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CEDERJ - CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Curso: Licenciatura em Geografia Disciplina: Geografia Política Autor: Ivaldo Lima AULA 8 O Nacionalismo e o Regionalismo em foco Meta Apresentar as noções de nação, nacionalismo e regionalismo no âmbito das relações socioespaciais. Objetivos 1. Definir a relação formada entre as noções de Estado, nação e nacionalismo; 2. Identificar uma tipologia e teorias de nacionalismos; 3. Discutir a relação formada entre região e regionalismo; 4. Distinguir os termos região, regionalização, regionalidade e regionalismo. Introdução: a dimensão político-geográfica do nacionalismo e do regionalismo O debate sobre as nações e os nacionalismos, sobre as regiões e os regionalismos é de extrema importância para a análise geográfica e, notadamente, para a geografia política. Isso porque os nacionalismos e regionalismos implicam movimentos sociopolíticos com uma clara referência espacial. Há territórios em jogo quando se fala das dinâmicas nacionalista e regionalista – os territórios nacional e regional, respectivamente –, o que equivale a dizer que esse jogo é disputado com referência à defesa desses territórios. Em outras palavras, há posições políticas assumidas por atores sociais em cada uma dessas dinâmicas, o que faz delas objeto de interesse político-geográfico, uma vez que essas posições podem conduzir – e quase sempre conduzem – a divergências em relação ao uso do espaço. Segundo Joan Nogué e Joan Rufí (2006), Qualquer território – e neste caso o território que reclama para si a condição de suporte da nação reivindicada – possui uma delimitação, ocupa uma porção da superfície da terrestre. Neste sentido, a primeira questão que se delineia, implícita ou explicitamente, em qualquer movimento nacionalista é até onde chega territorialmente a nação; quais são os seus limites ou, na maioria dos casos, quais deveriam ser esses limites, e a partir de que critérios são estabelecidos. São, certamente, questões elementares, mas de uma grande transcendência, porque, como lembra Raffestin (1980), “o limite provoca a diferença, ou, se preferirmos, a diferença suscita limite”. É um fato evidente que o discurso nacionalista necessita, antes de mais nada, esclarecer este ponto. O ponto a ser esclarecido é aquele referente aos limites territoriais da nação, ou seja, o alcance geográfica nacional. Mas, o que é uma nação? 1. A nação e o nacionalismo: das definições à tipologia Vejamos as considerações de López Trigal a esse respeito. Grupo de pessoas unido por vínculos étnicos, linguísticos ou culturais (em latim, natio), ainda que não necessariamente compartam o mesmo território. Noção enunciada primeiramente na tradição francesa (Rousseau, Sièyes, Renan) que representa uma comunidade histórica estável com consciência própria e cultura, valores e símbolos comuns, unida por vínculos contratuais que manifestam sua vontade de viver sob as mesmas leis. Um grupo de população unificado, cultural e politicamente, dotado de um elevado sentimento de participação em valores e instituições, do que decorre a prevalência de determinados interesses nacionais, trasladado á ideia da tradição alemã do Volksgeist [espírito de um povo] que considera a nação como um órgão ou ser vivo, que cresce e se desenvolve graças a ação inconsciente de uma força superior ou gênio nacional e que inspirou a escola de geografia política alemã a partir de Ratzel (LÓPEZ TRIGAL, 2013: 219). Joan Nogué (1998:17), nos alerta de que Os ideólogos do nacionalismo, apoiando-se às vezes em estudos teóricos sobre o tema, costumam apresentar o nacionalismo como uma força imanente, eterna, inamovível, autônoma, como uma força irracional arraigada em sentimentos atávicos e transcendentais. (...) Convenhamos que esta não é melhor maneira de enfocar o tema. (...) O nacionalismo não é um fenômeno natural nem nasce acidentalmente. (...) os nacionalismos funcionam atrelados a uma racionalidade política e ideológica, assim como a umas origens sociais que são analisáveis. Por mais complexas que sejam. Um os símbolos nacionais mais evidenciados é a bandeira de um país. Ela serve, antes de mais nada para identificar uma diferenciação territorial: uma nação territorializada. A marca nacional e seus símbolos Disponível em: http://4.bp.blogspot.com/- bwUggud4iZo/UJvDzjD7W3I/AAAAAAAACFo/pqZ7ELwKWGM/s1600/487042_4222680445013 07_1367147484_n.jpg. Acesso em: 15 maio 2017. Segundo o geógrafo Joan Nogué (1998:18), o nacionalismo é “um conjunto de expressões ideológicas que tentam fazer com que uma comunidade seja reconhecida como um todo e que se identifique a si mesma e em relação ao ‘outro’ como diferente, através da adesão a um conjunto de símbolos, valores e tradições”. Na perspectiva da geografia política – que valoriza o território como base e recurso político do processo de construção nacional num mundo constituído por Estados –, este autor vê os nacionalismos como uma forma territorial de ideologia, ou, como se queira, “uma ideologia territorial” (esta última expressão foi empregada por Benedict Anderson em seu livro Comunidades imaginadas, de 1983). Um dos aspectos mais característicos da ideologia e do movimento nacionalista é, na ótica de Joan Nogué, sua habilidade de redefinir o espaço, politizando-o e tratando-o como um território histórico distinto. “Os movimentos nacionalistas interpretam e se apropriam do espaço, do lugar, do tempo, a partir dos quais constroem uma geografia e uma história alternativas” (NOGUÉ, 1998:38). Em outras palavras, para o Autor, os movimentos nacionalistas expressam suas reivindicações em termos territoriais e, acrescentaríamos, vinculam-se, direta ou indiretamente, ao Estado territorial. ATIVIDADE 1 Atividade 1 (Atende ao objetivo 1) Uma ideia para nossa reflexão: As origens do nacionalismo como fenômeno moderno estão, inextricavelmente, vinculados ao nascimento do Estado-nação (DUPRÉ, 2011:187). _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ RESPOSTA COMENTADA As origens do nacionalismo estão condicionadas à ideia de uma nação que se reconhece como tal e de um Estado que lhe corresponda, culminando na fórmula Estado-nação. Essa fórmula política se desenvolve por meio dos ideais de afirmação de um Estado face aos demais, o que implica a seguinte situação: quanto mais coesa for a nação, mais forte será o Estado a ela correspondente. Desde as suas origens, o nacionalismo é, pelo exposto, uma prática política vinculada inseparavelmente às figuras do Estado e da nação. Podem ser identificados vários tipos de nacionalismos. Essa tipologia segue, aproximadamente, uma sequência histórica de diversos nacionalismos. Assim, com base na obra de A. Orridge, os geógrafos Peter Taylor e Colin Flint (2002) identificam cinco tipos fundamentais de nacionalismos, a saber: protonacionalismo; nacionalismo de unificação, nacionalismo de separação, nacionalismo de liberação e nacionalismo de renovação. Sistematizaremos, a seguir, a contribuição desses geógrafos. 1. Protonacionalismo. É o nacionalismo de Estados centrais originais, ou seja, os Estados de tamanho médio da Europa Ocidental. O geógrafopolítico Jean Gottmann, por exemplo, chega a mencionar a ideia de pro paria mori (morrer pela pátria) em trono de 1300. As afirmações do “nacionalismo” inglês que se encontram nas obras de Shakespeare, do final do século XVI e início do XVII, são exemplos mais conhecidos deste tipo de “patriotismo” precoce. Contudo, esses são exemplos de lealdade à monarquia, ao Estado ou até mesmo ao país, mas não à ideia coletiva de um povo que integra todas as regiões e classes sociais. A consequência disso foi o que Orridge denomina de “Estados protonacionais”. O povo começava a fazer parte da política, mas o nacionalismo como ideologia não se desenvolveu de todo até a chegada do século XIX; em consequência, podemos dizer que a nação precedeu ao nacionalismo. 2. Nacionalismo de unificação. Na Europa Central as pressões contraditórias dos Estados pequenos (à escala da cidade) e os grandes impérios multiétnicos haviam impedido que se desenvolvessem Estados de tamanho médio como aqueles da Europa Ocidental. Alemanha e Itália, por exemplo, eram mosaicos em que se mesclavam pequenos Estados independentes com províncias de impérios maiores. No exemplo germânico, o nacionalismo era, então, a justificação para que, sob o comando prussiano, se pudesse unir a maior parte da área cultural germânica em um novo Estado-nação; e que se pudesse transformar Itália a partir de uma mera “expressão geográfica” em um Estado-nação italiano. Esses são os dois principais focos originais dessa ideologia nacionalista de unificação. 3. Nacionalismo de separação. A maioria dos nacionalismos que trinfaram supuseram a desintegração dos Estados soberanos que os precederam. No século XIX e começo do XX, este tipo de nacionalismo esteve por trás da criação de um grande número de Estados a partir dos impérios austro-húngaro, otomano e russo. Na Europa Oriental, nos Bálcãs e na Escandinávia, novos Estados surgiram a partir desse tipo de nacionalismo. São exemplos os países: Albânia, Bulgária, Grécia, Finlândia, Hungria, Noruega, Polônia e Romênia. Também, há esse tipo de ideologia nacionalista nas tentativas de independência que ocorrem na Escócia, País Basco, Córsega, Québec e Valônia. 4. Nacionalismo de liberação. Aqui, falamos de desintegração dos impérios ultramarinos europeus. Quase todos os movimentos de independência nesses impérios foram “movimentos de liberação nacional”. O primeiro de todos foi o dos colonos estadunidenses em 1776, com a sua Guerra de Independência em relação à Inglaterra. Podem ser considerados movimentos nacionalistas liberais. No século XX, esses movimentos foram invariavelmente movimentos nacionalistas socialistas em suas diferentes versões: desde as mais moderadas, como a da Índia, até as mais revolucionárias, como a do Vietnã. Também, poderíamos tipologizar esses movimentos entre aqueles que se basearam nos grupos colonos europeus, como nos Estados Unidos, na América Latina, no Canadá, na Austrália, África do Sul e Nova Zelândia, bem como aqueles que se basearam nos povos indígenas, como em vários Estados Africanos e asiáticos. 5. Nacionalismo de renovação. Esse tipo tem a ver com as comunidades étnicas que lhe dão sustentação. Trata-se de uma renovação nacional para recuperar a grandeza perdida. Esse novo tipo de nacionalismo se converte, então, em um “grito de guerra”. Identifica-se no Irã, com a sua Revolução Islâmica, de 1978, por exemplo; ou na Turquia que, depois de perder seu império otomano na Primeira Guerra Mundial, se concentrou na sua essência étnica turca. Os casos clássicos desse tipo de nacionalismo se encontram no século XX na China e no Japão, dois impérios-mundo que foram incorporados intactos ao sistema-mundo moderno já a partir do século XIX. Israel é um caso muito característico desse tipo de nacionalismo de renovação, baseando-se no sentido inverso da diáspora sionista para formar um novo Estado no Oriente Médio. Podemos concluir, parcialmente, a partir dessa tipologia, que o nacionalismo é uma prática política com vários matizes, ou seja, que há variações no que denominamos de nacionalismo. Poderíamos, acompanhando as considerações de López Trigal (2013:221), acrescentar os tipos: a) nacionalismo regional (países árabes) e b) nacionalismo moderado ou soberanista (seguindo o discurso de forças políticas da Catalunha e do País Basco). Há, igualmente, uma ambiguidade fundamental que é o fato de o nacionalismo poder ser considerado algo bom, uma força positiva na história do mundo, quando se associa aos movimentos de liberação que se livra do domínio estrangeiro, ou algo desagradável, uma força negativa associada com o nacional-socialismo e com os fascismos na Europa, bem como com as ditaduras na periferia e na semiperiferia, como na América Latina, Ásia e África. ATIVIDADE 2 Atividade 2 (Atende ao objetivo 2) Observe a imagem de manifestação independentista na Catalunha. Disponível em: https://obeissancemorte.files.wordpress.com/2014/10/catalu1.jpg. Acesso em: 15 maio 2017. Explique a frase: Québec, Catalunha, Escócia e País Basco são exemplos contemporâneos de nacionalismo por separação. _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ RESPOSTA COMENTADA Os movimentos independentistas que se verificam atualmente no Canadá (no exemplo do Québec), na Espanha (nos exemplos do País Basco e da Catalunha) e no Reino Unido (no exemplo da Escócia) expressam claramente o nacionalismo de separação que defende a criação de um novo Estado-nação, dotado de território soberano. O Estado de origem ver-se-ia, desse modo, alijado de uma parte sociopolítica e territorial para dar lugar ao nascimento de uma nova entidade político-geográfica, isto é, de um novo país. Teoricamente, podemos sistematizar os nacionalismos entre i) aqueles que surgem de cima para baixo, ii) aqueles que surgem de baixo para cima e iii) aqueles que surgem de uma negociação de ideias. Essas variações nos permitem analisar os casos particulares da manifestação geo-histórica dos nacionalismos. Para tanto, apenas advertimos que os nacionalismos nunca ocorrem como fatos isolados, mas sempre vinculados a processos estruturais mais amplos que devem ser contemplados. É assim que Benedict Anderson, em seu livro mencionado há pouco, fala de comunidade imaginada para se referir à nação, ou seja, àquilo que poderá levar aos nacionalismos, como comunidades geradas a partir de um sistema cultural abrangente e, inclusive, anterior ao próprio nacionalismo, sem cair em posturas eurocêntricas, por exemplo. A frase mencionada por Gottmann – “morrer pela pátria” – expressa muito bem o sentimento de patriotismo. Para muitos autores, como Ben Dupré (2011), o nacionalismo é uma espécie de “primo-irmão” desse sentimento patriota, pois, com frequência, exige uma devoção fanática que exclui os outros e que pode alimentar um sentimento de superioridade sobre eles. Para Dupré, o caráter nacional que defende o nacionalismo pode ser, como apontou o filósofo alemão Schopenhauer em 1851, “somente outro nome para a forma que a pequenez, a perversidade e a vileza da humanidade adotam em cada país”. O Autor menciona Albert Einstein. Quando este afirma que o nacionalismo é uma “enfermidade infantil da humanidade”, pois o nacionalismo teria sido a causa fundamental dasGuerras Mundiais do século XX, e em tempos recentes, teria estado diretamente implicado nos fatos de violência espantosa e na grotesca “limpeza étnica” em lugares como Ruanda e os Bálcãs. Para Dupré (2011:184-5)): O nacionalismo vai mais além do amor ao país – o orgulho por seus sucessos e a preocupação por seu bem-estar – que é a base do patriotismo. Mais intencionado e mais intelectualizado que essa simples emoção, o nacionalismo costuma ter um componente ideológico ou político, que combina o sentimento patriótico com um programa para a mudança e o reconhecimento internacional. Em geral, a aspiração primordial de um programa nacionalista é conseguir um Estado próprio, um novo status que implique a independência e a soberania para uma comunidade cujos membros têm algumas razões para crer que formam uma “nação”. Dupré (2011) também nos indica que um aspecto característico dos nacionalismos é acreditar que seu próprio país é único (e, portanto, superior aos demais); assim como a convicção de que existe uma identidade ou caráter peculiar, o “gênio de uma nação”. Acredita-se, desse modo, em origens comuns, língua comum, mitos compartilhados, valores e memórias coletivas que funcionariam como fatores formadores da nação – essa “comunidade imaginada”, para relembrarmos, uma vez mais, as palavras de Benedict Anderson. 2. Região, regionalismo e regionalidade: uma distinção necessária Os termos geográficos região, regionalismo e regionalidade exigem uma distinção que esclareça o significado de cada um, bem como as vinculações entre eles. Isso porque esses termos estão implicados num processo geográfico bem mais amplo que é a regionalização, ou seja, um processo que define realidades e perfis regionais. A regionalização pode ser considerada simplificadamente como o processo de formação de regiões. Mas isso, embora correto, é apenas um começo, já que se trata de um processo bem mais complexo. A região é uma porção diferenciada do espaço geográfico. Muitos esclarecimentos já foram apresentados por geógrafos a esse respeito, como os livros de Sandra Lencioni (Região e Geografia) e de Roberto Lobato Corrêa (Região e Organização Espacial). Portanto, nesta aula, nosso objetivo não será tanto o de aprofundar o debate teórico-conceitual sobre o termo região, mas sim, partir de uma definição simples como a que foi mencionada, para pensar o regionalismo. A regionalidade pode ser conceituada como a identidade regional, ou seja, o sentimento de pertencimento entre uma sociedade e sua região. Desse modo, logo se percebe que as noções de região e de regionalidade nos servirão para pensar o regionalismo com mais clareza. Por quê? Porque o regionalismo é, antes de tudo, uma reivindicação política de caráter territorial que se refere a uma região. Essa referência é frequentemente reforçada pelo sentimento de pertença à região, ou seja, pela regionalidade. Assim, temos uma formulação político-geográfica extremamente interessante e complexa, qual seja: o regionalismo refere-se a uma região especificada por uma regionalidade. Regionalização Esse termo, aparecido na França por volta de 1960 no quadro das políticas de administração do território [aménagement du territoire], designa os esforços destinados a contrabalançar o papel considerado excessivo da aglomeração parisiense, visando favorecer o desenvolvimento econômico de grandes regiões. Essas últimas não tinham, todavia, uma existência oficial, devido ao retalhamento do território nacional, desde 1790, em um grande número de departamentos. Era necessário então reagrupá-los progressivamente numa vintena de regiões e essa foi a primeira etapa de uma política de regionalização. Foi necessário, em seguida, escolher em cada região uma capital regional (o que deu lugar às rivalidades entre as cidades) e financiar em cada uma dessas regiões os equipamentos coletivos (sobretudo do terciário superior) para que cada uma pudesse responder melhor às demandas da população do novo conjunto regional. Essa foi a segunda etapa da regionalização. Foi necessário, enfim, dotar cada região de um poder regional que tomaria a iniciativa de novas realizações, sem depender, portanto, de decisões tomadas na capital [Paris]. A lei de descentralização de 1982 conferiu novos poderes aos conselhos regionais e decidiu enfim as eleições com base no sufrágio universal. Mas, pouco depois, em 1984, os poderes dos departamentos, pelo menos aqueles dos conselhos gerais, foram reforçados. Em 2003, a descentralização na França foi ainda acentuada por uma reforma da Constituição, notadamente fazendo com que crescessem os poderes de cada um dos conselhos regionais das 22 regiões. Contudo, isso suscita as rivalidades com os conselhos gerais departamentais ou com as grandes comunidades urbanas, os quais dispõem, frequentemente, de meios financeiros mais importantes do que aqueles das regiões onde eles se situam. As políticas de regionalização levadas na França ou em outros Estados revelam a geopolítica, pois tratam das rivalidades de poderes no território. Regionalismo Movimento geopolítico que se impõe ao centralismo de um Estado-nação e que reivindica a outorga [concessão] de vantagem de poder aos representantes de uma região em razão de suas particularidades culturais, notadamente da persistência de uma língua regional. Os movimentos regionalistas que, frequentemente, são minoritários na sua região, podem lentamente se tornar autonomistas e depois separatistas, a fim de romper com o Estado-nação e transformar a identidade regional naquela da nação independente, onde a língua (mesmo se ela for muito marginal) é, a seus olhos, a comprovação real. Extraído de: LACOSTE, Y. De La géopolitique aux paysages. Dictionnaire de la géographie. Paris: Armand Colin, 2003, pp. 326-327. Segundo a geógrafa Iná de Castro (1992:29 e ss.), a região é o território da ação política e deve ser vislumbrada, obrigatoriamente, nas reflexões cobre o regionalismo que à região se refere. Para a Autora: Como não há regionalismo sem substrato regional, a compreensão do primeiro supõe a necessidade de discutir e conceituar a região, enquanto base territorial para expressão do fato político. A análise do espaço regional pressupõe, então, o conhecimento do espaço como um nível de generalização maior, ou seja, como produto da transformação da natureza pelo trabalho social. (...) A região, portanto, é a escala socioespacial, que possui uma especificidade funcional, definida nos processos sociais, que condicionam e são condicionados por espaços diferenciados.(...) A região é o espaço da sociedade local, em interação com a sociedade global, porém configurando-se de forma diferenciada. (...) A região, é então, uma fração estruturada do território (...), é o espaço vivido, ou seja, o espaço das relações sociais mais imediatas e da identidade cultural. E sobre o regionalismo, Castro (1992: 40), o define como “a mobilização política de grupos dominantes numa região em defesa de interesses específicos frente a outros grupos dominantes de outras regiões ou ao próprio Estado”. Para a Autora, “[o] regionalismo, portanto, é um conceito eminentemente político, vinculado, porém, aos interesses territoriais (...), [ele] constitui a expressão das relações políticas entre as regiões ou destas com o poder central”. No seu dicionário de Geografia Política, López Trigal (2013) faz interessantes considerações sobre o regionalismo. Vejamos algumas delas. Movimento político e cultural tendente a alcançar para uma região umacerta autonomia, o que supõe, de fato, reformar o Estado desde dentro, atendendo a tais demandas. Se ode entender, em certo sentido, enfrentando-se ao nacionalismo, enquanto que este não considera a região como uma comunidade territorial soberana, mas sim uma integrante da comunidade nacional que é aquele com supremacia política e administrativa. Na Espanha, o regionalismo aparece no final do século XIX, pretendendo afirmar a identidade e a personalidade histórica, cultural, econômica e social como também normativa e político-administrativa de algumas regiões no marco institucional de um Estado centralizado, reivindicando um “Estado regionalizado”. A depender das especificidades locais, tem-se um “regionalismo descentralizador” (para alguns, um regionalismo saudável como repulsa ao nacionalismo) e um “regionalismo desagregador” ou nacionalismo regional, tal como aparece atualmente na Europa (Catalunha, País Basco, Escócia, Flandres, Padania) com projetos favorecedores do reconhecimento de uma nação e com presença frequentemente entre as regiões mais desenvolvidas e dinâmicas de cada Estado, para os quais se considera o regionalismo como “um mero ajuste técnico do Estado”. Com essas considerações, pretendemos oferecer uma instrumentalização teórico-conceitual sobre os termos nacionalismo e regionalismo, principalmente. Essa instrumentalização deverá servir de preparação para análises concretas dos casos nacionalista e regionalistas vigentes e vindouros no mundo contemporâneo. Atividade Final Atividade Final (Atende ao conteúdo geral da aula) Analise atentamente o texto a seguir. Vemos que junto ao “nacionalismo” sempre encontramos “subnacionalismos” que estão dispostos a, mais dia menos dia, organizar os povos que pretendem representar na forma de um “Estado nacional” com leis, território e forças militares específicas. José Gil sintetiza de maneira magnífica o problema quando conclui que “tanto opressores quanto oprimidos desejam juntar-se em ‘comunidades nacionais’, os primeiros prontos a sacrificar as minorias às próprias ambições centralizadoras e os segundos defendendo a sua própria identidade. E, não raro, os oprimidos de hoje, tornam-se os opressores de amanhã” (MARTINS, 1992:63). As ideias do texto nos permitem considerar que mobilizações regionalistas podem se converter em nacionalismos ou “subnacionalismos”? Por quê? _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Resposta comentada O texto é bastante esclarecedor quanto às dinâmicas político-territoriais internas de um Estado, sobretudo, às dinâmicas vinculadas às reivindicações autonomistas de caráter regionalista/nacionalista. Em outras palavras, as ideias do texto nos permitem deduzir que algumas mobilizações regionalistas, ao requerem mais autonomia regional, podem se converter em manifestações nacionalistas, posto que a ideia de comunidade regional pode vir a ser complexificada e passar a representar uma comunidade nacional. Este parece ser o caso atual da Catalunha, na Espanha, haja vista que, nessa região autônoma espanhaola, se expressa publicamente o desejo popular de se criar um Estado catalão independente. Percebe-se que a relação entre regionalismo e nacionalismo pode ser traçada por uma linha muito tênue e ultrapassada a depender da situação real em que se encontram as sociedades locais que reivindicam mais autonomia territorial. A luta política da região catalã é, pois, uma luta (sub)nacionalista, se acompanharmos as mencionadas ideias de José Gil. . Na próxima aula, trataremos de um assunto extremamente instigante e vinculado a esta Aula 8, que é o tema do Estado. Vamos averiguar de perto a relevância do estudo do Estado, dos limites e das fronteiras. Até lá! Resumo Nesta aula, propusemos uma sistematização básica dos termos nação, nacionalismo, região, regionalização, regionalismo e regionalidade, com ênfase maior no termo nacionalismo e, em segundo lugar, no termo regionalismo. Os objetivos visavam o esclarecimento conceitual dos termos, mas, sobretudo a as conexões que existem entre eles. Esperamos ter apresentado uma sistematização que permita ao futuro profissional da Geografia a capacitação para realizar análises dos fenômenos político-geográficos ligados a essa temática regional-nacionalista. Referências bibliográficas CASTRO, Iná. O mito da necessidade. Discurso e prática do regionalismo nordestino. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992 LÓPEZ TRIGAL, Lorenzo. Diccionario de Geografía Política y Geopolítica. León: Universidad de León, 2013 MARTINS, André. Fronteiras e nações. São Paulo: Contexto, 1992 NOGUÉ, Joan. Nacionalismo y territorio. Lleida: Milenio, 1998 NOGUÉ, Joan; FONT, Joan. Geopolítica, identidade e globalização. São Paulo: Annablume, 2006 DUPRÉ, Ben. 50 cosas que hay que saber sobre política. Barcelona: Ariel, 2011 TAYLOR, Peter; FLINT, COLIN. Geografía Política. Economía-mundo, estado- nación y localidad. Madri: Trama, 2002