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/ ANTONIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenheiro e Investigador , , , , r r ,',' : ... :<>" ,',',' I I ",'" I'" ,',,' セ@ LLZセLG@ Z[M^セGZ@ ,',' ''''''''' "',',',',"',',', ," <:':'Y\, '::: ::::,::::;'f i: ,,://" lW",,---- ,... :, ':- ", .', "" ,',' セ@ - -- -, ',' I ... ;,,"1 セ@ .............. ,. A: .. 1 r-- , , , , , , , , , , , , , , tJt;' " " , .... ,' , , " " " EDIÇÃO Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos (APRH) A/C LNEC Av. do Brasil, 101 1700-066 Lisboa TeI. 21 844 24 28 E-mail: aprh@aprh.pt FICHA TÉCNICA Coordenadora Maria Manuela Portela Editores Maria Manuela Portela José Vieira da Costa António Heleno Cardoso Autores Referidos no texto Design Flatland - Design de Comunicação Pré-Impressão e Impressão Arlindo Silva, Artes Gráficas, Lda. Tiragem 2500 exemplares Depósito Legal 266093/07 ISBN 978-972-99991-3-0 INVESTIGADOR Maria Manuela Ponela, Professora Auxili ar do 1ST 1 Emídio Gil Santos, Professor Associado Aposemado do 1ST 1 António Betâmio de A lmeida, Professor Catedráti co do 1ST 2 Jorge Saldanha Maros, Professor Auxili ar do 1ST 2 João Luís Cardoso, Professor Catedráti co de Hi stória e Arqueologia da Universidade Aberra. Coordenador do Cemro de Esrudos Arqueológicos do Concelho de Oeiras (Câmara Municipal de Oeiras) 1 José Manuel de Mascarenhas, Professor Associado do Deparramemo de Ecologia da Universidade de Évora J 1 - CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS As contribuições de António de Carvalho Quintela relevantes no domínio das ciências associadas à Engenharia Civil, designadamente, no que respeita às suas múltiplas interacções com as "águas superficiais", iniciaram-se no âmbito da hidrologia e dos recursos hídricos. De entre os documentos que consubs- tanciam tais contribuições cita-se a dissertação de doutoramento Recursos de águas superficiais em Portugal Continental ([6] Quintela, 1967), de grande abrangência e pioneirismo ao nível da sistematização de conceitos, do rigor dos formalismos utilizados e da extensa caracterização hidrológica efectuada para Portugal Continental, incluindo a apresentação de novos procedimentos de estimação das disponibilidades hídricas superficiais. A tais contribuições sucederam-se as no domínio da hidráulica, por razões certamente relacionadas com o desempenho da profissão, mas muito especialmente com o perfil de investigador-engenheiro de António Quintela, caracterizado por uma invulgar capacidade, quer de intuição dos problemas práticos, quer de pesquisa e de conceptualização das correspondentes soluções. Não foi alheia a tal percurso a intervenção de António Quintela como professor, pelo conhecimento sólido e aprofundado que lhe imprimiu e pela opção de transmitir esse conhecimento com rigor, circunstâncias que conduziram a uma contribuição muito perdurável no âmbito e com alcance muito para além do objectivo pedagógico, materializada no livro Hidráulica ([7] Quintela, 1981). o percurso que, assim, António Quintela foi trilhando dotou-o de amplo e consistente conhecimento no domínio das ciências relacionadas com as "águas superficiais" , mas também no das implicações e aplicações práticas desse recurso, no presente e no passado, circunstância que poderá ter contribuído 1 "Considerações prévias" e "Investi gação em hidrologia e recursos hídricos". 2 "Investigação em hídráulica". J "Investi gação em história e arqueologia de obras hidráulicas". 93 E S T セ@ v à O C A B R A L SEGUNDO CEl'o'TtN,\nIO 01. Pl!DtT CAÇ10 RI CE R C H E I ST O "'I C II E. ri S I C II [ 10 10 .. I,) 5 r ... T L C K. .... _--, .. __ Nセ@ ......... . セ@ _.-- .. セ@ ....... _ ... ... セ@ ....... --... .... _. ' __ w 1_' ,,, セセN@ イイセ⦅NG@ ......... _. IIEN I:!JL Iro ['.\\SIU NI ' ,,,,,,.,MA.I01CCLfHI/ ""' __ r-_<'""'\_,-.,._ ". セn@ hGセGNG@ '''. Lセ L@, .... -. ... ,_ ... ... "",.,." 1'""" セ@ 8......... I, U!.<,," • セ@ lo: セ@ 1786 1986 HINt s1t;R!O 0(1 rLA"O r. ... ョセiii|ᄋiャGitr@ ... c;lo 00 TUIIU l'OlltO SECRtTAnu DF. " STAllO 00 .umU:STf' E m';ClIJlSOS :"ATlflL",S DW ECÇ"O_GEI'IAI. OOS H[Clrn:;os .. APnOl'l:IT.oHIU,'TOS QiQu{AャuャNイ coセ@ Capa da publicação sobre Estêvão Cabral ([ 13] Quintela, 1986). campos do Tejo em 1608 ([52] Quintela, 1984) e, outra, sobre os estudos de 1884 para a rega do Alentejo ([53] Quintela, 1984), conforme mencionado no sub capítulo precedente, relativo à investigação de António Quintela no âmbito da hidrologia e dos recursos hídricos. Em 1986, deve-se a António Quintela o ter sido revelado pela primeira vez algumas contribuições pioneiras de Estêvão Cabral (1 734-18 1 1), nomea- damente o emprego de molinetes para medir velocidades em profundidade nos cursos de água, tornando-se, assim, num percursor na hidrometria de rios ([13] e [109] Quintela, 1986, [5 8] Quintela; Loureiro, 1987, [60] Quintela, 1991 e [75] Quintela, 2001) . Três vultos dos séculos XIX e XX, Bento Fortunato de Moura Coutinho de Almeida d'Eça. (1825-1906), José Filipe Rebelo Pinto (1907 -1979) e Pedro de Varennes e Mendonça (1915-1991) são, também, objecto de notas biográficas ([7 6] Quintela, 2002, [77] Quintela, 2002 e [80] Quintela; Raposo, 2004). Em todas as publicações didácticas e de divulgação de sua autoria e nos relatórios técnicos elaborados sob a sua responsabilidade, realça-se o rigor da escrita e a precisão das definições e dos conceitos envolvidos. Rigor que pode ser considerado inexcedível o que, por si só, constitui uma vali osa contribuição para o conhecimento da hidráulica em Portugal. O sincero gosto de António Quintela pela utili zação correcta dos termos está bem patente no texto de 2 O 01, publicado na revista Recursos Hídricos da APRH, subordinado a uma questão de terminologia hidráulica referente à diferença entre as designações açude e barragem ([ 74] Quintela, 2001). 3.5 - Considerações finais O exemplo de alegria, rigor e competência nos estudos de hidráulica constitui, e constituirá, um legado perene para os que foram colaboradores directos de António Quintela. Salienta-se, ainda, uma outra mais-valia humana muito importante associada à sua actividade e produção bibliográfica como engenheiro, investigador e professor que neste texto foi comentada: o exemplo de comportamento ético. Entre outros aspectos, a ética de António Quintela manifesta-se no extremo cuidado nas referências a autores e a trabalhos, na verdade do que se escreve, na responsabilidade perante a leitura futura. Obrigado Professor António Quintela. 4 - INVESTIGAÇÃO EM HISTÓRIA E ARQUEOLOGIA DE OBRAS HIDRÁULICAS 4.1 - Palavras prévias Os autores deste sub capítulo consideraram conveniente apresentar, a útulo introdutório, algumas notas sobre os antecedentes do desenvolvimento da área de investigação objecto do mesmo, em meados dos anos 80, e as prindpais razões que levaram o Professor António Quintela a interessar-se e a envolver-se nela. 124 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenheiro c Im'cstigador .. ...Investigador o Dr. Caetano de Mello Beirão, malogrado e comum amigo dos autores, era, em 1984, o Director dos Serviços Regionais de Arqueologia da Zona Sul, serviço integrado no Departamento de Arqueologia do então Instituto Português do Património Cultural; sempre à procura de novas vias de afirmação da Arqueologia, incentivou os autores deste sub capítulo a enveredarem pelo estudo das barragens romanas no sul do território hoje português, que tão bem conhecia. A razão era simples: como Director daqueles Serviços, não desconhecia a importância de algumas daquelas estruturas, cujo estudo só poderia ser feito, de forma adequada, numa perspectiva pluridisciplinar. Por outro lado, sendo o primeiro autor deste sub capítulo, arqueólogo, que então desenvolvia no Laboratório Nacional de Engenharia Civil a sua actividade profissional como geólogo de engenharia, e desempenhando o outro autor, nesse período, funções de técnico superiorda Universidade de Évora na área da Ecologia, estavam, pois, reunidas as condições para se dar início aos desejados estudos de reconhecimento. Tendo tais incentivos sido recebidos com manifesto interesse por parte de ambos, que entretanto se conheceram, o início dos estudos teria, contudo, que aguardar as condições propícias, que, no decurso de 1984, ainda se não encontravam reunidas. Entretanto, nesse mesmo ano, o primeiro autor travou conhecimento com o Professor António Quintela, no âmbito da preparação da sua dissertação de Mestrado em Geologia de Engenharia, apresentada em Novembro à Univer- sidade Nova de Lisboa, de que foi arguente. O Professor António Quintela, sendo especialista de engenharia hidráulica e autor conhecido no âmbito da respectiva história, depois de instado a pronunciar-se sobre o interesse deste projecto, viria, de início, a exprimir algumas reservas, por ser de seu conhe- cimento que alguém, na Universidade de Évora, se estaria também a dedicar ao assunto. Depois de esclarecido que tal pessoa era, exactamente, o segundo autor deste capítulo, ficou combinado um encontro a três, o qual de facto se veio a realizar ainda no final desse mesmo mês, no Instituto Superior Técnico. Manifestou então o Professor António Quintela o maior interesse em dirigir um projecto dedicado ao estudo sistemático das barragens romanas do Sul do País, acrescentando que se tinha sentido "humilhado" pelo facto de ter, a dada altura, lido em obra do espanhol Fernández Casado, que a mais alta barragem de contrafortes conhecida no mundo romano se encontrava às portas de Lisboa, sem que tal facto fosse do conhecimento corrente, especialmente dos que tinham a seu cargo a formação de futuros engenheiros ... já que tal estrutura se encontrava classificada como Imóvel de Interesse Público desde 1974. Com .efeito, ao contrário do que se verificava em outros países, como na vizinha Espanha, onde, na Escola Superior de Caminhos, Canais e Pontes de Madrid, existia a cátedra de Estética da Engenharia, então ocupada pelo Professor Fernández Ordoíi.ez, na escola portuguesa fazia-se e faz-se sentir a falta de idêntica unidade curricular. Importa anotar que, no entanto, o Professor António Quintela já dirigia uma linha de investigação sobre História da Hidráulica em Portugal, no Centro de Estudos de Hidrossistemas (CEHIDRO), do 1ST, iniciada em 1982 que, até 1984, tinha originado quatro artigos publicados na revista Recursos Hídricos. 125 Garantido o apoio financeiro por parte da então designada Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, sendo Director-Geral o Engenheiro Faria Ferreira, os trabalhos de campo iniciaram-se logo em Janeiro de 1985. Mais de vinte anos volvidos, é de interesse relembrar a forma como que tais trabalhos decorreram: depois de recolhida e analisada a informação biblio- gráfica disponível, conjugada com outra resultante de um inquérito sistemá- tico às autarquias a sul do Tejo, e com informações verbais de muitos especia- listas, para o efeito contactados, a vasta área a investigar foi sendo dividida por sectores, os quais seriam objecto de sucessivos reconhecimentos de campo. A informação assim obtida foi sendo meticulosamente coordenada, por toda a equipa, tendo em vista a fase seguinte dos trabalhos, correspondente aos reconhecimentos de campo. Assim, ao longo de sucessivos fi ns-de-semana, que se prolongaram por toda a primeira metade do ano de 1985, todas as ocorrências previamente identifi cadas foram objecto de visita, por parte dos dois autores, depois de definid os, ao longo da semana antecedente, os percursos de automóvel mais aconselhados; foi uma época de trabalho árduo, tantas vezes à chuva e em terrenos alagados, por vezes quase impraticáveis, obrigando a extensos percursos a pé. Foi, contudo, a parte mais estimulante do trabalho, recompensada por novas descobertas, respeitantes a locais ainda não referenciados. Com efeito, ao questionar a população sobre a existência de "paredes velhas" , arcos ou canais" do tempo dos mouros", quantas vezes se deparava com vestígios de estruturas hidráulicas diferentes das procuradas! Noutros casos, a toponímia registada nas folhas da Carta Mili tar de Portugal à escala de 1/25 000 oferecia insuspeitadas pistas, ao registar topónimos sugestivos como "presa", "represa" , "muro", ou outros. Tais descobertas eram, depois, festejadas, com a excelente cozinha alentejana, acompanhada pelos não menos excelentes vinhos e doçaria, servindo como pausas reparadoras de tantas e tão exaltantes molhas e canseiras. Eram estas, afinal , as únicas recompensas obtidas, já que jamais os autores benefi ciaram - nem esse era o propósito - de quaisquer pagamentos pelos trabalhos efectuados. Por vezes, chegados noite adentro a certas povoações, e confrontados com a dificuldade de alojamento, geravam-se situações caricatas: foi o caso de, em Beja, ao pernoitar naquele que teria sido, há muito tempo, o melhor aloja- mento da cidade, depois de cortesmente recebidos por senhora que parecia ter estado ali desde o início dos tempos, ter um dos autores deste capítulo sido sobressaltado, a meio da noite, por um vulto dentro do quarto, que logo se pôs em fuga. Questionada a velha senhora sobre tão insólit o acontecimento, informou que tal era frequente, por parte de algum dos inofensivos bêbedos de fim-de-semana que frequentemente circulavam, altas horas, pela cidade ... No final de cada saída, domingo, já noite cerrada, numa época em que as actuais auto-estradas ainda nem sequer existiam em projecto, regressava-se a Li sboa, com inúmeras fotografias e notas de campo que eram, na semana seguinte, objecto de estudo, conjuntamente com o Professor António Quintela. A regularidade com que se estabeleceram e mantiveram ritmos de trabalho explica a efi cácia e prontidão com que se obtiveram resultados, que permi- 126 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenheiro e lnvesngador ]nvestigador tiram uma primeira publicação ainda nesse mesmo ano de 1985, [187J Quintela et aI., 1985. A importância de algumas ocorrências justificou a repe- tida deslocação a tais locais, em companhia do coordenador do projecto, sempre empenhado e preocupado com o rigor da análise e da caracterização efectuadas. No final do ano seguinte, estava pronto par-a pub1icação o li vro, editado pela entidade patrocinadora do projecto, intitulado Aproveitamentos hidráulicos romanos a sul do Tejo. Contribuição para a sua inventariação e caracterização ([176J Quintela et aI., 1986), com um belo prefácio da autoria do Professor Jorge de Alarcão, que assim quis distinguir o trabalho produzido. A apresentação pública da obra, efectuada no sede do Ministério do Plano e da Administração do Território, pelo então Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, Engenheiro Carlos Pimenta, constituiu o culminar desta fase inicial dos trabalhos da equipa que, orientada pelo Professor António Quintela, efectuou o primeiro e, até agora, o mais completo estudo de inventariação e caracterização de estruturas hidráulicas do período romano no território por- tuguês. Nele se apresentou um ensaio de classificação tipológica e construtiva das barragens romanas inventariadas. Mais tarde, o seu âmbito veio a ser sucessivamente alargado a outras regiões do país, e acrescentado com novas ocorrências, entretanto identificadas. Com o seu envolvimento neste estudo, António Quintela passou a dirigir no CEHIDRO uma linha de investigação abrangendo, também, a Arqueologia de Obras Hidráulicas. 4.2 - Barragens romanas As barragens são, de entre as estruturas hidráulicas antigas, as que possuem maior monumentalidade e maior diversidade de elementos arquitectónicos e estruturais, conferindo-lhes, naturalmente, interesse acrescido, face às restantes estruturas, como tanques, cisternas, poços, canais e aquedutos, das quais se inventariaram também interessantesocorrências. Pelas razões apontadas, não espanta que às barragens tenha sido dedicada boa 127 ( Lançamento do li vro Aproveitamentos hidráulicos romanos a sul do Tejo. Contribuição para a sua inventariação e caracteri zação ([ 17 6] Quintela et aI. , 1986). Barragem romana da Orca ( distri to de Castelo Branco). parte das publicações produzidas pela equipa. O seu interesse motivou, logo que concluído o livro [176] Quintela et al. , 1986, a preparação de artigo desti- nado a publicação em revista internacional, onde se sumarizaram os resultados mais salientes, [1 89] Quintela et al., 1987, os quais vieram a ser, ulteriormente, completados com novas observações de estruturas que ainda não tinham sido objecto de estudo, [1 95] Quintela et al., 1999. Contudo, a publicação destes trabalhos em actas de reuniões científicas nacionais, [188] Quintela et al., 1 98 6, [1 98] Quintela et al., 1 988, ou internacionais, [I 99] Quintela et al., 1989, não foi descurada. Merece destaque, também, pelo excelente convívio, a reunião promovida pela Fundación de San Benito, em San Benito de Alcântara (Cáceres), em Fevereiro de 1989. Tendo coincidido com a quadra carnavalesca, e em consonância com a temática da comunicação, não poderia deixar de ser recriada, ao vivo e com a indispensável toga e coroa de louros, a característica figura do patrício romano, satisfeito pelo facto de, volvidos dois mil anos, as obras hidráulicas por si mandadas executar no seu latifúndio, serem de novo trazidas à ordem do dia. Entretanto, novas informações sobre a existência de barragens de terra situadas a norte do Tejo, no distrito de Castelo Branco, conduziram os autores à identificação de obras ainda hoje imponentes, as quais se contam entre as melhores, no seu género, do período romano, para tal concorrendo o facto de terem sido poupadas à erosão. Estas barragens, não dispondo em geral de descarregadores de superfície, foram galgadas, em períodos de cheia, o que deu lugar à abertura de brechas nos aterros, através das quais passou a ocorrer o escoamento, permitindo deste modo a preservação de grandes trechos dessas barragens. Tal como as anteriores, a publicação dos resultados efectuou-se em prestigiadas revistas, portuguesas ou não, [193] Quintela et al., 1994, e [194] Quintela et al., 1995.Tais observações continuaram, até ao presente, a ser objecto de reapreciação e actualização, não só através de novas descobertas, mas também numa perspectiva de valorizar a sua funcionalidade, como, aliás, se verificou desde as primeiras publicações. Neste contexto, é de referir o estudo [I85] Quintela; Mascarenhas, 2006, no qual se abordam as barragens mineiras trans- montanas de Tresminas, cujo fornecimento de água para as explorações auríferas ali existentes tinha sido anteriormente reconhecida por outros autores. 128 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Pnltcssm, Engcnhclro < Jl1\c,rigador .. }nvestigador Treze das quarenta e uma barragens romanas actualmente inventariadas foram identificadas e estudadas pela primeira vez pela equipa constituída por António Quintela e pelos autores deste sub capítulo, sendo trinta e quatro o número das que foram por estes estudadas e caracterizadas. Para esta caracterização muito contribuíram os levantamentos topográficos das principais barragens e, em treze casos, das zonas que haviam sido ocupadas por albufeiras, os quais foram proporcionados pela Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráu- licos e, mais tarde, pelo Instituto da Água. Tais levantamentos de áreas de albufeiras permitiram avaliar o volume de água armazenável, cujo máximo atingia 840 000 m 3 na barragem de terra da Lameira (Castelo Branco), o que não espanta, dado o facto de a exploração mineira a que estaria associada requerer elevados volumes de água. Já a sul do Tejo, dadas as menores necessidades exigidas pela rega e pelo abastecimento doméstico, os volumes são claramente inferiores; ainda assim, o volume armazenável na albufeira da grande barragem do Muro (Campo Maior) ascendia a cerca de 178 000 m 3 • As preocupações com a divulgação para o grande público dos resultados obtidos conduziram também os membros da equipa a colaborarem em duas exposições realizadas no Museu Nacional de Arqueologia e na elaboração dos respectivos catálogos; em ambas, a utili zação da água no período romano foi abordada, [181 J Cardoso et a!., 1997, ou constituía mesmo a temática central do certame, [182 J Cardoso et a!., 2 O 04. Enfim, a salvaguarda oficial destes, por vezes, ainda monumentais VeStlglOs estava ainda por fazer, excepção feita à grande barragem dita "de Olisipo", sobre a ribeira de Carenque. Assim, em consequência do estudo conduzido pelos membros da equipa, [17 6J Quintela et aI., 1986, e no seguimento de proposta por eles subscrita, várias barragens estudadas foram classificadas como Imóveis de Interesse Público, pelo então Instituto Português do Património Cultural, IPPC. 129 .\ l .... c]lll'rd,l Barragem romana "de Olisipo" (ribeira de Carenque). -\ din'JlJ. Barragem romana do Muro (Campo Maior). I' I- Barragem romana de Pisões (Beja). Canal de adução da villa do Cerro da Vila (Loulé). 4.3 - Utilização da água no período romano Uma das preocupações que esteve presente desde os primeiros trabalhos da equipa, foi a atribuição de funcionalidade às estruturas hidráulicas romanas identificadas. Com efeito, não bastava a caracterização rigorosa de cada uma delas: no quadro de um estudo pluridisciplinar, onde a componente arqueo- lógica detinha lugar determinante, era necessário proceder a averiguações sobre a finalidade de tais estruturas, no quadro de uma investigação mais alargada. Assim, se as barragens de terra transmontanas e do distrito de Castelo Branco pareciam inquestionavelmente relacionar-se com as explorações mineiras, dada a relação directa com tais testemunhos, no primeiro caso, ou a reunião de critérios que excluem outras utilizações, no segundo caso - como a ausência, a jusante, de villae ou de canais de adução, a que se soma frequentemente a pouca aptidão de solos para a rega - já as barragens iden- tificadas a sul do Tejo tinham finalidades diferentes, sobretudo ligadas às duas funções referidas: abastecimento doméstico e rega dos campos. Nalguns casos, a relação das barragens com a pars urbana das villae é evidente: os casos mais notáveis são o da barragem de Pisões (Beja), situada na adjacência imediata da respectiva área habitada e o da barragem de Vale Tesnado (Loulé), que abastecia a villa do Cerro da Vila. Neste último caso, foi possível reconhecer o traçado do respectivo canal de adução, em toda a sua extensão de cerca de 1600 m, [176] Quintela et aI., 1986, e [198] Quintela et aI., 1988. Este canal viria a ser posto ocasionalmente a descoberto no decurso de obras de reordenamento turístico, realizadas ulteriormente ao estudo de 1986, na zona próxima da barragem. Tendo-se então deslocado ao local, a equipa nada mais pôde fazer que constatar a iminente destruição daquela importante estrutura, que, sem que fosse devidamente escavada, como se impunha, viria a ser totalmente destruída. Foi, contudo, verificado que o canal em causa partia do encontro da margem esquerda, sendo a descarga da água controlada por uma comporta plana de corrediça. apoiada em ranhuras dispostas verticalmente em blocos de pedra aparelhada. Igualmente interessante foi a identificação, na 130 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Prnt"ssor. eョァセョィ・ュI@ e I nn'sClgador .. }nvestigador parte central da barragem, de uma descarga de fundo constituída por dois orificios cilíndricos obturados por rolhões de madeira. Uma amostra desta madeira foi classificada pelo Professor João Pais, da Universidade Nova de Lisboa, como pertencente a pinheiro, e por este analisada quimicamente, revelando contaminação por cloreto de chumbo, em resultado da impregnação provocada pelo própriotubo da descarga (em chumbo). Uma amostra foi também datada no ITN, pelo Engenheiro A. M. Monge Soares, tendo-se obtido os intervalos calibrados a dois sigma, para cerca de 95% de probabilidade, com recurso à curva de Pearson et a!. (1986), de 13 0-1 5 O e de 1 71-197 cal AD. Este resultado é de grande interesse, porque foi a primeira e única obra hidráulica cuja utilização foi possível datar, em termos absolutos, [195] Quintela et a!., 1999, situando-a, no caso, no século II depois de Cristo. A utilização da água represada por barragens, no decurso do período romano, em todo o Sul do País teria, pois, finalidades de abastecimento doméstico e/ ou de rega, observando-se a concentração de obras nas zonas com menor 131 < A flll UIll. Barragem romana de Vale Tesnado (Loulé). \ l qlH re!.i Tomada de água da barragem romana de Vale Tesnado (Loulé). precipitação, pois nos locais onde a mesma era mais abundante, seria menos onerosa e mais fácil a realização de captações através de poços, além do aproveitamento directo das próprias exsurgências naturais. Dois casos, de entre os vinte e cinco inventariados a sul do Tejo, afastam-se dessa realidade. Com efeito, as barragens de Presa dos Mouros (Lagoa), publicada por ]. L. Cardoso e M. V Gomes, muito perto da linha de costa, e a barragem de Comenda (Setúbal), foram relacionadas com o abastecimento de água destinada à laboração de fábricas de salga de peixe, embora o abastecimento doméstico seja também admissível neste último caso. A exposição organizada em 2004 pela Fundació Agbar sob o sugestivo título Agua Romana. Técnica Humana e Força Divina que, depois de ter permanecido no Museu de les Aigües - Cornellà de Llobregat (Catalunha), percorreu, em 2005, diversas cidades peninsulares, como Lisboa (Museu Nacional de Arqueologia), Mérida (Museu Nacional de Arte Romano) e Madrid (Museu Arqueológico Nacional), possibilitou a abordagem de um tema ainda pouco investigado em Portugal: os moinhos romanos movidos pela água, [182J Cardoso et a!., 2004. Assim, além da já conhecida azenha de Conímbriga, [181J Cardoso et a!., 1997, valorizou- -se a estrutura de moagem que teria existido do lado de jusante de uma das mais belas e melhor conservadas barragens romanas do território português: a 132 \ ( tjtll'nL Câmara de jusante da barragem romana de Grândola. rtll hJJ'\f I Planta da barragem romana de Grândola. ( v I / // / t--- ____ ..... セ@ o 5 m ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenhclro t: IIl\'Csng.ldor .... Investigador barragem de Grândola, [195] Quintela et aI. ,1999, já mencionada na obra clássica do padre António Carvalho da Costa (1708), Corografia Portugueza e descripçarn topográfica do famoso Reyno de Portugal. Foi através da Dra . Marisol Ferreira, então arqueóloga da Câmara Municipal de Grândola, que a equipa teve acesso a esta obra hidráulica, cujo levantamento topográfico, realizado pela referida autarquia, depois de efectuada a limpeza e desmatação, tornou possível o seu estudo. Trata-se de um exemplo, entre outros que se poderiam referir, da colaboração, pouco usual, estabelecida entre entidades muito distintas, com finalidades exclusivamente científicas. Um outro tipo de máquinas hidráulicas, destinadas não ao aproveitamento da força motriz, mas à elevação da água, encontra-se representado em Tróia (Grândola), importante cidade industrial romana dedicada à produção de preparados de peixe, como indicam as diversas unidades fabris conhecidas desde o século XIX. Uma dessas unidades era abastecida pela água proveniente por gravidade de um tanque sobreelevado, suportado por arcaria de volta inteira. Conquanto fosse estrutura há muito conhecida pelos arqueólogos, ainda se não tinha compreendido a sua utilização, em relação com uma fábrica de salga situada em local adjacente, nem tão-pouco a evidente conotação com um poço de planta aproximadamente rectangular, situado junto ao seu embasamento, mantendo-se, deste modo, a indefinição da respectiva finalidade. Convidada a equipa pelo Dr. António Cavaleiro Paixão, então arqueólogo responsável pela estação arqueológica, e depois de se ter procedido a estudos no local, que incluíram o levantamento topográfico da estrutura e da área adjacente, bem como do seu alçado e a análise da variação do nível de água no poço, influenciado pela maré, verificou-se que este se destinava ao abastecimento do tanque, através de uma grande roda hidráulica de madeira, movida por um homem, marchando sobre o anel perimetral da roda. Trata-se da técnica, desi- gnada porVitrúvio, de homini bus calcantibus, apenas documentada em Portugal, 133 Tanque das ruúlas romanas de Tróia (Grândola) e perspectiva da provável operação da roda hidráulica a ele acoplada. (v ) Tanque romano dos Mouros (Estremoz). Pequeno edificio adoçado a uma parede do tanque em que se observa um orifi cio que permitiria a adução de água a um moinho de rodízio. até então, nas minas romanas de S. Domingos, para a evacuação de água das galerias abertas no decurso da exploração mineira. O respectivo estudo, [191] Quintela et aI., 1993, foi publicado no volume de homenagem a esse grande mestre da Arqueologia portuguesa que foi João Manuel Bairrão Oleiro, que sempre acompanhou com interesse a realização destes trabalhos que, confi- gurando, afinal, um outro olhar sobre o património arqueológico, produziram nova e enriquece dor a informação. O conhecimento das máquinas hidráulicas associadas a algumas das estruturas que os Romanos construíram para o armazenamento da água - para além das barragens, existiram também grandiosos tanques, de que é exemplo o Tanque dos Mouros, junto a Estremoz, com a mesma finalidade, o qual possui também indícios de possível instalação de um ou mais moinhos de rodízio, de eixo vertical - é um domínio ainda muito pouco conhecido em Portugal. Para o prosseguimento desta interessante linha de investigação seria necessário orga- nizar um programa metódico de escavações nas barragens melhor conservadas e associadas a vestígios mais monumentais, as quais só muito recentemente vieram a ter lugar. Com efeito, além da barragem que abasteceria a cidade de Aquae Flaviae (Chaves), publicada por R.Alfenim, em 1992, apenas a barragem de Chocapalhas (Tomar), publicada por S. da Ponte, em 200 I, e a barragem do Álamo (Alcoutim) foram objectos de intervenções arqueológicas, no último caso realizadas em 2006, sob direcção do primeiro autor e ainda inéditas. Porém, os resultados já obtidos - note-se que em Chocapalhas também se identificaram testemunhos de moinho hidráulico - justificam o prossegui- mento destes estudos. 4.4 - Barragens antigas pós-romanas A equipa constituída por António Quintela e pelos autores procedeu também ao estudo de barragens antigas pós-romanas, construídas em Portugal até meados do século XX, com a finalidade de criar albufeiras, e que se considerou serem detentoras de valor patrimonial. Foram estudadas vinte e oito barragens, vinte e sete das quais se localizam a sul doTejo, [180] Quintela et 01.,1994; [183] Quintela et 01.,2004; e [199] Quintela et aI., 1989. Salienta-se que a primeira destas referências resultou de convite do 134 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenheiro e In\'estigador .... .Investigador investigador espanhol José António Garcia-Diego para que o estudo das barragens antigas pós-romanas, [180] Quintela et al., 1994, fosse integrado num livro sobre presas antigas editado pela Fundación Juanelo Turriano (Madrid). Apenas a barragem de Alferrarede (Abrantes) se situa a norte daquele rio, [194] Quintela et a!., 1995. Estas barragens, na sua maioria, são de alvenaria de pedra, do tipo gravidade, sendo quatro construídas de terra. Várias destas estruturas têm mais de dois ou três séculos de existência: sabe-se da existência de duas destas barragens (Alpedreira de Baixo e Alpedreira de Cima, noconcelho de Elvas) em 1622, da barragem da Tapada Real (Borba), em 1729, da barra- gem de Penedos (Arraiolos), ca. 1 780, e da construção da barragem do Monte Branco (Borba), em 1749. É, todavia, provável, que, pelo menos uma das estruturas estudadas (barragem da Provença, Évora) possa ascender ao século XV ou XVI, pelo facto de apresentar uma tipologia próxima de algumas barra- gens romanas (traçado, em planta, curvilíneo, com concavidade virada para montante, pequena altura) e de se integrar numa quinta já existente em 1459, com uma ermida apresentando elementos arquitectónicos do séc. XV ou XVI. Duas outras barragens, Represa (Gavião) e Alferrarede, apresentam uma tipolo- gia (dois muros de alvenaria argamassada, com enchimento de aterro no núcleo) próxima da tipologia da barragem de Ontígola, construída em Espanha, no tempo de Filipe II, pelo que não é de excluir que ascendam à primeira metade do século XVII. Nas publicações, realizadas pelos autores com António Quintela, sobre estas barragens, já atrás referenciadas, mencionam-se também os aspectos mais rele- vantes, como sejam a fmalidade, as particularidades construtivas e as características hidráulicas. Em resultado destes estudos, consideraram-se de maior interesse as barragens de Alpedreira de Baixo, Monte Branco, Penedos e Jungeis (Alcácer do Sal), esta última muito mais recente do que as restantes (co. 1929). 135 Barragem de Alferarede (Abrantes). v A ... · ... qllt·rda Barragem de Alpedreira de Baixo (Elvas). \ uin:nJ Barragem de Penedos (Arraiolos). Algumas barragens, como a de Alpedreira de Baixo, são relativamente baixas (altura inferior a 5 m) enquanto outras, como as três últimas, apresentam altura superior a 10m. Também o traçado e o desenvolvimento variam: enquanto umas têm traçado poligonal, como as duas primeiras, noutras observa-se traçado rectilíneo, como nas duas últimas citadas, havendo ainda outras com traçado curvilíneo. Uma das barragens mais antigas (Alpedreira de Baixo) apresenta um desenvolvimento apreciável (cerca de 250 m), o que foi realçado pelos autores. A variabilidade da morfologia do perfil dos muros foi identica- mente posta em evidência. Foi dada também especial relevância à tipologia e características das descargas de fundo e de superficie das barragens estudadas. No que respeita ao primeiro aspecto, realça-se, em especial, a barragem de Alpedreira de Baixo dotada de duas descargas de fundo, constituídas por tubos que atravessam o muro, equi- padas com válvulas que se alojam em dois grandes nichos. Esta zona apresenta arranjo para área de lazer, com escadaria, estátuas, decorações várias e bancos, sendo o conjunto detentor de evidente qualidade estética, aspecto pouco comum em obras desta natureza, [199] Quintela et a!. 1989. Outras barragens apresentam descarregadores de concepção relativamente sofisti- cada e que mereceram, por parte dos autores, uma alusão especial, como as barra- gens do Conde e das Silveiras, no concelho de Évora, construídas cerca de 1890. Grande parte destas estruturas foi utilizada para fins múltiplos. A barragem de Alpedreira de Baixo parece ter sido construída para rega, se bem que, no século XIX, tenha também sido aproveitada para a lavagem de lãs, o que é atestado pelo topónimo da pequena ribeira a jusante (ribeira dos Pisões). Tal já não acontece com as barragens de Monte Branco e Penedos cuja finalidade prin- cipal foi armazenar água para o accionamento de moinhos de cereais, insta- lados em edificios justapostos nos paramentos de jusante das barragens. Na primeira barragem, o efeito de contraforte proporcionado pelas paredes do edificio, normais à barragem, parece ter ainda muito contribuído para a estabi- lidade da estrutura. A água retida por esta barragem terá também garantido o 136 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Proressor, Engenheiro e Invesng,ldor )nvestigador sustento do gado da Tapada Real de Vila Viçosa, e o regadio, a partir do final do século XIX, [199] Quintela et aI., 1989. Na barragem de Penedos verificou-se que, a partir de determinada época, houve também o objectivo de provocar o enateiramento, que era conseguido do se- guinte modo: no paramento de jusante nota-se uma pequena descarga de fundo que, a montante, apresenta um poço vertical, equipado até há poucos anos com uma comporta, que era fechada no Inverno e aberta no início da Primavera, para provocar a referida retenção de sedimentos finos, [1 99] Quintela et aI., 1 989. No que respeita a barragem de Jungeis, construída para a concessionária das minas de carvão de Santa Suzana, destinou-se, de início, a represar água para a lavagem de carvão, tendo sido também utilizada, após o encerramento da mina (1944), para a rega de arrozais, [183] Quintela et aI. , 2004. 4.5 - O Aqueduto da Água da Prata A equipa constituída por António Quintela, José Manuel de Mascarenhas, Maria da Conceição Rebola, Panagiotis Sarantopoulos e Maria Filomena Monteiro, coordenada pelos dois primeiros investigadores, realizou um estudo sobre o Aqueduto da Água da Prata e o abastecimento de água a Évora que foi apre- sentado no quadro do 7° SILUSBA - 7" Simpósio Internacional de Hidráulica e Recursos Hídricos dos Países de Língua Oficial Portuguesa, que teve lugar em Évora, entre 30 de Maio e 2 de Junho de 2005, [184] Quintela et aI., 2005. Os autores daquele estudo, após terem abordado a questão da origem romana do aqueduto e analisado os problemas da carência de água em Évora, antes da sua construção, realçaram as características técnicas e arquitectónicas do aque- duto do século XVI, a rede de distribuição de água e os seus regimentos. As várias reconstruções do aqueduto, em particular as que foram realizadas de 1873 a 1879, sob a direcção de António Matos Cabral e Caetano Câmara Manuel, e as do período de 1928 a 1933, em que se realçaram os projectos e realizações de Viriato Castro Cabrita, foram também objecto de reconhecimento e análise. > À esquerda: Aqueduto da Água da Prata. Torre encimando a caixa de decantação e de visita da Quinta de S. José. À direita: Aqueduto da Água da Prata. Vista aérea. Entrada do Aqueduto na malha urbana de Évora. 137 o AaUEDUTO DA ÁGUA DA PRATA E o ABASTECIMENTO DE ÁGUAA ÉVORA Capa do opúsculo relativo ao Aqueduto da Água da Prata [184] Quintela et aI., 2005. Algumas das captações de água subterrânea para alimentação do aqueduto, ao longo da primeira metade do século XX, foram identicamente reconhecidas e analisadas. A aludida equipa procedeu ainda a reconhecimentos no terreno sobre as con- dições de captação e de adução das águas e sobre os melhoramentos efectuados nas épocas atrás referidas. Foram analisadas as diferenças tipológicas dos vários trechos do aqueduto, em particular no que se refere às caixas de visita e lim- peza, e às técnicas construtivas. Os autores reconheceram também a existência do recurso, ao longo de algumas das captações construídas por Castro Cabrita, à recarga artificial dos aquíferos através de pequenos açudes de retenção, técnica, ao que se julga, pela primeira vez utilizada em Portugal. Os principais resultados dos estudos supra-citados foram publicados no opúsculo [184] Quintela et a1., 2005. 4.6 - Instalações hidráulicas antigas António Quintela procedeu ao reconhecimento em Portugal de numerosos engenhos hidráulicos, de diferentes tipos, e também a ampla investigação bibliográfica sobre as características desses engenhos e as épocas e amplitudes da respectiva difusão no País. Apresentou os resultados dessa investigação nas duas primeiras]ornadas de Molinologia em Espanha, [201] Quintela, 1995, e [204] Quintela, 1998. Nessas publicações, deu ênfase aos engenhos hidráu- licos destinados à moagem de cereais - moinhos, de roda horizontal, e azenhas, de roda vertical - à serração de madeira, ao apisoamento de tecidos, em pisões, ao esmagamentode azeitona e à trituração e mistura dos ingre- dientes da pólvora. Caracterizou sinteticamente a constituição desses engenhos e os principais aspectos de construção e funcionamento. Neste particular, acentuou a grande simplicidade - mesmo rusticidade - de alguns tipos de moinhos hidráulicos, em especial daqueles que não dispunham de cubo nem de seteira, e em que a água era acelerada ao longo de uma caleira (cale) forte- mente descendente, antes de incidir sobre a roda. Salientou ainda que o nú- mero de moinhos hidráulicos e azenhas existentes em Portugal (incluindo o território insular), em 1962, era, aproximadamente, 30 000, excedendo lar- gamente o de moinhos de vento (cerca 2 000). António Quintela acentuou ainda a importância que os moinhos funcionando à maré, alimentados por caldeiras que enchiam durante a preia-mar, assumiram ao longo da costa portuguesa e, em especial. no estuário do Tejo: existiam, no século XVI, nas seis léguas de Aldeia Galega ao Montijo, cerca de 60 moendas, accionadas por água proveniente de caldeiras que enchiam durante a preia-mar. Tais moendas destinavam-se a responder às necessidades de farinha, de Lisboa e do complexo fabril do Vale do Zebro, onde se produzia o biscoito destinado às armadas. Alguns destes moinhos estão recuperados com fim museológico. António Quintela descreve um dos moinhos de rodete, existentes no Alentejo, cujas rodas hidráulicas têm configuração análoga à das actuais turbinas Francis. 138 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenheiro e Investigador . Jnvestigador Menciona que, como reconhecido em 1993, tais moinhos foram precurso- ramente introduzidos pelos Romanos na Tunísia, em Chemtou e em Tichilla, próximo de Testou. Descreveu também os moinhos de rodete, de palas em cruz, instalados em reser- vatórios cilíndricos (domas), que reconheceu no trecho de jusante do rio Âncora. Reconheceu que os moinhos de rodete dos dois tipos mencionados têm a particularidade de poder funcionar com as rodas afogadas por jusante, embora com mais baixa velocidade de rotação. António Quintela salienta também a decisão do Infante D. Henrique de fomen- tar a construção, na Ilha da Madeira, de engenhos hidráulicos de serração de madeira (serras de água - topónimo ainda hoje utilizado) destinados a fabricar embalagens de madeira para exportar o açúcar, [201 J Quintela, 1995. Essa decisão reveste-se de carácter pioneiro, se se atender a que a difusão de tais engenhos na Europa era ainda escassa no século XIV Segundo o mesmo trabalho, o pisão hidráulico teria expressão no Baixo Mondego no século XIII e estaria generalizado em Portugal no século XVI. A larga difusão dos pisões é atestada pela frequente presença, ainda na actualidade, do topóni- mo pisão, notando-se que, no Dicionário Corográfico de Américo Costa (1947), tal topónimo é assinalado 220 vezes. António Quintela procedeu, em conjunto com os autores do presente sub capítulo e com o Engenheiro]. Timóteo Monteiro, [17 7J CEHIDRO/EDP, 1993, ao reco- nhecimento de engenhos e estruturas hidráulicas, de tecnologias tradicionais no rio Lima, na área que veio a ser submersa pela albufeira da barragem de Touvedo. Nos afluentes do rio Lima, no trecho estudado, foram reconhecidos açudes para, por meio de levadas, derivar água para rega, para o accionamento 139 À e'querda: Moinho submersível do rio Guadiana. À direita: Moinho de rodete, de palas em cruz, instalado num reservatório cilíndrico (doma). < v 1. Comporia 1. Caixa,,; lúbica ... 3. Ei,o 4. Caleira 5. Tanque de engenhos de moagem de cereais e de serração de madeira e para um lagar de azeite. No trecho abrangido pela albufeira do Touvedo, foram ainda inventariadas 23 estruturas que incluem açudes (ou grupos de açudes) com traçado em planta em ziguezague (ou em labirinto), que não são frequentes em Portugal, a não ser no rio Cávado (embora em número muito inferior). Tais açudes ofereciam um belo efeito paisagístico. Nos vértices dos labirintos desses açudes, voltados para montante, eram colocados aparelhos (nassas) para captura de lampreias; estas eram atraídas pelo aumento progressivo da velocidade da água no sentido das nassas. Nesse trabalho, [1 77] CEHIDRO/EDP, 1993, foi também descrito um engenho hidráulico de especial interesse, albergado numa câmara aboba- dada, de alvenaria, e destinado à captura automática de lampreias, que eram armazenadas num pequeno tanque no interior da câmara. ( 140 < A Em cima: Açude pesqueiro do rio Lima (vista de montante para jusante) . À esquerda: Câmara para captura de lampreias. ANTÓNIO DE CARVALHO QyINTELA pイッヲ」セウッイL@ Engenheiro e Investigador Investigador A equipa constituída por António Quintela, José Manuel de Mascarenhas, João Luís Cardoso, Maria Teresa Álvares e Telmo Pina procedeu à divulgação de numerosos engenhos hidráulicos na bacia do rio Sado, em que se incluía o então único engenho hidráulico reconhecido para descasque de arroz: o de Arez, accionado por uma roda hidráulica vertical, [183J Quintela et 01.,2004. Só muito recentemente, o segundo autor do presente capítulo teve conheci- mento da existência dum engenho deste tipo noutra região do território por- tuguês (Alcobertas, Rio Maior), pensando-se, todavia, que é muito limitada a sua ocorrência. o reconhecimento efectuado não se limitou aos engenhos hidráulicos, tendo incidido também sobre outras estruturas do património hidráulico. António Quintela integrou a Comissão Científica responsável pela organização do Simpósio Internacional Hidráulica Monástica Medieval e Moderna que teve lugar no Convento da Arrábida, entre IS e 17 de Novembro de 1993, promovido pela Fundação Oriente. No decurso desse evento, apresentou, não só a conferência inaugural, que versou sobre as obras hidráulicas e a utilização da água em Portugal anterior- mente ao século XVIII, [202J Quintela, 1996, como também uma comuni- cação relativa a um estudo dos sistemas hidráulicos do Convento da Arrábida, [203J Quintela et a!., 1996, executado por uma equipa constituída por si, pelos autores deste sub capítulo e pela Engenheira Maria Helena Abecasis; deu-se particular atenção à análise dos processos de captação utilizados. 4.7 - A Fábrica da Pólvora de Barcarena e os seus sistemas hidráulicos Em finais de 1994, a Câmara Municipal de Oeiras dava os primeiros passos no ambicioso plano de recuperação patrimonial e ambiental do vasto recinto da Fábrica da Pólvora de Barcarena, que havia adquirido recentemente. Na qualidade de Coordenador do Centro de Estudos Arqueológicos do Concelho de Oeiras (Câmara Municipal de Oeiras), o primeiro autor deste sub capítulo deslocou-se ali um dia, na companhia dos técnicos encarregues do reordena- mento de parte daquele espaço, para averiguar o seu potencial interesse arqueo- lógico. Contudo, o motivo da deslocação foi secundarizado, face à importância patrimonial, desde logo reconhecida, de um edificio, situado à entrada do antigo recinto fabril, então em estado de degradante abandono. Tratava-se, como mais tarde se veio a verificar, da fábrica para a produção de pólvora, concebida por Leonardo Turriano, em 1618/1619 e, depois de caída em abandono, re-inaugu- rada no dia 8 de Dezembro de 1729, após o holandês António Cremer ter ganho o concurso de arrematação para o fabrico da pólvora, instalando novos engenhos de galgas, movidos a energia hídrica, fornecida pela ribeira de Barcarena. Abria-se, assim, um novo capítulo da actividade da equipa dirigida por António Quintela: a da investigação histórica e documental relacionada com a impor- tante actividade económica desenvolvida desde o século XV até quase o final do século XX pela Fábrica da Pólvora de Barcarena. Tal investigação articulava-se, 141 por um lado, com a caracterização técnica dos engenhos destinados àquela finalidade e, por outro, com as soluções hidráulicas encontradas para a produçãoda energia indispensável à laboração. Acolhida favoravelmente, logo no início de 1995, pela Câmara Municipal de Oeiras, sendo seu Presidente o Dr. Isaltino Afonso Morais, a proposta apresentada para que tal estudo fosse levado a cabo, rapidamente a equipa pôs mãos à obra. Com a colaboração da Dra . Maria da Conceição André, conseguiu, no curto período de cinco meses, entregar para publicação o primeiro estudo realizado sobre aquele antigo complexo tecnológico-militar, intitulado A Fábrica da Pólvora de Barcarena e os seus sistemas hidráulicos, [17 8J Quintela et a!., 1995, o qual foi apresentado publi- camente no próprio local, no dia do Município de Oeiras (7 de Junho), na presença do Senhor Ministro do Plano e da Administração do Território, Professor Valente de Oliveira e da Senhora Secretária de Estado, Dr.' Isabel Mota. Estava, assim, demonstrada a importância patrimonial da "Fábrica de Baixo", assim designada para a diferenciar de outra, situada mais a montante e ainda por estudar e recuperar. Tendo presente o interesse dos resultados obtidos, recomendou-se, no termo do referido livro, que se criasse um espaço museológico específico, no qual se reunissem "utensílios de fabrico e de ensaio, modelos reduzidos de engenhos, documentos, incluindo reprodução de plantas antigas e de fotografias", sem esquecer a "reconstituição de, pelo menos, um engenho de moagem, mistura e encasque da pólvora ( ... )". Tais objec- tivos conduziram os autores a apresentarem um programa de trabalhos para a " criação, na "Fábrica de Baixo", de um Museu da Pólvora Negra, o qual foi セ@ . aprovado pela Câmara Municipal de Oeiras. Tal programa museológico, coordenado pelo Professor António Quintela, contou com a colaboração dos Capa do livro A Fábrica da Pólvora de Barcarena e os seus sistemas hidráulicos, [1 78J Quintela et 01., 1 995. autores deste sub capítulo e com o apoio técnico do Gabinete URBAN, da Autarquia e, até determinada altura, teve a participação do Arquitecto Mário Varela Gomes. No que à componente social dizia respeito, beneficiou-se do contributo de duas investigadoras nessa área: a Arquitecta Isabel Simões Raposo e a Dra Rita Sá Marques. Depois de se ter realizado um levantamento do espólio que importava obter, procedeu-se à proposta da respectiva aquisição ou cedência, reunindo-se assim um importante acervo, constituído por muitos elementos únicos que, de outra forma, se perderiam ou se manteriam em mãos de particulares. Tais exemplares, vieram a juntar-se a preciosa documentação sobre esta unidade fabril (fotografias antigas, processos individuais dos operários, livro de ordens, etc.) que se recolheu, nalguns casos, literalmente do lixo, após a retirada do antigo locatário, o INDEP (Indústrias e Participações de Defesa, S.A.). Com idêntica finalidade, os autores procederam também à localização e obtiveram a cedência de outro espólio, pertencente a diversas entidades, como uma bomba manual de água do antigo corpo privativo de bombeiros da fábrica, cedida pelos Bombeiros Voluntários de Barcarena e, entre outras peças de assinalável valor, duas grandes tinas de bronze para refinação do salitre e dois morteiros-provete, com os respectivos globos, cedidos pelo INDEP Todos estes exemplares encontram-se actualmente expostos no Museu da Pólvora Negra, cujo projecto de concepção dos espaços expositivos e dos equipamentos museológicos, a começar pela definição dos critérios de recupe- 142 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professor, Engenheiro c Investigador _Jnvestigador ração e de valorização do imóvel coube igualmente à equipa, naturalmente em cooperação com os responsáveis municipais. Bastaria recordar a minúcia do projecto de execução do engenho de galgas, depois construído à escala natural, o qual requereu acompanhamento constante, e se encontra actualmente instalado em urna das quatro salas do Museu, para se aquilatar do esforço e do rigor dispensados pela equipa a este projecto, a cuja inauguração, no dia 17 de Junho de 1998, presidiu o Senhor Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio. Integrado actualmente na Rede Portuguesa de Museus, o Museu da Pólvora Negra constitui sem dúvida uma das mais relevantes unidades museológicas temáticas da área de Lisboa. - - - r-..J ALÇADO LATtóRAL Depois da entrada em funcionamento do Museu, continuou a equipa a investigar o notável manancial de informação ainda por estudar e dar a conhe- cer, relacionado com a antiga Fábrica da Pólvora de Barcarena; assim, a síntese dos trabalhos realizados até 1999 encontra-se apresentada na obra A Fábrica da 143 < "- À esquerda: Fábrica da Pólvora de Barcarena. Projecto do engenho de galgas. Alçado lateral. À dire i la, em cima : Fábrica da Pólvora de Barcarena. Reconstrução, à escala natural, do engenho de galgas. À direita, em baixo: Inauguração, a 1 7 de Junho de 1998, do Museu da Pólvora Negra, com sua Excelência o Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, e o Presidente da Câmara, Dr. Isaltino de Morais. Capa do li vro A Fábrica da Pólvora de Barcarena. Catálogo do Museu da Pólvora Negra, [1 79] Quintela et aI., 2000. Pólvora de Barcarena. Catálogo do Museu da Pólvora Negra, [179J Quintela et 01., 2000, repositório documental e iconográfico que bem evidencia a importância daquele espaço musealisado; a convite da direcção da revista Arqueologia & Indústria, publicou-se outro contributo, com idênticas características, traçando os principais momentos evolutivos conhecidos pelo complexo fabril ao longo da sua existência, entre os séculos XVI e XX, [196J Quintela et 01., 199912000. A informação entretanto recolhida deu lugar à publicação de capítulo do livro Gunpowder, Explosives and the State. A Technological History, [184 J Quintela et a1., 2006, publicado em Inglaterra e nos Estados Unidos, e que constitui síntese, à escala mundial, da importância para a vida e economia dos Estados, do fabrico e uso da pólvora. No contexto descrito, bem se pode dizer que o Museu da Pólvora Negra constitui, pela mão de António Quintela e dos seus colaboradores, que o conceberam e lhe deram vida, continuando depois a desvendar o seu notável passado histórico, o legado mais visível e marcante do labor que o ilustre Professor tem dedicado ao estudo da tecnologia hidráulica antiga em Portugal. 144 ANTÓNIO DE CARVALHO QYINTELA Professo\", EngenheIro c Investigador Digitalizar0001 Digitalizar0002 Digitalizar0003 Digitalizar0004 Digitalizar0005 Digitalizar0006 Digitalizar0007 Digitalizar0008 Digitalizar0009 Digitalizar0010 Digitalizar0011 Digitalizar0012 Digitalizar0013 Digitalizar0014 Digitalizar0015 Digitalizar0016 Digitalizar0017 Digitalizar0018 Digitalizar0019 Digitalizar0020 Digitalizar0021 Digitalizar0022 Digitalizar0023 Digitalizar0024