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TCC-DANIEL-SANTOS-RODRIGUES-A-NATUREZA-JURIDICA-DA-MULTIPROPRIEDADE-VERSAO-FINAL


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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA 
DANIEL SANTOS RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A NATUREZA JURÍDICA DA MULTIPROPRIEDADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Florianópolis, SC 
2021 
 
DANIEL SANTOS RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A NATUREZA JURÍDICA DA MULTIPROPRIEDADE 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado 
ao Curso de Graduação em Direito, da 
Universidade do Sul de Santa Catarina, como 
requisito parcial para obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
 
 
 
Orientador: Professora Deisi Cristini Schveizer, Msc. 
 
 
 
Florianópolis, SC 
 
2021 
 
DANIEL SANTOS RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A NATUREZA JURÍDICA DA MULTIPROPRIEDADE 
 
 
 
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi 
julgado adequado à obtenção do título de 
Bacharel em Direito e aprovado em sua forma 
final pelo Curso de Graduação em Direito, da 
Universidade do Sul de Santa Catarina. 
 
 
 
Florianópolis, 14 de junho de 2021. 
 
______________________________________________________ 
Professora Deisi Cristini Schveizer, Msc 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
______________________________________________________ 
Professora Patrícia Fontanella, Dra. 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
______________________________________________________ 
Professora Luciana Faísca Nahas, Dra. 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
 
 
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE 
 
 
 
 
 
A NATUREZA JURÍDICA DA MULTIPROPRIEDADE 
 
 
 
 
 
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte 
ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de 
Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de 
todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso. 
Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso 
de plágio comprovado do trabalho monográfico. 
 
 
 
Florianópolis, 14 de junho de 2021. 
 
 
 
 
 
 
____________________________________ 
DANIEL SANTOS RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À minha esposa Fernanda, por seu amor 
incondicional e companheirismo, que me 
alimentou durante todo o trilhar deste caminho. 
 
AGRADECIMENTOS 
À minha família amada, em especial, minha esposa Fernanda e meus filhos Fernando e 
Violetta, por todo apoio recebido e pela compreensão com relação aos momentos em que 
precisei me ausentar para me dedicar à conclusão deste curso. 
À minha orientadora Deisi Cristini Schveizer pela generosidade, paciência e por todos 
os ensinamentos transmitidos durante a graduação e desenvolvimento deste trabalho. 
Ao corpo docente da UNISUL que cumpriu de forma exemplar com sua missão de 
transmitir conhecimento e de fazer apaixonar-me pelo Direito. 
À UNISUL, enquanto instituição de ensino de excelência, por todas as oportunidades 
de aprendizado e de desenvolvimento disponibilizadas ao seu aluno que contribuem para que 
este se torne de fato um cidadão. 
A todos aqueles que de forma direta ou indireta contribuíram para que fosse possível a 
conclusão deste curso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Visto que o fundamento da propriedade é a utilidade, onde não houver utilidade 
possível não pode existir propriedade.” (Jean Jacques Rousseau). 
 
RESUMO 
O presente trabalho consiste em verificar a natureza jurídica do instituto da multipropriedade 
no ordenamento jurídico brasileiro. Para isso, na elaboração da pesquisa, utiliza-se o método de 
abordagem dedutivo, com método de procedimento monográfico e a técnica de pesquisa 
bibliográfica e documental, com intuito de abordar os aspectos inerentes ao tema por meio da 
extração e interpretação do entendimento da doutrina pátria e estrangeira da área correlata. São 
tratados assuntos como a teoria geral dos direitos reais e obrigacionais, seus principais 
conceitos, elementos, características e traços distintivos. Também é abordado o direito real de 
propriedade, seus conceitos, características, função social e o instituto do condomínio e suas 
espécies. Além disso, o trabalho discorre sobre o instituto da multipropriedade no ordenamento 
jurídico brasileiro, contemplando sua origem, evolução e denominação adotada no Brasil. 
Expõe-se os principais conceitos doutrinários, características e espécies do instituto. Apresenta-
se também os contornos e soluções que foram adotadas para a inserção e operacionalização da 
multipropriedade no ordenamento jurídico de países considerados referências pela doutrina 
especializada. Por fim, o trabalho apresenta os entendimentos doutrinários, jurisprudenciais e 
legais relacionados à discussão da natureza jurídica do instituto, que amadureceram, 
especialmente, após a promulgação da Lei nº 13.777, de 20 dezembro de 2018, norma esta que 
contribuiu sobremaneira para a consolidação da multipropriedade no Brasil. Verificou-se que, 
no ordenamento jurídico brasileiro, a natureza jurídica da multipropriedade para bens imóveis 
é legalmente definida como de direito real, implementada sob regime de condomínio espaço-
temporal. No tocante à multipropriedade de bens móveis, a natureza jurídica afigura-se como 
direito obrigacional, diante da impossibilidade de aplicação por analogia da Lei nº 13.777, de 
20 de dezembro de 2018 e da inexistência de previsão legal específica. 
 
Palavras-chave: Propriedade. Natureza Jurídica. Multipropriedade. 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 9 
2 DIREITOS PATRIMONIAIS REAIS E PESSOAIS .................................................... 11 
2.1 DIREITOS REAIS ........................................................................................................... 12 
2.1.1 Noções introdutórias, conceitos e elementos ............................................................. 13 
2.1.2 Características ............................................................................................................. 16 
2.1.3 Classificação ................................................................................................................. 20 
2.2 DIREITOS PESSOAIS .................................................................................................... 22 
2.3 DISTINÇÃO ENTRE DIREITOS REAIS E DIREITOS PESSOAIS ............................ 25 
3 O DIREITO DE PROPRIEDADE E O INSTITUTO DO CONDOMÍNIO ............... 30 
3.1 CONCEITOS E ELEMENTOS DA PROPRIEDADE .................................................... 30 
3.2 CARACTERÍSTICAS ..................................................................................................... 35 
3.3 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE ...................................................................... 37 
3.4 O INSTITUTO DO CONDOMÍNIO ............................................................................... 40 
4 A MULTIPROPRIEDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ...... 48 
4.1 CONTEXTUALIZAÇÃO ................................................................................................ 48 
4.2 HISTÓRICO, EVOLUÇÃO E DENOMINAÇÃO .......................................................... 50 
4.3 CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E ESPÉCIES ........................................................ 52 
4.4 CONTORNOS DA MULTIPROPRIEDADE NO DIREITO ESTRANGEIRO ............. 55 
4.5 A NATUREZA JURÍDICA DA MULTIPROPRIEDADE ............................................. 60 
5 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 67 
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 69 
 
 91 INTRODUÇÃO 
O presente trabalho monográfico, requisito parcial para a conclusão do curso de 
Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), tem por objetivo a verificação da 
natureza jurídica do instituto da multipropriedade no ordenamento jurídico brasileiro, diante da 
constatação da existência de um complexo debate realizado pela doutrina e jurisprudência desde 
que o instituto foi introduzido pelos setores de turismo, hotelaria e imobiliário no Brasil. 
Constata-se que a multipropriedade ou time-sharing, compartilhamento no tempo 
da propriedade de um determinado bem, é um instituto consolidado no exterior que vem 
ganhando cada vez mais espaço no Brasil, demonstrando-se um tema atual. Com o 
desenvolvimento do mercado turístico e imobiliário na última década, vários empreendimentos 
ofertaram este tipo de modelo de negócios que consiste no compartilhamento da propriedade 
de um determinado bem entre vários proprietários a ser usufruído por determinada fração de 
tempo, por cada um deles, de maneira alternada e exclusiva. 
Neste sentido, a importância do tema versa sobre a divergência doutrinária acerca 
da definição da natureza jurídica da multipropriedade, considerando que, tanto a doutrina 
quanto a jurisprudência debatem se o instituto se trata de direito real ou de direito obrigacional. 
Neste diapasão, tal definição resulta em determinadas consequências jurídicas distintas como, 
por exemplo, a possibilidade daqueles titulares de um direito real, que tenham seus direitos 
ofendidos, de utilizar instrumentos jurídicos específicos protetivos destes direitos, como, por 
exemplo, ação reivindicatória no caso de direto real, ou a penhora de um bem, por 
descumprimento de uma prestação, no caso de direito obrigacional. 
Desta forma, neste trabalho, pretende-se responder à seguinte pergunta: qual é a 
natureza jurídica da multipropriedade? 
Por meio da pesquisa exploratória, pretende-se alcançar uma proximidade com os 
conceitos e nuances que permeiam o instituto da multipropriedade no ordenamento jurídico, 
jurisprudência e doutrina. Através do método de abordagem dedutiva, a pesquisa tem como 
ponto de partida a teoria geral dos direitos reais e obrigacionais, passando pelo direito de 
propriedade e o instituto do condomínio, para então, finalmente, definir a natureza jurídica da 
multipropriedade. 
Em relação aos procedimentos técnicos a serem adotados por esta pesquisa, 
entende-se que a melhor forma de buscar o devido aprofundamento no tema será a realização 
de pesquisa bibliográfica fundamentadas em livros e artigos científicos recentes relacionados 
ao tema. Embora haja poucos livros dedicados exclusivamente ao tema, constata-se que existe 
 10 
um relativo interesse da comunidade científica, verificado pelo aumento quantidade de artigos 
publicados recentemente, impulsionados claramente pela edição da recente lei da 
multipropriedade imobiliária. 
A pesquisa fará uso do método monográfico. Por meio deste método, o tema 
multipropriedade e sua natureza jurídica poderá ser investigado e discutido não apenas com a 
profundidade necessária, mas também observando e avaliando as várias perspectivas existentes 
do assunto, visando contribuir para a formação de uma visão mais sistematizada da 
multipropriedade e de sua natureza jurídica. 
Assim, este trabalho está organizado em cinco capítulos, sendo os assuntos 
distribuídos da maneira discriminada a seguir. 
O primeiro capítulo trata-se desta introdução e tem por objetivo a contextualização 
do tema a ser analisado, o objetivo, o método utilizado e a estrutura adotada pelo trabalho. 
O segundo capítulo tratará da teoria geral dos direitos reais e direitos obrigacionais, 
abrangendo seus conceitos, características e elementos. Além disso, abordará a distinção entre 
esses dois ramos do direito, por meio da comparação de suas principais características. 
No terceiro capítulo será contemplado o direito real de propriedade, seus conceitos, 
características, sua função social, além de apresentar o instituto do condomínio e suas espécies. 
O quarto capítulo versará sobre o instituto da multipropriedade no ordenamento 
jurídico brasileiro, contemplando a origem, evolução e denominação dada ao instituto no Brasil 
e no exterior. Além disso, cuida-se da apresentação dos principais conceitos doutrinários, 
características e espécies do instituto. Na sequência, reconhecendo-se que se trata de um 
fenômeno mundial, pretende-se apresentar os contornos e soluções adotadas para a introdução 
do instituto da multipropriedade no sistema jurídico de alguns países considerados como 
referências pela doutrina especializada. Por fim, apresentará os entendimentos doutrinários, 
jurisprudenciais e legais relacionados à multipropriedade no Brasil e no exterior, não perdendo 
de vista o fato de que estes entendimentos evoluíram e amadureceram de forma relevante após 
a edição da Lei nº 13.777, de 20 dezembro de 2018, norma esta que contribuiu de maneira 
relevante para a consolidação da multipropriedade no Brasil. 
Finalmente, o último capítulo deste trabalho, consiste em apresentar as conclusões 
aferidas pelo pesquisador na elaboração do trabalho. 
Desta maneira, o objetivo desta pesquisa consiste em verificar a natureza jurídica 
do instituto da multipropriedade no direito brasileiro. 
 
 11 
2 DIREITOS PATRIMONIAIS REAIS E PESSOAIS 
Atualmente, predomina o entendimento de que não existe sociedade sem direito - 
ubi societas ibi jus: da natureza do agrupamento social depende a natureza do direito, que o 
reflete e o rege. A sociedade depende de uma ordem jurídica, estando ela destinada à satisfação 
das suas necessidades, dirimir possíveis conflitos de interesses, assegurar a sua continuidade e 
atingir as suas metas e a garantia da paz social1. A ordem jurídica busca harmonizar as relações 
sociais intersubjetivas, maximizando os valores humanos com o mínimo de sacrifício por meio 
da observância de critérios como o do justo e do equitativo, conforme a cultura e costumes de 
um tempo e de um lugar. Sem o direito, “a sociedade pereceria pela violência ou pelo arbítrio 
do mais forte sobre o mais fraco.”2 
Decorrente desta necessidade, faz parte do direito o complexo de normas jurídicas 
que se destina a regular as diferentes esferas da vida social. Todas essas normas jurídicas, 
existentes em um determinado momento no país, constituem a ordem jurídica dominante e 
recebem a denominação de Direito Positivo3. 
Para Paulo Dourado de Gusmão, com o passar do tempo, com o desenvolvimento 
das relações sociais e com a especialização das relações jurídicas, houve a necessidade de o 
campo jurídico ser dividido em áreas ou subsistemas jurídicos dotados de princípios e regras 
próprias4. 
Esta organização dos subsistemas jurídicos deu origem às várias classificações que 
visam sistematizar e qualificar o seu entendimento e espectro de atuação. Uma das 
classificações mais adotadas pela doutrina pátria é a divisão do direito em dois grandes ramos: 
 
 
1 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; Teoria 
Geral do Processo. 26. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010. p. 35. 
2 DOWER, Nelson; SUZUKI, Claudio Mikio; JANDON, Carlos Eduardo; SOUZA, Luiz Roberto Carboni; 
BLASI, Renato Rubens; GABRIEL, S. Instituições de Direito Público e Privado. 15. ed. São Paulo: 
Editora Saraiva, 2017. E-book. 
3 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 28. ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2017. p. 36. 
4 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 258. 
 12 
o dos direitos não patrimoniais, concernentes às pessoas, como os direitos da personalidade5 e 
os de família6, e dos direitos patrimoniais7, que, por sua vez, se dividem em reais e pessoais8. 
A classificação dos direitos patrimoniais em direitos reais e direitos pessoais pode 
ser verificada na Lei nº10.406 de 10 de janeiro de 2002, que instituiu o Código Civil Brasileiro. 
Neste diploma, os direitos patrimoniais reais possuem previsão legal por meio dos artigos 1.196 
a 1.510 que compõe o Livro III - Do Direito das Coisas. Por sua vez, os direitos pessoais estão 
elencados ao longo dos livros intitulados - Do Direito das Obrigações, nos artigos 233 a 420 e 
artigos 854 a 965; Dos Contratos em Geral, nos artigos 421 a 853 e Do Direito de Empresa, nos 
artigos 966 a 1.195. Constata-se também a existência de regras específicas para os direitos 
pessoais nos livros de Direito de Família, artigos 1.511 a 1.783-A e de Direito das Sucessões, 
artigos 1.784 a 2.027 9. 
O presente capítulo objetiva estudar os principais aspectos dos direitos patrimoniais 
reais e pessoais, contemplando para isso, a exposição de seus conceitos, elementos e 
características. 
2.1 DIREITOS REAIS 
Esta seção abordará as noções introdutórias dos direitos patrimoniais reais, 
apresentando os principais conceitos, elementos e características tendo em vista o melhor 
entendimento do instituto da multipropriedade. 
 
 
5 Direitos inerentes à pessoa humana e, portanto, a ela ligados de maneira perpétua e permanente, não podendo 
mesmo conceber o indivíduo que não tenha direito à vida, à liberdade física ou intelectual, ao seu nome, ao seu 
corpo, à sua imagem e àquilo que ele crê ser sua honra. Tais direitos são inalienáveis, intransmissíveis, 
imprescritíveis e irrenunciáveis (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Parte Geral. Vol. 1. 34. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2007. p. 61). 
6 Ramo do direito civil concernente às relações entre pessoas unidas pelo matrimônio, pela união estável ou pelo 
parentesco e aos institutos complementares de direito protetivo ou assistencial, pois, embora a tutela e curatela 
não advenham de relações familiares, têm, devido à sua finalidade, conexão com o direito de família (GOMES, 
Orlando. Direito de família. 11. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1999). 
7 Os direitos patrimoniais consistem no “[...] conjunto de bens, direitos e obrigações de uma pessoa natural ou 
jurídica, sendo suscetíveis de estimação pecuniária, dividindo-se em reais e pessoais.” (DOWER, Nelson 
Godoy Bassil. Curso moderno de direito civil - v. 2. 5. ed. São Paulo: Nelpa, 2011. p. 5). 
8 GONÇALVES, Carlos Roberto; Direito Civil Brasileiro – Teoria Geral das Obrigações. 9. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2012. E-book. 
9 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
 13 
2.1.1 Noções introdutórias, conceitos e elementos 
Antes de adentrar no estudo dos direitos patrimoniais reais, se torna importante a 
abordagem do ramo do direito denominado pela doutrina de direito das coisas. Clóvis Beviláqua 
define direito das coisas como sendo o “complexo de normas reguladoras das relações jurídicas 
referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem. Tais coisas são, ordinariamente, do 
mundo físico, porque sobre elas é que é possível exercer o poder de domínio”10. Neste sentido, 
ao discutir o seu objeto, faz-se necessário traçar as devidas distinções entre os termos coisa e 
bem. 
Em relação ao conceito de coisa, os antigos greco-romanos definiram como “fatos, 
circunstâncias, acontecimentos, objetos materiais, que poderiam levar à realização de bens, 
como fins objetivos virtuosos ou valiosos. De coisas boas advinham bens; das más, não.”11 
Coelho afirma que o termo coisa é uma expressão ambígua já que pode ser usada tanto em um 
sentido amplo quanto em um sentido estrito. No sentido amplo, corresponde a tudo o que existe 
fora os sujeitos de direito, podendo ter ou não um determinado valor econômico para o ser 
humano. No sentido mais estrito, a coisa se relaciona com o conceito de bens corpóreos, dotados 
de substância física, ocupando lugar no espaço12. 
Por sua vez, o conceito de bem considera as mesmas definições adotadas pelas 
ciências econômicas, indicando uma dependência com o conceito de coisa. Neste sentido, bens 
são “[...] coisas que, por serem úteis e raras, são suscetíveis de apropriação e contém valor 
econômico”13, ou seja, apenas aquilo passível de posse exclusiva do homem e com a 
possibilidade de apreciação econômica pode ser considerado um bem. Assim, abrangem coisas 
corpóreas e incorpóreas, coisas materiais ou imponderáveis, fatos e abstenções humanas que 
podem ser tratadas como objeto de uma relação de direito14. 
Neste sentido, Clóvis Beviláqua afirma que “[...] as forças naturais, que, aliás, não 
ocupam lugar no espaço, como a eletricidade, somente entram na esfera do direito quando 
 
 
10 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Coisas. Vol. I. História do Direito Brasileiro, Vol. 3. Obra Fac-similar. 
Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2003. E-book. p. 9. 
11 LÔBO, Paulo. Direito civil. v. 4: coisas. 6. ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2021. E-book. Acesso restrito via 
Minha Biblioteca. 
12 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. Direito das Coisas – Direito Autoral. 4. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2012. E-book. 
13 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro - Direito das Coisas. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 
E-book. 
14 MONTEIRO, Washington de Barros; PINTO, Ana Cristina de B. M. F. Curso de Direito Civil. Parte Geral. 
Vol. 1. 45. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 202. 
 14 
apreendidas e submetidas à dominação do homem [...]”15. Desta forma, as coisas materiais que 
não podem ser exatamente apropriados exclusivamente pelo homem por conta de sua 
abundância ou da incapacidade de mensuração, como por exemplo, o ar para respiração, a luz 
do sol e ou a água da chuva, não podem ser considerados bens em sentido jurídico16. Francisco 
Cavalcanti Pontes de Miranda defende que, no direito, o conceito de coisa não é nem 
naturalístico e nem físico, mas sim um conceito econômico-social: “o que o espírito humano 
inventa, criando valor econômico-social, pode não ser corpóreo.”17 
Verifica-se que nem sempre é possível correlacionar tão bem as expressões bens e 
coisas, pois, algumas vezes, coisas são consideradas gêneros de bens, e em outras, ocorre 
justamente o inverso: bem é gênero, coisa, a espécie. Além disso, muitas vezes são empregados 
como sinônimos, isto é, possuem o mesmo significado e utilizados para definir o mesmo 
objeto18. A possibilidade jurídica de apropriação é essencial para que um determinado bem seja 
considerado uma coisa e, consequentemente, possa ser objeto da disciplina dos direitos reais19. 
Neste sentido, Paulo Lôbo apresenta o processo de coisificação em que 
determinados direitos ou bens passam a ser objeto da relação jurídica mencionada 
anteriormente: 
 
Há direitos que se coisificam, por necessidade do tráfico jurídico. Por exemplo, o 
usufruto de um crédito, o usufruto de ações de sociedade por ações, a hipoteca do 
direito de superfície. São passíveis de coisificação os direitos reais limitados ou os 
direitos disponíveis20. 
 
Assim, em direito das coisas emprega-se a expressão coisa no seu sentido estrito, 
isto é, bens corpóreos, sendo inaplicáveis à bens incorpóreos ou a direitos, a não ser 
expressamente que a lei admita tal aplicação, o que se pode verificar em leis esparsas como, 
por exemplo, no caso do usufruto de ações emitidas por sociedade anônimas ou da cessão 
 
 
15 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Coisas. Vol. I. História do Direito Brasileiro, Vol. 3. Obra Fac-similar. 
Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2003. E-book. p. 10. 
16 LOPES, José Reinaldo de Lima. Curso de Filosofia do Direito – o direito como prática. São Paulo: Editora 
Atlas, 2021. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
17 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. XI. Atualizado por Luiz Edson 
Fachin. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 74. 
18 MONTEIRO, Washington de Barros; PINTO, Ana Cristina de B. M. F. Curso de Direito Civil. Parte Geral. 
Vol. 1. 45. ed.São Paulo: Saraiva, 2015. p. 203. 
19 GAGLIANO, Pablo Stolzer; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de direito civil: volume único. 5. ed. 
São Paulo: Saraiva Educação, 2021. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
20 LÔBO, Paulo. Direito civil. v. 4: coisas. 6. ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2021. E-book. Acesso restrito via 
Minha Biblioteca. 
 15 
fiduciária de direitos creditórios ou mesmo no Código Civil como por exemplo, o penhor do 
título de crédito previsto no artigo 1.45121. 
Também são muito comuns as dúvidas relacionadas à utilização dos termos direito 
das coisas e direitos reais. Visando esclarecer o emprego dos termos, Flávio Tartuce compila 
de forma sintetizada as seguintes definições obtidas na doutrina pátria: o direito das coisas é o 
ramo do Direito Civil que tem como conteúdo as relações jurídicas estabelecidas entre pessoas 
e coisas determinadas ou determináveis. Em contrapartida, os Direitos Reais representam o 
conjunto de normas que regulamentam as relações de domínio existentes entre a pessoa humana 
e as coisas passíveis de apropriação22. 
Assim, enquanto o direito das coisas estuda a relação de senhoria, de poder e de 
titularidade de um determinado sujeito sobre uma certa coisa, ou seja, o direito subjetivo que 
liga um sujeito de direito às coisas das quais se apropriou, os direitos reais regulam as relações 
jurídicas estabelecidas por meio da qual o titular pode gozar, explorar ou retirar da coisa, de 
modo exclusivo e contra todos, as utilidades que ela é capaz de produzir23. 
Por isso, a noção de senhoria, indicada anteriormente, necessita de regulamentação 
jurídica para adequar a sociedade aos anseios e necessidades individuais. Como as coisas 
apropriáveis são finitas, cabe ao Estado regular sua apropriação e utilização. Relacionado com 
o conceito maior de propriedade, o direito real é o que mais recebe reflexos históricos, políticos 
e econômicos nas diversas épocas e nos diversos Estados, isto é, altera-se no espaço e no 
tempo24. 
Alguns doutrinadores divergem acerca do termo direito das coisas adotado pelo 
Código Civil de 2002 para designar o livro que aborda a posse e os direitos reais25. A maior 
crítica reside no fato de que o instituto da posse não é especificamente um direito, mas sim um 
fato socioeconômico potestativo que é juridicamente protegido26. Inclusive está em tramitação 
 
 
21 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil – Direito das Coisas – Direito Autoral. 4. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2012. E-book. 
22 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
23 MONTEIRO, Washington de Barros; MALUF, Carlos Alberto Dabus; Curso de Direito Civil: Direito das 
Coisas. Vol. 3. 39. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009. 
24 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Reais. 20. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2020. E-book. 
25 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
26 ALVES, José Carlos Moreira. Posse. 2. ed. Vol. 2. Tomo I. Rio de Janeiro: Forense, 1999. 
 16 
na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 699/2011 que altera o título do Livro III para 
“DA POSSE E DOS DIREITOS REAIS (NR)”27. 
Na lição de Orlando Gomes, os direitos reais estão ancorados em duas grandes 
teorias justificadoras: a Teoria Realista e a Teoria Personalista. Na primeira, o direito real tem 
por característica a percepção de um poder imediato da pessoa exercido sobre a coisa de maneira 
erga omnes, isto é, contra todos. Por sua vez, a teoria Personalista preceitua que os direitos 
reais também são relações entre pessoas, todavia, no que diz respeito ao polo passivo, seria este 
indeterminado, havendo neste caso, a verificação de uma obrigação passiva universal, que 
deveria respeitar o direito. Assim, a obrigação se concretizaria toda vez que alguém violasse o 
direito28. 
2.1.2 Características 
Os direitos reais apresentam características próprias que os distinguem dos direitos 
pessoais. A seguir, abordaremos essas principais características observadas pela doutrina 
jurídica, a saber: oponibilidade erga omnes, direito de sequela, publicidade, preferência, 
aderência e taxatividade. 
Característica marcante dos direitos reais, a oponibilidade erga omnes ou 
absolutismo se manifesta através do poder conferido ao titular da coisa, que, exercendo seu 
domínio sobre esta, adquire a capacidade de oponibilidade a qualquer um que o tenha lesado de 
seu direito, mesmo que inexista qualquer relação jurídica entre esses sujeitos29. Desta forma, o 
titular da coisa pode fazer uso dela da maneira que melhor lhe convier desde que respeite as 
regras estabelecidas em lei, sendo que as pessoas não poderão interferir sobre como o titular 
exerce este seu direito30. 
 
 
27 BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei PL nº699/2011. Altera o Código Civil, instituído pela Lei nº 
10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: 
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=494551. Acesso em: 16 abr. 
2021. Texto Original. 
28 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21. ed. rev. e atual. por Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012. E-
book. p. 9-10. 
29 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil – Direito das Coisas – Direito Autoral. 4 ed. São Paulo: 
Saraiva, 2012. E-book. 
30 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
 17 
A sequela e a publicidade são características dos direitos reais decorrentes da 
oponibilidade erga omnes e que auxiliam na concretização do seu exercício31. Através do direito 
de sequela, o titular do direito real tem o direito de seguir a coisa em poder de todo e qualquer 
detentor ou possuidor da coisa, não importando quem seja este. Orlando Gomes diz que “[...] 
para significá-lo, em toda a sua intensidade, diz-se que o direito real adere à coisa como a lepra 
ao corpo (uti lepra cuti). Não importam usurpações; acompanhará sempre a coisa.”32 Em 
relação à publicidade, tal característica é necessária para dar conhecimento a terceiros de quem 
se trata o titular da coisa33. Tendo em vista essa característica, os direitos reais sobre bens 
imóveis só se adquirem mediante registro junto ao cartório de imóveis34. Por sua vez, os direitos 
reais que recaem sobre bens móveis, a aquisição se dá apenas mediante a tradição35. 
Maria Helena Diniz leciona que a preferência é característica restrita dos direitos 
reais de garantia como o penhor e a hipoteca consistindo no privilégio de obter o pagamento de 
uma dívida com o valor de bem aplicado exclusivamente à sua satisfação. A responsabilidade 
da obrigação recai sobre o bem do patrimônio devedor após a constituição do direito real de 
garantia que em caso de inadimplemento, poderá o credor exercer seu direito de se satisfazer 
sobre o valor desse bem, tendo preferência sobre outros credores que tenham apenas direito 
pessoal contra o devedor ou mesmo direito real constituído posteriormente36. 
Uma outra característica marcante dos direitos reais diz respeito à aderência à coisa 
a que se refere. De acordo com Fábio Ulhoa Coelho, esse direito afeta o bem no sentido de 
ligar-se a ele e não ao sujeito que o titula. Em outras palavras, o direito continua existindo 
mesmo que mude o seu titular. Tomando-se como exemplo o direito real de servidão, verifica-
se que qualquer que seja o dono do prédio dominante, ele pode valer-se da servidão instituída 
sobre o serviente37. 
 
 
31 SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Direito Imobiliário. Teoria e Prática. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 
2020. E-book. 
32 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21. ed. rev. e atual. por Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012. E-
book. p. 20. 
33 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro - Direito das Coisas. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 
E-book. 
34 Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidospor atos entre vivos, só se adquirem 
com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos 
expressos neste Código (BRASIL, 2002). 
35 Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, 
só se adquirem com a tradição (BRASIL, 2002). 
36 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. Vol. 4. 28. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2014. p. 36. 
37 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil: Direitos das Coisas / Direito Autoral. 4. ed. São Paulo: 
Editora Saraiva, 2012. E-book. 
 18 
Por fim, observa-se que a taxatividade (numerus clausus) é também outra 
característica importante dos direitos reais. De acordo com Paulo Lôbo, a enumeração taxativa 
dos direitos reais é da tradição do direito moderno. No direito antigo, ao contrário, vigorava o 
numerus apertus, que incluía a superposição de direitos sobre a mesma coisa e o que hoje se 
denomina obrigações positivas propter rem38. Na lição de Francisco Cavalcanti Pontes de 
Miranda, o número é fechado, clauso, porque não se podem criar, sem lei, outros direitos reais39. 
 Os direitos reais atualmente estão relacionados no artigo 1.225 do Código Civil de 
2002: 
 
Art. 1.225. São direitos reais: 
I – a propriedade; 
II – a superfície; 
III – as servidões; 
IV – o usufruto; 
V – o uso; 
VI – a habitação; 
VII – o direito do promitente comprador do imóvel; 
VIII – o penhor; 
IX – a hipoteca; 
X – a anticrese; 
XI – a concessão de uso especial para fins de moradia; (Incluído pela Lei 11.481/2007) 
XII – a concessão de direito real de uso; (Incluído pela Lei 11.481/2007) e 
XIII – a laje. (Incluído pela Lei 13.465/2017)40 
 
 
O Código Civil de 2002 excluiu do rol dos direitos reais a enfiteuse e as rendas 
expressamente constituídas sobre imóveis, previstas anteriormente pelo Código de 1916, e 
incluiu o direito de superfície e o direito do promitente comprador do imóvel41. A Lei nº 11.481, 
de 15 de junho de 2007 acrescentou ao rol do artigo 1.225 do Código Civil a concessão de uso 
especial para fins de moradia e a concessão de direito real de uso42. Por fim, o último direito 
 
 
38 LÔBO, Paulo. Direito civil. v. 4: coisas. 6. ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2021. E-book. Acesso restrito via 
Minha Biblioteca. 
39MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. XI. Atualizado por Luiz Edson 
Fachin. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. 
40 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. 
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071impressao.htm. Acesso em: 19 mar. 2021. 
41 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro - Direito das Coisas. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 
E-book. 
42 MATHIAS, Maria Ligia Coelho; DANELUZZI, Maria Helena M. B. Considerações sobre a Lei Nº 11.481/07 
Concessão de Uso Especial para Fins de Moradia e Concessão de Direito Real de Uso. Revista Justitia, São 
Paulo. v. 64. n. 197. p. 193-197. jul./dez. 2007. Disponível em: 
https://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/25936. Acesso em: 19 mar. 2021. 
 19 
real adicionado a este rol foi o direito de laje introduzido por intermédio da Lei nº 13.465 de 11 
de julho de 201743. 
Na doutrina atual, a taxatividade tem sido alvo de debates por parte de alguns 
autores que têm apresentado contrapontos e limitações a esta característica. 
De acordo com Gustavo Tepedino, “[...] o sistema de numerus clausus constitui-se 
em orientação afeta à política legislativa, não se configurando um elemento ontologicamente 
vinculado à teoria dos direitos reais.”44 Por sua vez, Paulo Lôbo indica que modernamente, o 
numerus clausus dos direitos reais não é privilégio de qualquer lei específica, inclusive do 
Código Civil de 2002, podendo outras leis instituírem novos direitos reais. Verifica-se, por 
exemplo, que o Código Civil de 1916 fez enumeração dos direitos reais, mas, todavia, permitiu 
que outros direitos fossem criados em leis esparsas como foi o caso do direito do promitente 
comprador de imóvel e da propriedade fiduciária em garantia. Outro exemplo seria o caso da 
propriedade fiduciária em garantia, que embora não esteja explicitamente referida como direito 
real na enumeração do artigo 1.225, acabou sendo disciplinada nos artigos 1.361 a 1.368-A45. 
Flávio Tartuce defende uma relativização da taxatividade dos direitos reais 
motivada principalmente pelo reconhecimento da influência do princípio da autonomia 
privada46 no direito das coisas. De acordo com o autor, o rol constante do artigo 1.225 do atual 
Código Civil não seria taxativo, mas sim exemplificativo, havendo uma quebra parcial da regra 
da taxatividade ou tipicidade dos direitos reais. As alterações legislativas recentes confirmariam 
o entendimento de que a relação constante do artigo 1.225 do CC/2002 é aberta, havendo a 
possibilidade de introdução de novos direitos reais por meio de novas leis no sistema jurídico47. 
A justificativa apresentada pelo autor baseia-se no fato de que o Código vigente é inspirado na 
teoria tridimensional de Miguel Reale48, que tem como um de seus pilares o princípio da 
 
 
43 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
44 TEPEDINO, Gustavo. Comentários ao Código Civil. vol. 11. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 37. 
45 LÔBO, Paulo. Direito civil. v. 4: coisas. 6. ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2021. E-book. Acesso restrito via 
Minha Biblioteca. 
46 A autonomia privada consiste “[...]no poder reconhecido aos particulares de autorregulamentação dos seus 
interesses, de autogoverno de sua esfera jurídica. [...] os particulares podem, no domínio da sua convivência 
com outros sujeitos jurídico-privados, estabelecer a ordenação das respectivas relações jurídicas.” (PINTO, 
Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. 4. ed. Coimbra: Editora Coimbra. 2005, p. 102). 
47 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
48 A teoria tridimensional do direito elaborada por Miguel Reale trata da relação dialética entre fato, valor e 
norma. “A norma será o fato valorado pelo magistrado em consonância aos princípios constitucionais. O 
magistrado exercerá a vital tarefa de, periodicamente, construir e reconstruir a norma, segundo o valor 
 20 
operabilidade49, que resulta em um sistema aberto e de cláusulas gerais com vistas a um Direito 
Civil mais efetivo50. 
Como consequência desta linha de pensamento, Cristiano Chaves Farias e Nelson 
Rosenvald afirmam que não se deve ter por absoluta a rigidez na elaboração de tipos no Código 
Civil. A autonomia privada pode, no âmbito de cada direito real, intervir para indicar diferentes 
modelos jurídicos, dentro dos espaços permitidos pela lei. Por isso, 
 
[...]os privados podem atuar dentro dos tipos legais, utilizando a sua vontade criadora 
para inovar no território concedido pelo sistema jurídico, modificando o conteúdo dos 
direitos afirmados na norma. Como exemplo, podemos citar a multipropriedade, – 
tanto resultante da fusão da propriedade individual e coletiva nas convenções de 
condomínio, como aquela tratada na propriedade de shopping center, de flat ou time 
sharing.51 
 
Como se vê, a multipropriedade imobiliária, que será vista em mais detalhes no 
capítulo 4 deste trabalho, se enquadra na regra apresentada por Cristiano Chaves Farias e 
Nelson Rosenvald, uma vez que não era tipo previsto até o ano de 2018 no Código Civil, quando 
passou a ser tratada expressamente por meio de norma jurídica, introduzida no ordenamento 
jurídico por meio da Lei nº 13.777, de 20 de dezembro 201852. 
2.1.3 Classificação 
Existem várias classificações doutrinárias relativas aos direitos reais, sendo que é 
majoritária a divisão desses direitos em dois grupos: Direito real sobre a coisaprópria (jus in re 
 
 
justiça.” (FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil: Teoria Geral. 9. ed. Rio de 
Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011. p. 55). 
49 O Princípio da Operabilidade, leva em consideração que o direito é feito para ser efetivado, para ser 
executado. Por essa razão, o Código Civil buscou evitar as complicações e complexidades. (GONÇALVES, 
Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, v. 1: parte geral. 18. ed. São Paulo Saraiva, 2019. E-book.). Para 
Reale, o princípio da operabilidade leva a redigir certas normas abertas, e não normas cerradas, para que a 
atividade social mesma, na sua evolução, venha a alterar-lhe o conteúdo daquilo que ele denomina estrutura 
hermenêutica. Essa estrutura hermenêutica complementa naturalmente a estrutura normativa. Por isso, a 
doutrina é fundamental porque ela é o modelo dogmático e teórico que diz o que os demais modelos jurídicos 
significam (CARVALHO, Augusto César Leite. Princípios de direito do trabalho sob a perspectiva dos 
direitos humanos. São Paulo: LTR, 2018. E-book. Disponível em: https://livros-e-
revistas.vlex.com.br/source/principios-direito-trabalho-perspectiva-direitos-humanos-22009. Acesso em: 20 
mar. 2021). 
50 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
51 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 12. 
52 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, vol. IV, 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. 
E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
 21 
propria), que é o domínio, e direitos sobre a coisa alheia (jura in re aliena) que são os demais 
direitos reais, além do domínio, como seus desmembramentos53. 
O direito real sobre a coisa própria, também conhecido por direito real ilimitado, é 
representado pela propriedade, que é o direito real por excelência, e constitui síntese de todos 
os direitos reais, manifestando-se no domínio, ou no poder de submissão de uma coisa à vontade 
da pessoa54. 
Maria Helena Diniz sistematiza os direitos reais dispondo a propriedade como 
elemento central deste sistema em razão do grau de extensão dos poderes existentes jus 
disponendi, utendi ou fruendi. Desta forma: 
 
[...] a propriedade seria o núcleo do sistema dos direitos reais devido estar 
caracterizada pelo direito de posse, uso, gozo e disposição. A posse aparece como a 
exteriorização do domínio. Todos os demais direitos reais formariam categorias 
distintas conforme atinjam o jus disponendi, utendi ou fruendi.55 
 
Assim, a propriedade é o único direito real em que o titular pode exercer os poderes 
de usar, gozar, dispor e reaver a coisa. Destaca-se que a qualquer momento o titular pode 
transferir um desses poderes para terceiro de forma que isto resultará em uma propriedade 
limitada, e desta maneira, o terceiro que recebeu aquele poder será titular de um direito real 
sobre coisa alheia56. 
Por sua vez, os direitos reais sobre a coisa alheia, também chamados de direitos 
reais limitados, se subdividem em três categorias: direito de gozo, de garantia e de aquisição. 
Os direitos reais de gozo sobre a coisa alheia conferem o poder ao sujeito para usar ou fruir os 
bens do qual não é o proprietário, sendo representados pelo usufruto, o uso, a habitação, a 
servidão, a superfície e a laje. Por sua vez, os direitos reais de garantia visam assegurar o 
cumprimento eficiente da obrigação garantida. Destaca-se que o gravame do direito real de 
garantia sobre a coisa alheia não importa a titularidade da propriedade do bem ao titular do 
direito. Encontram-se nessa categoria, a hipoteca, o penhor e anticrese. Por fim, o direito à 
 
 
53 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: direito das coisas. v. 5. 2. ed. São Paulo: Saraiva 
Educação, 2019. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
54 RIZZARDO. Arnaldo. Direito das Coisas. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense 2021. E-book. Acesso restrito via 
Minha Biblioteca. 
55 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. Vol. 4. 28. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2014. p. 35. 
56 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21. ed. rev. e atual. por Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012. E-
book. p. 17. 
 22 
aquisição de coisa alheia confere ao seu titular a prerrogativa de reivindicar a propriedade de 
bem objeto de compromisso de compra e venda, após integral pagamento do preço57. 
2.2 DIREITOS PESSOAIS 
Esta seção abordará as nuances dos direitos patrimoniais pessoais, também 
conhecidos como direitos obrigacionais, apresentando os seus principais conceitos, elementos 
e características. 
Para Clóvis Beviláqua, o direito das obrigações consiste num complexo de normas 
que regem as relações jurídicas de ordem patrimonial, que têm por objeto prestações de um 
sujeito em proveito do outro58. Em outras palavras, tem por objetivo a regulação dos vínculos 
jurídicos, no qual se encontra em um dos polos, alguém com o poder de exigir o cumprimento 
de uma determinada prestação, e no outro, alguém com o dever de cumprimento desta mesma 
prestação. Este ramo do direito civil trata dos vínculos existentes entre credor e devedor, 
excluindo de sua esfera as relações de uma pessoa para com uma coisa, em razão do qual, o 
primeiro pode exigir do segundo uma prestação59. Assim, este ramo do direito tem em seu cerne 
a obrigação60. 
O Código Civil de 2002 não definiu conceitualmente a obrigação. Desta maneira, a 
doutrina jurídica pátria concebe o conceito de obrigação como sendo a relação jurídica que tem 
caráter transitório que se estabelece entre um sujeito dito devedor e outro dito credor, cujo 
objeto é uma prestação pessoal e econômica, positiva ou negativa, sendo esta devida pelo 
primeiro ao segundo, garantida o adimplemento da pretensão por meio do patrimônio do 
devedor61. 
Pablo Stolzer Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho observam, além da 
transitividade, o elemento coercitivo presente no conceito de obrigação, indicando que ela se 
trata de relação jurídica de caráter transitório que estabelece vínculos jurídicos entre duas 
diferentes partes (credor e devedor), cujo objeto é uma prestação pessoal, positiva ou negativa, 
 
 
57 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil: Direitos das Coisas / Direito Autoral. 4. ed. São Paulo: 
Editora Saraiva, 2012, E-book. 
58 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Obrigações. Salvador: Livraria Magalhães, 1896. E-book. Disponível em: 
https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/242359. Acesso em: 24 mar. 2021. 
59 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Vol. 2. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 
60 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral das Obrigações. 22. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2007. p. 3 
61 MONTEIRO, Washington de Barros; MALUF, Carlos Alberto Dabus. Curso de Direito Civil: Direito das 
Obrigações. Vol. 4. Parte 1. 39. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009. 
 23 
garantido o cumprimento, sob pena de coerção judicial. Assim, a obrigação é uma relação 
jurídica, que exclui os deveres alheios ao direito, como o de gratidão ou cortesia, visto que o 
devedor pode ser compelido a realizar a prestação62 . 
Para Washington de Barros Monteiro, a efemeridade, maior ou menor, é inerente a 
todas as obrigações. Isto quer dizer que o caráter da obrigação é transitório uma vez que não 
podem existir obrigações perpétuas ou infinitas. Uma vez que determinada prestação foi 
satisfeita, seja de forma amigável ou judicialmente, põe-se um fim à obrigação63. 
Conforme lição de Paulo Lôbo o objeto da obrigação é a prestação: 
 
[...] ao direito corresponde o dever, que tem por objeto a prestação. Quando o direito 
pode ser exercido, tem-se a pretensão do credor, a que corresponde a obrigação do 
devedor (no sentido estrito e preciso do termo) de fazer, de não fazer e de dar. As 
obrigações de dar compreendem as obrigações de entregar ou restituir posse, 
propriedadeou outro direito64. 
 
Seu objeto consiste em uma prestação pessoal pois somente a pessoa vinculada está 
obrigada ao cumprimento da prestação. Assim, trata-se de relação jurídica de natureza pessoal 
e econômica, já que se institui entre duas pessoas (credor e devedor) e por ser necessário que a 
prestação positiva ou negativa (dar, fazer ou não fazer) tenha um valor pecuniário, isto é, que 
seja aferível em termos monetários65. 
O conceito de obrigação também pode ser explorado por meio da análise dos seus 
elementos constitutivos. A doutrina sistematiza os elementos constitutivos da obrigação em três 
grupos: elementos subjetivos, elementos objetivos ou materiais e elementos imateriais66. 
Em relação aos elementos subjetivos, trata-se dos sujeitos que se encontram nos 
polos da relação jurídica, representados pelo sujeito ativo (credor) que é o beneficiário da 
obrigação e pelo sujeito passivo (devedor) que assume um dever de cumprimento da obrigação 
sob pena de responder com o seu patrimônio. Os sujeitos da obrigação, tanto o devedor quanto 
o credor, podem ser pessoa natural ou jurídica desde que estes sejam determinados ou, no 
mínimo, determináveis. Não há possibilidade de obrigação sem conhecimento de seus sujeitos. 
 
 
62 GAGLIANO, Pablo Stolzer; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de direito civil: volume único. 5. ed. 
São Paulo: Saraiva Educação, 2021. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
63 MONTEIRO, Washington de Barros; MALUF, Carlos Alberto Dabus. Curso de direito civil. Vol. 4. Parte 1. 
38. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. 
64 LÔBO, Paulo. Direito Civil. Obrigações. Vol. 2. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. p. 21. 
65 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Obrigações e Responsabilidade Civil. 21. ed. São Paulo: Atlas, 
2021. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
66 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020. E-
book. 
 24 
O que pode ocorrer é que, em algumas ocasiões, o sujeito da obrigação não é desde logo 
determinado, porém, a fonte da obrigação deverá fornecer os elementos ou dados necessários 
para a sua determinação67. 
De uma maneira geral, a definição da titularidade do sujeito nos polos credor ou 
devedor da relação obrigacional dependerá da função que desempenham as prestações. Por 
exemplo, é bastante comum nas relações contratuais que os contratantes sejam, ao mesmo 
tempo, credores e devedores de prestações distintas68. 
De acordo com Fabio Ulhoa Coelho, os elementos objetivos ou materiais dizem 
respeito ao conteúdo da obrigação, ou seja, a prestação. Para o autor, é sempre uma conduta do 
devedor que se manifesta por meio de uma ação ou omissão dele. Esta conduta realiza as 
finalidades da obrigação estabelecidas pelas próprias partes ou pela lei. Ela pode ser positiva 
ou negativa. No primeiro caso, é uma ação do devedor, que se obriga a dar ou fazer algo; no 
segundo, é uma omissão, obrigando-se o devedor a não fazer determinado ato. A prestação 
positiva, por sua vez, pode ter por objeto uma coisa ou um comportamento esperado. No caso 
de ser uma coisa, o devedor se obriga a dar um bem ao credor. No caso de ser um 
comportamento, espera-se que o devedor faça algo, ou seja, que preste um serviço ou que aja 
conforme determinada maneira69. 
Por fim, os elementos imateriais da obrigação referem-se ao vínculo jurídico 
existente na relação obrigacional refletindo o liame legal que une os sujeitos, isto é, relação que 
obriga o devedor ao cumprimento da prestação positiva ou negativa em favor do credor70. De 
acordo com Washington Barros Monteiro este vínculo obrigacional: 
 
 
[...]expressa o direito do credor de impor ao devedor uma prestação positiva ou 
negativa, dando lugar a uma diminuição da liberdade do sujeito passivo, pois não 
poderá libertar-se da relação obrigacional sem cumpri-la, visto que o credor, 
insatisfeito, está autorizado a acioná-lo, promovendo a execução de sentença, 
penhorando seus bens e levando-os à praça, para obter com o produto o valor 
correspondente à prestação devida.71 
 
 
 
67 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Teoria Geral das Obrigações - v. 2. São Paulo: 
Saraiva, 2011. E-book. 
68 TEPEDINO, Gustavo. SCHREIBER, Anderson. Fundamentos do Direito Civil - v. 2 – Obrigações. Rio de 
Janeiro: Forense, 2020. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
69 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: Obrigações - Responsabilidade Civil. v. 2. 5. ed. – São Paulo: 
Saraiva, 2012. E-book. 
70 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Teoria Geral das Obrigações - v. 2. São Paulo: 
Saraiva, 2011. E-book. 
71 MONTEIRO, Washington de Barros; MALUF, Carlos Alberto Dabus. Curso de direito civil. Vol. 4. Parte 1. 
38. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 12. 
 25 
 
Para isso, o patrimônio do devedor serve de garantia do adimplemento ao credor, 
conforme disposto pelo artigo 39172 do Código Civil de 2002 evidenciando que o fato de que, 
embora a obrigação busque a prestação pessoal do devedor, na execução por inadimplemento 
pode se valer de seus bens para ser cumprida73. 
2.3 DISTINÇÃO ENTRE DIREITOS REAIS E DIREITOS PESSOAIS 
Como visto na seção 2.1, o direito das coisas disciplina as relações jurídicas que 
dizem respeito aos bens que podem ser apropriados pelo homem e, por isso, ele inclui tão 
somente os direitos reais. Neste sentido, para melhor entendimento dos conceitos relacionados 
aos direitos reais, se torna importante a distinção entre estes e os ditos direitos pessoais ou 
obrigacionais74. 
Tal distinção trata-se de uma questão recente, já que no direito romano clássico não 
havia quaisquer preocupações em elaborar uma teoria dos direitos reais, pois não se falava em 
direitos (jus), mas em ações (actio), por isso, afirma-se que a actio precedeu o jus tanto que os 
termos jus in re e jus ad rem, utilizados para distinguir os direitos reais dos pessoais somente 
irão aparecer no século XII sob a influência do direito canônico 75. 
Uma primeira distinção é feita com relação aos sujeitos que compõe a relação 
jurídica. Nos direitos pessoais, constate-se uma dualidade de sujeitos: o credor e o devedor 
atuam como sujeito ativo e passivo, respectivamente, sendo desta forma identificados quando 
se estabelece a relação jurídica. A importância do papel dos sujeitos na relação obrigacional se 
justifica na medida em que não há pretensão sem um credor que a pleiteie e por outro lado, não 
há prestação sem um devedor para cumpri-la76. Por sua vez, nos direitos reais, há apenas um 
único sujeito, uma vez que estes direitos disciplinam a relação entre o homem e a coisa, sendo 
que na relação jurídica, verifica-se a existência de três elementos: o sujeito ativo, a coisa e a 
 
 
72 Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor (BRASIL, 2002). 
73 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral das Obrigações. 22. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2007. p. 29. 
74 SCHREIBER, Anderson. Manual de Direito Civil: Contemporâneo. 4.ed. São Paulo: Editora Saraiva. E-
book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
75 ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 19. ed. São Paulo: Editora Forense, 2019. E-book. Acesso 
restrito via Minha Biblioteca. 
76 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. Vol.4. 27. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2012. p. 28. 
 26 
inflexão imediata do sujeito ativo sobre a coisa77. Conforme explica Arnaldo Rizzardo, a 
distinção entre os direitos pessoais e reais estaria no sujeito passivo, pois: 
 
[...] nos direitos pessoais, o sujeito passivo (ou devedor) é pessoa certa e determinada. 
Nos direitos reais, é indeterminado, o que redunda em uma obrigação passiva 
universal, consistente no dever de respeitar o direito. [...] não existe um devedor 
individual. Este surgirá quando se verificar a lesão no direito, pois o que há é uma 
obrigaçãopassiva universal, uma obrigação de abstenção de todas as pessoas. Todas 
são obrigadas a se abster de qualquer ato sobre a coisa, em face do direito real. O 
devedor da obrigação seria a totalidade das demais pessoas, excetuado, na 
humanidade, apenas o titular do direito, que seria o credor.78 
 
Outra distinção diz respeito ao direito de ação. Quando violados, os direitos 
pessoais dão ao titular (credor) o direito de ação contra o indivíduo que figura na relação jurídica 
como sujeito passivo (devedor). Por sua vez, nos direitos reais, em caso de violação, o titular 
do direito de ação só poderá exercê-lo contra aquele detiver a coisa79. 
Direitos reais e pessoais também se distinguem em relação ao objeto da relação 
jurídica. No direito pessoal, o objeto é uma prestação positiva ou negativa (dar, fazer, ou não 
fazer) do devedor enquanto o objeto do direito real é a coisa. Importante destacar que os direitos 
reais não criam obrigações para terceiros. Neste sentido, Orlando Gomes defende que os 
direitos reais geram uma obrigação passiva universal, isto é, um dever geral de abstenção de 
prática de qualquer ato que atinja direito do titular da coisa80. 
Outra característica em que se verificam distinções diz respeito à tipicidade dos 
direitos reais e dos pessoais. Neste sentido, constata-se que o direito pessoal é ilimitado, uma 
vez que se submete ao princípio da autonomia privada, permitindo que sejam criadas obrigações 
baseadas nas figuras contratuais previstas na lei ou ainda por meio de formas que não possuem 
correspondência na lei, isto é, por meio dos ditos contratos inominados ou atípicos, conforme 
se verifica por meio do artigo 42581 do Código Civil82. Conforme visto na seção 2.1.2, existe 
uma parcela da doutrina que considera possível a relativização da taxatividade dos direitos reais, 
 
 
77 MATHIAS, Maria Lígia Coelho. Direito Civil – direitos reais. Coleção Leituras Jurídicas – Provas e 
Concursos. Vol. 7. 4. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2011, p. 3. 
78 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Coisas. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. E-book. Acesso restrito em 
Minha Biblioteca. 
79 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil - Direito das coisas. Vol. 5. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 9. 
80 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21. ed. rev. e atual. por Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012. E-
book. 
81 Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código 
(BRASIL, 2002). 
82 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Reais. 20. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2020. E-book. 
 27 
o que os aproximaria, neste sentido, dos direitos pessoais. Todavia, a doutrina majoritária ainda 
adota o posicionamento de que os direitos reais não podem ser objeto de livre convenção entre 
particulares, ou seja, as partes não podem estabelecer, por si mesmas, direitos reais com 
conteúdo arbitrário, estando sempre vinculadas aos tipos jurídicos disponibilizados pela norma 
jurídica83. 
Os direitos pessoais e reais também se distinguem em razão da sua eficácia, isto é, 
característica que se relaciona à amplitude e aplicabilidade do direito perante a terceiros. Os 
direitos reais têm eficácia erga omnes, isto é, se exerce contra todos, indicado pela doutrina 
como o princípio do absolutismo. Já os direitos pessoais possuem eficácia interpartes, ou seja, 
são oponíveis entre as partes de uma relação linear, sendo tal característica expressão do 
princípio da relatividade dos efeitos contratuais84. 
Com relação à extinção, verifica-se que nos direitos pessoais diante da constatação 
do perecimento do direito que se dá quando o sujeito se queda inerte, operando a prescrição85 
ou a decadência86. Já nos direitos reais, estes se conservam até o momento em se constitua uma 
situação contrária em benefício de outro titular87. 
O direito de sequela, a possibilidade de aquisição mediante usucapião, a posse e a 
possibilidade de abandono da coisa são caracteres de exclusividade do direito real, como se 
verá a seguir. 
Em relação à sequela, o titular pode perseguir a coisa onde quer que se encontre e 
respondendo esta, onde quer que ela esteja, não restando esta possibilidade ao detentor do 
 
 
83 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 
2012. p. 30. 
84 DONIZETTI, Elpídio; QUINTELA, Felipe. Curso de Direito Civil. 10. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2021. 
E-book. Acesso restrito em Minha Biblioteca. 
85 Prescrição é a extinção de uma ação ajuizável em virtude da inércia de seu titular durante um certo lapso de 
tempo, na ausência de causas preclusivas de seu curso (MAGALHÃES, Esther C. Piragibe; MAGALHÃES, 
Marcelo C. Piragibe. Dicionário jurídico Piragibe. 9. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007) 
86 Decadência é instituto do direito substantivo em que há a perda de um direito previsto em lei. O legislador 
estabelece que certo ato terá de ser exercido dentro de determinado tempo, fora do qual ele não poderá mais 
efetivar-se porque dele decaiu o seu titular. A decadência se consubstancia pelo decurso de um termo 
prefixado para o exercício do direito. O tempo age em relação à decadência como um requisito do ato, pelo 
que a própria decadência é a sanção consequente da inobservância de um termo (GONÇALVES, Carlos 
Roberto. Direito civil: parte geral. Sinopses Jurídicas. v.1. 25. ed. São Paulo Saraiva, 2018. E-book. Acesso 
restrito via Minha Biblioteca). 
87 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 
2012. p. 30. 
 28 
direito pessoal já que estes geram a responsabilidade patrimonial dos bens do devedor pelo 
inadimplemento da obrigação88. 
A aquisição de direitos reais por meio de usucapião ocorre por meio das diversas 
modalidades previstas constitucionalmente e pelos outros instrumentos legais, sendo este 
instituto totalmente incompatível com os direitos pessoais89. 
A posse também é característica exclusiva do direito real, uma vez que ela é a 
exteriorização do domínio da coisa90. Ressalta-se que nem todos os direitos reais comportam a 
figura da posse, como é o caso, por exemplo, da hipoteca91. Por sua vez, há também quem 
defenda a possibilidade de posse dos direitos pessoais, com base na Teoria Objetiva de 
Lhering92, chegando a tal conclusão com base no corolário de que a posse é um exercício de 
um direito. Todavia, essa corrente não encontra eco uma vez que a posse não consiste no 
exercício de qualquer direito. Como a posse é exterioridade da propriedade, traduzindo-se em 
condição econômica para o exercício desse direito e sabendo que a propriedade se trata de um 
direito patrimonial, não lhe seria possível alargar o sentido para aplicá-la também aos direitos 
extrapatrimoniais93. 
Em relação à possibilidade de abandono, verifica-se aplicabilidade apenas aos 
direitos reais já que a coisa pode ser abandonada caso o titular desta não queira arcar com ônus 
gerados por ela. O abandono consiste no “[...] ato de derrelicção (perda voluntária da posse, 
cuja aparência fática é a de abandono material) praticado com a intenção de perder a 
 
 
88 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: 
Método, 2020. E-book. 
89 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, vol. IV, 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. 
E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
90 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, v. 5: direito das coisas. 16. ed. São Paulo: Saraiva Jur 
2021. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
91 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil – Direito das Coisas – Direito Autoral. 4. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2012. E-book. 
92 De acordo com a Teoria Objetiva de Lhering para constituir a posse basta o corpus, já que o animus está 
intrínseco no corpus. Lhering não contesta a necessidade do elemento intencional, apenas entende que esseelemento implícito se acha no poder do fato exercido pela coisa. A posse será a exteriorização da 
propriedade, o poder de dispor da coisa. É a visibilidade do domínio, tendo em vista a sua função econômica. 
O Código Civil adotou a Teoria Objetiva de Ihering no art. 1.196, que reza que se considera possuidor todo 
aquele que tem de fato o exercício pleno, ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. É o sinal 
exterior da propriedade, direito de possuir, e pelo qual o proprietário, de modo geral, afirma seu poder sobre 
aquilo que lhe pertence (CASSETTARI, Chistiano. Elementos de direito civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 
2021. E-book). 
93 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21. ed. rev. e atual. por Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012. E-
book. p. 43-44. 
 29 
propriedade (animus derelinquendi).”94 Assim, constitui-se em uma das hipóteses de perda da 
propriedade, cuja previsão está insculpida no inciso III do artigo 1.27595 do Código Civil de 
2002. No direito pessoal, inexiste a figura do abandono, uma vez que a prestação gera um dever 
de cumprimento que não pode ser desconsiderado, já que o devedor é compelido a cumprir a 
obrigação sob pena de responder com seu patrimônio96. 
Por fim, uma última característica em que os direitos se diferenciam diz respeito ao 
elemento da perenidade. Neste sentido, os direitos reais têm caráter permanente, enquanto os 
direitos pessoais possuem caráter transitório. Todavia, essa característica vem sendo cada vez 
mais contestada, já que existem atualmente muitos contratos que trazem em seu bojo o aspecto 
da perpetuidade diante do seu prolongamento no tempo, como por exemplo, os contratos de 
seguro-saúde e seguro de vida, que normalmente são contratos celebrados por longo prazo97. 
Finalizado o capítulo do estudo dos direitos patrimoniais reais e pessoais, o próximo 
capítulo tratará do estudo da propriedade, direito real sobre a própria coisa e aspectos inerentes 
ao instituto do Condomínio. 
 
 
94 DONIZETTI, Elpídio; QUINTELA, Felipe. Curso de Direito Civil. 10. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2021. 
E-book. Acesso restrito em Minha Biblioteca. 
95 Art. 1.275. Além das causas consideradas neste Código, perde-se a propriedade: [...] III - por abandono; 
(BRASIL, 2002). 
96 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Obrigações e Responsabilidade Civil. 21. ed. São Paulo: Atlas, 
2021. E-book. Acesso restrito via Minha Biblioteca. 
97 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: 
Método, 2020. E-book. 
 30 
3 O DIREITO DE PROPRIEDADE E O INSTITUTO DO CONDOMÍNIO 
 Este capítulo tratará sobre o direito de propriedade, seus conceitos doutrinários, 
elementos e principais características, abordando também a sua função social. Na sequência, 
será apresentado o instituto do condomínio e a sua relação com a propriedade, de modo a 
contribuir para o estudo do instituto da multipropriedade. 
3.1 CONCEITOS E ELEMENTOS DA PROPRIEDADE 
É consenso para a doutrina que a propriedade se apresenta como o direito real mais 
significativo e que por mais transformações passou ao longo da História da humanidade. Até 
hoje, a palavra propriedade não possui “[...] um significado unívoco, não se podendo manter a 
ilusão de que à unicidade do termo corresponda à real unidade de compacto instituto.”98 
A ideia de propriedade é algo que nasce junto com o indivíduo, valor 
essencialmente inato ao ser humano. Pode ser caracterizada tanto como um fenômeno jurídico 
quanto como um fenômeno social, todos estes incorporados pelo Direito. O conceito de 
propriedade evolui paralelamente “[...]com a transição da fase do homem selvagem para a do 
homem sedentário, quando a civilização se assenta sobre determinados espaços físicos, 
retirando da terra seu sustento e valores.”99. Assim, a noção de propriedade, a qual o ser humano 
se vê como dono de alguma coisa, antecede a mais embrionária forma de organização social a 
que se poderia chamar ordem jurídica100. 
Ainda hoje, os juristas se defrontam com o problema da conceituação do direito de 
propriedade. Ele reside, com relação ao direito vigente em cada país, na dificuldade de se 
resumirem, numa única definição, os múltiplos poderes do proprietário101. Neste sentido, Paolo 
Grossi observa que para melhor conceituar a propriedade é preciso defini-la como espécie de 
 
 
98 MATTIETTO, Leonardo. Função social e diversificação do direito de propriedade. Revista da Faculdade de 
Direito de Campos, Rio de Janeiro, v. 6, n. 6, p. 155-168, jun. 2005. Disponível em: 
http://fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista06/Docente/06.pdf. Acesso em: 15 abr. 2021. 
99 ASSIS, Luis Gustavo Bambini. A evolução do Direito de Propriedade ao longo dos textos constitucionais. 
Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo. v. 103. p. 781 – 791, jan./dez. 
2008. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67828. Acesso em: 15 abr. 2021. 
100 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil: Direitos das Coisas / Direito Autoral. 4. ed. São Paulo: 
Editora Saraiva, 2012. E-book. 
101 ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 19. ed. São Paulo: Editora Forense, 2019. E-book. Acesso 
restrito via Minha Biblioteca. 
 
 31 
mentalidade jurídica, isto é, tomar esta como um conjunto de valores enraizados em certo 
âmbito espacial e cultural, e que em cada etapa da histórica respeita um perfil específico102. 
O conceito clássico de propriedade origina-se do final do século XVIII, tendo sido 
inserido por meio do Código Civil Napoleônico. O Código Francês trazia em seu artigo 544 103 
a ideia de propriedade como o direito que o seu titular exerce de la manière la plus absolute104. 
No direito pátrio, a propriedade é reconhecida pela Constituição Federal da 
República Federal do Brasil de 1988 como direito fundamental previsto em seu artigo 5º, inciso 
XXII105. Tal direito, todavia, não goza de absolutismo, sofrendo determinadas limitações, 
estabelecidas pela própria carta cidadã de 1988, pelo mesmo artigo 5º, inciso XXIII106, 
relacionadas ao dever de cumprimento de determinada função social107. Luiz Edson Fachin 
indica que o direito de propriedade cumpre papel relevante para a concretização da dignidade 
da pessoa humana. Para o autor: 
 
A subjetivação jurídica do direito de propriedade tem hoje, no Brasil, explícito assento 
constitucional, como direito fundamental imbricado na respectiva função social. 
Assegura-se, assim, tanto o direito de propriedade como o direito à propriedade, 
instrumento que sirva à concretização da dignidade humana.108 
 
 
A carta magna de 1988 também inovou ao tratar do conceito de propriedade no 
âmbito da ordem econômica e financeira, por meio do artigo 170, reconhecendo que a livre 
iniciativa e a valorização do trabalho humano, primórdios da justiça social do Brasil devem 
atender ao princípio da propriedade privada conforme disposto no inciso II109. Assim como 
erigiu a propriedade como princípio, o legislador constituinte também elevou a função social 
 
 
102 GROSSI, Paolo. História da propriedade e outros ensaios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. 
103 Art. 544. A propriedade é o direito de gozar e dispor as coisas da forma mais absoluta, desde que não seja 
utilizada de forma proibida por lei ou regulamento (FRANÇA. Code Civil. Loi du 27 Janvier 1804 
promulguée le 6 février 1804. Paris, 1804. Disponível em: 
https://www.legifrance.gouv.fr/codes/section_lc/LEGITEXT000006070721/LEGISCTA000006117904/#LE
GISCTA000006117904. Acesso em 18 abr. 2021). 
104 DONIZETTI, Elpídio; QUINTELA, Felipe. Curso de Direito Civil. 10. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2021. 
E-book. Acesso restrito em Minha Biblioteca. 
105 Art. 5º. [...] XXII - é garantido o direito de propriedade (BRASIL, 1988). 
106
Art. 5º. [...] XXIII - a propriedade atenderá a sua função social (BRASIL, 1988). 
107 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único.10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: 
Método, 2020. E-book. 
108 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. XI. Atualizado por Luiz Edson 
Fachin. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 61. 
109 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim 
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: 
[...] II – propriedade privada (BRASIL,1988). 
 32 
da propriedade ao nível de princípio de modo a configurar requisito a ser observado para a 
garantia do direito de propriedade110. 
A Constituição não define exatamente o conteúdo e os limites do direito de 
propriedade, tendo delegado ao legislador infraconstitucional a tarefa de definir as condições 
para seu exercício no âmbito do direito privado e público. Como direito constitucionalmente 
previsto, a propriedade é protegida das arbitrariedades do Estado que, para intervir no seu 
exercício, deve preencher condições legais e constitucionais111. 
Sob influência do Código Napoleônico, Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda 
aduz que o conceito de propriedade pode ser visualizado em sentido amplíssimo, amplo, 
coincidente ou estritíssimo: 
 
Em sentido amplíssimo, propriedade é o domínio ou qualquer direito patrimonial. Tal 
conceito desborda o direito das coisas. O crédito é propriedade. Em sentido amplo, 
representa um direito irradiado em virtude de ter incidido regra de direito das coisas. 
Em sentido quase coincidente, é todo direito sobre as coisas corpóreas e a propriedade 
literária, científica, artística e industrial. Em sentido estritíssimo, é só domínio.
112
 
 
De fato, verifica-se uma correspondência do conceito de propriedade com o feixe 
de poderes jurídicos a partir do qual o proprietário pode utilizar a coisa ou praticar outros atos 
de disposição ou fruição, respeitando certas limitações impostas pelo Estado. Neste sentido, 
integram o polo passivo como sujeitos passivos da relação jurídica de propriedade todos aqueles 
que não o titular do direito; todos com o dever de abstenção oponível erga omnes pelo 
proprietário113. 
Modernamente, a propriedade, pode ser conceituada como: 
 
[...] o direito que vincula um sujeito – proprietário – a toda a coletividade, com relação 
a um bem – por um lado, atribuindo ao proprietário os poderes de usar, fruir, dispor e 
reivindicar, e o direito de possuir o bem, assim como o dever de, no exercício desses 
poderes e desse direito, atender à função social do bem, e, por outro, impondo à 
 
 
110 ASSIS, Luis Gustavo Bambini. A evolução do Direito de Propriedade ao longo dos textos constitucionais. 
Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo. v. 103. p. 781 – 791, jan./dez. 
2008. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67828. Acesso em: 15 abr. 2021. 
111 OLIVEIRA, Claudio Brandão de. A Constituição, o Estado e o Direito de Propriedade. In: OLIVEIRA, J. M. 
Leoni Lopes de (org.). Temas de direito privado. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p.87-118. 
112 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. XI. Atualizado por Luiz Edson 
Fachin. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 70. 
113 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: 
Método, 2020. E-book. 
 33 
coletividade o dever de respeitar a propriedade alheia, concedendo-lhe, por meio do 
Estado que a representa, o direito de exigir que seja cumprida a função social.114 
 
Para Alexandre Cortez Fernandes, o conceito de propriedade deve ser 
compreendido sob o ponto de vista de dois aspectos: um mais interno – de conteúdo econômico 
– representada pelo poder do titular sobre a coisa, e outro mais externo, de formato jurídico, 
que é o poder do proprietário em relação aos sujeitos passivos da relação jurídica de direito real. 
O aspecto interno identifica a propriedade com o poder uso, gozo e disposição da coisa. Já o 
aspecto externo representa a possibilidade de reivindicar a coisa e exclusão de terceiros115. 
Orlando Gomes leciona que o conceito de propriedade, para uma melhor 
compreensão, deve ser analisado sob a ótica de três critérios: o sintético, o analítico e o 
descritivo. No primeiro, trata-se do poder de submissão de uma coisa a uma pessoa, em todas 
as suas relações. No segundo, diz respeito ao direito de usar, fruir e dispor de um bem, e de 
reavê-lo, em caso de perda injusta para outrem. Por fim, de acordo com o último critério, trata-
se de direito complexo, absoluto e exclusivo, que resulta na submissão de uma coisa à vontade 
de uma pessoa, com as devidas limitações legais116. 
Constata-se que não há na legislação pátria, uma definição para o instituto da 
propriedade, havendo apenas uma menção feita pelo Código Civil de 2002 aos poderes do 
proprietário que conforme disposto no artigo 1.228117. O aludido artigo perfaz a descrição 
analítica dos poderes dominiais consubstanciados nas faculdades de usar, gozar, dispor e 
reivindicar a coisa que lhe serve de objeto118. 
Estes atributos podem ser reunidos em uma só pessoa, verificando-se, neste caso, a 
propriedade plena, ou simplesmente, a propriedade ou propriedade sem qualificativos: plena in 
re potestas. Mas pode ocorrer o desmembramento, transferindo-se a terceiros um ou mais 
poderes, como por exemplo, na instituição de usufruto, ou de uso, ou de habitação, resultando 
na situação em que a utilização ou fruição da coisa passe a compor o conteúdo patrimonial de 
outra pessoa (domínio útil). Outra possibilidade seria o perder o poder proprietário de dispor da 
 
 
114 DONIZETTI, Elpídio; QUINTELA, Felipe. Curso de Direito Civil. 10. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2021. 
E-book. Acesso restrito em Minha Biblioteca. 
115 FERNANDES, Alexandre Cortez. Direitos Civil: Direitos Reais. 2. ed. revista e ampliada. Caxias do Sul: 
Educs, 2016. p. 29. 
116 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21. ed. rev. e atual. por Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2012. E-
book. p. 103. 
117 Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do. Poder de 
quem quer que injustamente a possua ou detenha (BRASIL, 2002). 
118 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Direitos Reais. vol. 5. 8. ed. 
Salvador: ed. JusPOVIM, 2012. p. 262-263 
 34 
coisa, como por exemplo no caso de inalienabilidade por força de lei ou decorrente da vontade. 
Nessas hipóteses, diz-se que a propriedade é menos plena, ou limitada119. 
A faculdade de usar (ius utendi) consiste em dar à coisa a destinação econômica 
que lhe é própria, ou seja, dar-lhe uso sem promover alteração de sua substância. Assim, por 
exemplo, o titular usa o imóvel quando o habita, permite que terceiro o faça ou, simplesmente, 
o mantém em seu poder120. No entanto, o uso precisa ser civiliter, “[...] uma vez que o uso se 
subordina às normas da boa vizinhança e é incompatível com o abuso do direito de 
propriedade.”121 Subordinando, o parágrafo segundo do artigo 1.228 do Código de 2002122, a 
propriedade à teoria do abuso do direito, veda o exercício da propriedade dirigido no propósito 
de ser nocivo a terceiro123. 
O poder ou direito de gozar ou fruir (ius fruendi) consiste na percepção dos frutos 
e na utilização dos produtos da coisa. É o direito de gozar da coisa ou de explorá-la 
economicamente. Resulta na obtenção de vantagens econômicas que são geradas pelo bem, 
como os frutos industriais e civis, os produtos, os rendimentos financeiros e as outras utilidades 
que o bem possa produzir. O disposto pelos artigos 92124 e 1.232125 do Código Civil de 2002 
reforçam este atributo da propriedade: no primeiro, pelo reconhecimento da dependência 
existencial entre principal e acessório e no último, pelo regramento que estabelece que o dono 
do principal também o será dos seus acessórios.