potencial_de_a%C3%A7%C3%A3o
javascript:void(0);
11/5/22, 1:22 AM Musicologia na Mídia – Um blog de ciência da UNICAMP dedicado à pesquisa em música
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/ 3/6
cheiro constante (por isso é tão difícil, por exemplo, alguém detectar o seu
próprio mau hálito) ou um estímulo tátil constante (como no exemplo aci-
ma, do contato da nossa própria roupa) mas não nos acostumamos com a
sensação de dor continuada (pois esta age como um tipo de alarme corpo-
ral para nos alertar de alguma anomalia).  As inúmeras ilusões (tanto vi-
suais quanto sonoras) se baseiam nessas discrepâncias sensoriais, focan-
do em inconsistências interpretativas da realidade, de modo a confundir
nosso entendimento e nos comprovando assim que não percebemos “a
vida como ela é” (aqui parafraseando Nelson Rodrigues) 
Qual lado parece mais alto; o da esquerda superior ou o
da direita inferior? Para inverter a percepção do lado
mais alto, basta fixar o olhar no lado mais baixo e imag-
iná-lo acima. Após alguns instantes a imagem irá, como
que mágicamente, trocar o lado que aparece acima. 
 Menos impressionante, porém também relevante é notar
que as faces pretas e brancas dos degraus, que na reali-
dade são retângulos (formadas por 4 ângulos retos) são
aqui desenhadas como losangos, cuja distorção nos dá a
sensação de profundidade.
 
https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Vida_como_Ela_%C3%89...
javascript:void(0);
11/5/22, 1:22 AM Musicologia na Mídia – Um blog de ciência da UNICAMP dedicado à pesquisa em música
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/ 4/6
No cotidiano, os sentidos agem simultaneamente, em cooperação, a fim
de nos prover informação útil e robusta. Por exemplo, é mais difícil se
equilibrar num só pé estando de olhos fechados, ou assobiar uma escala
musical ascendente (dó, ré, mi, fá, sol)  ao mesmo tempo que baixamos
nossos braços. A integração sensorial multimodal (entre sentidos distin-
tos) promove um melhor entendimento da realidade. Sendo assim, não é
de se estranhar que sensações de um determinado sentido influenciem a
sensação de outro sentido. Um exemplo disso é a sensação de sabor, que é
dada pela integração quase que inconsciente dos sentidos do paladar e do
olfato (por isso que quando se está com o nariz tampado, o sabor dos ali-
mentos parece atenuado ou até ausente).  
No entanto, outras integrações menos óbvias também ocorrem e têm sido
objeto de estudo científico, com forte apelo comercial. Este é o caso da in-
tegração entre a sensação de sabor (paladar e olfato) e a sensação sonora.
Conhecida como “sonic seasoning” (tempero sonoro), esta tem sido uma
área de estudos da influência do som e da música no sabor percebido ao
ingerir alimentos e bebidas. Recentemente, o pesquisador Felipe Reinoso
Carvalho, professor de marketing da Universidad de los Andes deu uma
interessante palestra sobre o tema, para o grupo de Neurociência e Músi-
ca da UFABC, o que me inspirou a escrever este artigo. A influência da
música na propaganda já é algo bastante conhecido, utilizado como fator
persuasivo pelo menos desde os trabalhos de Edward Bernays, considera-
do por muitos como o “pai da propaganda”, e estudado por teóricos como
Theodor Adorno, em trabalhos como o seu conceito de indústria da cul-
tura. O que há de novo no conceito aqui apresentado (sonic seasoning) é
estudar a influência não psicológica ou cultural, mas sinestésica, de medi-
ação sensorial do sabor através de estímulos tanto puramente sonoros de-
sprovidos de contexto (notas, sons senoidais) quanto musicais (através de
programação musical especificamente escolhida para estimular ou inibir
determinadas nuances do sabor). É sabido por todos como a maioria das
pessoas gosta de consumir alimentos enquanto escuta música ou assiste
vídeos. Talvez a influência sonora já seja intuitivamente utilizada por to-
dos ao escolher e harmonizar um cardápio com uma programação musi-
cal específica. O que os estudos aqui tratadostentam realizar, a meu ver, é
avançar o conhecimento científico no sentido de compreender um pouco
mais as razões perceptuais (os fatores psicoacústicos) e os emotivos (os
https://qz.com/871605/sonic-season-changing-taste-with-sound
http://sonictaste.weebly.com/contact.html
https://uniandes.edu.co/
https://youtu.be/ncJSlWpbbp0
https://neuro.ufabc.edu.br/music/
https://en.wikipedia.org/wiki/Edward_Bernays
https://en.wikipedia.org/wiki/Culture_industry
javascript:void(0);
11/5/22, 1:22 AM Musicologia na Mídia – Um blog de ciência da UNICAMP dedicado à pesquisa em música
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/ 5/6
fatores musicais) que permitem mediar sonoramente a promoção ou con-
tenção de provavelmente o maior dos prazeres humanos; beber e comer; e
por isso mesmo, fonte de tanta satisfação e sofrimento. 
 
continua…
 
 
Como citar este artigo:
José Fornari. “Som e sabor – parte 1”. Blogs de Ciência da Universidade
Estadual de Campinas. ISSN 2526-6187. Data da publicação: 30 de out-
ubro de 2022. Link:
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/2022/10/30/som-e-sabor-
parte-1/
 
José Fornari (Tuti) in Sem categoria | 30 de October de 2022 | 1,270 Words | Comment | Edit
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/author/musicologia/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/category/sem-categoria/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/2022/10/30/som-e-sabor-parte-1/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/2022/10/30/som-e-sabor-parte-1/#respond
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/wp-admin/post.php?post=1523&action=edit
javascript:void(0);
11/5/22, 1:22 AM Musicologia na Mídia – Um blog de ciência da UNICAMP dedicado à pesquisa em música
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/ 6/6
Page 1 of 58 1 2 3 4 5 ... 10 20 30 ... » Last »
Independent Publisher empowered by WordPress
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/2/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/3/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/4/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/5/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/10/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/20/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/30/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/2/
https://www.blogs.unicamp.br/musicologia/page/58/
http://independentpublisher.me/
http://wordpress.org/
javascript:void(0);